A Garota Do Lago

A Garota Do Lago

A CACHOEIRA DO SOL DA MANHÃ

17 de fevereiro de 2012

A ocasião de sua morte

A NOITE DE INVERNO CAIU NO EXATO MOMENTO EM QUE Becca

Eckersley deixou o café. Caminhando pelas ruas escuras de Summit Lake, ela

enrolou o cachecol em torno do pescoço para se proteger do frio. Sentia-se bem

depois de finalmente ter falado com alguém, pois tornou aquilo real. A revelação

de seu segredo de longa data aliviou a pressão, permitindo-lhe relaxar um pouco.

Enfim, Becca acreditou que tudo daria certo.

No lago, o cais rangeu sob seus pés até ela alcançar o terraço que circundava a

casa à beira do lago de seus pais. Despreocupada após o tempo passado no Café

Millie, Becca não sentiu a presença dele. Não o notou nas sombras, oculto na

escuridão. Ela abriu a porta lateral e a trancou atrás de si. Em seguida, na

antessala tirou o cachecol e se livrou do casaco pesado. Ligou o alarme e se

dirigiu ao banheiro. Ali, colocou-se sob a ducha de água quente e deixou o

estresse para trás.

A confissão no café foi um teste. Prático. No último ano, Becca guardara

muitos segredos — e aquele era o maior e o mais insensato de todos. Os outros

podiam ser atribuídos à juventude, à inexperiência. No entanto, esconder essa

última parte de sua existência era pura imaturidade, explicada apenas pelo medo

e pela ingenuidade. O alívio que sentiu ao enfim contar para alguém confirmou

sua decisão. Seus pais precisavam saber. Já era hora.

Exausta por causa da pós-graduação em direito e do ritmo frenético de sua

vida, ficava fácil imaginar-se indo para debaixo das cobertas e dormindo até de entrar nos eixos novamente. Dormir não era uma opção, portanto. Assim, ela

levou dez minutos para secar os cabelos, vestir um agasalho esportivo confortável

e meias grossas de lã. Na bancada da cozinha, ligou o iPod, abriu o livro, ajeitou

as anotações e o laptop, e começou a estudar.

Antes, o chuveiro e o secador de cabelos encobriram o ruído da maçaneta da

porta e dos dois fortes golpes de ombro testando a resistência da fechadura. No

entanto, naquele momento, após estudar direito constitucional durante uma

hora, Becca escutou: uma pancada ou vibração na porta.

Becca reduziu o volume do iPod e apurou a audição. Meio minuto de silêncio

se passou, e então um golpe estridente na madeira. Três batidas sonoras que a

assustaram. Ela consultou o relógio e se espantou — ele só deveria chegar no dia

seguinte. A menos que quisesse fazer uma surpresa, o que costumava acontecer.

Becca correu até a antessala e puxou a cortina para o lado. Ficou confusa com

o que viu. Nessa confusão, seus pensamentos se perderam. Sentiu um frio na

barriga e um arrepio na espinha. Com a mente pouco clara, nenhum pensamento

se sobressaiu para fazê-la refletir. Lágrimas brotaram nos olhos e, ao mesmo

tempo, um sorriso se manifestou. Ela desligou o alarme, com a luz vermelha se

convertendo em verde. Em seguida, destrancou a porta e girou a maçaneta.

Espantou-se quando ele forçou a entrada e, como água acumulada contra um

dique, projetou-se na direção da antessala. Mais surpreendente ainda foi a

agressão.

Despreparada para o ataque dele, Becca sentiu os calcanhares serem

arrastados por sobre o piso de ladrilhos. Então, ele a empurrou com força contra

a parede. Agarrando-a pelos ombros e pelos cabelos, arrastou-a até a cozinha. O

pânico esvaziou a mente de Becca. Naquele momento, todas as ideias e imagens

que tinham estado ali até alguns segundos atrás desapareceram, dando lugar aos

seus instintos mais primitivos. Becca Eckersley passou a lutar por sua vida.

