O Dr. Tanaka tentou argumentar, explicar os termos do contrato que Yashiro e Keiko haviam assinado às pressas, mas suas palavras se perdiam no turbilhão de emoções. Yashiro, com o rosto vermelho de raiva e descrença, finalmente soltou o médico, mas sua voz ainda era um trovão contido.
"Eu não me importo com contrato nenhum! Vocês transformaram meu filho em... em outra pessoa! Devolvam meu Yuri! O que é essa clínica? Onde fica? Eu vou processar cada um de vocês!"
Keiko, no chão, começou a soluçar ainda mais forte, um lamento que cortava o ar. "Meu filho... minha vida... Yuri, por que, meu amor? Por que eles fizeram isso com você?"
Yuri, encolhida na cama, sentia cada palavra como uma facada. O "Yuri" que seus pais queriam de volta não existia mais. A raiva do pai, a dor da mãe, tudo se misturava ao seu próprio terror e confusão. Ela era um estranho em seu próprio corpo, e agora, parecia que era uma estranha para sua própria família.
O Dr. Tanaka, vendo que a conversa não levaria a lugar nenhum naquele momento de crise, decidiu recuar, prometendo providenciar os detalhes da clínica para onde Yuri seria transferida, conforme o "tratamento" exigia. Ele saiu do quarto, deixando a família em seu tormento particular.
Os dias que se seguiram foram um borrão de desespero e incompreensão. Yashiro, consumido pela fúria, dedicou-se a investigar a misteriosa clínica e os "cientistas" que, segundo ele, haviam mutilado seu filho. Ele fez ligações incessantes, vasculhou a internet, encontrou-se com advogados, mas todas as pistas pareciam levar a becos sem saída ou a informações vagas e contraditórias. A empresa farmacêutica parecia fantasma, ou tão bem escondida que era impossível rastreá-la.
Enquanto isso, Keiko oscilava entre a negação e uma tristeza profunda. Ela trazia as refeições de Yuri para o quarto, mas mal conseguia olhar para a filha, evitando o contato visual. Quando falava, era com uma voz trêmula, chamando-a de "meu amor" ou "filho", mas nunca pelo seu nome, Yuri, em sua nova identidade. A cada vez que Yuri tentava articular o que sentia, a dor e a frustração da mãe apenas aumentavam, resultando em mais choro e silêncio.
Para Yuri, cada momento era uma tortura. As roupas, os espelhos, até mesmo sua própria voz – tudo era estranho, alienígena. Ela tentava entender quem era agora. A figura imponente e temida de Yuri Takashi, o líder do Red Dragon, parecia uma memória distante, quase de outra vida. Quem era essa garota frágil e assustada que o espelho refletia?
Uma parte dela, a antiga Yuri, ainda sentia a fúria e a resistência. Ela se recusava a aceitar aquilo. Tentava, inutilmente, forçar seu corpo a voltar ao que era, batendo contra o que via no reflexo, como se pudesse quebrar a ilusão. Mas a cada tentativa frustrada, a dura realidade se impunha, e a sensação de impotência se aprofundava.
A velha gangue, o Red Dragon, estava em polvorosa. Notícias do "desaparecimento" de seu líder se espalharam, misturadas a boatos estranhos sobre seu desmaio e hospitalização. Sem Yuri, a hierarquia da gangue começou a balançar, e velhos rivais aproveitaram a oportunidade para tentar dominar o território. A ausência de Yuri não era apenas uma lacuna familiar, mas um vácuo de poder no submundo adolescente de Shibuya.
Em meio a esse caos, uma verdade fria começou a se instalar em Yuri: a cura, que deveria ser uma bênção, havia se tornado uma maldição. Ela estava viva, sim, mas em um corpo que não reconhecia, em uma família que não a aceitava, e em um mundo que não fazia mais sentido. A luta contra o tumor havia terminado, mas uma nova e muito mais complexa batalha acabara de começar: a batalha por sua própria identidade e por um lugar em um mundo que a havia virado de cabeça para baixo.
A fúria de Yashiro, alimentada pela inação e pelo desespero, atingiu um ponto de ebulição. A impossibilidade de rastrear a clínica e a sensação de que seu filho havia sido roubado o impeliram a uma medida drástica. Apesar dos apelos chorosos de Keiko, que temia a exposição e o julgamento público que recairiam sobre Yuri, Yashiro estava determinado a encontrar respostas, custe o que custasse.
Ele procurou os grandes veículos de imprensa. No início, houve ceticismo, mas a história de um adolescente desaparecido do hospital após um tratamento "experimental" e a angústia palpável de um pai desesperado logo capturaram a atenção. Em poucos dias, o caso Yuri Takashi explodiu na mídia japonesa. Reportagens investigativas pipocavam nos telejornais, artigos de jornal detalhavam a busca frenética de Yashiro, e a imagem antes temida de Yuri, agora sobreposta pela figura de uma garota frágil, estampava capas de revistas.
Yashiro apareceu em programas de entrevistas, seu rosto cansado, mas seus olhos queimando com uma determinação implacável. Ele implorava por informações, descrevendo o homem misterioso do sobretudo escuro e o dilema que o levou a assinar aquele termo de consentimento. Sua voz embargada pela emoção ressoava em milhões de lares, mobilizando a opinião pública em busca de justiça para seu filho.
No entanto, a cada dia que passava, a esperança de Yashiro se chocava contra um muro intransponível. Apesar de toda a comoção, de todos os holofotes, a clínica parecia não existir. As autoridades investigaram, mas não encontraram registros, licenças ou sequer um endereço físico para a tal farmacêutica. Era como se o homem misterioso e a droga experimental tivessem surgido do nada e, após a transformação de Yuri, tivessem simplesmente evaporado. Teorias da conspiração começaram a surgir: uma experiência clandestina do governo, uma organização secreta, ou até mesmo um golpe elaboradamente cruel.
Para Yuri, confinada em casa enquanto a imagem do seu "antigo eu" e a sua nova realidade eram dissecadas publicamente, a exposição era uma faca de dois gumes. Por um lado, sentia-se invadida, exposta, observando sua tragédia pessoal virar um espetáculo. Por outro, havia uma estranha sensação de alívio por não ser a única a carregar aquele peso. Mas o fato de que nem mesmo a mídia, com todo o seu poder de alcance, conseguia desvendar o mistério, apenas aprofundava a sensação de que estava presa em uma armadilha sem saída. A cada nova reportagem que não trazia respostas, a verdade inegável se impunha: a vida de Yuri Takashi, o líder da Red Dragon, havia chegado ao fim de uma forma irreversível. E agora, ela teria que aprender a viver com as consequências.
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Atualizado até capítulo 48
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