Brincadeiras e vultos

O som os levou até a parte de trás da casa, onde um grupo de pessoas se aglomerava perto de uma cerca baixa. Maya acelerou o passo, o coração batendo mais pelo susto do que por medo real.

— Dá licença — disse, empurrando levemente dois curiosos.

No centro da confusão, um rapaz vestindo uma fantasia improvisada de lobo se levantava do chão, rindo e esfregando o cotovelo.

— Você é maluco, Caio! — gritou uma garota, ainda rindo. — Quase matou a gente de susto!

— A culpa é dessa bebida aí, não minha — respondeu ele, trôpego, apontando para um copo vazio. — Achei que podia pular a cerca, mas... bem, acho que não posso.

Todos riram. A tensão se desfez tão rápido quanto tinha começado.

Maya soltou o ar devagar, percebendo que estava com os ombros tensos. Atrás dela, Eron a observava com atenção.

— Nada demais — disse ela, meio aliviada, meio envergonhada.

— Melhor assim — ele respondeu, com um meio sorriso. — Mas você correu rápido.

— Claro. Vai que era meu amigo gritando. Ou um urso. Ou, sei lá, um serial killer mascarado.

— Ou um cara bêbado tentando voar — completou Eron.

Ela riu, dessa vez de verdade. O susto tinha passado, mas o clima ainda estava estranho — não por causa do grito, mas por causa dele. De Eron. E da forma como ele estava sempre… presente. Como se pudesse antecipar os pensamentos dela.

— Obrigada por vir comigo — disse, um pouco mais suave.

— Sempre. — Ele olhou para ela por mais um segundo antes de desviar o olhar para a floresta escura atrás da cerca. — Mas... se fosse algo sério, você estava mesmo pronta pra encarar?

— Não sei. Mas não ia ficar parada.

— Bom sinal.

— Sinal de quê?

— De que tem mais em você do que parece — disse ele, ainda sem olhá-la. — Muito mais.

Maya não respondeu. Mas por dentro, sentia que talvez... só talvez... ele tivesse razão.

E que ela também não era exatamente quem achava ser.

O celular vibrou no bolso de Maya. Ela o puxou e desbloqueou a tela. Algumas mensagens de Airon piscavam na tela:

📳Desculpa, Mah. Tô com o boy aqui e as coisas tão que tão 🔥.

📳O Eron cuida de você, ele é gente boa (mas o irmão dele 🔥🔥🔥🔥🔥🔥🔥que homem).

📳Mil perdões, te compenso outro dia. Beijinhos. Ah, qualquer coisa, usa o canivete. Você tá com ele, né?

📳Fui.

Maya suspirou, balançando a cabeça com um sorriso quase resignado. Ela mostrou a mensagem para Eron, que a leu de relance e riu.

— Então... já sou digno da tua confiança pra te oferecer uma carona? — perguntou ele, arqueando uma sobrancelha.

— Não tenho muitas opções. Mas saiba que tenho um canivete.

— Oh — Eron levou uma mão ao peito, fingindo choque. — Estou verdadeiramente intimidado.

— O problema é que... não sei onde deixei.

Eles riram, a tensão da noite finalmente se dissolvendo em algo mais leve.

— Bom, nesse caso, se eu quiser te sequestrar, tenho uma janela de oportunidade. — Eron piscou.

— Vai precisar correr muito rápido. — Maya estreitou os olhos, brincando. — Tenho pernas boas.

— Não duvido — disse ele, com um sorrisinho malicioso.

Ela bufou rindo, e balançou a cabeça.

— Você é um péssimo desconhecido.

— Eu tento. — Ele deu de ombros. — Então... vamos?

Maya hesitou por meio segundo, mas então assentiu.

— Vamos.

Eles seguiram juntos até o carro. A noite estava fria, e Maya se encolheu levemente no casaco. O som da festa foi se apagando às costas deles, substituído pelo canto distante de um grilo e o farfalhar das folhas. Ao entrar no carro, ela lançou um último olhar para a floresta. Por um instante, achou ter visto algo se mover entre as sombras.

Mas quando piscou... já não havia nada.

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