A agressão prosseguiu na cozinha, com Becca agarrando e chutando qualquer

coisa que fosse capaz de ajudá-la. Depois de o livro e o laptop caírem no chão, ela

procurou tracionar os pés com meias de lã nos ladrilhos frios. Enquanto ele a

puxava pelo recinto, ela agitava as pernas freneticamente. Foi quando desferiu

um pontapé enfurecido contra a cristaleira, despedaçando toda a louça e

espalhando os cacos pelo piso. Com o caos na cozinha ainda instalado, incluindo

tigelas rolando e banquetas se chocando, Becca conseguiu pisar no tapete da sala,

O que lhe deu força e tração. Ela tirou proveito disso para buscar se libertar do

domínio do oponente, mas sua resistência só aumentou a fúria dele, que passou a

puxar a sua cabeça para trás com força, arrancando uma mecha de cabelos e

fazendo-a cair de uma vez. Ao pousar, Becca bateu a cabeça contra a estrutura de

madeira do sofá. Então, ele se arremessou sobre ela.

A dor era lancinante. A visão de Becca ficou embaçada, e a audição,

comprometida. Foi quando ele enfiou as mãos frias sob a calça do agasalho

esportivo dela. Nesse momento, Becca recobrou a plena atenção. Apesar de estar

imobilizada sob o peso do corpo dele, ela o esmurrou e o arranhou ao ponto de

deslocar alguns dedos e de as unhas ficarem cobertas de pele e sangue.

Ao sentir a calcinha ser rasgada, Becca soltou um grito agudo, estridente, que

durou apenas alguns segundos, pois as mãos dele logo apertaram seu pescoço,

sufocando-a. Ela arfou, buscando ar, mas sem sucesso. Embora seu corpo não

conseguisse mais reagir aos apelos aterrorizados de sua mente, Becca ainda

resistia, nunca perdendo o contato visual com o agressor. Até que sua visão se

desvaneceu como sua voz.

Ferida e sangrando, Becca ficou ali, desfalecida, acordando cada vez que ele a

maltratava em ondas coléricas, violentas. A impressão foi de que se passou uma

eternidade antes de o homem decidir abandoná-la. Antes de ele escapar pela

porta corrediça de vidro da sala, largando-a aberta e deixando que o ar frio da

noite penetrasse pelo recinto e atingisse o seu corpo despido.

Ela sentia as pálpebras pesadas. Naquele momento, tudo o que Becca

conseguia ver era a luz branca emitida pela lâmpada no batente, um brilho

contra a escuridão da noite. Ela permanecia imóvel, incapaz de piscar ou desviar

o olhar. Era estranho, mas a paralisia não a incomodava. As lágrimas rolaram

pelo rosto e gotejaram silenciosamente no piso. O pior tinha passado. A dor

desaparecera. Becca não mais recebia socos, nem estava mais sendo sufocada.

Finalmente, livrara-se do domínio dele. Não sentia mais aquele hálito quente no

rosto. Ele não estava mais sobre ela. A ausência dele era toda a liberdade que ela

queria.

No chão, com as pernas estendidas e os braços como dois galhos de árvore

quebrados ligados às suas laterais, ela encarava a porta escancarada do pátio. O

farol distante, com sua luz brilhante orientando os barcos perdidos na noite, era

tudo que ela percebia e tudo que ela queria. Era vida, e Becca se agarrou à sua imagem oscilante.

Ao longe, uma sirene ecoou na noite, baixinha no início, e depois, mais alta.

A ajuda estava chegando, embora ela soubesse que era muito tarde. No entanto,

Becca saudou a sirene e o auxílio que traria. Não era mais para si que ela esperava

a ajuda.

