Capitulo 3 - Escolhas

Myra foi tomada por um misto de angústia e incerteza ao receber a importante decisão. A responsabilidade de proteger todas as vidas em seu vilarejo pesava em seus ombros, enquanto a falta de confiança nos deuses a corroía por dentro. Desde jovem, perdeu a admiração que nutria pelos seres divinos, deixando um vazio em

sua alma.

Apesar de estar disposta a fazer o que fosse necessário para garantir o bem-estar de seus entes queridos, Myra se questionava se Ares, seria misericordioso com seu vilarejo. Todos conheciam as predileções dos deuses, e ela sabia que não as correspondia.

Myra se apercebeu subindo no monte como se sua mente a fizesse ir até aquele lugar em busca de clareza e paz. Lá, ela se sentou e contemplou o horizonte, refletindo sobre o destino.

Foi então que seus olhos encontraram a plantação, e a cena que viu à sua frente a fez sentir ainda mais pesar.

As ramas de trigo ainda tentavam dançar com o vento, mas seu ballet era interrompido pelo lado oposto consumido pelo fogo. Algumas poucas ramas persistiam em sobreviver na vasta área carbonizada, sua dança  agora tristes e melancólicas.

Myra guardou aquela cena com compaixão, sentindo seu coração ser comprimido por uma tristeza profunda. Enquanto as plantas lutavam para continuar seu ciclo, ela viu as ramas se transformarem em pessoas gritando desesperadas, correndo para salvar suas vidas de uma horda de guerreiros implacáveis.

Eles cortavam e dilaceravam tudo em seu caminho, esses guerreiros incendiavam casas e plantações e matavam criações inteiras. Myra viu os rostos dos habitantes de seu vilarejo nas plantas queimadas, e sentiu a dor e o desespero que se espalhou pelo vilarejo.

O ar encheu-se com o cheiro de fumaça e sangue, que impusionava aqueles homens dominados por uma fúria incontrolável e sedentários por carnificina, os guerreiros avançavam implacavelmente, deixando um rastro de destruição por onde passavam. Myra

assistia a tudo em choque, incapaz de agir diante da cena macabra.

Foi então que viu sua tia correndo desesperadamente, carregando nos braços seu primo Scylax, enquanto seu tio tentava alcançar Pythios, seu filho mais velho, que se encontrou perdido em meio ao caos. Mas antes que pudesse elaborar qualquer coisa,

Myra presenciou a cena mais terrível de todas: Pythios sendo covardemente apunhalado por dois guerreiros.

Um grito de agonia escapou da garganta de Myra e de seu tio, unidos em um só tom. Ela observou, impotente, enquanto uma rajada de vento soprou, dissipando a cena trágica que acabara de testemunhar. Myra ficou em pé, olhando para o que sobrou da plantação, chorando e se perguntando se aquele devaneio poderia ser um

prenúncio do que estava por vir.

E mais uma ela sentiu o peso de todas as vidas que dependiam dela e o medo a invadiu. Mas Myra sabia que não podia permitir que seu vilarejo fosse completamente destruído.

Myra nunca havia experimentado uma visão! Ainda mais tão vívida e assustadora, mesmo que fosse apenas uma ilusão, ou coisa de sua cabeça atordoada. Ela caminhou sem rumo a sua casa, desorientada e ansiando por encontrar seus tios e primos a salva. O seu coração pulsava como uma embarcação galés rumo ao frenesi de uma

batalha.  Pelo caminho, ela encontrou Scylax, que carregava um pequeno fardo de trigo.

— Está tudo bem, primo? Onde estão todos? E Pythios, como ele está? — perguntou Myra.

— Estou bem. O que aconteceu, prima? Você está bem? Você ficou muito tempo no sol? — Scylax perguntou, tentando entender o que havia acontecido com sua prima. Myra não conseguiu responder, apenas olhou na direção da casa e viu sua tia indo buscar mais fardos. Ela caminhou em sua direção.

Myra encontrou sua tia que estava com um semblante preocupado, e ela sabia que era devido à decisão que ela té ria que tomar.

— Finalmente a encontrei! Estou a horas te procurando para vir almoçar! — disse sua Agapi.

