Melissa não conseguia parar de sorrir. Desde o beijo no corredor, o mundo parecia mais leve, o café mais doce — e até as aulas de estatística, milagrosamente, menos traumáticas.
Carol, obviamente, percebeu.
— Tá, vamos lá. Ou você tá apaixonada ou encontrou um fornecedor clandestino de serotonina.
— Talvez os dois — respondeu Melissa, mordendo um morango no refeitório, com um brilho no olhar.
— Você dormiu com ele?! — Carol sussurrou em choque teatral.
— Não! Ainda não. Mas… — ela olhou ao redor, abaixando o tom — a gente se beijou.
— Gritando internamente.
— Eu quase gritei externamente. Ele beija daquele jeito que te faz repensar todas as decisões da sua vida.
Carol bateu a testa com a bandeja, exasperada.
— Melissa, por favor. Isso é o tipo de roteiro que começa fofo e termina com alguém chorando na chuva ao som de Adele.
— Eu sei. Mas... e se dessa vez for diferente?
— E se não for?
Melissa sorriu com um canto da boca, um brilho quase desafiador nos olhos.
— E se, mesmo assim, eu quiser descobrir?
Na quarta-feira, após a aula, ela encontrou um bilhete escondido entre as páginas de um livro deixado sobre sua mesa. Papel dobrado, caligrafia firme.
> “Sala dos fundos da biblioteca. 19h. Não se atrase. — M.”
Melissa quase engasgou com o coração.
Passou o resto do dia num misto de ansiedade e antecipação. Sabia que não era exatamente... sensato. Mas também sabia que certas decisões erradas carregam um gosto inconfundível de liberdade.
Às 18h59, ela já esperava. Às 19h em ponto, Miguel entrou.
A sala era pequena, reservada para reuniões. Luz suave, dois livros abertos sobre a mesa, como disfarce. Tudo parecia quase banal — exceto pelo modo como ele a olhou.
— Achei que você não viesse.
— Achei que fosse uma armadilha — ela respondeu, meio brincando.
— Talvez seja. Ainda quer entrar?
Ela entrou.
Ele trancou a porta.
— Eu queria conversar — ele começou, com a voz baixa.
— Conversar com chance de beijo ou só papo acadêmico? — ela perguntou, sentando-se.
Ele riu, sentando-se ao lado dela.
— Eu não sou desses professores que se envolvem com alunas.
— Pena que o "não" já virou "sim", professor Miguel.
Ele a encarou por um segundo, tenso. Depois cedeu, o rosto se suavizando.
— A verdade é que você me desconcerta, Melissa. Desde a primeira aula.
Ela sentiu um arrepio. A sinceridade dele tinha o dom de deixá-la sem armadura.
— Eu também fico perdida perto de você. Mas de um jeito... bom.
— A gente precisa de regras. Não quero que isso vire um problema.
— Que tipo de regras? — ela ergueu uma sobrancelha, provocando.
— Nada público. Nada que pareça namoro. Se perguntarem...
— Eu minto melhor do que atriz de novela das nove. Confia.
— E nada de se apaixonar.
Ela deu um sorriso torto.
— Tarde demais.
Ele riu, mas o olhar denunciava que, talvez, fosse tarde demais pra ele também.
Nas semanas seguintes, os encontros se multiplicaram. Discretos. Cuidadosamente escondidos sob a fachada da rotina acadêmica. Às vezes, se esbarravam no corredor com olhares que diziam tudo. Outras, trocavam mensagens com desculpas de trabalho.
E, às sextas-feiras, tinham a sala 304.
Escondida no prédio antigo de humanas, aquela sala virou refúgio. Uma hora só deles. Lá, entre livros empoeirados e janelas semiabertas, eles se entregavam àquilo que não cabia em regras.
Falavam, riam, se beijavam com a intensidade de quem sabe que não tem tempo de sobra.
— Você sempre me beija como se fosse a última vez — ela murmurou, com a camisa dele entre os dedos.
— Porque pode ser.
— Isso é triste.
— Isso é real.
— Então finge que não é. Só por hoje.
E ele fingia. Beijava-a devagar, com aquele cuidado que vinha do desejo contido demais. Como se cada toque fosse um segredo, e cada suspiro, uma promessa muda.
Carol, claro, farejava o mistério no ar.
— Você desaparece nas sextas. Depois volta com cara de quem passou no vestibular da vida.
— É só... amor platônico.
— Platônico com batom borrado? Hmm.
Melissa ria, mas no fundo sabia: aquilo estava ficando perigoso. Porque toda vez que Miguel a chamava de “Melissa” com aquela voz rouca e grave, todas as regras pareciam desintegrar.
Na última aula antes do feriado, Miguel lançou um olhar rápido pela sala — e parou nos olhos dela.
Foi um segundo. Um olhar cheio. Quente. Denso.
— Aproveitem o feriado. Relaxem, descansem... e evitem se envolver em algo complicado — ele disse, com um leve sorriso.
Melissa cruzou os braços, contendo outro.
Complicado? Ela já estava afundada até o pescoço no complicado.
E não queria sair tão cedo.
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Atualizado até capítulo 43
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