Capítulo 4
Daniel sorri e beija Mirian, que fica alisando sua barriga como se já tivesse vários meses de gestação.
ASILO, INTERIOR, MANHÃ.
No munícipio de Campo Largo, interior do Paraná, Flávio e seus amigos do grupo voluntário Doces Sorrisos estão alegrando as pessoas idosas que residem num asilo muito humilde. Com um violão, Flávio toca uma música e seu amigo canta, para animar o local. Outros amigos se dividem em ajudar os idosos a pintar quadros, fazem parcerias para jogar xadrez e cartas ou simplesmente sentam embaixo das árvores do pátio para conversarem. O asilo tomou novos ares com o grupo voluntário, que soube entreter os internos. Para terminar, Flávio entrega ao dono do asilo um cartão ilimitado de um supermercado para compras de um ano, fruto de um pedido de Flávio ao dono do estabelecimento comercial que aceitou ajudar o asilo. Os idosos comemoram, emocionados, pois o local sofre muito com o abandono do governo.
CASA DA FAMÍLIA MORAES, INTERIOR, MANHÃ.
Glória está costurando a barra de uma calça no sofá da sala, enquanto Mirian está assistindo TV, sentada no outro sofá.
(GLÓRIA): – Então, minha filha, você já tá grávida?
(MIRIAN): – Praticamente sim… Falta fazer um exame daqui uns dias pra confirmar. Se Deus quiser, vai dar positivo! E pode ir se preparando pra fazer roupinhas de tricô, futuro vovó!
(GLÓRIA): – Olha, Mirian, eu desejo de verdade que você realize o seu sonho de ser mãe. Eu conheci poucas mulheres que, desde muito pequenas, sonhavam em serem mães como você. Às vezes eu posso ser rabugenta, talvez seja um sintoma da velhice, mas nunca esqueça que eu quero a tua felicidade, embora ache bem estranho esse negócio de inseminação.
(MIRIAN): – Oh, mãezinha, fico tão feliz pelas suas palavras… Tenta implicar menos com o Daniel, ele é um cara tão bom, não fica desdenhando dele, tá?
Glória não diz nada, apenas volta a se concentrar na costura, enquanto Mirian volta a assistir televisão e pensar em sua gestação.
CARRO DE FLÁVIO, INTERIOR, TARDE.
Flávio trouxe alguns de seus amigos em seu carro e os deixou em casa, seguindo viagem sozinho para a mansão. Ele nem imagina que uma festa de aniversário surpresa o espera. Ele lembra-se que hoje está fazendo 21 anos e se recorda dos momentos felizes em que viveu com seus pais, Solange e Vitor, e também com Zuleide, a governanta da mansão. De repente, Flávio é surpreendido por uma capivara no meio da rua em frente ao Parque Barigui. Assustado, ele vira o volante para desviar do animal. O carro acaba entrando no parque, assustando as pessoas que descansavam no gramado. Flávio tenta frear, mas o nervosismo o deixa atrapalhado, perdendo o controle do volante. Logo, o pneu do carro passa em uma rocha grande que se encontrava no gramado, fazendo o veículo capotar. O público do parque vê a cena, apavorados, e os animais que ali estavam, fogem assustados. O carro de Flávio capota várias vezes até que cai dentro do lago que há no parque. Desacordado e ferido, Flávio não consegue reagir e afunda nas profundezas do lago junto com seu veículo.
MANSÃO DA FAMÍLIA MORAL, EXTERIOR, TARDE.
Os convidados da festa estão chegando. Familiares, amigos, colegas de faculdade… Todos são recebidos por Solange e Vitor, muito animados com a comemoração. Zuleide caminha pelo jardim, dando orientação aos demais empregados. Logo ela se aproxima de Solange.
(ZULEIDE): – Um amigo do Flávio acabou de ligar dizendo que todos já estão em Curitiba. O Flávio deixou todos os amigos em casa e está vindo pra mansão.
(SOLANGE): – Ai, Zuleide, então ele já tá chegando! Quero só ver a cara dele diante da surpresa.
Zuleide sorri. Vitor se aproxima das duas com Rosa, que acabou de chegar à festa.
(ROSA): – Boa tarde, pessoal. E o aniversariante? Já chegou?
(ZULEIDE): – Ainda não, mas já está a caminho. Mas como você tá bonita!
(ROSA): – Obrigada, Zuleide. Mas nada se compara a decoração dessa festa.
(SOLANGE): – Fui eu quem fez. É um lazer que eu gosto, mexer com decoração. Vem que eu vou te mostrar umas coisas antes do Flávio chegar.
Solange e Rosa caminham pela festa, enquanto Vitor pega uma bebida para tomar e Zuleide segue orientando os empregados.
PARQUE BARIGUI, EXTERIOR, TARDE/NOITE.
