Já era por volta das dez da manhã quando a direção da escola onde os meninos estudam ligou para mim dizendo que algo aconteceu. Não sei exatamente quem ligou, mas parecia bastante desesperado, o que me fez entrar em desespero também.
Sem pensar duas vezes, corri pro estacionamento e quando coloquei os pés na área, já cliquei o botão start/stop da chave do carro.
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Ao chegar estacionei o carro e corri pra dentro da escola, tudo parecia abafado e corrido, o que me deixou mais ainda em desespero. Entrei na diretoria como um louco e avistei um homem de costas, Mike sentado com uma carinha triste, olhar quebrado e rosto bem ruborizado, também tinha uma mulher que aparentava ser um pouco mais velha de braços cruzados.
"O que aconteceu com meu filho?!"— Pergunto me aproximando.
"Prefiro que o auxiliar explique."— Ainda de braços cruzados, a mulher pronuncia sem perder a postura enquanto indicava com a cabeça o homem de costas pra mim e de frente pro Mike.
"Bom dia."— Ele cumprimenta se virando e sorri educado. Jay.
Ele não ficou surpreso provavelmente por ter visto o Mike lá.
"Bom... dia..."— Cumprimento também, só que um pouco sem graça.— "O que o Mike fez?"
"Então..."— começa juntando as mãos e se virando pro garoto sentado.— "O Mike me viu e correu até mim, o que é super normal vindo de uma criança que conhece alguém... Só que ele não quis me largar e desobedeceu a auxiliar da classe dele, o que causou um tumulto. Ela agarrou ele pelo braço e... Você deve imaginar o resto."
"Onde ela está? Quem ela pensa que é pra andar segurando uma criança pelos braços? Eu deveria denunciar essa infame!"— Indago exaltado.
"Calma, ela foi demitida. E eu sinto muito por ter causado essa confusão e feito você correr até aqui. Sinto muito mesmo."— Abaixa a cabeça.
"Não precisa pedir desculpas, eu conheço minha peça."— Me refiro ao Mike e ele ri.— "Se for só isso, eu gostaria de levar ele embora. E o Mark também."
"Jay, pode ir buscá-lo."— A diretora quem pede e o mesmo vai sem hesitar.— "Tenho que admitir, o Mark é um aluno excelente. Faz tudo certinho e sempre respeita os professores, ele é bem maduro pra idade dele."
"Eu sei. Obrigado."— Sorrio realmente agradecido, mas uma parte de mim não gostou por ela ter dito isso na frente do Mike. Sempre que alguém elogia o Mark, ele me pergunta o porquê de não dizerem palavras bonitas pra ele também.— "Vamos Mike."
"E Mark?"— Com a voz rouca ele pergunta pelo seu parceiro de todos os momentos.
"Vamos encontrar com ele lá fora filho."— Pego sua mochila e coloco nas costas, em seguida pego o mesmo no colo e com um aceno de cabeça me despeço da mulher e saio.
.........
"Mais uma vez, me desculpe por isso."— Jay fala de novo e eu sorrio achando fofo o jeito preocupado dele.
Estávamos na frente do portão, Mike e Mark estavam abraçados enquanto eu estava falando com Jay. Ele é lindo de todos os jeitos mesmo.
"Você estuda a noite?"— Pergunto como quem não quer nada.
"Sim..."— Confirma e eu apenas olho para os meninos e de volta pra ele.
"Depois nos falam mais, você tem que voltar pro seu trabalho"— Desconverso e ele concorda.
"Tchau!"— Se despede sorrindo e não demora muito pra entrar. Pego os meninos e levo eles pro carro e seguimos pra casa.
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"Papai, quando vem a grand-mère?"— Mark quem pergunta se sentando ao meu lado.
Ele queria saber quando minha mãe viria vê-los. Normalmente ela vem duas vezes no ano, esse ela ainda não veio.
E apenas duas vezes porque eu cortei laços com minha famíli via e meu pai ficou bem puto com isso já que eu era o único herdeiro dele. Foram tantos xingamentos naquele dia que eu não lembro nem de metade. Desde então minha mãe vem duas ou até mesmo uma vez pra ver os meninos, traz mimos e muita história pra contar, o que me lembra nossa relação antes de tudo isso acontecer, antes do meu pai ter me excluído 100% de tudo que envolvia a nossa família, ou melhor, a família dele.
"Em breve meu amor... Talvez ela venha nesse mês, ou no mês que vem..."— Digo encarando a xícara em minhas mãos. Nem sequer o número dela eu tenho, só aparece de surpresa.
"Hum... Ela esqueceu da gente?"— Ele questiona com aqueles olhinhos castanhos que facilmente você se perde na profundidade que parece ter.
"Não, claro que não... Certeza que vocês moram no coração dela"— Aponto pro seu peito e sorrio, recebendo em troca um grande sorriso também.
"Papai também tá lá!"— Ele me abraça. Esses meninos com certeza são a minha cura apesar de tudo.
"Quem sabe... Vai brincar com seu irmão enquanto eu vou preparar a pipoca"
"Vamos ver filmes?!"— Com os olhos brilhando e sorrindo de ponta a ponta, ele pergunta empolgado.
"Sim!"— beijo sua testa e ele corre pra chamar o outro.
...----...
Havia colocado o filme dos bebês que falam e "trabalham", como diz o Mike. Eles amam esse desenho não sei porquê, só sei que quase sempre que estamos juntos, ou até mesmo na casa do padrinho deles, é esse desenho que assistem.