— Tia, eu já tomei minha decisão. Serei o tributo.

Agapi a olhou surpresa e, por um momento, não soube o que dizer. Mas logo respondeu, tentando convencer a sobrinha do contrário.

— Myra, você tem certeza? É perigoso, ele é um deus violento e imprevisível. Não sabemos o que pode acontecer.

— Sei dos riscos, tia! Mas já tomei minha decisão. Preciso fazer isso.

— Mas pense bem, minha querida. Você pode ser mantido aprisionado, obrigado a fazer coisas que não queira. E se ele não aceitar você como tributo? Não se pode saber o que ele fará com você. — disse Agapi com a clara intenção de mudar a ideia de Myra.

— Mas é algo que preciso fazer. Não importa o que aconteça, eu estou disposto a enfrentar tudo. O pior e saber que eu poderia evitar mais tragédias.

A tia olhou com um misto de respeito e preocupação.

— Está bem, minha querida. Não podemos mudar suas escolhas, mas esperaremos até amanhã

para informar sua decisão. Não apressaremos o inevitável.

Myra sentiu uma angústia, mas sabia que era o caminho que precisava seguir.

Ela não podia compartilhar a visão que teve com ninguém, pois sabia que isso só aumentaria a tensão já existente. Por isso, ela manteve tudo em segredo, guardando consigo a angústia e a aflição que sentia.

Cada segundo que passava parecia uma eternidade, como se o tempo estivesse congelado. O dia se arrastou lentamente, mas no final, Myra sentiu como se tivesse perdido todo o tempo em um piscar de olhos. Ela sabia que sua tia estava preocupada com ela, mas não podia permitir que o medo tomasse conta de

sua mente. Ela tinha que se manter forte, por si mesma e por sua família.

Durante o jantar, Myra tentou agir com naturalidade, mas estava tensa. Ela não conseguia comer, pois sua mente estava em outro lugar. Quando a noite chegou e todos foram dormir, ela finalmente pensou que poderia relaxar um pouco. Foi nesse momento que um de seus primos a interpelou, trazendo-a de volta para a realidade.

Seus pensamentos se misturavam em um turbilhão de emoções, e ela se perguntava se conseguiria manter tudo sob controle. Mas Myra sabia que não podia desistir. Ela precisava proteger sua família e sua comunidade, custe o que custar. E assim, ela se preparou para enfrentar qualquer desafio que viesse pela frente.

— Não te incomoda fazer algo em que você não acredita? — perguntou Scylax.

Todos sabiam que ela diferia dos outros moradores do vilarejo, que tinham fé e confiança nas divindades. E responder uma pergunta como essa ainda, mais de um ser tão novo e já tao atento, foi ainda mais difícil. Ela olhou nos olhos de Scylax e respondeu, com a voz trêmula.

— Eu não sou contra os deuses, Scylax, só acho que eles não se importam tanto assim com o nosso sofrimento. Mas ainda assim, eu preciso fazer o que está ao meu alcance para tentar salvar o vilarejo. É minha responsabilidade como cidadã.

Scylax franziu o cenho, tentando entender as palavras da prima.

— Mas se você não acredita que eles possam nos ajudar, então por que você fará isso? — ele questionou confuso.

— Eu não sei, Scylax. É difícil explicar. Eu só sinto ser o certo a se fazer, mesmo que não haja garantia de sucesso. Eu não posso ficar de braços cruzados enquanto o vilarejo está em perigo.

Scylax pareceu ainda mais confuso, mas Myra o abraçou, dando-lhe um beijo de boa noite na testa.

— Agora vá dormir. Amanhã será um dia difícil, ainda a muito trigo para colhermos. — disse ela, tentando confortá-lo.

Myra se afastou, deixando Scylax em seus pensamentos. Ela só esperava que, no final, suas ações fossem suficientes para proteger sua comunidade.

E ao deitar a jovem se começou a lembrar das imagens que observou na plantação, do desespero, a agonia, e a maldade e perversidade que vinha trajada, de guerreiros. Myra se levantou e foi até a janela, olhando para o céu noturno. As estrelas brilhavam intensamente, como se conversassem entre si, falando sobre coisas que a jovem

desconhecia.

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