– Ai, meu Deus.
Tum.
– Ai, meu Deus.
Tum, tum.
Eu sacolejava na cama com o ímpeto de suas metidas. Ele se impeliu contra mim com uma força inabalável, dando-me exatamente o que eu podia aguentar, empurrando-me só um pouquinho para além da beirada. Me fitou, duro, disparando um sorriso de quem sabia. Fechei os olhos e me permiti sentir o quão
profundamente estava sendo afetada. E era muito profundamente.
Pegou minhas mãos e as ergueu na direção da cabeceira, acima da minha
cabeça.
– Acredite, você vai querer se segurar firme agora – ele sussurrou, colocandouma de minhas pernas sobre seu ombro e mudando o ritmo de seus quadris.
– Simon! – guinchei, começando a sentir espasmos no corpo. Seus olhos,
aqueles malditos olhos azuis, se fixaram nos meus enquanto eu palpitava em torno
dele. – Hummmm, Simon! – gritei de novo. E acordei… com os braços sobre a
cabeça, as mãos agarrando firmemente a cabeceira.
Fechei os olhos por um momento e fiz força para descerrar os dedos. Quando olhei de novo, vi pontos brancos em minhas mãos, tão apertadas estavam.
Sentei com dificuldade. Estava coberta de suor e ofegava. Ofegava de verdade. Os lençóis formavam uma bola no pé da cama, com Clive soterrado, só o focinho
aflorando.
– Clive, você está se escondendo?
– Miau! – foi a resposta zangada, e uma carinha se seguiu ao focinho.
– Pode sair, seu bobo. Mamãe não vai mais gritar. Acho. – Dei risada e passeios dedos pelo meu cabelo desgrenhado.
Havia charmosamente suado no pijama inteiro, então me levantei e fiquei diante do ar-condicionado, me refrescando e começando a me acalmar.
– Essa foi por pouco, hein, O? – gracejei, pressionando uma perna contra aoutra e sentindo um incômodo nada desagradável entre as coxas.
Desde a noite em que nos conhecemos, eu não parava de sonhar com Simon. Não que quisesse – não queria mesmo –, mas meu subconsciente havia tomado o controle e fazia loucuras com ele durante a noite. Meu corpo e meu cérebro tinham
se separado: o cérebro sabia bem; a Pequena Caroline tinha suas dúvidas…
Clive se desvencilhou de mim e correu rumo à cozinha para sua dança habitual ao redor da tigela.
– Eu sei, eu sei, sossega aí – resmunguei enquanto ele roçava em meus tornozelos. Despejei uma colher de ração na tigela e fiz café. Me debrucei sobre o
balcão e tentei me recompor. Ainda ofegava um pouco.
Aquele sonho tinha sido… intenso, digamos assim. Pensei de novo em seu corpo curvado sobre o meu, uma pérola de suor escorregando de seu nariz e
tombando em meu seio. Ele se abaixava e passava a língua na minha barriga, em direção aos seios, e depois…
Tim, tim!
O sr. Café me trouxe de volta de meus devaneios atrevidos, e eu fiquei grata. Podia sentir que estava ficando excitada outra vez.
Será que isso vai ser um problema?
Enchi uma xícara de café, descasquei uma banana e olhei pela janela. Ignorei a vontade de massagear a banana e a meti na boca. Oh, meu Deus do céu… A coisa
se dirigiu para o sul rapidamente. E, por “sul”, eu quero dizer…
Dei um tapa na minha cara e me forcei a pensar em algo que não fosse o
galinha com quem atualmente partilhava uma parede. Coisas insignificantes. Coisas inócuas.
Cachorrinhos… Dar de quatro.
Sorvete de casquinha… Lamber a casquinha dele e duas bolas.
Brincadeiras de criança… Hum, será que eu quero seguir o mestre Simon? Ok,
chega!
Você não está nem tentando mais!
Debaixo do chuveiro, cantei o hino dos Estados Unidos várias vezes seguidas
para impedir que minhas mãos fizessem outra coisa senão ensaboar. Precisava ter em mente o idiota que ele era – e não como ficava vestindo apenas um lençol e um
sorriso. Fechei os olhos e me inclinei para o jato de água, relembrando aquela noite. Quando parei de encará-lo – ou melhor, de encarar o que se encontrava embaixo do lençol –, abri a boca para falar:
– Escuta aqui, cara, você faz ideia do barulho que estão fazendo? Eu precisodormir! Se eu tiver que ouvir você e seu harém batendo na minha parede por mais uma noite, aliás, por mais um minuto, vou perder o juízo!
