Enquanto caminhava com os olhos quase fechados e a respiração baixa e precisa, Ciel parecia um cadáver ambulante, mas ela gostava da sensação.
Ela havia tido a ideia a partir de sua amiga coruja. Abaixando a respiração, fechando os olhos e tornando seus passos lentos e precisos, ela fazia o movimento automaticamente e assim guardava sua forças.
Não que a coruja caminhasse. Às vezes parecia que ela fingia estar a dormir apenas para não levar a culpa pela dura viagem.
Em um canto de sua mente, ela sorria por ter conseguido caminhar tanto. No início parecia desesperador, mas agora ela se sentia estranhamente vazia e relaxada.
Algumas vezes sua ansiedade brotava, o desespero vinha junto e ela agarrava a sua cabeça, esperando que passasse o mais rápido possível.
Sua cabeça doía assim que seus dedos paravam de cavar.
Ela mergulhava a cabeça na água morna em seguida, sonhando com o dia que teria coragem para se deixar afogar naquele rio cristalino.
Mas a caminhada recomeçava e dessa vez, ela finalmente viu alguma esperança.
À distância havia apenas escuridão, porém ela percebeu uma leve mudança de luz.
De início, ela se forçou a rejeitar. Ela não queria falsas esperanças.
Seus olhos já tinham feito o mesmo antes.
Mas dessa vez ela ficou sem fala e só pôde assistir com lágrimas nos olhos enquanto aquela escuridão ia se desfazendo de um jeito inexplicável e ilusório.
Quase como se fosse um tecido e uma parte daquele lugar.
Quando os arredores dela ficaram claros o suficiente, por alguns metros em todas as direções, ela apenas caiu de joelhos.
Lágrimas quentes desciam em cascata pelas bochechas magras, sua voz chorosa e rouca era um misto entre um rosnado, um riso e um gemido desesperado.
Ela mal sabia de onde havia saído, ou onde estava, mas sentia como se estivesse recebendo uma segunda vida.
Sem ter certeza de nada, ela tirou a mochila das costas enquanto a colocava sob o rosto.
Em meio a soluços, a jovem desmaiou, sendo vigiada de perto pelos olhos azuis brilhantes do belo pássaro.
***
Ciel franziu os olhos ao acordar com um bater de asas próximo ao seu rosto.
Abrindo os olhos, pela primeira vez sob luzes, ela manteve o olhar entreaberto por um momento. Se lembrando de como adormeceu, suas emoções pareciam querer voltar, mas ela mordeu os lábios secos levemente e se forçou a se sentar.
Seu corpo, agora dolorido em várias partes parecia mais revigorado. Aparentemente, ela dormiu bastante.
Olhando ao redor, seus olhos se arregalaram quando viram a coruja ali, parada indiferente enquanto bicava suas penas de aparência macia. Sob os pés dela estavam várias frutas, muito parecidas com peras.
Pensando sobre o tamanho do pássaro e suas garras longas, ela ainda deve ter buscado por duas ou três vezes.
"Por quem sabe qual distância", ela pensou.
Ciel engoliu em seco com a visão e aproximou a mão da indiferente e graciosa coruja. Lentamente ela acariciou um lado do animal, sorrindo ao perceber sua surpresa.
Ela não tinha pensado sobre, mas ela devia ter feito isso antes. O animalzinho era maravilhosamente fofo de se acariciar.
Ela até se sentiu um pouco mal por pensar em comê-lo.
A corujinha parecia vibrar sob o toque, fechando os olhos satisfeitos.
Ciel riu levemente e logo começou a comer. Com uma confiança estranha na comida que o animal deu a ela, Ciel mordeu sem hesitação.
Se surpreendendo sobre o quão doce era a fruta, logo haviam apenas os talos que nenhum dos dois pareciam querer.
Pensando sobre isso, ela finalmente percebeu que o pássaro não havia comido, assim como ela naqueles dias. Ela se sentiu mal pelo pássaro, mas em sua defesa, a coruja não parecia mudar nada de sua aparência redonda.
Depois de algumas horas olhando para o vazio e respirando suavemente, Ciel se ergueu e seguiu em frente. Com o pássaro logo voando para o seu ombro, como se já fosse sua propriedade, mesmo agora que eles estavam em uma bela planície.
Olhando naqueles olhos brilhantes e inteligentes, o pássaro parecia ter seus próprios planos.
***
Lentamente caminhando planície abaixo, Ciel lançou um olhar para trás, para a parede infinita de puro cinza e que mais fundo se tornaria a escuridão onde ela foi jogada.
Quão longe ela caminhou para sair de lá e quão longo era esse rio, ela pensou.
Mas logo ela deixou tudo de lado quando viu uma vasta floresta à distância.
Por um momento ela se sentiu sem fôlego com a visão, no outro ela se sentiu estranha.
"Será que eu fugi da frigideira pro fogo?", ela se questionou mentalmente, lançando um olhar para o seu parceiro de asas, mas vendo apenas a mesma elegante indiferença de sempre, ela se sentiu mais confiante.
Com um ar mais jovial e um pouco mais de cor depois do último sono, Ciel caminhou mais levemente. Em poucas horas ela já estava frente a frente com a muralha de árvores.
Passando a mão pelo tronco de uma e sentindo a textura, ela se sentiu estranhamente emocional. Quase como se voltasse para casa depois de muito tempo.
O terreno da floresta era belo e calmante para dizer o mínimo. O que melhorou o seu humor muitas vezes. Ela estava cansada da escuridão.
Chegando a evitar as sombras mais profundas das árvores automaticamente.
Horas se passaram assim, com cada respiração a fazendo se sentir mais revigorada, seus passos se tornaram mais ágeis. O rio ainda fazia companhia, sempre a sua frente como um amigável marco de esperança e conforto.
Estranhamente, seu outro parceiro, a coruja, parecia ter se tornado protetora. Sumindo em meio ao topo das altas árvores e a assustando, apenas para que uma chuva daquelas mesmas frutas caíssem em seguida.
Ciel já comia como um coelho faminto quando o pássaro desceu, se espreguiçando com um ar orgulhoso. Até gemendo um pouco ao ser acariciada. Pouco a pouco, ela parecia entender o humor inocente e amistoso da bela coruja.
Juntos eles caminharam em silêncio, pelo que pareceram mais dois dias de uma jornada sem pressa ou inconvenientes.
Ciel sentia como se aquele mar de folhagens, humidade, silêncio e sombras pouco a pouco estivessem curando sua mente dolorida e acalmando o seu coração, assim se surpreendeu quando a floresta finalmente deu sinais do seu fim.
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Atualizado até capítulo 29
Comments
dziyyo
Essa história deixou uma marca na minha vida, com certeza vou indicar a todos. 😍
2023-08-03
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