02

— Pelo visto já estão se entendendo — a voz de Vinicius soou pela sala, desvio os olhos de Ivy dolorosamente e encaro meu cunhado, minha respiração pesada, os braços na cintura, tentando manter a postura.

Vinicius está parado na porta da sala, com seu típico termo preto e as mãos nos bolsos, seus olhos param em mim por alguns segundos antes de ir para sua esposa, ele praticamente a repreende com o olhar, o que me deixa pior ainda, provavelmente os dois irão brigar, a culpa será minha, como eu posso ser tão ruim assim, para todos?

Através dele é possível ver alguns funcionários perambulando, passando devagar por ali, os olhos assustados para dentro da sala.

Parabéns, mais um escândalo dentro da empresa, como se já não bastasse todos os acontecimentos.

Respiro fundo, deixando o ar entrar pelos pulmões, pressiono os dedos nos cantos dos olhos enquanto escuto os passos dele para dentro da sala, em seguida passo as mãos pelo cabelo tentando controlar a irritação, mas é em vão, eu vivo irritado, até dormindo sinto meu corpo ferver.

— Vocês deram um belo de um show, como sempre — Vinicius diz enquanto fecha a porta atrás de si, dando fim no show para os funcionários curiosos, eu o sigo com o olhar enquanto caminha até Ivy, que parece tensa, ele tira Eduarda dos braços dela que não reclama ou nega, apenas deixa a neném ir com o pai — vocês precisam se acalmar e parar de um ficar acusando o outro, todo mundo errou, mas ninguém errou de propósito.

Vinicius sorri olhando para Duda quando ela deita a cabeça em seu ombro, da mesma maneira que deitou em mim, ele a balança dando leves batidinhas com a mão em sua fralda, nem parecia o mesmo cara que conheci na faculdade.

— Certo! — falo por fim, tentando quebrar o silêncio constrangedor dentro da sala, passo por Ivy e sigo em direção a minha mesa — eu preciso voltar ao trabalho, se vocês me derem licença.

Ivy revira os olhos e bufa, mas antes de me deixar falar alguma coisa a mais, sai pisando duro, passando por Vinicius e segundos depois está fora da sala, batendo a porta atrás de si como uma menina mimada que ela era.

Aperto os lábios e respiro fundo novamente tentando controlar a vontade de ir atrás dela e brigarmos de novo, por que tão irritante?

— O que está acontecendo com você? — Vinicius me pergunta trazendo minha atenção para si,

Encaro ele por alguns segundos antes de puxar a cadeira e sentar atrás da minha mesa.

— Nada — respondo seco, desviando os olhos dele para o amontoado de documentos ali em cima, começo a folear um deles, mas mal estou prestando atenção.

— Felipe, eu sei que não é, me fala — insiste.

— Eu só não consigo mais Vinicius, só isso — levanto o olhar e o encaro, seus olhos estavam presos em mim e respiro fundo de novo relaxando, encosto meu corpo na cadeira me entregando ao cansaço de sempre brigar pela mesma coisa — ela vem aqui toda vez querendo exigir as coisas, eu não preciso disso — desabafo — eu não vou fazer os gostos dela.

Vinicius caminha até minha mesa, sentando-se em uma das cadeiras e ajeitando Eduarda em seu colo.

— Ela só quer te ver feliz Felipe — fala, calmamente, realmente não parece nada com o meu amigo da faculdade.

— O problema é que ela acha que minha felicidade continua com a Leticia, mas não está — afirmo.

— Ok — Vinicius diz também parecendo estar cansado desse assunto, e eu não o culpo, já que eu também estou — eu não vou discutir isso com você, só parem de brigar, principalmente perto dela — diz e gesticula a cabeça para Duda que dorme lindamente nos braços grandes do pai — espero você hoje em casa, não esquece, jantar de aniversário.

Porra!

— Eu preciso mesmo ir? — pergunto desanimado, torcendo para que ele diga que não, mesmo sabendo que isso é impossível.

— A ideia é sempre o aniversariante estar presente não é? — disse rindo e eu dessa vez não pude conter o riso balançando a cabeça.

— Ok, estarei lá — desisto! Me rendendo a mais uma festa.

Vinicius sorri e se levanta saindo da sala e então finalmente consigo soltar o ar que parecia estar segurando por horas, a última coisa que eu queria era comemorar meu aniversário, não tenho vontade nenhuma, mas Ivy fez questão de vir para a cidade apenas para poder passar o dia comigo e eu como sempre, estraguei tudo.

Meus olhos estão fixos na porta branca da sala, mas minha cabeça estava em outro lugar, viajou de volta para o Rio, para Leticia, minha irmã, por mais que eu não queira admitir ela tinha razão em certo ponto, eu realmente amei Leticia, eu fui feliz estando com ela, de uma maneira que não consegui ser mais, mas acabou, já era, os dois chegaram nesse consentimento e Ivy tem que entender.

O telefone sobre a mesa me traz de volta a realidade quando seu toque soa alto ao meu lado, encaro o mesmo e atendo no segundo toque.

— Senhor Willians.

— Senhor aqui é a Giovana, estou com os currículos que o senhor me pediu para novos estagiários, prefere que eu leve para o Senhor ou posso encaminhar por e-mail? — a voz da Senhorita Duarte é doce do outro lado, me faz lembrar dela gemendo em meu ouvido em algum tempo no passado, arrepio percorre pela minha coluna, e pigarro antes de responder.

— Certo, pode encaminhar no e-mail por gentileza Senhorita Duarte, eu vou analisar eles e depois te encaminho o escolhido para entrevista — respondo, tentando parecer ser normal, ela aqui.

— Tudo bem, obrigada Senhor — simplesmente diz e desliga, sem me dar a chance de responder.

Novos estagiários, era tudo o que eu mais precisava agora, ter que perder meu tempo com isso, mas prometi ao meu pai, que a empresa sempre que possível iria manter estagiários para sempre os incentivar na profissão escolhida, ele sempre fez questão de me lembrar, que eu e Ivy somos privilegiados por nascerem em berço de ouro, ao contrário de muitos, todos precisam de uma chance.

Se o meu dia já havia começado ruim agora, sim, tinha piorado de vez.

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