Berrei para aliviar toda a tensão que teria sido, poderia ter sido, deveria ter sido descarregada à maneira Clooney.
– Calma aí. Não pode ser tão grave assim. Essas paredes são bem grossas. – Elesorriu e bateu o punho na moldura da porta, tentando fazer um charme.
Obviamente, estava acostumado a conseguir o que queria. Com abdominais como
aqueles, eu podia entender por quê.
Balancei a cabeça para recuperar o foco.
– Você está maluco? Essas paredes são mais ocas que sua cabeça. Eu ouçotudo! Cada palmada, cada miado, cada risadinha, já deu! Essa putaria acaba agora! – rugi, sentindo o rosto queimar de raiva. Cheguei a fazer aspas com as mãos para enfatizar as palmadas, os miados e as risadinhas.
Quando mencionei seu harém, ele deixou o charme de lado e tomou uma
postura agressiva.
– Ei, ei, já chega! – contra-atacou. – O que eu faço na minha casa é problemameu. Sinto muito se te incomodei, mas você não pode bater aqui no meio da madrugada e me dizer o que posso e o que não posso fazer. Você não me vê atravessando o corredor e batendo na sua porta.
– Não, você já bate na minha maldita parede! Nós dividimos uma das paredesdo quarto. E você fica bem em cima de mim quando estou tentando dormir. Tenha
um mínimo de educação.
– E por que você me ouve mas eu não te ouço? Ah, porque não tem ninguémbatendo no seu lado da parede…
Ele deu um sorrisinho insolente, e eu senti o sangue se esvair do meu rosto.
Cruzei firmemente os braços sobre o peito e, quando olhei para baixo, me toquei
do que estava vestindo.
Baby-doll cor-de-rosa. Que maneira de demonstrar credibilidade.
Enquanto eu soltava fumaça, seu olhar percorreu meu baby-doll, detendo-se descaradamente na renda e no meu quadril, que oscilava conforme eu batia o pé irritadamente no chão.
Seus olhos finalmente voltaram para cima e, ao encontrarem os meus, não se
desviaram. Então, aquele azul-bebê cintilou, e ele me deu uma piscada.
Vi tudo vermelho.
– Ahhh! – exclamei e voei para o meu apartamento.
Agora, mortificada, deixei que a água lavasse minha frustração. Não o tinha visto desde então, mas e se tivesse? Bati a cabeça contra os azulejos.
Quando abri a porta da frente, quarenta e cinco minutos depois, lancei um
adeus para Clive por cima do ombro e rezei silenciosamente para que não houvesse
qualquer garota do harém no corredor. Tudo deserto.
Coloquei meus óculos escuros ao atravessar a porta do prédio, mal reparando no Land Rover. E, por “mal”, eu quero dizer que mal pensei em Simon afastando a minha saia enquanto eu estava no banco do passageiro e…
Caroline!
Ok, talvez eu tivesse um problema. Naquela mesma tarde, a cabeça de Jillian
surgiu na porta do meu escritório.
– Toc, toc – ela disse, sorrindo.
– Oi! E aí, tudo bem? – Eu me recostei na cadeira.
– Me pergunte sobre a casa em Sausalito.
– Ei, Jillian, e a casa em Sausalito? – obedeci, revirando os olhos.
– Terminada – ela sussurrou e jogou os braços para cima.
– Mentira! – sussurrei de volta.
– Totalmente, completamente, absolutamente terminada! – Ela soltou um gritinho e sentou na cadeira de visita.
Também comemorei com um gritinho.
– Isso sim é uma boa notícia. Precisamos celebrar. – Abri uma gaveta.
– Caroline, se você tirar daí uma garrafa de uísque, vou ter que consultar o RH
– ela advertiu e abriu um sorriso.
– Em primeiro lugar, você é o RH. Em segundo, é claro que não tem uma
garrafa de uísque na minha gaveta. Obviamente, o uísque está num frasquinho amarrado na minha coxa. – Sorri e mostrei dois pirulitos.
– Boa. De melancia, ainda por cima. Meu favorito – ela disse, e nós desembrulhamos e começamos a chupar.
– Bem, me conte tudo – incitei.
Eu me consultei algumas vezes com Jillian enquanto ela escolhia os toques finais da casa que reformara com Benjamin; era o tipo de casa com a qual eu sonhava havia anos. Como Jillian, seria calorosa, convidativa, elegante e cheia de luz.
Falamos de trabalho por um tempo, e depois ela me deixou voltar às minhas coisas.
