Luz e Sombra: A Dança dos Vampiros
Sob o céu cinzento e pesado, a cidade de Valeford parecia envolta em um véu de mistério. As ruas de paralelepípedos estavam cobertas por uma neblina espessa, e cada esquina parecia esconder segredos antigos, aguardando para serem revelados. Elara Hawthorne caminhava por essas ruas com passos hesitantes, seu coração dividido entre a esperança e a inquietação.
Elara Hawthorne
Ela era uma jovem de beleza singular, seus cabelos ruivos caindo como chamas emolduradas pela névoa. Os olhos castanhos, cheios de determinação, contrastavam com a vulnerabilidade que ela carregava em seu interior. A vida em Valeford tinha sido uma prisão de responsabilidades e expectativas, e Elara sonhava em ir além dos muros invisíveis que a cercavam.
Naquele dia, enquanto suas pernas a guiavam pelas ruas que conhecia tão bem, ela se encontrou em frente à mansão de Sebastian Von Lichtenberg.
A construção gótica erguia-se na colina como um predador, observando a cidade abaixo com uma presença ameaçadora. As histórias sobre o vampiro que ali residia sussurravam em sua mente, carregadas de mistério e temor.
Sebastian era um nome envolto em lendas sombrias. Viúvo, recluso, e com uma filha, Lila, que havia sido tragicamente silenciada pela morte de sua mãe. Segundo boatos, o próprio vampiro predou sua companheira.
Diziam que ele a protegia com um fervor quase animalesco, temendo que o mundo tirasse dela o pouco que restava de sua inocência. Elara sentiu um calafrio percorrer sua espinha. Havia algo naquela mansão que parecia chamar por ela, como uma sombra antiga tentando se arrastar de volta à luz.
Lila Von Lichtenberg
Sebastian Von Lichtenberg
Ela balançou a cabeça, afastando os pensamentos, e apressou o passo, tentando esquecer a estranha sensação que a invadira. Mas a imagem de Sebastian permanecia, como um eco persistente em sua mente, mesmo que ela nunca o tenha visto pessoalmente.
A jovem caminhava em direção ao mercado, seus pensamentos tão inquietos quanto as folhas que o vento levava pelo caminho. A agitação do mercado contrastava com o peso silencioso que crescia em seu peito. O murmúrio das vozes, o som dos carrinhos de madeira passando sobre as pedras, tudo parecia abafado pela tempestade que rugia dentro dela. As dívidas que assombravam sua casa pareciam crescer a cada dia, ameaçando devorar a pequena loja que ela e seu pai lutavam para manter.
— Elara, — a voz de John Hawthorne soou áspera ao seu lado, enquanto ele vasculhava legumes com dedos calejados. — Frivolidades são um luxo que não podemos nos dar. Não mais. — Ele suspirou, sem erguer os olhos, como se o simples ato de falar sobre o assunto já o esgotasse.
— Frivolidades? — Elara parou por um instante, segurando um saco de açúcar com as mãos trêmulas. — Pai, é apenas um pouco de açúcar... para fazer um bolo. Uma simples lembrança do que a vida costumava ser, antes de tudo desmoronar. — Sua voz era um sussurro cortante, carregada de frustração contida.
John levantou os olhos lentamente, seu olhar cansado, oscilando entre a tristeza e a resignação. — Um pouco de açúcar... — Ele deu uma risada sem humor, seca como a terra estéril. — Se pudéssemos viver de bolos e doces, talvez eu não precisasse me preocupar se teremos um teto sobre nossas cabeças no próximo mês. Mas não é assim, Elara. A realidade não é doce. Cada moeda importa. Cada escolha pesa como uma pedra sobre nós.
Elara sentiu um aperto no peito, o gosto amargo da impotência subindo à sua garganta. — Você acha que não sei disso? — respondeu ela, a voz quebrando levemente. — Acha que eu não sinto esse peso todos os dias? Eu só queria... — Ela parou, incapaz de continuar, as palavras morrendo em sua boca. Queria dizer que apenas desejava um pedaço de normalidade, uma lembrança de tempos mais leves. Mas até isso parecia um sonho distante agora.
