Os dias que se seguiram àquela noite no bar pareciam ter sido marcados por um silêncio incomodativo. Lúcia tentava se concentrar no trabalho e nas pequenas coisas que a faziam feliz, mas a presença de Beatriz continuava a rondar seus pensamentos. Ela se forçava a não pensar demais, a se convencer de que estava sendo exagerada, mas as cenas daquele dia — Beatriz sempre tão atenta a André, sempre tentando capturar sua atenção — não saíam da sua mente.
Naquela terça-feira, Lúcia se encontrou com André para o café de sempre, esperando que a rotina as acalmasse, que as risadas e as conversas os ajudassem a esquecer o mal-estar que estava começando a pairar sobre eles. Quando entrou no café, ele já estava lá, como sempre, e seus olhos se iluminaram ao vê-la. Mas ao se aproximar, Lúcia notou algo que a fez prender a respiração: Beatriz estava sentada ao lado de André.
“Oi, Lúcia!” Beatriz disse com um sorriso largo, quase forçado, enquanto se afastava um pouco para dar espaço para que Lúcia se sentasse. Mas a maneira como ela olhou para André, e o fato de estar ali, sem ser convidada, sem nem mesmo avisar que se encontraria com ele, fez Lúcia se sentir deslocada. Havia algo de intencional naquela situação.
“Oi, Beatriz…” Lúcia respondeu com um sorriso um tanto seco, tentando manter a cordialidade, mas sentindo o desconforto escorrer por sua pele. Ela olhou para André, que parecia um pouco surpreso, mas ainda assim sorria com a mesma energia. A conversa seguiu, mas Lúcia não conseguia desviar o olhar de Beatriz, que fazia questão de falar mais do que o necessário, de se inclinar para André com uma confiança desconcertante, como se estivesse em casa.
“Então, Lúcia,” Beatriz começou, sem tirar os olhos de André, “estava pensando em organizar um encontro com o pessoal do escritório para a próxima semana. Você não se importaria de vir, não é?” Ela virou a cabeça, agora encarando Lúcia diretamente, com um sorriso doce, mas ao mesmo tempo, algo provocante, como se a provocação fosse disfarçada de gentileza.
Lúcia não sabia como reagir. Ela não queria dar a impressão de que estava sendo possessiva ou insegura, mas não conseguia ignorar o tom de superioridade que Beatriz trazia na conversa. Algo nela, algo muito profundo, estava começando a sentir que ela era vista apenas como uma intrusa, alguém que não pertencia a aquele círculo, aquele espaço.
André parecia completamente alheio à tensão. Ele estava absorto nas palavras de Beatriz, como se fosse a coisa mais natural do mundo tê-la ali, entre eles, quase como uma convidada de honra. Mas Lúcia não sabia como lidar com aquela situação, com a presença de Beatriz invadindo algo que ela sentia ser só seu e de André. Havia algo de invasivo na forma como Beatriz olhava para ele, na forma como tocava seu braço quando falava de algo engraçado, como se já tivesse um direito sobre ele.
No fundo, Lúcia sabia que estava apenas sendo sensível, talvez exagerando, mas a semente de insegurança já havia sido plantada. Não podia negar que sentia ciúmes. Era algo novo para ela, algo que ela sempre evitara. Mas agora, com Beatriz ali, com sua presença tão dominante, esse sentimento era inevitável.
Após aquele encontro, Lúcia não pôde deixar de se perguntar se estava sendo racional ou não. Ela sentia uma mistura de emoções: desconforto, frustração, insegurança. Mas, ao mesmo tempo, ela sabia que a relação que ela tinha com André não era simples. Ele não era um objeto, um prêmio a ser disputado. E ainda assim, o que Beatriz estava fazendo a fez se sentir pequena, como se fosse uma sombra que sempre estava por perto, esperando o momento certo para se infiltrar.
No final da semana, a situação piorou. Durante um encontro com o grupo, Beatriz não apenas se posicionou entre Lúcia e André de forma calculada, mas também começou a compartilhar histórias pessoais de uma maneira exagerada, como se quisesse destacar o quão próxima ela era de André. “Eu e o André sempre fomos grandes amigos, sabe? A gente se conhece há tanto tempo…” Beatriz disse, enquanto ria, tocando o ombro de André de uma forma que parecia mais íntima do que qualquer toque amigável deveria ser.
Lúcia engoliu a vontade de revirar os olhos, tentando manter a compostura. Mas sentiu que, naquele momento, algo dentro dela se partia. Era como se ela fosse uma espectadora em sua própria vida, assistindo a algo acontecer sem poder fazer nada para impedir.
André percebeu a mudança no clima. Ele observava Lúcia com atenção, já sentindo a tensão crescente. Algo havia mudado nela, algo estava diferente. Ela estava mais quieta, mais distante, e ele sentia que não era apenas o cansaço. O olhar dela, que antes sempre encontrava conforto no dele, agora parecia evitar o contato.
Ao final do encontro, enquanto todos se despediam, André tomou coragem. Ele se aproximou de Lúcia, preocupado. “Ei, você está bem? Você está mais quieta hoje. Alguma coisa aconteceu?” Ele perguntou suavemente, com o olhar genuinamente preocupado.
Lúcia olhou para ele, forçando um sorriso. “Sim, André, estou só cansada. Acho que a semana foi mais difícil do que eu pensei.” Ela se sentiu estranha mentindo, mas não queria colocar a situação em palavras. Ela não queria dar a impressão de que estava reagindo de forma exagerada. Mas, por dentro, ela sabia que estava lidando com algo muito maior do que simples cansaço.
André hesitou, mas não insistiu. Ele apenas a observou por mais um momento, sentindo que havia algo errado, algo que ele ainda não conseguia compreender. Quando se despediu de Lúcia naquela noite, ela tentou manter o semblante tranquilo, mas dentro de si, um tumulto de sentimentos se formava. Ela sabia que Beatriz estava tentando se aproximar dele, e, mais importante, ela sabia que o comportamento de Beatriz não era inocente. Ela estava jogando um jogo, um jogo que Lúcia não sabia se tinha forças para vencer.
Enquanto caminhava para casa, Lúcia não pôde deixar de pensar em tudo o que havia acontecido, em como Beatriz parecia ter um controle tão natural sobre a situação. E mais uma vez, sentiu uma frustração crescente. Ela sabia que, se queria algo com André, teria que enfrentar isso — essa batalha silenciosa, esses ciúmes disfarçados que estavam tomando conta de seu coração. Mas, naquele momento, o que mais ela queria era entender de onde vinham esses sentimentos, e o que exatamente estavam significando.
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Atualizado até capítulo 24
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