– A propósito, festa de inauguração no próximo fim de semana. Leve as suascocotas
– ela falou a caminho da porta.
– Você disse cocotas? – Eu achei ter ouvido X no lugar de C. Meu Deus, o que há
comigo.
– Acho que sim. Vocês topam?
– Parece ótimo. Podemos levar alguma coisa? E podemos ficar secando seunoivo?
– Não se atrevam. E eu não esperaria outra coisa de vocês – Jillian replicou.
Sorri e voltei ao trabalho. Festa em Sausalito? Soava promissor.
– Você não tem realmente uma queda por ele, tem? Quero dizer, quantos
sonhos já teve com ele? – perguntou Mimi, sugando seu canudo.
– Uma queda? Não, ele é um idiota… Por que eu teria…
– Claro que ela não tem! Quem sabe por onde aquele pau já passou? Caroline,nem pensar – Sophia respondeu por mim e jogou o cabelo por cima do ombro,
deixando embasbacada uma mesa de homens de negócio que a encarava desde que ela entrara. Tínhamos combinado de almoçar em nosso bistrô favorito, em North
Beach.
Rindo, Mimi recostou-se na cadeira e me deu um pontapé por baixo da mesa.
– Sai fora, imbecil! – Olhei duro para ela, corando de irritação.
– É, sai fora, imbecil! Você acha que a Caroline vai… – Sophia deu uma
gargalhada e então se deteve, finalmente tirando os óculos escuros e cravando o olhar em mim.
A violoncelista e a imbecil perceberam minha inquietação. Uma sorriu, a outra
praguejou.
– Jesus, Caroline, não me diga que você tem uma queda por esse cara. Ah, não,
você tem, não tem? – zangou-se Sophia enquanto o garçom pousava na mesa uma
garrafa de San Pellegrino. Ele a observou passar os dedos pelo cabelo, e ela o
despachou com uma piscada certeira. Sophia sabia como os homens a olhavam, e
era divertido vê-la fazê-los sofrer.
Mimi era diferente. Era tão pequena e fofa que, a princípio, os homens se atraíam pelo seu charme natural. Depois, eles realmente prestavam atenção nela e percebiam que era adorável. Alguma coisa em Mimi fazia que os homens quisessem tomar conta dela, protegê-la. Até que a levavam para a cama. Pelo menos, foi o que me disseram. Essa era aloprada…
Quanto a mim, diziam que eu era bonita, e de vez em quando eu acreditava.
Em um dia bom, dava conta do recado. Nunca me senti tão deslumbrante quanto Sophia ou tão perfeitinha quanto Mimi, mas me saía bem. Sabia que, juntas, nós nos
completávamos e, até recentemente, usávamos isso a nosso favor.
Cada uma gostava de um tipo diferente, o que era bom. Raramente disputávamos o mesmo cara.
Sophia era bem peculiar. Curtia homens esbeltos e lindos. Não podiam ser muito altos, mas mais altos do que ela. Sophia os queria educados, inteligentes e
preferivelmente loiros. Esse era o seu fraco. Também caía de quatro por um sotaque
sulista. Sério: se um cara imitasse um sotaque do Sul, ela era capaz de pular nele
primeiro e só depois perguntar seu nome. Aprendi isso em primeira mão, porque,
uma vez em que ela estava de porre, eu a provoquei com meu melhor sotaque de Oklahoma. Tive que fugir dela pelo resto da noite: de acordo com Sophia, a faculdade era tempo de experimentar.
Mimi também era peculiar, mas não tinha preferência por um biótipo. Topava todos, mas eu já tinha reparado que gostava de tamanho extragrande. Seus homens
costumavam ser corpulentos, altos e fortes. Adorava que a levantassem para beijá-la,
ou que a colocassem num banquinho para não ficarem com torcicolo. Gostava de caras mais sarcásticos e odiava os condescendentes. Como era pequena, acabava
atraindo sujeitos que queriam “proteger”. Mas minha amiga tinha feito caratê desde criança e não precisava da proteção de ninguém. Era uma cabra-macho em saia retrô.
Eu era mais difícil de definir, mas sabia quem era o cara certo assim que o via.
Como o Supremo Tribunal com relação à pornografia, permanecia sempre alerta.
