A Arte Dos Seus Olhos

A Arte Dos Seus Olhos

Cores que sangram

Cain acordou lentamente, sentindo o peso da noite passada sobre o peito, como se um manto escuro tivesse sido jogado sobre ele enquanto dormia
O teto branco do pequeno apartamento que dividia com Esmael parecia o mesmo, imutável, mas para Cain era como uma tela em branco que ele não tinha coragem de pintar
Seus pensamentos estavam nublados pelas últimas palavras que ouviu de seus pais
palavras cortantes, recheadas de rejeição e desaprovação
Rejeição por ser quem era
Cain
Cain
*rola na cama, evitando o rosto cansado refletido no espelho do quarto*
olhos fundos, pele pálida, uma expressão de quem carrega um mundo inteiro de dores invisíveis
Cain sentia que a cada dia sua paleta de cores internas se esgotava mais, restando apenas tons de cinza e preto
No quarto ao lado, Esmael roncava baixinho
Cain sabia que ele tentava ser o suporte silencioso, mas também não era fácil para ninguém
Eles se conheceram no período em que Cain fora expulso de casa e, desde então, o apartamento compartilhado era um misto de abrigo e prisão
Cain
Cain
*levanta e veste a primeira roupa que encontra*
Cain
Cain
*sai sem fazer barulho*
A cidade já estava acordando, mas para Cain parecia engolir as pessoas em uma monotonia sufocante
Ele caminhava pelas ruas pensando nas cores que queria transformar em pinturas, mas que teimavam em não aparecer
No estúdio, o cheiro de tinta e madeira velha dava uma sensação de familiaridade
Sofia, sua chefe, uma mulher de pulso firme e olhar crítico, já estava lá, ordenando tarefas para a equipe
Sofia
Sofia
Bom dia Cain
Cain
Cain
Bom dia Sofi
Cain sentia o peso da cobrança em cada palavra dela, mas ao mesmo tempo sabia que precisava daquela pressão para continuar respirando naquele mundo da arte que tanto amava
Foi então que Akira entrou
Cain percebeu primeiro os olhos dele — azuis, profundos, como se cada olhar guardasse um segredo.
A câmera pendurada no pescoço não diminuía a intensidade do seu sorriso, que era ao mesmo tempo desafiador e acolhedor
Akira
Akira
Você deve ser o Cain *disse, aproximando-se com uma confiança que parecia natural*
Akira
Akira
Ouvi dizer que você é o artista que consegue pintar até a dor
Cain não soube se aquilo era um elogio, uma provocação ou apenas uma observação irrelevante
Cain
Cain
E você deve ser o fotógrafo que quer capturar almas *respondeu, com uma pontada de sarcasmo*
Akira
Akira
*ri baixinho, inclinando a cabeça*
Akira
Akira
Talvez só a sua
O clima mudou, uma tensão invisível que nem Cain conseguia explicar
Era como se, pela primeira vez, alguém olhasse para ele de verdade, enxergando não só o que estava na superfície, mas as rachaduras escondidas
Durante a tarde, Akira acompanhou Cain nos preparativos para a exposição que se aproximava
Enquanto Cain tentava organizar suas telas e misturar tintas, Akira clicava, cada foto parecia captar não apenas a imagem, mas a essência do momento
Aquela interação despertou algo em Cain — uma mistura estranha de curiosidade, medo e esperança
O que Akira via nele que ninguém mais tinha conseguido?
Ao final do dia, enquanto o estúdio começava a esvaziar, Cain ouviu a voz firme de Sofia dizendo
Sofia
Sofia
Cuide para não se perder demais, Cain
Sofia
Sofia
A arte pode ser libertadora, mas também pode aprisionar
Cain
Cain
*não responde, mas sentiu a verdade naquela frase como um golpe*
Talvez ele estivesse mesmo preso em suas próprias cores sombrias
No caminho para casa, a cidade parecia mais fria do que nunca. Cain passou por uma praça onde um casal sorria, mãos entrelaçadas, e uma pontada de saudade lhe atravessou o peito
Não era só a rejeição dos pais, mas o medo de nunca encontrar alguém que o enxergasse de verdade
Chegando no apartamento, Esmael estava acordado, lendo algo no celular
Levantou os olhos e sorriu cansado
Esmael
Esmael
Tudo bem? *pergunta, sabendo que a resposta provavelmente não seria um sim*
Cain
Cain
*suspira*
Cain
Cain
Acho que não
Cain
Cain
Mas amanhã é um novo dia, né?
Esmael
Esmael
*assente, mas a dúvida ficou pairando no ar*
Eles sabiam que aquela rotina de sobrevivência era frágil
Antes de dormir, Cain olhou para o teto mais uma vez e, por um instante, tentou imaginar os olhos de Akira — profundos, intensos, diferentes de tudo que ele já viu
Talvez ali houvesse uma cor nova para pintar
Talvez, finalmente, ele pudesse deixar alguém enxergar além das sombras
°
°
°
☆Continua☆
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Comments

lari^>^

lari^>^

muito bom

2025-05-26

1

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