John suspirou profundamente, seus ombros curvando-se sob a carga invisível que o esmagava. — Eu sei que queres, filha. Mas desejos não pagam contas. — Ele fez uma pausa, os olhos suavizando por um breve momento. — Eu adoraria te dar o mundo, mas tudo o que posso te oferecer agora é sobrevivência. E até isso está ficando difícil de garantir.
O silêncio entre eles era pesado, carregado de palavras não ditas e de uma dor compartilhada que parecia crescer como uma sombra. Elara segurou o pacote de açúcar por mais um segundo antes de devolvê-lo à prateleira, sentindo o sabor amargo da derrota.
— Vamos terminar logo com isso, — murmurou ela, virando-se para continuar a seleção dos alimentos. Mas seu pai, percebendo a decepção nos gestos dela, tocou-lhe o ombro com suavidade.
— Elara, — sua voz agora era quase um sussurro, mais suave, mais humano. — Não estou te pedindo para desistir dos teus sonhos. Só preciso que segure as rédeas agora, enquanto os tempos são cruéis. — Ele a olhou com uma expressão de quem carregava um fardo muito maior do que suas palavras deixavam transparecer. — A tempestade vai passar. Só precisamos ser mais fortes que ela.
Na mansão dos Von Lichtenberg
Sebastian observava o jardim da mansão com olhos pesados, enquanto o sol da manhã tingia o céu de um tom suave de dourado. Mas o brilho da luz não conseguia dissipar a escuridão que pairava dentro de sua casa. Sua filha, Lila, brincava sozinha entre as flores, girando em silêncio, o vestido leve flutuando ao vento. Seu sorriso era tímido, quase como uma memória distante de algo perdido para sempre. Desde a morte da mãe, o silêncio havia se tornado sua única forma de comunicação. E para Sebastian, aquele silêncio era mais ensurdecedor do que qualquer grito.
Ele suspirou profundamente, sentindo o peso de uma impotência que nunca havia sentido antes. “Como posso proteger alguém do que ela não diz?” pensava ele. Todos os dias, ele tentava alcançar sua filha, quebrar o véu de tristeza que a cercava, mas era como tentar agarrar o vento.
— Lila, — chamou ele, sua voz suave, mas firme. A menina olhou para ele, seus olhos castanhos profundos, mas vazios. Não havia palavras, não havia perguntas. Apenas o silêncio.
Sebastian aproximou-se lentamente, sentindo cada passo como um mergulho em águas escuras. Ele se ajoelhou ao lado da filha, observando o rosto sereno, mas distante dela. — Você se lembra das histórias que sua mãe contava sobre as flores? — Ele tocou uma das pétalas com cuidado, como se ela pudesse quebrar ao menor toque. — Ela costumava dizer que cada flor tem uma música, mesmo que nós não possamos ouvi-la. — Seu tom era suave, quase um sussurro, como se tentasse alcançar o coração da filha por entre as sombras.
Lila continuou a girar, lentamente, o vestido flutuando ao redor dela como a brisa leve que movia as flores. Mas suas palavras não atravessavam o silêncio.
Sebastian fechou os olhos por um momento, sentindo a dor de sua própria incapacidade. “Como posso trazer a luz de volta ao mundo dela, quando eu mesmo estou preso na escuridão?” Ele pensava, os dedos apertando levemente o caule de uma flor.
A solidão o envolvia como um manto, denso e implacável, e pela primeira vez na vida, ele se sentia verdadeiramente impotente. Havia um buraco no coração de sua filha que ele não sabia como preencher, e isso o aterrorizava. Mais do que qualquer inimigo que já enfrentara, mais do que qualquer ameaça que já havia conhecido.
— Eu vou encontrar uma maneira, — murmurou ele para si mesmo, embora não soubesse como. “Eu preciso encontrar uma maneira. Por ela. Pelo fantasma que deixamos para trás.”
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Atualizado até capítulo 69
Comments
Leya
16/11/24
2024-11-17
1
Mellika Duarte
comecei agora a ler
2024-10-27
2
Mikaela
parece ser boa a história
2024-10-19
0