Capítulos
1 A CACHOEIRA DO SOL DA MANHÃ
2 2 1º de março de 2012 Duas semanas depois da morte de becca
3 3 Becca Eckersley Universidade George Washington 30 de novembro de 2010 ...
4 4 Kelsey Castle Summit Lake 5 de março de 2012 Dia 1
5 5 Becca Eckersley Universidade George Washington 2 de dezembro de 2010 ...
6 6 Kelsey Castle Summit Lake 6 de março de 2012 Dia 2
7 7 Becca Eckersley Universidade George Washington 10 de dezembro de 2010
8 8 Kelsey Castle Summit Lake 7 de março de 2012 Dia 3
9 9 Becca Eckersley Universidade George Washington 21 de dezembro de 2010
10 10 Kelsey Castle Summit Lake 8 de março de 2012 Dia 4
11 11 Becca Eckersley Universidade George Washington 22 de dezembro de 2010 ...
12 PARTE II AUTOAJUDA
13 13 Becca Eckersley Summit Lake 22 de dezembro de 2010
14 14
15 15
16 16
17 17 Becca Eckersley Universidade George Washington 14 de março de 2011
18 18
19 19 Becca Eckersley Universidade George Washington 7 de abril de 2011
20 20 PARTE III OLÁ, DETETIVE
21 21 Becca Eckersley Universidade George Washington 13 de maio de 2011
22 22
23 23
24 24
25 25
26 26
27 27 Becca Eckersley Universidade George Washington 12 de outubro de 2011
28 28 Kelsey Castle Summit Lake 15 de março de 2012 Dia 11
29 29 Becca Eckersley Universidade George Washington 21 de dezembro de 2011
30 30
31 31
32 32 Kelsey Castle Summit Lake 15 de março de 2012 Dia 11
33 33 Becca Eckersley Universidade George Washington 15 de fevereiro de 2012
34 34 Kelsey Castle Summit Lake 15 de março de 2012 Dia 11
35 PARTE IV TRÊS BATIDAS
36 36 Peter Ambrose Summit Lake 15 de março de 2012 Dia 11
37 37 Becca Eckersley Summit Lake 17 de fevereiro de 2012 A noite de sua morte
38 38 __
39 40__
Capítulos

Atualizado até capítulo 39

1
A CACHOEIRA DO SOL DA MANHÃ
2
2 1º de março de 2012 Duas semanas depois da morte de becca
3
3 Becca Eckersley Universidade George Washington 30 de novembro de 2010 ...
4
4 Kelsey Castle Summit Lake 5 de março de 2012 Dia 1
5
5 Becca Eckersley Universidade George Washington 2 de dezembro de 2010 ...
6
6 Kelsey Castle Summit Lake 6 de março de 2012 Dia 2
7
7 Becca Eckersley Universidade George Washington 10 de dezembro de 2010
8
8 Kelsey Castle Summit Lake 7 de março de 2012 Dia 3
9
9 Becca Eckersley Universidade George Washington 21 de dezembro de 2010
10
10 Kelsey Castle Summit Lake 8 de março de 2012 Dia 4
11
11 Becca Eckersley Universidade George Washington 22 de dezembro de 2010 ...
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PARTE II AUTOAJUDA
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13 Becca Eckersley Summit Lake 22 de dezembro de 2010
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17 Becca Eckersley Universidade George Washington 14 de março de 2011
18
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19
19 Becca Eckersley Universidade George Washington 7 de abril de 2011
20
20 PARTE III OLÁ, DETETIVE
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21 Becca Eckersley Universidade George Washington 13 de maio de 2011
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27 Becca Eckersley Universidade George Washington 12 de outubro de 2011
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28 Kelsey Castle Summit Lake 15 de março de 2012 Dia 11
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29 Becca Eckersley Universidade George Washington 21 de dezembro de 2011
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32 Kelsey Castle Summit Lake 15 de março de 2012 Dia 11
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33 Becca Eckersley Universidade George Washington 15 de fevereiro de 2012
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34 Kelsey Castle Summit Lake 15 de março de 2012 Dia 11
35
PARTE IV TRÊS BATIDAS
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36 Peter Ambrose Summit Lake 15 de março de 2012 Dia 11
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37 Becca Eckersley Summit Lake 17 de fevereiro de 2012 A noite de sua morte
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