O vento cortava as ruas como lâminas frias, trazendo um cheiro de terra úmida e algo metálico que grudava na garganta. Era cedo demais para a cidade parecer tão morta, mas ali, em Akatsuka, o silêncio era quase uma regra. Apenas os estalos ocasionais dos galhos balançando ao vento quebravam a quietude, e, ainda assim, soavam como dedos batendo nos vidros das janelas.
Eu descia a rua estreita que levava à escola, os degraus de pedra escorregadios de musgo, e por um instante senti que estava sendo observado. Olhei para trás — apenas uma rua vazia e algumas casas antigas, com suas janelas fechadas como se ninguém mais morasse nelas. Mas o incômodo não passou.
Foi então que reparei.
As flores vermelhas haviam se espalhado ainda mais desde o dia anterior. Não apenas nos cantos esquecidos ou nos becos, mas quebrando as pedras antigas do calçamento, erguendo-se, vivas e pulsantes, como se algo lá embaixo as empurrasse para fora da terra.
As pétalas pareciam mais brilhantes que nunca, quase molhadas, como se tivessem acabado de ser lavadas em… sangue.
Parei, sentindo minha respiração falhar.
— …Essas flores… — murmurei sem perceber.
Uma senhora que passava me lançou um olhar rápido, cheio de desconfiança.
— Ele está cada vez mais perto… — murmurou para a vizinha, achando que eu não ouviria.
— Dizem que as flores aparecem primeiro ao redor do próximo escolhido.
— Talvez ele já esteja marcado…
Apertei os punhos. Fingi não escutar e continuei andando, mas cada passo parecia mais pesado. O peso dos olhares era sufocante. As janelas fechadas, as cortinas se mexendo sutilmente… todos estavam me observando, como se eu fosse um animal prestes a ser abatido.
Quando passei por um portão de madeira, algo se moveu no canto da visão. Olhei rápido.
Nada. Apenas o vento balançando as flores.
Mas então elas… se mexeram de novo.
Devagar. Como se me seguissem com o movimento do vento, mas o ar estava parado naquele momento.
Engoli em seco. Apertei o passo.
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Na escola os corredores estavam mais silenciosos que o normal, exceto por um leve chiado de vozes abafadas vindo de um grupo de alunos encostados no bebedouro. Quando passei, as conversas cessaram abruptamente, e senti os olhares queimando minhas costas.
— Você viu as flores na frente da casa dele?
— Estão crescendo mais rápido do que antes…
— Talvez ele seja o próximo…
Fingi não ouvir. Entrei na sala de aula e me sentei na minha carteira, tentando ignorar as vozes que surgiam em minha cabeça.
Foi aí que ouvi o primeiro sussurro do dia.
"Você não vai escapar."
Minha cabeça se ergueu rápido. Olhei em volta. Os colegas estavam conversando normalmente, ninguém parecia ter dito aquilo.
Respirei fundo. Só coisa da minha mente… certo?
Mas então outro sussurro veio, mais próximo, arranhando meus ouvidos:
"O amor que te cerca é feito de sangue…"
Fechei os olhos com força. Não, não, eu não estava ficando louco… certo? Mas o som parecia vir de todos os lados.
As vozes começaram a rir, um coro baixo e abafado, e senti um frio subir pela espinha. Quando abri os olhos, vi algo que me fez perder o ar.
Na janela ao lado, flores vermelhas estavam brotando lentamente da madeira, como se a própria parede estivesse sangrando. E entre elas, por um segundo, juro que vi um rosto distorcido me encarando de dentro do reflexo do vidro.
Pisquei, e desapareceu. Mas as flores continuavam lá, pingando um líquido escuro que manchava a madeira.
— Seong? — uma voz real me chamou.
Virei rapidamente. Era Ryusei, parado na porta.
Ele me encarava com aquela expressão séria, mas havia algo nos olhos dele… preocupação?
— Você está pálido. — ele disse, se aproximando. — Aconteceu alguma coisa?
Eu queria dizer que estava tudo bem, mas as palavras ficaram presas. Ele se sentou ao meu lado, e por um instante o cheiro dele, fresco como chuva, me trouxe uma sensação estranha de… segurança. Mas logo foi quebrada.
Porque, quando olhei para ele, vi sangue escorrendo pelo canto da boca dele.
Piscar. Desapareceu.
Mas meu coração já estava disparado.
Ryusei me observou com cuidado.
— …As flores estão crescendo mais, não é?
Fiquei em silêncio.
— Não liga para o que dizem. — ele murmurou, desviando o olhar. — Eu sei como é…
Ele não terminou a frase, e um silêncio pesado se instalou entre nós. Mas eu sabia. Ele estava falando da marcação dele…
As vozes voltaram, baixas, só para mim:
"Ele vai morrer também. E a culpa vai ser sua."
Quase me levantei, mas Ryusei segurou meu pulso. Sua mão estava quente — mas, por um segundo, senti como se dedos gelados segurassem meu braço também, por baixo da pele.
Olhei para baixo. Juro que vi uma mão pálida e deformada segurando meu pulso junto com a dele.
— …Seong?
Piscar. Sumiu.
— …Nada. — murmurei, tentando me soltar.
Ele não insistiu, mas me olhou como se soubesse exatamente o que eu estava sentindo.
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No caminho de casa o sol já estava se pondo quando desci a rua novamente, e o vento parecia mais gelado do que nunca. A neblina se acumulava rápido, cobrindo as casas e tornando a cidade ainda mais sufocante.
As flores agora pareciam olhar para mim. Cada pétala parecia me seguir, como olhos vermelhos e imóveis.
Foi quando ouvi.
Passos atrás de mim.
Parei. Os passos também pararam.
Olhei por cima do ombro. Nada. Apenas a rua vazia e as flores balançando lentamente.
Continuei andando. Os passos voltaram.
Mais rápidos agora.
Virei de repente. Nada. Mas senti uma respiração gelada perto do meu pescoço, e as vozes, agora gritadas, ecoaram na minha mente:
"Você deveria ter fugido!"
Corri.
As flores pareciam se mover com o vento, avançando pelo chão como se quisessem me agarrar. Quase escorreguei na ladeira, e o barulho de algo arranhando o chão me seguiu até a porta de casa.
Quando finalmente fechei a porta atrás de mim, o silêncio voltou. Mas eu ainda ouvia, bem no fundo da minha mente, o sussurro abafado:
"Você não vai escapar."
>FIM DO CAPÍTULO 3
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Atualizado até capítulo 36
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