A primavera chegou cedo naquele ano.
As flores de cerejeira dançavam ao vento, e o céu se abria num tom suave, como se o mundo tivesse decidido respirar de novo.
Samántha observava a paisagem da janela da sala de aula. O sol dourava o vidro, e cada pétala que passava parecia tocar seu coração com delicadeza. Ela sempre gostou de pintar, mas nunca tinha conseguido capturar aquelas cores — o rosa vivo da esperança e o brilho tímido dos dias que recomeçam.
— Samántha? — a voz da professora a despertou.
— S-sim! — respondeu rapidamente, corando.
Alguns alunos riram, mas Samántha apenas abaixou a cabeça, escondendo o rosto por trás dos fios escuros.
Do outro lado da sala, Cardan observava a cena com um pequeno sorriso. Ele era o capitão do time de futebol, sempre rodeado de amigos e elogios, mas, naquele instante, percebeu algo diferente.
Aquela garota parecia pertencer a outro mundo. Um mundo silencioso e cheio de cores que ninguém mais via.
O sinal tocou. Samántha juntou os livros e saiu apressada, como se o vento a chamasse. Caminhou pelo corredor cercado de lockers e sussurros. Do lado de fora, o pátio estava coberto de pétalas cor-de-rosa.
Ela se abaixou para pegar uma flor caída, e foi nesse exato instante que colidiu com alguém.
Os livros se espalharam.
— Ah! Me desculpa! — ela exclamou, curvando-se rapidamente.
— Tudo bem — disse uma voz calma.
Quando levantou o olhar, Samántha viu os olhos castanhos de Cardan refletindo o sol. Por um momento, o tempo parou.
Ele se abaixou para ajudá-la, e as mãos quase se tocaram.
O coração dela bateu tão alto que parecia ecoar no silêncio.
— Você é... a Samántha da turma 2-A, certo? — ele perguntou, sorrindo.
— S-sou sim... — respondeu, tentando disfarçar o nervosismo.
— Eu sou o Cardan, do time de futebol. Acho que nunca tínhamos falado antes.
Samántha assentiu, mas não conseguiu dizer nada. Sua mente estava em branco, como uma tela esperando pelas primeiras pinceladas.
Cardan riu de leve, coçando a nuca.
— Você gosta de desenhar, né? Eu vi um quadro seu na exposição da escola. Era... diferente. Parecia que o vento tinha cor.
Ela o encarou surpresa. Ninguém nunca tinha reparado daquele jeito.
— Você... viu mesmo? — perguntou, com um fio de voz.
— Vi. E gostei. Acho que ninguém pinta o céu como você.
As palavras ficaram presas no ar, suaves como o perfume das flores. Samántha sentiu o rosto esquentar.
— Eu só tento colocar no papel o que sinto — respondeu.
— Então, deve sentir o mundo de um jeito bonito — ele disse, sorrindo.
O sino da tarde tocou, quebrando o momento. Samántha se despediu e correu, mas olhou para trás — só uma vez — e o viu ainda ali, com um sorriso leve e o cabelo balançando com o vento.
Naquela noite, ela abriu o caderno de desenhos e começou a pintar novamente.
O céu, as pétalas, e um garoto sob as cerejeiras.
As cores pareciam mais vivas que nunca.
💭 “As cores que eu não vi antes...” — pensou.
Talvez fosse isso o que chamavam de amor — um sentimento que transforma até o ar em poesia.
Na manhã seguinte, Samántha chegou cedo à escola. As árvores ainda estavam floridas, e o sol fazia o pátio parecer um quadro vivo.
Quando ela passou pelo portão, ouviu uma voz familiar:
— Ei, Samántha!
Era ele. Cardan estava encostado na cerca, com a mochila no ombro e um sorriso de quem carrega o nascer do dia nos olhos.
— Bom dia — disse ela, com o coração acelerado.
— Bom dia — respondeu ele. — Sabe... eu estava pensando... será que você me mostraria como vê o mundo?
Ela sorriu, surpresa e feliz.
— Posso tentar. Mas só se você me mostrar como é o seu também.
E ali, sob as cerejeiras, algo começou a florescer — devagar, como um novo amanhecer.
📜 “Foi naquele dia que nossas estações começaram a se misturar.”
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