A Última Herdeira
Anielisse Pov
Anielisse examinou cuidadosamente as jóias postas sobre a mesa.
- Essa, e essa - Sorriu apontando para um colar de rubis e um par de brincos combinando - Não acha que são perfeitos? - Se voltou para o homem esparramado num divã e concentrado numa taça de vinho.
- Você está sempre perfeita, minha noiva - Vidar sorriu.
Aquela era a realidade pela qual ela sempre esteve por trás, escolhendo jóias que outras pessoas usariam, comprando vestidos, servindo, limpando, cuidando, agora era finalmente ela que estava no centro de tudo isso, tinha tudo o que desejasse ao alcance de suas mãos.
Faziam duas semanas que as falcatruas do Patriarca de Vance foram jogadas ao vento, com uma simples carta, um documento comprometedor, com um selo específico, de um homem que metade da corte sequer vira o rosto, e tudo foi pelo ralo.
Era quase cômico que o Patriarca tenha solicitado um Sábio para garantir que seu segredo estaria seguro, e agora por causa do mesmo, ele estava na cadeia.
- Soube que o Rei solicitou uma audiência com Primrose - Vidar colocou a taça vazia de lado e se sentou no divã.
- E o que ele pode fazer?
- Enquanto Rei? Muita coisa.
- Não há uma autoridade nessa Terra que pode livrar Primrose do destino dela, em algumas semanas ela dará a luz, então irá para a forca, e teremos um problema a menos, essa criança, se é que vai vir ao mundo viva, já não terá direitos como herdeiro.
- Além disso ele está se recuperando, isso é um problema, só vai atrasar a coroação de Friedch.
- E a sua pequena protegida não está ajudando muito.
- Asteria foi pega de surpresa pela situação, ela vai ceder eventualmente.
- Acho bom, mesmo que o Rei esteja aparentemente bem nós sabemos que a realidade é outra, ele vem atormentado a tanto tempo, seu corpo está fraco, ele vai precisar se aposentar se quiser continuar vivo.
- Você tem uma resposta para tudo não é?
- De fato - Ela se voltou para o espelho colocando o colar sobre seu colo exposto e sorriu - Eu tive bastante tempo para pensar.
*
Anielisse encarou pela fresta da porta o Rei atrás de uma mesa, lendo uma pilha de documentos, os olhos fundos e cansados, os cabelos longos e escuros amarrados na nuca e a camiseta amarrotada, o sempre impecável e inabalável Ronan estava destroçado.
Ela entrou no escritório e ele ergueu os olhos apenas um segundo para ver quem entrava, então voltou para seus papéis.
- Soube que pediu para ver Primrose - Disse se sentando no sofá.
- Demorei um pouco para processar tudo isso.
Anielisse despejou um pouco de água quente em duas xícaras e então acrescentou as folhas secas.
- E que conclusão chegou?
- Nenhuma, preciso tirar a história a limpo com Rose. Alguma notícia de Cordelia?
- Nenhuma ainda.
Ele respirou fundo apertando o espaço entre os olhos.
- O que vai fazer se a encontrarmos?
- Não sei se quero encontra-la, Cordelia foi obrigada a viver uma mentira, esteve presa por todo esse tempo, agora, pelo menos eu espero, que ela esteja vivendo como quiser.
- Não sente falta dela? - Anielisse colocou a xícara sobre a mesa dele.
- O que está fazendo Vossa Graça? Não tem mais que me servir.
- Não é trabalho fazer uma gentileza a um amigo.
Ronan sorriu e pegou a xícara.
- Sinto falta, mesmo que não tenha meu sangue, sempre a considerarei minha filha.
- Sinto muito que as coisas tenham tomado esse rumo Ronan.
Ele respirou fundo e pousou a xícara na mesa.
- Talvez teve que seguir, agora eu sei por que Cordelia e Rose nunca se davam por satisfeitas, as duas estavam vivendo amarradas a uma farsa, quero que elas sejam felizes Anie... E não quero que Rose morra... - Ele escondeu os olhos com uma mão enquanto tentava controlar a respiração e impedir que as represas em seus olhos desabassem.
