Ela apenas me ignorou e continuou caminhando.
Fui em direção ao meu 4x4 preto, um Toyota Land Cruiser 200 que se erguia como um titã de aço e borracha. Este veículo, um utilitário esportivo alto e robusto, era perfeitamente adequado para enfrentar o clima extremo da região. Suas rodas enormes foram projetadas para atravessar a neve profunda sem esforço, enquanto o chassi elevado impedia que o veículo ficasse preso nos bancos de neve mais traiçoeiros. A carroceria, revestida de um metal resistente ao frio e à corrosão, brilhava sob o pálido sol, refletindo a luz em um caleidoscópio de cores frias.
Quando vi que ela seguia pelo caminho em direção ao ponto de ônibus, acelerei, ao passar ao lado dela, fiz uma curva de 90 graus, parando bem na frente dela com um grande estrondo de pneus. Ela não esperava por isso; vi a surpresa e o medo surgindo em seus olhos.
— Entre — disse com voz fria e autoritária.
— Alfa Samuel, não é necessário, eu pego o ônibus. — Disse em voz baixa e trêmula.
— Não vou me repetir — foi a única coisa que disse, deixando claro no meu tom de voz que estava irritado e que não havia espaço para negociações.
Ela entrou no banco do passageiro e fechou a porta com um pouco mais de força do que o necessário. Um sorriso ameaçou se formar no canto dos meus lábios. ‘Vamos, cachorra, um pouco mais’, pensei para mim mesmo. Mas apaguei qualquer rastro de sorriso do meu rosto, voltando a ser o mesmo de sempre, quando em seguida ouvi:
— Sinto muito, Alfa, não vai acontecer de novo.
Não tinha certeza se ela estava se referindo à tentativa de bater na minha porta. Decidi ignorá-la.
A estrada se estendia diante de nós, com árvores e mato nas laterais, e o céu ainda estava tingido de um azul escuro, como se a noite não quisesse soltar seu abraço. Kattie estava quieta, olhando pela janela com uma expressão que misturava medo e determinação. Sabia que estava prestes a cruzar uma linha, já tinha passado dos limites durante nosso café da manhã, e isso me fazia sentir uma estranha mistura de satisfação e culpa.
— Vai me levar o caminho todo? — perguntou finalmente, sua voz era quase um sussurro.
Seu tom estava carregado de um temor palpável, mas também de uma certa rebeldia que mal aparecia, como um raio de sol em uma tempestade.
— E se eu fizer isso, cachorra? O que você vai fazer a respeito? — respondi, tentando manter minha voz firme, embora uma leve hesitação denunciasse minha intriga.
Esta era a parte do jogo que mais gostava, mas desta vez, algo em seus olhos me dizia que estava no limite, um limite diferente; um ponto de ruptura e não sabia se era bom ou ruim.
A estrada estava deserta, sem outro veículo à vista. O motor do meu 4x4 rugia sob nós, uma espécie de rugido que parecia ressoar com as batidas do meu coração. A tensão era palpável. O silêncio se tornou pesado, até que Kattie quebrou o gelo com uma pergunta que me pegou de surpresa:
— Por que faz isso, Alfa Samuel? Por que não me deixa em paz?
Essa pergunta, simples e direta, me deixou sem palavras por um segundo. Meu lobo e eu estávamos em conflito constante, mas essa pergunta... essa pergunta tinha um tom que nunca tinha ouvido antes. Era como se, por um momento, Kattie não estivesse submissa, mas me enfrentando com sua verdadeira força.
— Não sei — disse finalmente, tentando soar indiferente, embora minha voz soasse mais vulnerável do que queria admitir.
— Talvez porque você é forte, e gosto de ver como luta, como se defende. Gosto de ver seu verdadeiro eu, não o que a alcateia te obrigou a ser — as palavras saíram da minha boca sem poder contê-las, como uma catarata que leva tudo em seu caminho.
Seu olhar se cravou no meu e, por um segundo, me pareceu ver um lampejo de algo que não conseguia decifrar. Era tristeza? Ou talvez algo mais perigoso, algo que me desafiava a seguir em frente?
Kattie não disse nada, apenas voltou a olhar pela janela, seu corpo estava tenso como um arco pronto para ser solto. A rota se tornava mais solitária, e o som do motor e o vento eram a única coisa que quebrava o silêncio.
A escola estava à vista, e o tempo parecia desacelerar. Sabia que estávamos no ponto sem volta.
— Vai deixar que eu vá, Alfa Samuel? — perguntou com uma voz que estava entre o medo e a determinação.
Não respondi imediatamente. Estava em uma encruzilhada. Meu lobo uivava dentro de mim, desejando que continuasse com o jogo, que a levasse ao limite. Mas uma parte de mim, essa parte que havia ficado calada por tanto tempo, também sentia algo mais profundo, algo que ia além da simples diversão.
A vi colocar um pé no chão, preparando-se para sair do carro. Então, algo dentro de mim fez clique. Sabia que devia ir mais além, que tinha que romper essa couraça que a mantinha cativa.
— Desça — disse com voz grave, mais séria do que o habitual.
Olhei-a nos olhos e, por um segundo, vi uma faísca de algo que não conseguia entender completamente. Era uma mistura de medo e fúria, mas também de uma determinação que me fez perceber que desta vez, as regras do jogo estavam mudando.
Kattie desceu do carro, mas antes de fechar a porta, olhou para mim uma última vez, com uma mistura de desafio e resignação.
— Não se esqueça, Alfa Samuel. Também tenho meus limites — disse olhando-me nos olhos, fechou a porta e foi embora sem olhar para trás.
Quando fechou a porta e se afastou, senti como se uma parte de mim tivesse mudado para sempre. Por algum motivo não senti satisfação diante do olhar que me deu.
Observei-a caminhar em direção à escola e, pela primeira vez, me perguntei se talvez, só talvez, o que Kattie mais precisava era, não um alfa dominante para ajudá-la a romper sua casca, talvez precisasse de um companheiro que visse seu verdadeiro eu e a ajudasse a se libertar de sua própria sombra. Mas isso não era tudo, havia outra pergunta na minha cabeça: por que meu lobo se contorce diante da mera ideia de que ela encontre seu companheiro?
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Atualizado até capítulo 97
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