...Misaka...
Corri atrás. Ele era rápido. Atalho pela cerca. Saltei caixas de madeira. O som dos meus passos ecoava no beco de trás.
Quase alcancei.
Quando estendi o braço e agarrei o casaco dele — PAH!
Um cotovelo entrou no meu estômago.
O ar escapou do meu corpo como um soco na alma.
Cai de joelhos, sem ar por um segundo.
Ele virou pra fugir.
Mas uma voz cortou o ar:
— “FBI! PARADO!”
BANG! — Um tiro de advertência.
Cruz.
Ela surgiu no final do beco com a arma em punho, acompanhada por Camila e Leon.
O suspeito parou.
Foi algemado em segundos.
Ofegante, ainda ajoelhada, olhei pra ele.
Jovem. Camisa suja de sangue. Respirava rápido. Suava frio.
Toquei no braço dele com a ponta dos dedos. Só um segundo.
E então a verdade pulou da mente dele pra minha.
Ele esteve na casa.
Ele conhecia a enfermeira.
Discutiram. Ele a empurrou.
Ela bateu a cabeça. Sangue. Pânico.
Ele tentou simular um ataque igual aos de Israel.
Tentou imitar o serial killer pra encobrir o próprio crime.
Filho da mãe.
Mas… eu não podia contar como soube.
Cruz se aproximou, séria.
— “Você tá bem?”
Assenti.
— “Ele é o culpado.”
— “E como sabe disso?”
— “Só sei. Instinto. Análise do corpo dele. As roupas, o nervosismo. Ele correu ao ver as viaturas. Fugiu. Reagiu. E não pareceu surpreso com a morte. Parece alguém que sabe o que aconteceu.”
Cruz me olhou como se soubesse que havia algo a mais.
Mas não insistiu.
Ela apenas assentiu e mandou levá-lo para interrogatório.
—
Enquanto os outros estavam ocupados com o suspeito, eu voltei para a casa.
Não pedindo permissão.
Apenas entrei.
O sangue ainda fresco manchava o tapete da sala. A espiral estava desenhada com mais perfeição do que as anteriores.
Mas algo… algo estava errado.
Me agachei.
Observei de perto.
— “Essa espiral… tem uma quebra.”
Notei um traço duplo, quase invisível, entre as curvas.
Toquei levemente.
Uma digital.
Mas não da vítima…
Nem do falso assassino.
Alguém esteve ali depois da morte.
Israel.
Ele esteve na cena, depois.
Corrigiu a obra.
Marcou sua assinatura como se dissesse: "Eu ainda estou no controle."
E deixou algo mais.
Pintado com o sangue, discretamente no canto inferior do espelho, estava escrito:
> “Você pegou o rato errado, boneca.”
Sorri.
— “Você tá mesmo assistindo de perto, não tá?”
Olhei em volta.
Cada sombra parecia respirar.
—
Israel sabia de mim.
Sabia de Cruz.
Sabia da equipe toda.
Mas só eu podia ler os traços invisíveis que ele deixava.
Só eu.
A sala de interrogatório era fria. Minimalista.
Mesa de metal. Espelho falso na parede. Câmeras discretas no teto.
O suspeito estava algemado. Sentado, inquieto, respirando como se tivesse corrido uma maratona.
A ficha sobre ele dizia o nome: Lucas Mendez, 24 anos, entregador, sem antecedentes.
Pelo menos, até hoje.
—
Eu entrei primeiro.
Cruz queria que Leon conduzisse o interrogatório, mas eu pedi cinco minutos sozinha.
Ela hesitou… e deixou.
Quando fechei a porta, Lucas ergueu o olhar.
Assustado. Arrependido.
Mas tentando fingir que ainda podia escapar.
Sentei. Encostei as mãos na mesa. Não disse nada por alguns segundos.
Só o olhei.
— “Você sabe quem eu sou?” — perguntei.
Ele hesitou.
— “Alguma... psicóloga?”
— “Mais ou menos. Eu sou a pessoa que sabe que você matou a enfermeira.”
Ele bufou.
— “Eu já disse que encontrei ela morta. Fiquei com medo. Fugi. Foi só isso.”
— “Ah, entendi. Então você tropeçou no corpo, pegou sangue no dedo, desenhou uma espiral perfeitamente simétrica no espelho com um traço que só um dos serial killers mais inteligentes do mundo usa… e depois fugiu porque ficou nervoso.”