Ela odiava esse homem, chegou no palácio durante o puro caos, viu guerra, fome e destruição durante todo caminho até chegar a essa bolha de ouro, onde ele estava escondido, cercado de soldados, assistia homens e mulheres informando seus feitos, os relatórios de quantas vidas se perderam nas batalhas, e ele estava ali, de pé em suas roupas chiques e sua coroa de ouro e jóias sobre a cabeça.
Só que quanto mais Anielisse o observava mais passava tempo pensando no que ela faria diferente se estivesse no lugar dele, e nada vinha a sua mente, ele sempre esteve na corda bamba, era matar ou ver seu povo morrer, perdeu as contas de quantas vezes o viu se esconder em seu escritório e chorar enquanto escrevia cartas para as famílias dos soldados perdidos, todas a mão, citando-os por nome, quantas promessas ele fez a Rose de que seu herdeiro nunca teria que passar por aquilo.
O mundo era injusto, não havia nada que eles pudessem fazer, então Anielisse decidiu que viveria no topo dessa pirâmide
- Eu sinto muito, Majestade...
*
Depois de três dias o julgamento do Patriarca aconteceria, e para a alegria de Anielisse, ele a chamou para conversar antes da sessão.
Ela se sentou ajeitando as saias, ele parecia deplorável, olhos fundos e rodeados de manchas escuras, perdeu peso, a barba por fazer, ela queria sorrir.
Era tão irônico, Anielisse estava sentada em frente a o Patriarca dos de Vance, ele parecia um plebeu e ela uma Rainha.
- Te chamei para agradecer por todo tempo que dedicou a minha filha, e a Cordelia, você foi de grande ajuda para nossa família.
- Foi uma honra.
- Eu sei que nem precisaria pedir, mas te dou o que você quiser, se não disser o que aconteceu aquela noite.
- Que noite? A que eu me livrei do herdeiro Natimorto às suas ordens? - Ela cruzou as pernas apoiando o cotovelo no braço da poltrona.
- Se ainda existe uma chance de sairmos disso precisamos da sua ajuda Lady Anielisse.
Ela sorriu inclinando a cabeça.
- Já se perguntou o por quê do Sábio ter revelado seu segredo a essa altura do campeonato?
- Não faço idéia - Ele passou as mãos pelos cabelos - Ele que devia nos proteger causou essa desgraça.
- Não sei quanto pagou a ele naquela época, simplesmente apareceu alguém que pagaria mais.
Ele franziu a testa se retesando.
- O que você sabe?
- Recentemente alguns soldados faziam testes com explosivos nas regiões montanhosas de Tarenthe, e para a surpresa de todos foram descobertas minas de pedras preciosas, é uma pena que Tarenthe não tenha mão de obra ou recursos para explorar a região, e por isso precisavam da ajuda de Domhall, infelizmente a falsa princesa e o príncipe Cressiano não teriam como prioridade a escavação de pedras.
Ele baixou os olhos para o colar de rubis dela e cerrou os dentes.
- Você vendeu nosso segredo? Como pôde?! Mandar a mim e a Rainha para a forca! Quem você pensa que é?! Pode estar coberta de ouro agora mas não passa de uma criada, filha de nobres ferrados em decadência! Você não sabe do que eu sou capaz!
- Eu tenho uma pequena noção sim - Ela disse calmamente, com uma expressão fria enquanto o homem berrava em seu rosto.
- Você vai pagar por isso.
- Não sou eu que estou numa cela - Ela se levantou com o queixo erguido - É a sua vez de pagar, por tudo o que me fez.
- O que eu te fiz? O que você queria? Uma condecoração por ter enterrado uma criança morta?
Anielisse riu.
- Que constrangedor, dediquei tanto tempo da minha vida odiando alguém que nem se lembra de mim.
- Do que está falando?
Seu sorriso sumiu.
- Foi bem ver sua cabeça sobre o pescoço uma última vez, te vejo na sua execução, Gourdon - Anielisse fez uma reverência exagerada e saiu batendo a porta.
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Atualizado até capítulo 58
Comments
Vera Lúcia Subtil Oishi
qual nome do 1° livros
2024-03-23
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