O sol mal havia subido quando Aeryn foi acordada por um grito seco e autoritário.
— De pé, ferro-velho! — a voz de Jerek cortou o ar frio da manhã como uma lâmina.
Ela rolou para fora do cobertor improvisado com um gemido, os músculos protestando a cada movimento. A dor era uma presença constante agora, latejando sob a pele, uma lembrança viva do treino brutal do dia anterior.
Aeryn não reclamou.
Não podia.
Cada corte, cada hematoma, era o preço que ela havia escolhido pagar.
Ainda esfregando os olhos, ela se levantou e caminhou até a clareira onde Jerek a esperava. As árvores lançavam sombras longas sobre o chão irregular. O vento gelado assobiava entre os galhos nus, carregando o cheiro metálico da terra molhada.
Hoje, o martelo parecia ainda mais pesado nas mãos dela.
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Jerek não perdeu tempo em discursos.
Ele atirou-lhe um bastão grosso, feito de um tronco pesado, cheio de lascas.
— Você vai lutar comigo hoje.
— Não era isso que eu estava fazendo ontem? — rebateu Aeryn, segurando o bastão com dificuldade.
Jerek riu com desprezo.
— Ontem você apanhou. Hoje, quero ver se consegue sobreviver.
Sem aviso, ele avançou.
Aeryn mal teve tempo de levantar o bastão. O primeiro golpe de Jerek acertou-a na lateral do corpo, arrancando-lhe um grito sufocado.
Ela cambaleou, mas não caiu.
Resistir. Sempre resistir.
Outro golpe. Dessa vez, ela conseguiu desviar, tropeçando para o lado, a lama agarrando suas botas.
O bastão pesado vibrava em suas mãos a cada bloqueio malfeito.
Jerek não a poupava.
Seus movimentos eram rápidos, cruéis, cheios de fúria contida.
Aeryn sabia: ele queria quebrá-la ali mesmo. Queria ver até onde ela podia suportar antes de desmoronar.
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O tempo perdeu significado.
Os golpes vinham como uma tempestade — implacáveis, sem misericórdia.
Ela bloqueava como podia, esquivava-se quando conseguia, e às vezes simplesmente aceitava a pancada porque não havia escolha.
Seu corpo se tornou uma tapeçaria de dores.
As costelas latejavam. Os pulsos gritavam. Um filete de sangue escorria de seu couro cabeludo onde um golpe a acertara de raspão.
Mas seus olhos… seus olhos continuavam firmes. Ardendo de determinação.
— Você é teimosa como um cavalo selvagem! — gritou Jerek, ofegante. — Isso vai te matar um dia!
Aeryn cerrou os dentes e respondeu entre respirações curtas:
— Então venha me matar, Jerek.
Por um segundo, ele pareceu hesitar. Um pequeno sorriso deformou seu rosto duro.
— Assim que se fala.
E atacou de novo.
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O treinamento prosseguiu até que o sol escalou o céu e o calor se tornou quase insuportável.
Cada músculo do corpo de Aeryn parecia ter sido substituído por pedras.
Seus braços tremiam sob o peso do bastão. Sua visão começava a embaçar nas bordas.
Finalmente, depois de um último golpe brutal — que ela desviou apenas por instinto — Jerek ergueu a mão, encerrando o treinamento.
Aeryn caiu de joelhos, arfando, o bastão escorregando de seus dedos calejados.
— Beba. — Jerek atirou-lhe uma cabaça d'água.
Ela bebeu com avidez, sem se importar com a água escorrendo pelo queixo.
Por cima da borda da cabaça, viu Jerek observá-la, braços cruzados, a expressão ilegível.
— Não é força que te mantém de pé, garota.
— Então o que é? — perguntou, a voz rouca.
— Ódio. Dor. Fome. — Ele se aproximou, ajoelhando-se para que ficassem olho a olho. — Mas você precisa aprender a transformar isso em controle. Ou vai morrer como todos os outros.
Aeryn apenas assentiu. Não confiava em sua voz para responder.
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Depois do treino, Sera se aproximou.
Trazia um pano limpo e um punhado de folhas medicinais.
— Deixe-me ajudar. — disse, com uma gentileza que contrastava com a brutalidade da manhã.
Aeryn hesitou por um instante, mas depois estendeu os braços.
As mãos de Sera eram firmes, eficientes. O pano úmido ardeu nas feridas, mas ela não reclamou.
— Você é forte. — comentou Sera, concentrada no trabalho.
— Não tenho escolha. — murmurou Aeryn.
— Sempre há escolha. — Sera sorriu de leve. — Mas nem todos têm coragem de fazer a certa.
Aeryn pensou na cidade destruída. Na fumaça cobrindo o céu. Nos corpos entre as ruínas.
Coragem? Ou desespero?
Ela não sabia mais.
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Naquela noite, enquanto os outros dormiam, Aeryn permaneceu sentada à margem da clareira.
O vento frio carregava sons distantes — galhos quebrando, o uivo de uma criatura na escuridão.
Ela segurava o martelo no colo como uma criança seguraria um brinquedo querido.
Pedra e sangue.
Essas seriam as bases sobre as quais ela reconstruiria a si mesma.
Não seria uma heroína.
Não seria uma mártir.
Seria uma arma.
E armas, ela sabia, não hesitavam.
Sob o brilho frio da lua, Aeryn fechou os olhos e sussurrou para a noite:
— Podem me quebrar. Podem me sangrar. Mas não vão me deter.
O vento levou suas palavras, como um juramento antigo, perdido entre as árvores.
E no fundo de sua alma, algo endureceu ainda mais.
A forja estava apenas começando.
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Atualizado até capítulo 67
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