De fato, tinha uma inclinação para homens que viviam ao ar livre – salva-vidas,
mergulhadores, alpinistas. Gostava deles bem cuidados mas um pouquinho desalinhados, com um toque de playboy e um salário alto o bastante para que eu
não precisasse bancar a mamãe. Não passaria um verão com um surfista delicioso que não pudesse pagar sequer sua manteiga de amendoim. Nem mesmo a habilidade de provocar orgasmos múltiplos e intermináveis o salvaria se eu
descobrisse que ele vinha usando meu American Express para pagar a parafina da prancha. E a conta do celular. E a viagem para as ilhas Fiji para a qual não fui convidada. Cai fora, surfista. Cai fora.
No fim das contas, deveria ter seguido o ditado de que mais vale um pássaro na mão… Ah, a época antes do sumiço dos Os… Orgasmos intermináveis. Suspiro.
– Mas, espera aí, você o viu depois do encontro no corredor? – Sophia
perguntou depois que fizemos o pedido e eu voltei das minhas lembranças de verão.
– Não – resmunguei.
Mimi deu uma pancadinha de leve em meu ombro.
– Ele é um gato, não é?
– Merda, pior que é! Lindo demais pro seu próprio bem. Mas é um idiota! –Bati a mão na mesa com tanta força, que os talheres sambaram. Sophia e Mimi se
entreolharam, e eu dei o dedo do meio às duas. – E, na manhã seguinte, ele estava no corredor beijando Purina! Aquilo é um desfile doentio de orgasmos do qual eu não quero fazer parte! – falei, mastigando furiosamente minha folha de alface depois de contar a história pela terceira vez.
– Não acredito que a Jillian não te avisou sobre esse cara – comentou Sophia,afastando os croutons com a ponta do garfo. Ela estava outra vez numa fase sem
pão, apavorada com os três quilos que supostamente ganhara no último ano. Não fazia o menor sentido, mas, quando Sophia metia uma coisa na cabeça, não adiantava discutir.
– Não, não, ela disse que não o conhece – comentei. – Ele mudou quando elajá não morava mais lá. Aliás, a Jillian mal ficava no apartamento. Era mais para ter
um lugar onde dormir na cidade caso precisasse. Segundo os vizinhos, ele vive lá há um ano, mais ou menos.
Enquanto relatava isso, me dei conta de que havia compilado um verdadeiro dossiê sobre Simon.
– Então, ele andou trepando pela parede esta semana inteira? – perguntou
Sophia.
– Esteve relativamente calmo, na verdade. Ou escutou o que eu disse e estásendo um bom vizinho, ou seu pau finalmente quebrou dentro de uma delas e ele foi atrás de um médico – falei um tanto alto demais. A mesa de homens de negócio devia estar prestando bastante atenção, pois todos se engasgaram e se remexeram no assento, comprimindo as pernas em uma suposta solidariedade involuntária. Nós três rimos e continuamos nosso almoço. – Falando na Jillian, vocês duas foram convidadas para a festa de inauguração da casa de Sausalito, no próximo fim de
semana.
Ambas imediatamente se abanaram com as mãos. Benjamin era o único cara sobre o qual todas concordávamos. Sempre que enchíamos a cara de Jillian, lhe confessávamos nossa queda e a fazíamos contar coisas sobre ele. Se conseguíssemos fazê-la virar um martíni a mais… bem, digamos apenas que era bom saber isto: valia
a pena continuar fazendo sexo mesmo depois que seu homem já estivesse pra lá dos
quarenta. A história sobre Benjamin e a Suíte Tonga, no Hotel Fairmont? Uau. Ela
era uma mulher de sorte.
– Que bacana. Por que a gente não se encontra no seu apartamento e se arruma lá, como nos velhos tempos? – Mimi gralhou, e eu e Sophia tapamos os
ouvidos.
– Tá bom, mas para de gritar, ou você vai pagar a conta sozinha – Sophiarepreendeu, e Mimi se recostou na cadeira, os olhos brilhando.
Depois do almoço, Mimi partiu para seu próximo compromisso, ali na
vizinhança, e eu e Sophia dividimos um táxi.
– Então, sonhos safadinhos com o vizinho.
Conta tudo – ela começou, para deleite do motorista.
– Continue prestando atenção no caminho, senhor – instruí quando o flagreiolhando para nós pelo retrovisor.
Deixei meus pensamentos vagarem até os sonhos nos quais gozara todas as noites da semana passada. Eu mesma, no entanto, não havia chegado lá – minha
frustração sexual disparara a um ponto crítico. Na época em que era capaz de
ignorar O, eu estava bem. Agora que era diariamente presenteada com sonhos com Simon, a ausência de O se tornara insuportável. Até Clive passou a dormir em cima do armário, a salvo das minhas pernas inquietas.