Me inclinei.
— “Isso acontece com todo mundo, claro.”
Ele desviou o olhar.
—
Meus olhos percorreram cada movimento dele.
Microexpressões, respiração, tensão no maxilar.
O medo era real.
Mas o remorso? Inexistente.
—
— “Você a empurrou.” — disse, com voz baixa.
— “Não empurrei ninguém.”
— “Ela gritou. Te chamou de covarde. Você ficou com raiva.”
Ele gelou.
— “Foi um acidente.”
A boca falou antes do cérebro.
Peguei. Sorri.
— “Sabia que Israel Keyes não deixa rastros biológicos? Mas você… deixou saliva numa colher da cozinha.”
Ele empalideceu.
(Claro que era blefe. Eu não precisava que fosse verdade. Eu só precisava da reação.)
— “Você não é um assassino inteligente, Lucas. Só é um idiota oportunista tentando esconder um erro.”
Ele começou a suar.
— “Ele vai me matar agora, né?”
— “Israel? Provavelmente. Você roubou a assinatura dele. Imagina só, um amador sujando o nome de um artista.”
Lucas começou a tremer.
— “Você não entende… ele tava lá. Depois. Eu juro que vi. Eu ouvi passos. Ele me viu. Ele sabe quem eu sou…”
Ah.
Então era verdade.
Israel estava ali.
Depois da morte. Viu o corpo. Viu Lucas fugindo.
E o deixou viver.
De novo.
Uma isca.
Uma piada interna.
Um jogo com uma só adversária.
— “Ele me viu!” — Lucas gritava agora. — “Eu achei que se eu fizesse igual a ele, talvez... talvez ele me deixasse! Talvez me aceitasse!”
Eu apenas o encarei.
— “Ele não aceita cópias. Ele desmonta elas.”
A porta se abriu. Cruz e os outros entraram.
— “Terminou?” — ela perguntou.
Assenti. Me levantei.
— “Ele confessou. Mas tem mais. Israel estava na casa. Ele viu o que aconteceu, e permitiu. Porque queria que a gente perdesse tempo com o cara errado.”
Theo digitava tudo no tablet. Leon olhava fixo pro suspeito, agora colapsando mentalmente.
Camila?
Ela só murmurou:
— “Esse filho da mãe tá se divertindo com a gente.”
Cruz olhou pra mim.
— “O que ele quer, Misaka?”
Respondi sem piscar:
— “Quer que eu me canse antes de chegar até ele. Mas ele esqueceu uma coisa.”
— “O quê?”
— “Eu não me canso.”
O hospital à noite tem um cheiro diferente.
Mais químico. Mais morto.
Não tem o som das enfermeiras apressadas. Nem o barulho dos telefones.
Só o zumbido do ar-condicionado.
E o som constante e profundo da minha própria respiração.
Estava de volta ao quarto. Luz apagada. Cortina semiaberta.
A cidade lá fora parecia respirar em câmera lenta.
Me sentei na beira da cama.
O crachá ainda pendurado no pescoço.
Pés descalços no chão frio.
Tablet no colo, com todas as informações que eu mesma roubei, montei, limpei e processei.
O rosto de Lucas ainda rodava na tela.
Fraco. Covarde.
Mas útil.
Ele me mostrou que Israel está começando a mudar.
A assinar sua obra com erros de propósito.
A brincar.
E quando ele começa a brincar... é porque ele está perto.
—
Desliguei o tablet. Olhei pro teto.
Pensei na minha família.
Minha mãe gritava por mim, naquela noite.
Meu pai tentou me proteger.
Minha irmã menor… ela nem teve chance.
Tudo por causa de um homem que olhou nos meus olhos e disse:
> “Você não vai morrer. Vai me entender.”
E eu entendi.
Cada maldito pedaço.
—
Me levantei.
Fui até o espelho do banheiro.
A luz de emergência piscava.
Por um segundo, vi algo no reflexo.
Não meu rosto.
A espiral.
Pisquei.
Não estava mais lá.
Mas havia algo no chão, aos meus pés.
Um envelope branco.
Sem nome. Sem carimbo.
Fechado com cera vermelha — em espiral.
Abaixei, peguei com cuidado.