Ver os dois felizes murmurando coisas inaudíveis e rindo é uma das melhores partes de ser pai.
A maioria das pessoas acham que estou cansado de tudo, mas na verdade não é bem assim. Não é porque eu tenho dois meninos e sou solteiro que significa que passo sufoco com eles. Vou na empresa três a quatro vezes na semana pela manhã, então tenho bastante tempo livre e busco ajudar meus filhos com as lições de casa, levá-los para passear, etc. Gosto e quero que tenham uma parte da vida que eu tive, a parte feliz.
"Papai olha!"— Me tirando de todos os meus pensamentos, Mike chama minha atenção à força. Ele virou minha cabeça em direção a TV, tudo pra eu ver o garoto correndo atrás do bebê.
Solto um leve riso de satisfação com a situação e fico mexendo no cabelo dele, que por sinal já está na hora de cortar, porém ele odeia.
"Papai quelo moto"— Diz Mike subindo em meu colo e me abraçando. Sono. Pensei comigo.
"Quando tiver idade pode ter uma."
"Quando?"
"Daqui há uns 12 anos, por aí.."— Ele assente calado já de olhos fechados.
Mike sempre teve esse diferencial do irmão. Poderia estar pulando, gritando e tudo mais, de repente sente sono e procura um jeito de ir dormir.
A pediatra disse que é normal por ele ter dificuldades pra dormir, então quando sente sono, imediatamente arranja um jeito de dormir.
"Boa noite."— Beijo o topo da sua cabeça e sinto o cheiro do shampoo que fora derramado na noite anterior, sorrio. Levo ele pra cama e pego o meu celular, são 20:40 e tinha uma mensagem do Jay, que antes mesmo de poder abrir fui interrompido pelo Mark.
"Papai"— Ele me chama baixo.
"Hm?"— Apenas murmuro sem olhando de relance pra ele e voltando minha atenção pro celular.
"Você não gosta de mim?"— Ele perguntou sem demonstrar emoção nenhuma, tão frio, às vezes me surpreendo.
"Que pergunta Mark. Eu não apenas gosto de você, eu amo você. Por que não gostaria do meu próprio filho, quem disse isso pra você?!"— Aquela perguntou me desestabilizou total. O que o faz pensar assim?
"Ninguém falou... percebi."— Disse dando de ombros.— "Você é mais calinhoso com ele pai."— Sua voz baixa, consegui sentir o peso em suas palavras. Ele realmente pensa isso? Ou melhor, eu realmente faço parecer isso?!
"Olha pra mim"— Desligo a tv e acendo a luz do abajur. Assim que ele se vira eu seguro suas mãos firme e amostro um sorriso orgulhoso.— "Eu amo você e seu irmão igualmente, vocês ainda são tão novinhos pra pensar nisso... mas... Eu tenho muito orgulho de você, só seis anos e entendimento de uma criança de dez."
Consegui arrancar um sorriso dele, não era o melhor que eu sei, mas era um sorriso.
"Mark, o seu irmão tem certas dificuldades de aprendizado enquanto você já é mais avançado, então eu tento dar apoio pra que ele não se importe com o que os outros vão falar... Eu sei que você é só uma criança e me desculpe se eu cobro muito de você, eu tento ser o melhor pai, estando presente, mas acabo sendo o melhor pai só pra um..."— Arrumo seus fios castanhos e ele sorri assentindo, esse parece sincero.
"Tudo bem papai, fico feliz porque você também me ama."— Abraço ele dizendo repetidas vezes "Te amo" e "Me desculpe". Jamais quero meus filhos pensando que um é mais que o outro. Lutei pra eles não brigarem por dinheiro e não vou vacilar agora.
...***...
Estava no meu quarto em plena duas da madrugada pensando e repensando sobre o que o Mark e eu conversamos. Tracei toda a trajetória de vida dos garotos mentalmente e procuro pontos que me ajudem a melhorar como pai.
Mark desde pequeno sempre foi muito direto, se ele quisesse algo iria pedir, se não quisesse apenas diria "não", tanto que a primeira palavra dele foi essa "não", quando ainda tinha sete meses.
Já o Mike, descobri quando ele tinha três anos que teria algumas dificuldades pra ler e aprender a falar tudo corretamente. Sua primeira palavra foi "papa", com três anos. Com o decorrer do tempo, sua dificuldade ficou mais visível, principalmente quando coloquei os dois na escola.
A professora vivia me informando que o Mike mal falava, não acompanhava e não lembrava das vogais que ela acabara de ditar.
Preocupado levei ele para pediatra, fonólogo, neuro, otorrino, etc. Foi aí que saiu o diagnóstico, Dislexia.
Como pai principiante e sozinho, me senti mal e me culpei vários dias e noites por isso, mas depois em vez de lamentar fui ajudar meu filho. Até porque uma dificuldade não impediria a vida dele.
Me emociono toda vez que lembro do dia que o médico me informou isso, os dois mesmo sem entender nada me abraçaram quando olharam em meus olhos avermelhados e escutaram minha voz abatida.
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Atualizado até capítulo 56
Comments
Tec Marketing
haaa eu também _kkk
2024-01-15
3
Coala 🐨🖤
você é um ótimo pai, não se preocupe! 🥺❤️
2022-04-15
3
Coala 🐨🖤
aaahh, que lindo 🥺❤️
2022-04-15
0