– Os sonhos? Os sonhos são bons, mas ele é um idiota! – exclamei, dando ummurro no assento.
– Sei. Você já disse isso mil vezes – Sophia falou, o olhar fixo em mim.
– E daí? Que olhar é esse?
– Nada. Só olhando. Você está muito incomodada com alguém que não passade um idiota.
– Eu sei – suspirei, mirando pela janela do táxi.
– Você está me cutucando.
– Não estou, não.
– Sério, o que você tem no bolso, Mimi? Está armada? – Sophia exclamou,afastando a cabeça para longe enquanto Mimi passava a chapinha em seu cabelo.
Dei risada. Eu estava sentada na cama e amarrava as sandálias. Já tinha enchido o cabelo de bobes antes de elas chegarem, por isso fui poupada do tratamento
completo. Mimi gostava de fantasiar que era uma renegada da escola de beleza e, se pudesse abrir um salão no próprio quarto, teria pensado seriamente nisso.
Ela tirou uma escova do bolso e a mostrou a Sophia antes de começar a
provocar. Com a escova, claro.
Estávamos fazendo um esquenta exatamente como fazíamos em Berkeley, com daiquiri frozen. Embora estivéssemos acostumadas com aquela mistura de álcool e suco de limão, ela ainda nos deixava excitadas e bobas.
– Ah, vá! A gente nunca sabe quem vai encontrar. Você não quer estar com ocabelo reto quando conhecer o Príncipe Encantado, quer? – Mimi convencia Sophia a levantar o cabelo para “um pouco de volume no cocuruto”. Você não discutia
com Mimi; você obedecia, e pronto.
– Não tem nada reto aqui. Se você enrolar, eles vão ficar curtos demais e oPríncipe Encantado nem vai notar que eu tenho cabelo – Sophia resmungou, o que provocou uma nova rajada de risos. Em seguida, nossas risadas foram subjugadas por vozes no vizinho. Levantei da cama e me aproximei da parede, para ouvir
melhor. Desta vez, era possível escutar duas outras vozes masculinas além da de Simon, mas eu não conseguia entender o que diziam. De repente, a parede foi
atravessada por “Welcome to the Jungle” em um volume tão alto, que Sophia e Mimi pararam o que estavam fazendo.
– Que porra é essa? – grunhiu Sophia, olhando ferozmente ao redor do quarto.
– Pelo jeito, Simon é fã do Guns N’ Roses
– dei de ombros, secretamente curtindo a música. Coloquei uma fita no meioda testa e fiz a dancinha de caranguejo de Axl, para o deleite de Mimi e a
desaprovação de Sophia.
– Não, não, não é assim, boba – Sophia falou e pegou outra fita. Mimi gargalhou histericamente enquanto Sophia e eu competíamos pelo melhor Axl – até que o cabelo de Sophia começou a desmanchar, claro. Aí Mimi tentou contê-la. Sophia pulou na cama pra fugir dela, e eu fiz o mesmo. Ficamos pulando, gritando a letra e dançando freneticamente. Mimi finalmente cedeu, e nós três dançamos animadas. Senti a cama se mover sob nossos pés e percebi que ela estava batendo na parede – a parede de Simon.
– Toma essa! E essa! E mais… essa! Ninguém bate no meu lado da parede, né?Ha-ha-ha-ha! – gritei, alucinada. Mimi e Sophia me olhavam atônitas. Sophia desceu da cama, e as duas se abraçaram e riram enquanto eu martelava. Balancei pra frente
e pra trás como se estivesse surfando, empurrando incessantemente a cabeceira da cama contra a parede.
A música parou de repente. Caí como se tivesse sido atingida. Mimi e Sophia
levaram a mão uma à boca da outra, enquanto eu continuava estendida na cama e mordia o nó dos dedos para não rir. O frenesi no quarto era igual ao de ser pego
fugindo depois de tocar a campainha do vizinho ou dando risada no fundo da
igreja. Você não pode parar e também não pode não parar.
Tum, tum, tum.
Não era possível! Ele estava batendo na parede por minha causa?
Tum, tum, tum.
Ele estava batendo na parede por minha causa.
Tum, tum, tum! Bati tão forte quanto pude. Não conseguia acreditar que ele tinha a cara de pau de me mandar ficar quieta. Ouvi vozes masculinas rindo.
Tum, tum, tum– soou mais uma vez, e minha paciência explodiu.
Uau, ele realmente era um idiota…
Olhei incrédula para as meninas, que se juntaram a mim na cama.
Tum, tum, tum – nós martelamos, seis pulsos coléricos fustigando o reboco.
