O som dos cascos do cavalo se dissipou quando Kael finalmente parou em uma pequena clareira escondida entre as árvores altas. A escuridão da noite havia caído completamente, e a única luz vinha da lua tímida que conseguia atravessar a folhagem espessa acima deles.
Herla desceu do cavalo com um suspiro, aliviada por finalmente ter os pés no chão novamente. A cavalgada havia sido intensa, e a proximidade com Kael ainda a deixava desconcertada. Ela não estava acostumada a depender de ninguém, muito menos de alguém como ele, cujas intenções ainda eram um mistério.
— Vamos descansar aqui por enquanto — disse Kael, sem sequer olhar para ela, enquanto amarrava o cavalo a uma árvore próxima. Ele começou a procurar por gravetos e pedras, preparando o terreno para uma fogueira.
Herla se afastou um pouco, tentando manter distância tanto física quanto emocional. O silêncio da floresta parecia amplificar seus pensamentos, deixando-a inquieta. Por mais que tivesse escapado por enquanto, os magos da Academia não desistiriam tão facilmente. Ela precisava recuperar sua magia, e rápido.
— Não devíamos continuar? — perguntou ela, cruzando os braços. A ansiedade de estar parada, vulnerável, fazia sua mente correr.
Kael olhou para ela de relance, antes de se abaixar para acender o fogo.
— O cavalo precisa descansar, e nós também — disse ele, de forma prática. Ele não parecia minimamente preocupado com a possibilidade de serem seguidos. — Além disso, se eles quisessem nos alcançar, já teriam feito isso.
Herla bufou, mas não tinha como negar a lógica dele. Seu corpo estava exausto, mesmo que sua mente se recusasse a descansar. Ela se sentou em um tronco próximo, ainda mantendo Kael à vista.
Kael acendeu a fogueira com facilidade, e as pequenas chamas começaram a crescer, iluminando o acampamento improvisado com uma luz suave e trêmula. O calor da fogueira trouxe um certo alívio ao frio da noite, mas não foi suficiente para relaxar completamente Herla, cujos pensamentos permaneciam agitados.
— Você não me perguntou por que os magos estavam atrás de mim — disse ela de repente, sua voz ecoando no silêncio da noite. **Havia uma ponta de desconfiança em seu tom, seus olhos fixos no fogo que crepitava.
Kael não ergueu o olhar de imediato, concentrado em ajeitar a fogueira. Ele parecia deliberadamente não interessado nos segredos de Herla, o que a deixava ainda mais inquieta.
— Se quisesse me contar, já teria feito isso — respondeu ele, finalmente, de forma casual, como se o assunto não importasse.
Essa resposta a irritou mais do que o esperado. A aparente indiferença de Kael era desconcertante. Ele a estava ajudando, mas não parecia se importar com seus motivos. Isso era incomum para alguém como ela, acostumada a ser questionada, temida ou reverenciada.
— E por que você me ajudaria\, então? — ela pressionou\, a irritação transparecendo em sua voz. **Ela não confiava em Kael\, mas não podia negar que ele a estava ajudando\, e isso a deixava desconfortável**.
Kael finalmente ergueu os olhos para ela, o brilho das chamas refletindo em seus olhos astutos.
— Não se preocupe, eu não faço nada de graça — respondeu ele com um sorriso de canto.
Herla estreitou os olhos, tentando decifrar a intenção por trás daquele comentário.
— Ah, é? E o que exatamente você quer em troca? — perguntou, tentando manter a compostura.
Kael não respondeu imediatamente. Ele se levantou lentamente, caminhando até o cavalo para pegar algo em uma das bolsas amarradas à sela. Herla acompanhou cada movimento com os olhos, sempre alerta.
— Eu ainda não decidi — disse ele, finalmente, lançando-lhe um olhar cheio de significado, antes de se sentar ao lado da fogueira com um pedaço de pão e um pequeno cantil de água. Ele mordeu o pão com a mesma calma que parecia reger cada uma de suas ações, como se o tempo estivesse sempre a seu favor.
Herla ficou em silêncio por alguns momentos, tentando digerir as palavras dele e sua aparente falta de urgência. Kael era um enigma — um que ela não conseguia decifrar facilmente, e isso a deixava inquieta.
— Se acha que vou ficar lhe devendo favores, está muito enganado — ela murmurou, tentando soar mais confiante do que realmente se sentia naquele momento.
Kael riu baixinho, sem tirar os olhos da fogueira.
— Já está me devendo, Herla. Só estou sendo educado o suficiente para não cobrar... ainda.