Minhas mãos tremiam. Mas minha mente estava firme.
Abri.
Dentro, um único papel.
Letra cursiva. Precisa.
> “Quantos inocentes você está disposta a sacrificar para ganhar esse jogo?”
> “A próxima jogada é sua, boneca.”
E abaixo disso…
Um endereço.
Rua 17, Bloco 9, Zona Industrial.
03:00 da manhã. Sozinha.
Meu reflexo no espelho me observava com um sorrisinho frio.
Meu próprio sorriso.
— “Você me acha previsível, Israel. Mas você me ensinou a ser você.”
—
Olhei o relógio.
2h14.
Pus os sapatos.
Amarrei o cabelo.
Guardei a carta no bolso interno do casaco.
E saí do quarto.
Sozinha.
Em silêncio.
A cidade me esperava.
E ele também.
Mas o que Israel ainda não entendeu é:
> Eu não estou indo pra sobreviver.
> Estou indo pra vencer.
Zona Industrial. 02:58 da manhã.
O vento carregava cheiro de ferrugem e óleo velho.
Galpões abandonados, cercas retorcidas, janelas com vidro quebrado.
Uma das áreas esquecidas da cidade — perfeita para se desaparecer sem deixar rastros.
Cheguei sozinha.
Sem FBI.
Sem Cruz.
Sem rastreador.
Deixei tudo pra trás.
Exceto a mente.
Essa, ele nunca arrancou de mim.
—
O endereço me levou até um galpão escuro, o Bloco 9.
Porta de metal enferrujada, com um cadeado… aberto.
Óbvio demais.
Israel não era de dificultar o acesso.
Ele queria que eu entrasse.
Abracei o silêncio.
Empurrei a porta com cuidado.
Ela gemeu como uma garganta velha.
O interior era escuro. Mas havia luz.
Fraca. Tremeluzente.
Luz de velas.
Dezenas.
—
As chamas criavam sombras dançantes nas paredes.
No centro, uma cadeira.
Nela, um corpo amarrado.
Fui me aproximando devagar.
A mulher — viva.
Boca amordaçada, olhos arregalados.
Era policial.
Reconheci o distintivo preso no uniforme.
A mesma mulher que estava na equipe da Cruz horas atrás.
Agente Camila Duarte.
Meu estômago virou. Mas não me deixei abalar.
Removi a mordaça. Ela arfava.
— “Misaka… era… uma armadilha.”
— “Eu sei.”
Olhei em volta.
Nenhum som. Nenhum passo.
Apenas o barulho de um projetor, que foi ligado na parede oposta.
O chiado do rolo começou.
E então… Israel apareceu na tela.
Gravado, claro.
Seu rosto coberto por sombras. Máscara negra.
Voz distorcida, mas familiar.
> “Você veio. Esperava menos de você, boneca.”
> “Sua mente é afiada. Seu controle, admirável.”
> “Mas será que você vai manter tudo isso… quando tiver que escolher quem vive e quem morre?”
A imagem se estilhaçou em preto.
Uma contagem começou na parede:
02:00
01:59
Camila começou a se debater.
— “Tem uma bomba… ele me prendeu com uma bomba—!”
Eu já estava agachada atrás da cadeira.
Não precisava pensar. Só agir.
Fios. Gatilhos. Temporizador.
Mas algo não fazia sentido.
Israel sempre dava um jogo justo.
Isso… estava fácil demais.
Parei. Respirei.
Isso é uma distração.
Me levantei, olhei ao redor — e vi.
Um ponto vermelho no canto da sala.
Uma câmera. Ele estava assistindo em tempo real.
Ele queria ver se eu salvaria a agente…
…ou fugiria.
Era um teste.
Mas não da bomba.
Era sobre mim.
E eu fiz o que ele não esperava.
Arranquei o fio do temporizador.
1 segundo.
Nada explodiu.
Camila chorava, ainda tremendo.
— “Tava blefando. Ele queria me quebrar.” — eu sussurrei.
A câmera desligou.
—
Me levantei. Olhei bem na lente antes disso.
— “Você vai precisar mais do que isso.”
Peguei Camila nos braços.
E saí do galpão.
—
No alto de um prédio distante, Israel assistia tudo.
E pela primeira vez em muito tempo… ele não sorriu.
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Atualizado até capítulo 59
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