Tum, tum, tum – eles contra-atacaram, desta vez muito, muito mais alto. Seus amigos tinham entrado em ação.
– Desista, meu senhor! Nada de sexo para você! – berrei para a parede, Mimi eSophia gargalhando maniacamente.
– Toneladas de sexo para mim, minha senhora. Nada para você! – ele gritoumuito claramente através da parede.
Ergui o punho para mais murros. Tum, tum, tum.
Tum, tum! Um único punho respondeu da outra trincheira, e depois tudo ficou em silêncio.
– Oooohhhhhh! – gritei para a parede, e ouvi Simon e seus amigos rindo.
Mimi, Sophia e eu nos entreolhamos com olhos arregalados e então escutamos um leve suspiro atrás de nós.
Nos viramos e vimos Clive se instalando no armário. Ele devolveu o olhar,
suspirou de novo e começou a lamber o traseiro.
– Olha o descaramento desse sujeito! Ele realmente tem a cara de pau de baterna minha parede? Na minha parede? Mas que…
– Idiota. A gente já sabe – Mimi e Sophia disseram em uníssono conforme euprosseguia com meu discurso.
– Sim, um idiota! – falei, ainda revoltada. Estávamos no carro, a caminho dafesta de Jillian. O táxi que havíamos reservado tinha chegado pontualmente às oito
e meia da noite.
Contemplando as luzes cintilantes de Sausalito, comecei a me acalmar. Eu me recusava a deixar aquele cara me aborrecer. Estava com minhas duas melhores
amigas, prestes a curtir uma festa fantástica de inauguração, cuja anfitriã era a
melhor chefe do mundo. E, se tivéssemos sorte, o noivo dela nos deixaria ver as fotos do tempo em que nadava pela equipe da faculdade, quando ainda se usavam
aquelas minúsculas sungas Speedo. Suspiraríamos e babaríamos sobre os retratos até que Jillian dissesse basta. Então, ela dispensaria Benjamin – só por aquela noite.
– Estou falando, tenho um bom pressentimento dessa festa. Sinto que algumacoisa vai acontecer – falou Mimi, olhando através da janela.
– Alguma coisa vai acontecer: vamos nos divertir muito, beber muito, e, quemsabe, pegar no peitinho da Caroline na volta – disse Sophia, piscando para mim.
– Hum, docinho – provoquei com um sotaque sulista, e ela me jogou um beijo.
– Vamos parar com esse romance pseudolésbico? Estou falando sério – Mimicontinuou, suspirando na voz de mocinha de romance meia-boca que ela usava às
vezes.
– Quem sabe? Não sei quanto a mim, mas talvez você encontre o PríncipeEncantado hoje – cochichei, retribuindo seu sorriso esperançoso. De nós três, Mimi
seguramente era a mais romântica. Era inabalável em sua convicção de que cada pessoa tinha uma alma gêmea.
Bem… Pra mim, um O gêmeo já estava de bom tamanho.
Chegamos à entrada da casa de Jillian e Benjamin; havia carros estacionados por toda a sinuosa rua, e lanternas japonesas e velas delimitavam o terreno. Como acontece com a maioria das residências construídas em paisagens acidentadas, da rua não se podia ver nada. Demos uma risadinha ao atravessarmos o portão, e abri
um sorriso quando minhas amigas avistaram aquela coisa à nossa frente. Eu já tinha
visto a planta daquilo, mas ainda precisava dar uma volta.
– Que caralho de riquexó é esse? – Sophia exclamou, e não consegui seguraruma gargalhada. Jill e Benjamin haviam desenhado e construído um elevador que subia e descia a colina. Bastante prático, se você considerar a quantidade de degraus
que era preciso percorrer para alcançar a casa. A encosta era forrada de jardins de terraço e bancos e flores, tudo artisticamente arranjado à margem de caminhos lajeados e iluminados por tochas que conduziam à casa. Ainda assim, para as
compras do dia a dia e outras atividades menos contemplativas, o elevador
facilitava, e muito, as coisas.
– As senhoritas gostariam de usar o elevador ou preferem descer a pé? –
perguntou um empregado que surgira de trás da “carruagem”.
– Você quer dizer andar nessa coisa? – grasnou Mimi.
– Claro, é para isso que serve. Vamos, vai!
– encorajei, atravessando a portinha que ele abrira para nós. Parecia mesmo umteleférico de pista de esqui, a não ser pelo fato de que descia uma colina em vez de atravessar o céu.