O corpo de bombeiros já está no local, após serem solicitados pelos frequentadores, e tentam encontrar o local exato onde o carro está submerso. Apesar de um grande tempo ter se passado, há uma esperança que Flávio esteja vivo. Depois de muita dificuldade, eles encontram o veículo e alguns bombeiros começam a nadar ao fundo do lago para retirar o corpo do motorista, assim como um guincho está tentando içar o carro. Minutos depois, dois bombeiros surgem na superfície do lago com o corpo de Flávio. Eles nadam até a margem, colocam-no deitado no chão. Imediatamente, um dos bombeiros começa a fazer massagem cardíaca e respiração boca-a-boca em Flávio, na tentativa de reanimá-lo. Naquele momento, o guincho consegue retirar o veículo do lago, colocando-o na margem, bastante danificado pela capotagem. O bombeiro segue com a massagem cardíaca e a respiração boca-a-boca por alguns minutos, mas é tarde demais: Flávio faleceu. A polícia chega ao local, juntamente com a perícia, para avaliar a cena. São recolhidos os testemunhos de alguns frequentadores e dos bombeiros.
CASA DA FAMÍLIA MORAES, INTERIOR, NOITE.
Daniel chega à casa cansado da obra de construção. Ao entrar no quarto, ele se surpreende com um carrinho de bebê. Ele larga o chapéu na cama e volta à sala.
(DANIEL): – Que carrinho é aquele, Dona Glória?
(GLÓRIA): – Tua esposa comprou hoje de tarde, custou os olhos da cara.
(DANIEL): – Ai meu Deus… E aonde ela está agora?
Quando Glória vai responder, Mirian entra em casa, muito sorridente e com um sacola nas mãos. Ela dá um selinho em Daniel, mas estranha sua indiferença.
(MIRIAN): – Que foi? Discutiu com a mamãe?
(DANIEL): – O que significa aquele carrinho de bebê no quarto?
(MIRIAN): – Não é lindo? Eu fui caminhar um pouco pela tarde e acabei passando em frente a uma loja de produtos para bebês, aí não resisti. Comprei amarelo claro para ser neutro, tanto menina quanto menino poderão usar.
(DANIEL): – Mas você não podia ter feito isso sem me consultar! É final do mês, estamos com pouco dinheiro em casa, o estoque de comida tá acabando e você vai gastar com carrinho de bebê que só será usado daqui nove meses?
Mirian fica cabisbaixa. Daniel se aproxima e pega sua sacola, abre e vê vários pacotes de fraldas descartáveis.
(DANIEL): – Fraldas? Mirian, você tá ficando fora de si! Até o bebê nascer, elas já estarão vencidas!
(MIRIAN): – O que foi agora? Vai ficar me recriminando? Eu só fiz isso porque meu instinto materno falou mais alto, Daniel! Eu sei que no fim do mês o dinheiro fica curto, mas eu não resisti ao impulso de comprar o carrinho e as fraldas. Pensei que você fosse mais compreensivo!
Mirian arranca a sacola das mãos de Daniel e corre para o quarto, trancando-se. Daniel bate na porta e pede para ela abrir, mas não tem resposta alguma. Glória assiste tudo, dividida entre apoiar a filha ou o genro.
MANSÃO DA FAMÍLIA MORAL, INTERIOR, NOITE.
Zuleide está ligando para o celular de Flávio, mas dá fora de área. Vitor está na sala, tenso. Após muita insistência, a governanta desliga o telefone.
(ZULEIDE): – Ele não atende. Às vezes, a ligação nem é completada, parece que o sinal tá ruim.
(VITOR): – Eu estou ficando preocupado, Zuleide. Já era para ele ter chegado aqui há muito tempo, já são 19h. Todos os convidados chegaram, até a banda tá tocando, mas o aniversariante não apareceu.
(ZULEIDE): – Pois é, também estou aflita. Volta à festa, faça companhia a Dona Solange, ela está uma pilha de nervos. Se alguém ligar, eu lhe aviso, Seu Vitor.
Vitor compreende e volta ao jardim, tentando acalmar Solange e tentando se acalmar. Minutos depois, o telefone da mansão toca. Zuleide corre atender, ansiosa.
(ZULEIDE): Alô! Quem fala? Delegado? Mas… Sim, é da mansão da Família Moral. O Flávio? Mora aqui sim, é filho dos meus patrões. O quê? (recebe a notícia do falecimento). – Como assim? Ai meu Deus… Quando foi isso? Como aconteceu? Jesus… (chorando). – Obrigado, senhor delegado, eu darei a notícia sim.
Zuleide desliga o telefone e cai num choro desesperador, pois não quer acreditar que Flávio morreu no dia de seu aniversário.
(ZULEIDE): – Meu Deus do céu, como eu vou dar essa notícia?
Zuleide continua a chorar. Ela limpa as lágrimas e tenta tomar coragem para ir ao jardim.
MANSÃO DA FAMÍLIA MORAL, EXTERIOR, NOITE.
