Relatos de Além-túmulo
A Casa da Colina Branca
Dizem que certas casas guardam memórias. Outras, carregam cicatrizes profundas do que foi vivido dentro delas — ou do que nunca deveria ter acontecido. A casa da Colina Branca era uma dessas. Esquecida no topo de uma estrada de terra que poucos tinham coragem de subir, ela se escondia entre árvores secas e um ar denso de abandono. Vista de longe, parecia apenas uma construção velha. Mas de perto, ela exalava uma presença que era quase palpável.
Meu nome é Clara Mendonça. Sou jornalista investigativa especializada em fenômenos paranormais e casos sem explicação. Passei anos cobrindo histórias que muitos consideravam lendas ou exageros. Mas nada, absolutamente nada, me preparou para o que encontrei naquela casa.
Tudo começou com uma carta. Um envelope envelhecido chegou à redação, sem remetente, apenas com meu nome escrito em letra tremida e antiga. Dentro, havia uma única frase:
“Se quiser saber a verdade, vá até a casa da colina antes que ela leve mais um.”
Era um aviso, ou talvez um chamado.
Cheguei à cidadezinha de Areal às 16h, com o céu encoberto por nuvens pesadas e o vento cortando como lâmina. Os moradores, todos desconfiados, evitavam até mencionar a casa. “Não vá lá”, diziam alguns, “não se mete com o que dorme em silêncio”, murmuravam outros. Mas era tarde demais para voltar atrás.
A casa estava exatamente como nas fotos antigas: madeira escurecida pela umidade, janelas quebradas, telhado afundado em alguns pontos. O portão rangeu quando o empurrei. Ao cruzar o jardim seco e coberto de folhas, senti um arrepio subir pela espinha — não de frio, mas de instinto. Algo naquela casa me reconhecia.
Entrei sem dificuldades. A porta estava encostada, como se esperasse por mim. O interior era um retrato de abandono: móveis cobertos por lençóis empoeirados, quadros tortos nas paredes, e um silêncio tão absoluto que até minha respiração parecia intrusa. O ar era denso, cheirando a mofo, terra molhada e algo metálico… como ferrugem. Ou sangue.
Segui para o segundo andar. Cada degrau rangia de forma incômoda, e por um momento, tive a impressão de que alguém pisava logo atrás. Mas ao olhar para trás, vi apenas o vazio.
No fim do corredor, uma porta entreaberta me chamou a atenção. Atrás dela, o quarto dos irmãos Cardoso — desaparecidos misteriosamente em 1993, nunca encontrados. O local parecia intacto. Havia desenhos infantis nas paredes, brinquedos espalhados, e, no canto, uma boneca de porcelana com olhos escuros, quase humanos, me encarando.
Me aproximei devagar. E então ouvi. Um sussurro. Quase inaudível, mas claro como um pensamento:
— Você não devia estar aqui...
O quarto ficou gelado de repente. A porta atrás de mim se fechou com um estrondo. A lâmpada piscou e apagou. A única luz vinha de uma fresta na janela, iluminando a boneca que agora… sorria.
Meu coração disparou. Tentei abrir a porta, mas a maçaneta estava trancada, como se tivesse desaparecido. E então, nas paredes, as palavras começaram a se formar sozinhas, como se uma mão invisível escrevesse com pressa: "AJUDE-NOS".
Foi ali que percebi: aquela casa não queria apenas contar uma história. Ela queria ser ouvida. Ela queria libertar algo. Ou alguém.
Mas antes… ela queria me prender.
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Atualizado até capítulo 41
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