Herla bufou, revirando os olhos. Ela odiava a sensação de estar em dívida, ainda mais com alguém como ele. Mas, por mais que detestasse admitir, precisava de Kael agora. Pelo menos, até conseguir recuperar seus poderes.
Ela se ajeitou no tronco onde estava sentada, observando o céu escuro acima. As estrelas mal eram visíveis através das copas das árvores**, mas o silêncio da noite era quase reconfortante. Ela não sabia o que o futuro traria, mas tinha certeza de uma coisa: Kael estava mais envolvido do que deixava transparecer, e ela precisava descobrir o que ele realmente queria antes que fosse tarde demais.
Ela soltou um suspiro, deixando-se cair levemente no tronco, seus olhos voltados para o céu escuro acima. Lá se foi a minha ideia de ter uma vida normal, pensou, um toque de sarcasmo percorrendo sua mente. Tudo o que ela queria, ao acordar, era poder recuperar suas forças, talvez viver longe de problemas, sem ser caçada ou obrigada a confiar em estranhos.
Mas agora, aquela esperança parecia tão distante quanto as estrelas ocultas pelo dossel das árvores. "Agora, estou em uma floresta, com um homem enigmático, fugindo de magos que querem me capturar... Realmente, uma vida normal está fora dos meus planos."
Ela bufou internamente, seu humor ácido trazendo um alívio momentâneo ao peso da situação. No entanto, enquanto seus pensamentos vagavam sobre sua realidade, Herla percebeu que algo mais a incomodava. Não era apenas o fato de estar fugindo ou de sua magia perdida. Era Kael.
Ela tentou afastar a ideia, mas sua mente sempre voltava para ele. Quem era Kael, realmente? Ele havia aparecido do nada, e desde então, estava ao seu lado, calmamente aceitando toda a loucura ao redor. Não havia feito perguntas, não havia mostrado medo ou hesitação. Qualquer pessoa normal estaria nervosa, ou ao menos curiosa, com magos poderosos os caçando. Mas Kael... ele parecia estar completamente no controle.
Por que ele não quer saber mais sobre mim? Essa questão a perturbava, pois, até então, todos que se aproximavam dela o faziam por conta de seu poder ou de seus segredos. Kael, no entanto, parecia indiferente a ambos, o que, ironicamente, o tornava ainda mais misterioso.
Herla lançou um olhar de relance para ele, observando-o à distância, sentado perto da fogueira. Ele estava relaxado demais para o gosto dela. **Nada naquela situação parecia abalar Kael, e isso só aumentava a curiosidade dela.
Talvez seja eu quem deva fazer as perguntas, pensou, **sentindo o impulso de descobrir mais sobre ele. Quem era esse homem que, sem nenhuma boa razão, estava ajudando-a a fugir? Havia algo por trás de sua calma, algo que ela ainda não conseguia entender, mas queria.
— Você sempre é assim? — Sua pergunta saiu mais repentina do que ela planejou.
Kael ergueu os olhos, uma sobrancelha arqueada.
— Assim como? — perguntou ele, uma leve provocação em sua voz.
Herla cruzou os braços, tentando parecer casual, mas a curiosidade a estava consumindo.
— Calmo. Como se nada ao seu redor fosse importante. Como se estivesse... acostumado a lidar com esse tipo de coisa.
Kael sorriu de canto, o brilho das chamas refletindo em seus olhos.
— Digamos que aprendi a não me surpreender com facilidade — respondeu ele, evasivo, enquanto dava mais uma mordida no pão.
Herla franziu o cenho. Não estava satisfeita com essa resposta.
— E o que exatamente você já viu que o faz pensar que tudo isso é normal? — Ela continuou, seu tom misturando desconfiança e genuína curiosidade.
Kael a observou por um momento, como se estivesse ponderando até onde poderia ir com suas respostas. Então, ele deu de ombros.
— Ah, você sabe... o mundo é cheio de surpresas. E, se você viver o suficiente, começa a perceber que nada é tão incomum quanto parece.
Herla não pôde evitar sentir que havia muito mais por trás das palavras dele. Ela o observou por mais alguns segundos, e quanto mais tentava entendê-lo, mais curiosa se tornava. Kael era diferente, e isso a irritava, porque ela não gostava de mistérios que não conseguia resolver.
Kael quebrou o silêncio antes que ela pudesse continuar a interrogá-lo.