A festa está muito animada. Enquanto a banda toca, os convidados dançam em frente ao palco. Solange e Vitor assistem a comemoração de longe, sempre olhando para o portão da mansão a espera que Flávio chegue. Zuleide sai da mansão e vê os patrões, sentindo uma angústia no peito e controlando-se para não chorar. Devagar, ela se aproxima deles.
(ZULEIDE): – Ligaram pra mansão.
(SOLANGE): – Era o Flávio? E aí, cadê esse menino?
(ZULEIDE): – Era um delegado. Ele disse que é pros senhores irem fazer o reconhecimento do corpo no IML.
Solange e Vitor entram em pânico. Lágrimas escorrem do rosto de Zuleide.
(SOLANGE): – IML? Então, o meu filho… Meu filho… O Flávio? Não! Não pode ser!
(VITOR): – Tem certeza que era um delegado? Não era trote, Zuleide?
(ZULEIDE): – Era o delegado sim, Seu Vitor. O Flávio está morto!
Solange e Vitor se abraçam e choram desesperadamente, enquanto a festa de aniversário continua, pois ninguém recebeu a notícia ainda. Zuleide se afasta, indo para dentro da mansão. Rosa, que está longe, percebe algo de diferente e vai até eles.
(ROSA): – O que está acontecendo? Porque estão chorando?
(SOLANGE): – O Flávio, Rosa! O Flávio morreu!
(ROSA): – Morreu? Mas como assim? Isso não pode ser verdade!
(VITOR): – Nós precisamos ir ao IML agora para tirar essa história a limpo, você fica aqui com a Zuleide?
(ROSA): – Claro, eu fico sim. Me deem notícias!
Solange e Vitor vão até a garagem e saem de carro muito depressa, sem parar de chorar. Rosa fica na festa, muito nervosa e com medo que a notícia seja verdadeira.
CLÍNICA DE DR. CLEMENTINO, INTERIOR, NOITE.
Dr. Clementino está guardando alguns documentos antes de ir embora. É quando, sem querer, ele aperta o botão do controle remoto da TV quando foi pegar mais papéis e o aparelho se liga. O geneticista guarda os documentos, enquanto na TV passa o jornal.
(REPÓRTER): – Hoje à tarde, um acidente assustou os frequentadores do Parque Barigui. Um carro descontrolado capotou e caiu dentro do lago. Os bombeiros tiveram dificuldade para retirar o veículo. O motorista era Flávio Moral, de 21 anos. Ele foi retirado do fundo do lago e os bombeiros tentaram reanimá-lo, mas ele faleceu no local. Ele é filho único da socialite Solange Moral e do empresário Vitor Moral.
Dr. Clementino fica pasmo ao ouvir aquela notícia. O sobrenome Moral lhe vem à cabeça com o erro que cometeu pela manhã.
(CLEMENTINO): – Esse sobrenome… É muito parecido com o sobrenome da Mirian e do Daniel. E o nome dos pais desse rapaz me soam familiares… Preciso conferir isso!
Dr. Clementino desliga a TV e sai de sua sala, desconfiado.
CLÍNICA DE DR. CLEMENTINO, SALA DE EXPERIÊNCIAS, INTERIOR, NOITE.
Dr. Clementino está no computador da sala de experiências, procurando no registro pelo sobrenome Moral. Logo, ele o encontra.
(CLEMENTINO): A Solange Moral e o Vitor Moral fizeram tratamento para fertilização artificial aqui na clínica em 1990. Foram gerados dois embriões, mas um ficou congelado. (rapidamente, sua memória lembra-se desse fato). – Claro, é esse o caso dos gêmeos em que a mulher gestou apenas um, virou até notícia na capa de jornal. Então, o outro embrião tem que estar aqui.
Dr. Clementino vai até o botijão de hidrogênio e procura pelo sobrenome Moral. Ao encontrá-lo, ele nota que o frasco está vazio. Ao lado, encontra-se o frasco com sobrenome Moraes. Ao pegá-lo, percebe que há um embrião. Logo, o geneticista chega à confirmação de que cometeu uma troca de embriões.
(CLEMENTINO): – A Mirian está gerando o embrião da Solange e do Vitor… Ela está gerando o gêmeo do Flávio, que acabou de falecer. Que confusão… O que eu vou fazer agora? Como explicar essa situação?
Dr. Clementino põem os frascos embrionários de volta ao botijão, extremamente nervoso. Ele desliga o computador e sai da clínica, tentando encontrar uma solução.
INSTITUTO MÉDICO LEGAL (IML), INTERIOR, NOITE.
Um funcionário do local leva Solange e Vitor até a sala dos cadáveres que chegam ao IML. Lentamente, eles entram e veem um corpo coberto por um lençol, em cima de uma maca. O funcionário descobre o rosto do cadáver e o casal tem a confirmação: é Flávio.
(VITOR): – Meu Deus… É ele! O nosso filho… Ele se foi, Solange!
(SOLANGE): – Não!
Continua...
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Atualizado até capítulo 53
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