– Tudo bem, vamos nessa – disse Sophia, embarcando atrás de mim e se estatelando no assento. Mimi deu de ombros e nos seguiu.
– Haverá alguém à espera de vocês lá embaixo. Divirtam-se na festa, senhoritas.– Ele sorriu, e nós arrancamos.
À medida que descíamos a encosta, a casa se erguia ao nosso encontro. Jillian
havia criado um mundo simplesmente mágico no lugar – através das enormes janelas que rodeavam a residência, pudemos observar a festa durante a viagem de
elevador.
– Uau, tem muita gente – notou Mimi, os olhos arregalados. O som tilintantede uma banda de jazz chegou a nós desde um dos pátios.
Senti um friozinho na barriga quando o elevador parou e outro empregado abriu a porta. Nossos saltos estalaram através da laje; ouvi a voz de Jillian vinda do
interior da casa e imediatamente sorri.
– Meninas! Vocês vieram! – ela exclamou ao entrarmos.
Rodopiei nos calcanhares, inspecionando todo o lugar de uma só vez. A casa
era quase como um triângulo que se encaixava na encosta e se espraiava. O piso de
mogno escuro se derramava sob nós e contrastava lindamente com as linhas claras das paredes. Jillian era adepta do moderno com conforto, e os tons da residência
refletiam a paisagem que a cercava: o verde tépido das folhagens, marrons
ricamente terrosos, cremes discretos e suaves e vestígios de um profundo azulmarinho.
Quase toda a parte de trás da casa de duas faces era de vidro, para tirar proveito
da vista espetacular. O luar dançava sobre a água da baía, e, ao longe, avistavam-se
as luzes de San Francisco.
Lágrimas se espalharam pelos meus olhos enquanto eu apreciava a casa que Jillian e Benjamin haviam criado para si, e, ao me voltar para minha chefe, percebi a
excitação em seus olhos.
– É perfeita – murmurei, e ela me deu um abraço apertado.
Um garçom serviu-nos champanhe, e Sophia e Mimi atacaram Jillian. Quando
ela se afastou para fazer as honras da casa, nós três nos dirigimos a um dos vários
terraços a fim de examinar a festa. Garçons passaram com bandejas, e, mastigando camarões grelhados e bebendo espumante, esquadrinhamos a multidão em busca de
conhecidos. Naturalmente, inúmeros clientes de Jillian haviam comparecido – eu
sabia que aquela noite envolvia um pouco de trabalho, mas, no momento, estava contente em saborear meu camarão fino e ouvir os comentários de Mimi e Sophia
sobre os homens presentes.
– Sophia, achei um cowboy para você bem ali… Não, espera, ele já pertence aoutro cowboy. Próximo. – Mimi suspirou e continuou pesquisando.
– Achei! Acabo de ver seu boy desta noite, Mimi! – Sophia sussurrou estridentemente.
– Onde, onde? – Mimi sussurrou de volta, escondendo a boca atrás de umcamarão. Revirei os olhos e peguei mais uma taça de champanhe quando outro
garçom passou.
– Lá dentro… Viu? Bem ao lado do balcão da cozinha, de suéter preto e calçacáqui? Puxa, ele é deliciosamente alto! Hummmm, lindo cabelo também – Sophia provocou, estreitando os olhos.
– De cabelo castanho e cacheado? É, eu podia perfeitamente dar um trato naquilo – disse Mimi, animada. – Olha como é alto. E quem é a gostosura de bofe
com quem ele está falando? Se essa baranga saísse do caminho… – Mimi arqueou uma sobrancelha até que a suposta baranga finalmente se afastasse, proporcionando uma visão clara do homem em questão.
Também olhei, e, com o caminho desimpedido, nós agora conseguíamos ver os dois homens que conversavam. O sujeito grande era bem grande. Alto e corpulento
– ombros de zagueiro central. Ele preenchia o suéter de um jeito bastante agradável,
e, quando sorriu, seu rosto se iluminou. Sim, exatamente o tipo de Mimi.
O outro cavalheiro tinha cabelo loiro e ondulado, que ele constantemente enganchava atrás da orelha. Usava uns óculos de intelectual que realmente lhe caíam
bem. Era esguio e magro e tinha um olhar intenso – quase clássico em sua beleza. Não havia erro: tratava-se de uma lindeza geek, e, ao vê-lo, Sophia suspirou rapidamente.
Enquanto assistíamos ao desenrolar da cena, um terceiro homem se juntou a eles, e nós três sorrimos. Benjamin.