— Então, qual é o seu plano? — perguntou ele, tranquilamente, jogando o graveto que estava em suas mãos na fogueira. — Quero dizer, depois de fugir dos seus "amigos", o que você vai fazer?
Herla estreitou os olhos, considerando o que ele disse. Ela sabia que não podia continuar fugindo sem rumo.
— Recuperar minha magia, o mais rápido possível. Não posso continuar fugindo como uma... — Ela hesitou. A ideia de admitir sua vulnerabilidade a deixava irritada.
Kael arqueou uma sobrancelha.
— Sim, parece um bom plano. Mas você não tem magia agora, e os magos provavelmente estão vasculhando cada cidade maior à sua procura. Se você tentar ir para a capital... — Ele fez uma pausa dramática, apontando para as árvores ao redor. — Bem, vai ser uma repetição de hoje, só que muito mais complicada.
Herla bufou, irritada.
— Então qual seria sua brilhante sugestão? — Ela sabia que ele estava certo, mas admitir isso para Kael seria insuportável.
Kael deu de ombros, como se a resposta fosse óbvia.
— Se eu fosse você, me manteria fora de vista por um tempo. Viveria uma vida simples, misturando-se com o resto de nós, pessoas comuns. — Ele lançou um sorriso provocador na direção dela. — Quem sabe até se tornar uma aventureira? Você poderia até se divertir.
Herla piscou, incrédula.
— Aventureira? Eu sou uma maga, Kael. A mais poderosa que este império já viu, não uma mercenária qualquer. Acha que vou andar por aí matando monstros insignificantes por algumas moedas? — Pensou Herla
— É isso ou continuar fugindo — O tom de Kael se manteve calmo, mas havia um peso nas palavras dele que a fez pensar. — Não estou dizendo que vai ser fácil, mas é uma forma de se esconder à vista de todos.
Herla ficou em silêncio, analisando a proposta. A ideia a incomodava profundamente — viver como uma pessoa comum, sem sua magia, parecia uma humilhação. Mas Kael estava certo: ela não poderia continuar fugindo indefinidamente. E a capital, o lugar mais óbvio para buscar respostas, estava fora de questão enquanto os magos a caçavam.
Ela olhou para Kael, que a encarava com aquela expressão despretensiosa de sempre. Ele parecia perfeitamente confortável em seu papel de aventureiro, e Herla sentiu uma ponta de inveja. Viver uma vida sem magia, sem o fardo do poder, era algo que ela nunca havia considerado.
— E onde exatamente você sugere que eu comece essa nova carreira? — perguntou ela, sarcástica, mas com um toque de curiosidade. A ideia estava começando a se infiltrar em sua mente, mesmo que ela odiasse admitir.
Kael sorriu de canto.
— Podemos ir até uma cidade pequena, ao sul. Há uma guilda de aventureiros por lá. Eles costumam ter missões simples o suficiente para alguém que... — Ele deu uma pausa provocadora, observando a expressão irritada dela. — Digamos, está começando uma nova vida.
Herla lançou um olhar afiado para Kael, mas no fundo, sabia que ele tinha razão. Não era uma questão de orgulho agora, mas de sobrevivência. E, enquanto estivesse sem magia, precisava encontrar uma maneira de se manter fora do radar dos magos.
Ela bufou, exasperada.
— Isso é temporário — disse ela, apontando o dedo para ele. — Assim que eu encontrar uma forma de resolver minha situação, vou sair dessa vida ridícula.
Kael levantou as mãos em sinal de rendição, ainda com o sorriso de canto no rosto.
— Claro, claro. Temporário. — Ele se levantou, pegando o cantil de água. — Mas enquanto isso, você vai precisar aprender a se virar sem seus "truques" misteriosos.
Herla o observou, ainda relutante em aceitar totalmente a ideia. Mas algo dentro dela sabia que, no momento, isso era o melhor a fazer.
Ela teria que aprender a sobreviver no mundo comum, sem depender de sua magia, e talvez Kael pudesse ajudá-la nesse novo caminho. Mesmo que fosse por um curto período, viver como uma aventureira seria uma maneira de se esconder e, ao mesmo tempo, de planejar seu próximo passo.
Enquanto Kael se afastava para verificar o cavalo, Herla deixou escapar um suspiro cansado. A ideia de se passar por um aventureiro era quase ridícula, mas não havia como negar que, por enquanto, era sua melhor opção.
Fim do Capítulo 4
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Atualizado até capítulo 27
Comments
🏹💕mycupidaneko💘🐈
A cada capítulo, me apaixono mais por essa história. 📖❤️
2024-09-26
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