A Fada e o Playboy
Tyler
Passo o dedo pelo visor do celular, irritado é claro, já é a sétima mensagem nos últimos quinze minutos. Que parte do NÃO ESTOU A FIM ela não entendeu?
Como se não bastasse, a reunião está um tédio tão profundo que até os executivos mais proeminentes da Medeiros Empreendimentos estão abrindo a boca e bocejando. Mesmo meu pai, na sua postura de dono do mundo, está começando a parecer frustrado.
O homenzinho estranho que conduz a reunião está animado, apontando para os índices na tela projetada, com uma luzinha vermelha que volta e meia escapa e vai parar nos olhos do meu pai.
O velho vai acabar demitindo o sujeito. E eu preciso dar um jeito de me mandar daqui, antes que acabe velho e enrugado como os executivos ao redor da mesa, uvas passas vestidas com ternos.
Com duas palavras pipocando na minha cabeça, ODEIO FINANÇAS, empurro a cadeira e levanto. Meu pai ergue os olhos na minha direção e aperta a linha entre as sobrancelhas.
Um sorrisinho endiabrado brota na minha boca, mas me contenho, mordendo a língua para me impedir de provocá-lo. Meu pai sabe que vou dar o fora.
— Com licença — digo e sem esperar por qualquer resposta, dou as costas para a reunião financeira e saio.
Caminho até o elevador e aperto o botão.
— Aonde pensa que vai, Tyler? — meu pai pergunta, atrás de mim. Viro e encaro o olhar de reprovação que sempre aparece quando diz respeito a algo que eu faça.
— Dar o fora — respondo sem desviar.
— Você não vai a lugar nenhum, volte já pra lá.
— Nem que o mundo estivesse acabando e ouvir aquele cara falar fosse a única salvação — declaro, tirando a
gravata e abrindo um sorriso irônico que sei que vai irritá-lo.
— Nós temos um acordo, mantenho sua mesada se você trabalhar na empresa.
— Nesse caso seria um salário e não mesada.
Ele bufa.
— Um salário teria muito menos zeros — devolve, afiado.
— Touché.
Um nó se forma na minha garganta, faz algumas semanas que meu pai me deu um ultimato, ou trabalho na empresa ou ele para de me bancar de vez, me chuta do testamento e deixa que eu “aprenda a
viver pelas minhas próprias pernas”. Talvez ele esteja certo e estou cansado dessa disputa em que estamos desde que eu me formei na faculdade.
— Não vou voltar pra lá — respondo, sabendo o resto do discurso dele.
— Você deu sua palavra — meu pai, o poderoso empresário Raimundo Medeiros, me lança seu famoso olhar de decepção. — Temos um acordo.
— E eu tenho cumprido minha parte, só que ser o filho atencioso e centrado que um dia vai assumir os negócios do
pai e ficar ouvindo aquele sujeito chato falar sem parar não faz parte do pacote, pai.
— Mas faz parte do fato de ser meu filho e ser o herdeiro dos nossos negócios.
Dou um passo na direção dele e coloco minhas mãos nos seus ombros, suspiro, apelando pelo bom e velho jeitinho de filho.
— Você sabe que eu te amo, não sabe? Pai, você é meu ídolo, meu exemplo...
— Pare com isso, essa conversa pode funcionar com sua mãe, mas não comigo.
— Bom, é a verdade, eu o amo, pai, mas jamais vou ser você.
Entro no elevador e aperto o botão do estacionamento.
— Você não vai... — ele coloca a mão e segura a porta aberta.
— Com todo o respeito que o senhor me ensinou a ter, mas você tem um herdeiro perfeito sentado do seu lado na
reunião. — Tiro a mão dele que mantém a porta aberta.
— Sua irmã é uma...
— Ela é uma mulher, eu sei, mas elas vão dominar o mundo, pai, acostume-se. — A porta se fecha bem diante de um olhar vermelho e uma linha tensa na testa do meu pai.
Ele não é machista de proposito, foi criado assim e não sabe como mudar, mas talvez um dia acabe percebendo que a melhor escolha para sucedê-lo é minha irmã mais nova. Sue é uma cópia do pai, adora números e reuniões chatas e se alguém pode levar as nossas empresas para o futuro é ela.
É uma pena que ele não veja isso.
Penso em todo o esforço que minha irmã tem feito nos últimos cinco anos para conquistar seu espaço e mostrar ao
nosso pai que merece estar ao seu lado, enquanto o elevador desce. Sue é linda, talentosa, inteligente e sabe exatamente como lidar com executivos e suas luzinhas idiotas em reuniões de merda.
Diferente de mim que não suporto nada disso.
Mas e quem é que consegue convencer meu velho?
Termino de tirar a gravata e a enfio no bolso do terno. Não é que eu não goste de trabalhar, só não acho que seja a coisa certa pra mim. Não nasci para demitir, contratar, fechar negócios milionários. Não gosto de ver a dor nos olhos de um empregado no chão de fábrica ao ser demitido, ou na fila de candidatos para uma vaga que vai pagar uma ninharia. Isso não é pra mim.
Já tentei muito me adequar ao que meu pai espera de mim, mas cheguei à conclusão de que sou inadequado e ponto final. Não tem nada que possamos fazer sobre isso, nunca serei o que ele quer e ele nunca me aceitará como eu sou.
Então, o jeito é ir embora, curtir o resto do meu maldito dia, quem sabe dar uma corrida na Beira Mar Norte e acabar a noite enterrado em um rabo empinado e gostoso.
Desço em silêncio até o andar da garagem. Meu celular começa a tocar e um número desconhecido pisca na tela. Desligo sem atender, coloco o aparelho no bolso e saio para o ambiente escurecido do estacionamento.
Caminho por entre os carros e de longe vejo meu Range Rover. Sigo na direção dele, mas uma sensação estranha me faz parar bem no meio do estacionamento e olhar ao redor.
Como não vejo nada, me preparo para escapar da empresa antes que meu pai decida aparecer por aqui e me levar de volta com um puxão de orelha.
Dou mais alguns passos, mas paro quando um barulho alto me chama atenção. Viro na direção do som e vejo um SUV escuro vindo a toda velocidade pra cima de mim.
Só tenho tempo de me jogar para o lado e rolar.
O carro freia com força, cantando pneu.
Ainda em alerta, levanto e volto minha atenção para o carro.
Grito uma porção de palavrões por causa do susto, e vejo uma mão surgir de dentro da janela do motorista.
A unha vermelha ergue o dedo do meio, me mandando para aquele lugar.
— Sua Vaca! — É minha única resposta.
O carro parte em disparada, me deixando com o terno todo empoeirado e um rasgo na calça.
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Atualizado até capítulo 37
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