Seguimos imediatamente até a cozinha para dizer oi ao nosso homem favorito no planeta. Sem dúvida, Sophia e Mimi estavam contentes também pelo fato de
Benjamin se encarregar das apresentações. Olhei de relance para as duas enquanto elas se retocavam ao mesmo tempo. Mimi disfarçadamente beliscou as duas bochechas – à la Scarlett O’Hara –, e Sophia ajeitou furtivamente o sutiã. Pobres rapazes, não tinham a menor chance.
Benjamin notou que nos aproximávamos e abriu um sorriso. Os homens
abriram o círculo, e Benjamin envolveu a todas nós num abraço gigante.
– Minhas três meninas prediletas! Estava me perguntando quando vocês iamaparecer. Elegantemente atrasadas, como sempre – ele provocou, e nós demos
risadinhas. Benjamin tinha este poder: ele nos transformava em colegiais bobas.
– Oi, Benjamin – dissemos em coro, e me dei conta do quanto tínhamos soadocomo As panteras de Benjamin.
Grandão e Óculos apenas sorriram, talvez esperando uma apresentação
enquanto secávamos Benjamin. Ele realmente envelhecia de um jeito perfeito:
cabelo castanho ondulado, começando a ficar grisalho nas têmporas. Vestia calça jeans, camisa azul-escura e um par de botas de cowboy. Podia facilmente estar
desfilando para Ralph Lauren.
– Me permitam apresentá-las. Caroline trabalha com Jillian, e Mimi e Sophiasão suas, ah, como se diz… BFF? – Benjamin sorriu, apontando para mim.
– Uau, BFF? Quem anda te ensinando as gírias, papaizinho? – Eu ri e estendi aminha mão para o Grandão. – Olá, sou Caroline. Muito prazer.
Ele engolfou minha mão com sua pata. Era como uma pata mesmo. Mimi ia perder a cabeça com aquele cara. Havia diversão no olhar dele quando sorriu para
mim.
– Oi, Caroline. Meu nome é Neil. E essa coisa aqui é o Ryan – disse ele, acenando para Óculos.
– Obrigado. Me lembre disso da próxima vez que você esquecer a senha do seue-mail.
– Ryan abriu um sorriso espontâneo e estendeu a mão para mim. Eu a apertei,reparando no quão incandescentemente verdes seus olhos eram. Se Sophia tivesse filhos com esse homem, eles seriam ridiculamente bonitos.
Tomei a rédea das apresentações depois que Benjamin se afastou. Começamos
a bater papo, e eu sorri quando os quatro deram início à dança para-se-conheceremmelhor. Neil avistou alguém atrás de mim e gritou:
– Ei, Parker, traga essa carinha linda aqui! Venha conhecer nossas novas amigas.
– Estou indo, estou indo – escutei e me virei para ver quem se juntaria a nós.
A primeira coisa que vi foi o azul. Suéter azul, olhos azuis. Azul. Esplendidamente azul. Então, tudo ficou vermelho quando reconheci a quem pertencia aquele azul.
– Maldito Trepador de Paredes – assobiei, petrificada.
Seu sorriso se desfez enquanto ele tentava me identificar.
– Maldita Garota do Baby-Doll Cor-de-Rosa – concluiu. Fez uma careta.
Nos encaramos, e o ar entre nós se tornou elétrico, estalando e vibrando.
Atrás, os quatro emudeceram diante do breve diálogo. Então, a ficha caiu.
– Esse é o Trepador de Paredes? – Sophia guinchou.
– Espera aí, essa é a Garota do Baby-Doll Cor-de-Rosa? – Neil riu, e Mimi eRyan bufaram.
À medida que eu processava a informação, meu rosto se inflamou e a expressão de Simon se transformou naquele maldito sorrisinho insolente que eu vira no
corredor. Quando bati em sua porta. Quando interrompi seu espetáculo com a
Risadinha. Quando gritei com ele. Quando eu estava usando… – Garota do Baby-Doll Cor-de-Rosa.
Garota do Baby-Doll Cor-de-Rosa! – engasguei, pra lá de irritada. Pra lá de puta.
Pronta para fazer barraco. Encarei Simon, concentrando toda minha tensão naquele olhar. Todas as noites de insônia e Os perdidos e banhos frios e bananas metidas na boca e impiedosos sonhos molhados se juntaram naquele olhar.
Queria nocauteá-lo com os olhos, obrigá-lo a suplicar por misericórdia. Mas
não… Não Simon, diretor do Fórum Internacional de Orgasmos.
Ele.
Ainda.
Estava.
Sorrindo.
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