O domingo amanheceu preguiçoso, como todos os domingos deviam ser. Mas na mente de Lívia, o dia começou antes mesmo da luz atravessar as frestas da cortina. Ela acordou cedo, com o coração inquieto e a memória ocupada — não por imagens, mas por sensações.
A dança.
O toque.
O olhar.
Cael.
Mesmo que tudo tivesse acontecido em poucas horas, ela sentia como se tivesse vivido uma pequena vida ao lado dele. Uma vida silenciosa, intensa, que ficou presa entre um olhar e uma despedida não dita.
Mari entrou no quarto de pantufas e caneca na mão, o cabelo emaranhado no topo da cabeça.
— Bom dia, sonhadora — cantarolou ela. — Dormiu bem ou ficou se revirando pensando no bonitão do casamento?
Lívia soltou um sorriso preguiçoso.
— Você me conhece demais.
— Claro. E também porque você ficou com essa cara de "me toca que eu derreto" desde que chegou ontem.
Ela se sentou na cama, puxando o cobertor para o colo.
— Então... vai me contar? O que rolou entre você e o misterioso homem de terno preto?
Lívia suspirou, jogando o corpo de volta no colchão.
— Nada aconteceu. Nada... físico, pelo menos. Mas Mari, foi como se eu conhecesse ele de algum lugar. Como se ele já me conhecesse. É estranho.
— Estranho ou mágico?
— Assustador.
— Hum... isso é porque você tem medo de se entregar.
Lívia a encarou de lado.
— Eu não tenho medo. Eu só... sou racional.
— Tá. E onde está toda essa racionalidade agora?
Lívia fechou os olhos. Não conseguia explicar. Era como se ele tivesse deixado uma marca invisível nela. Um rastro de algo que não se desfazia, mesmo com o tempo, mesmo com o silêncio do dia seguinte.
Do outro lado da cidade, em uma cobertura no alto de um edifício imponente, Cael Monteiro estava sentado diante da enorme janela panorâmica de seu quarto. A cidade ainda dormia embaixo dele. Mas ele não conseguia descansar.
Desde que saíra do casamento, no fim da noite anterior, sua mente não parava. Ele conhecia centenas de pessoas todos os anos. Mulheres lindas, atraentes, interessantes — muitas até demais. Mas nenhuma delas tinha o efeito que Lívia causou com um simples olhar.
Ela era diferente.
Era... real.
Ele não sabia seu sobrenome. Não tinha seu número. Não fazia ideia de onde morava, ou o que fazia da vida. E aquilo o incomodava mais do que gostaria de admitir.
Ligou para Rodrigo, seu sócio — e o noivo da festa da noite anterior.
— Cara, você sabe o nome completo daquela prima da Renata? A morena que estava de vestido vinho?
Rodrigo riu do outro lado da linha.
— Você tá ligando pra perguntar isso? A festa foi boa assim?
— Responde, Rodrigo.
— Calma, tá nervoso por quê? Nome dela é Lívia, Lívia Fernandes. Mas eu não à conheço muito bem. Fala com a Renata, ela é grudada nela.
Cael desligou antes que o amigo continuasse a provocação. Lívia Fernandes. Era tudo que tinha.
E agora que sabia o nome, faria de tudo para reencontrá-la.
Enquanto isso, Lívia tentou seguir com sua semana como se tudo estivesse normal.
O trabalho no escritório continuava entediante. Sua chefe continuava um pesadelo disfarçado de salto alto. E ela seguia empurrando os dias com a força de quem não tem tempo para distrações. Ou tenta fingir que não tem.
Mas todas as noites, ao deitar, sua mente voltava para o jardim iluminado por lanternas. Para os olhos cinzentos. Para a conversa que parecia ter tocado sua alma.
Ela não era uma mulher de se apegar rápido. Não acreditava em paixão à primeira vista. Mas o que sentia não era apenas atração. Era como se houvesse algo ali que escapava da lógica. Uma conexão que ela não soube evitar — e que agora não conseguia esquecer.
Mari, claro, não a deixava em paz.
— Já tentou procurar ele?
— Procurar como? Eu nem sei o sobrenome dele.
— Já pensou se ele também tá te procurando?
Lívia riu, mas algo dentro dela esperava por isso. Secretamente.
Na quinta-feira à tarde, ela recebeu uma ligação inesperada.
— Lívia? Oi, é a Renata!
— Rê! Que bom te ouvir. Casamento dos sonhos, hein?
— Obrigada! Foi tudo lindo mesmo. Mas estou te ligando por outro motivo.
Lívia sentiu o coração bater mais forte, instintivamente.
— Um amigo do Rodrigo pediu seu contato. Disse que te conheceu no casamento e não consegue parar de pensar em você.
— Quem?
— Cael. Cael Monteiro. Conhece?
O nome fez algo dentro dela estremecer.
— Sim... conheço.
— Posso passar seu número pra ele?
Lívia hesitou por alguns segundos. Seu coração gritava “sim”, mas sua mente, sempre cautelosa, tentava protegê-la de algo que ela mesma não compreendia.
— Pode — respondeu, por fim, com a voz quase falhando.
E naquele instante, algo dentro dela se abriu como uma flor ao sol. O acaso havia agido de novo. E o destino parecia estar brincando com as linhas do invisível.
Na manhã seguinte, o celular dela vibrou com uma mensagem desconhecida:
Número desconhecido:
"Bom dia, Lívia. Não consegui te esquecer. Podemos conversar?"
Ela mordeu os lábios, sentindo uma onda de nervosismo e expectativa tomar conta do corpo. Era ele.
Lívia:
"Bom dia, Cael. Achei que você tivesse desaparecido."
Cael:
"Desaparecer nunca foi uma opção. Só precisei de um tempo para encontrar você. Agora que encontrei... espero que me dê outra chance de te ver."
Ela digitou, apagou. Reescreveu.
Lívia:
"E se eu disser que pensei em você todos esses dias também?"
Cael:
"Então acho que o acaso está jogando a nosso favor."
Lívia:
"Talvez seja a hora de descobrir o que ele está tentando nos mostrar."
Cael:
"Hoje à noite. Um jantar? Sem festa. Só nós dois."
Ela fechou os olhos por um segundo. Respirou fundo. Sabia que esse era o início de algo maior. Algo que viria com força, desejo, e consequências. Mas naquele momento, ela não queria resistir.
Queria viver.
Lívia:
"Me mande o endereço."
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Atualizado até capítulo 55
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