Capítulo 4

Eu não sabia o que esperar dele. Mal nos conhecíamos e, de repente, senti como se ele me apalpasse. Seus dedos percorreram minha bochecha, o nariz, minhas pálpebras fechadas e, finalmente, minha boca.

— Seus cílios são longos. Você tem a pele macia e seu nariz parece perfilado. — Ele fez uma pausa. — Seus lábios… úmidos e macios.

Ele afastou a mão e eu ainda não entendia por que ele tinha feito isso. Nem por que ele me pedia algo assim em vez de deixar que eu o atendesse como se supunha.

— Você…?

— Não te parece agradável? — perguntou com naturalidade. — Tomar o fresco, sentir paz e não ter medo.

Sem medo? Justo ele, Nicolás, era quem me provocava nervos. Meu coração parecia querer sair do peito.

— Está fresco, sim — admiti. — Mas você…

— Estou fazendo isso há uma semana.

— Fechar os olhos de propósito? — soltei, direto demais.

— No princípio me desesperava, mas agora estou me acostumando a momentos como este.

— Uma semana sem ver?

— Isso mesmo. Fui operado. Não sabia?

— Eu…

— Meus pais não te disseram?

— Sim, mas não em que consistia sua recuperação.

Estalou a língua.

— Que raios! Terei que te contar eu mesmo. Não posso ver. A cirurgia foi uma preparação para minhas pupilas.

Sua revelação me caiu como um balde de água. Até esse momento entendi por que precisava que alguém o cuidasse.

— Não pensei que… não pudesse ver.

O vento agitou as folhas da árvore em frente a nós.

— Ainda está com os olhos fechados?

— Sim.

— Genial! Então me alimente assim.

— Você está louco!

— Um pouco.

Ri sem querer.

— Que bom que me avisa, terei isso presente.

Ele também riu. Continuava sendo convencido ou só brincava comigo?

— Bom, vai me alimentar?

— E por que não se alimenta sozinho?

— Se pudesse, o faria. Mas não posso.

Mordisquei o lábio. Como era fácil me esquecer de que seu mundo era feito só de sons, aromas e tato.

— Abra os olhos — disse sem medo. — Estou com fome.

Obedeci.

No princípio tudo era turvo. Pouco a pouco minha visão se aclarou, até que o vi em frente a mim. O lenço cobrindo seus olhos confirmava.

— Operaram seus olhos?

— Sim. E por isso preciso que me alimente. Você disse que tinha vindo me cuidar.

Nicolás era alto, com barba espessa de várias semanas e o cabelo algo desalinhado. Já não parecia convencido: tinha porte. Era bonito. Me intrigava a cor de seus olhos escondidos.

— Está bem. Quer…?

— Me leve ao sofá. Prefiro tomar café da manhã ali.

Fui buscar a bandeja e a levei para a sala.

— Foi embora? Lembra que não posso ver.

Tinha me esquecido de que dependia de mim.

— Perdão. Sou seus olhos.

— É meus olhos?

Me aproximei de novo.

— Agora sou. Que surpresa! Meu pai não me disse que cuidaria do filho dos patrões… e menos que estivesse cego. Seus pais tampouco me advertiram.

— É muito franco.

— Perdão, talvez devesse me calar…

— Fale sem pena. Não me incomoda.

E então por que antes sim? Sorri.

— Genial. Vamos tomar café da manhã.

Peguei sua mão. Era enorme e cálida. O guiei com passos lentos até o sofá.

— Está aqui porque te obrigaram, verdade?

— Sim.

— Seus pais?

— Sim. Porque os seus precisavam de alguém que conhecesse o negócio da sua família.

— Sabe que meu pai é narco?

— Sei. O que não entendo é por que não contrataram um cuidador profissional. Eu só sou um rapaz. Não espere muito.

Pareceu sorrir.

— E o que poderia esperar de você?

— Nem ideia. Só que aprenderei na marcha.

O observei enquanto movia os lábios ao falar. Não podia me ver, mas eu o sentia demasiado presente.

— Quantos anos tem?

— Dezoito. Seu pai me disse que tem vinte e oito.

— O que mais meus pais te disseram?

Enchi uma colher e a aproximei de seus lábios. Abriu a boca. A imagem me deu risada interna: como alimentar um bebê.

— Me disseram que tinha um caráter da droga e que devia te ajudar a se sentir bem.

Ele mastigou e engoliu.

— Da droga estou agora! Não posso ver.

— Bom, sim, mas tampouco tanto.

— Por que diz isso?

Lhe dei outra mordida.

— Olha onde vive: casa de luxo, tudo o necessário… e agora alguém que te cuida. Isso não é estar tão mal. Há gente de verdade na droga, e ainda assim segue adiante. O seu é temporal.

Guardou silêncio, estava processando.

— Sua família está na droga?

— Pra que te digo que não, se sim. Por isso estou aqui. Meu pai me obrigou a aceitar este trabalho. Até me deu uns tapas. Estou aqui à força.

— E por que precisamente você?

— Seu pai ofereceu dinheiro em troca de alguém discreto e dócil, que soubesse calar pelo narcotráfico. Como meu pai deve dinheiro a um tio, me usou para pagar.

Eu não me sentia tão dócil nem tão recatado.

— Mas aqui vai passar bem.

— Isso espero. Se fica pesado, e te deixo. Não gosto de me deixar se me tratam mal.

— Caráter engraçado, diz? Mais bem forte.

— Pois sim. Há pouco na viagem sentia que queria me enforcar… e agora estou como menino bem, em modo servente. Quer café?

Sorriu.

— Está bem.

— Ainda que não sou seu servente, hein?

Lhe aproximei a xícara e bebeu uns goles.

— Não gosta de ser?

Soltei uma risada.

— A verdade não. Estou aqui porque meu pai sempre foi moço. Como já terminei o ensino médio, quer que me endureça. Além disso, já quer me casar, e como eu não quero… pois se irrita.

— Seu pai quer que já se case?

— Sim. Mas é uma longa história.

Assentiu.

— Então usará suas férias para me cuidar.

— Sim. Já te disse que me obrigaram. Valorize minha companhia, porque não sei nada de cuidar de enfermos, mas aprendo rápido.

A confiança crescia. Não me deu medo me mostrar tal qual era.

— Tenho vontade de ir ao banheiro. Poderia me levar?

Fiquei gelado.

Levá-lo ao banheiro? Se não podia comer sozinho, tampouco poderia…? Engoli saliva.

— Está bem. Do um ou do dois?

— Só urinar.

Rolei os olhos.

— Beleza. Vamos.

O banheiro cheirava a maçã com canela.

— Já estamos. O vaso sanitário está atrás de você. Te espero lá fora.

— E se esguicho todo o piso?

— Pois sente-se. Não é tão difícil.

Não me sentia preparado para isto. Cuidar de alguém limitado significava mais do que pensei.

— Te aviso quando estiver pronto.

— Genial. Te espero.

— Ainda que… deveria me ajudar com a calça.

Me tencionei de golpe.

— Suponho que sim… — me aproximei, olhei o lenço sobre seus olhos e, contendo a respiração, desabotoei seu cinto e o botão da calça. — Pronto.

— Obrigado.

— Me grita quando puder entrar.

Fechei a porta atrás de mim e respirei fundo. Nunca imaginei que cuidá-lo seria assim… e era apenas o primeiro dia.

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Comments

Elza de lima

Elza de lima

desculpa autora mais a escrita está um pouco confusa entre as falas dos personagens. não conseguirei continuar lendo. espero que melhore

2025-10-09

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