"O lamento é a mais amarga das canções."
Atravessei os portões, adentrando o reino dos que descansam eternamente. Vaguei entre os anjos chorosos esculpidos em mármore, enquanto o vento soprava folhas secas das árvores sem frutos. O silêncio era quebrado apenas pelo seu assobio, que ecoava entre os túmulos.
À medida que a madrugada avançava, o silêncio se tornava ainda mais profundo. Não se via nem ouvia nada além dos meus pensamentos. Ali, perdi a noção do tempo, e uma sensação de angústia me atormentava. Me sentia vigiada, e de repente pude ver algo se mexer entre alguns túmulos sem nome. O que poderia ser? Se ali não havia nada além de túmulos e lápides, fixei meu olhar ao meu lado até que minha vista se ajustou. Vi um brilho metálico. Resolvi me aproximar.
Havia um rosário estendido em uma pá enfiada em um monte de terra, e do outro lado havia uma cova que tinha sido recentemente aberta. Me aproximei, mas não conseguia ver o seu fundo. Então, me aproximei um pouco mais, e em um breve momento, eu deslizei sobre a terra solta ao lado e quase me esborrachei dentro da cova. Bati a poeira e novamente tentei ver o fundo da cova. Com os meus olhos se ajustando ao escuro, pude ver ao fundo que naquela cova já havia um inquilino.
Ao olhar bem para o rosto daquele cadáver, me assustei. Não pude me conter. Estava horrorizada com tal visão. O inquilino da cova recentemente aberta era eu! Corri desesperadamente, sem gritar. Não havia forças para isso. Chegava a tropeçar nos galhos das árvores que tinham caído. Tentava alcançar os portões, mas nunca chegava até eles. Me rendi depois de horas de tentativas, que mais me pareciam uma eternidade.
Rezava aos prantos para que tudo aquilo não passasse de um pesadelo e que, a qualquer momento, eu me despertaria. Entretanto, para minha angústia, isso não aconteceu. A noite toda ali, vendo as baratas andando sobre o meu cadáver. E quando amanheceu, entrou no cemitério um senhor, provavelmente o coveiro, e jogou toda aquela terra fria sobre o meu cadáver. Fez uma curta oração antes de sair, levando sua pá, mas deixando um rosário sobre o meu túmulo.
A manhã se passou, e as pessoas entravam e saíam, lamentando a perda de entes queridos. A tarde, o cemitério se esvaziou, e o silêncio voltou a reinar. Mas não houve ninguém que veio chorar por mim, se lamentar e me trazer lindas flores. Será que não fui querida quando em vida? Será que a minha alma ficará presa aqui para sempre, ouvindo as canções de lamento?
A noite chegou, e o céu se tornou tempestuoso. Não havia mais ninguém no cemitério, e o vento uivava entre os túmulos. Ao som de um trovão, um homem alto, vestido com capa de chuva, coberto pelo capuz e botas de cano alto, veio até o meu túmulo. Agachou-se sobre ele, e por um momento, pensei que ele estava ali para me lamentar. Mas então, ele pegou o rosário e o quebrou, amaldiçoando-me. Era o homem que me jurou amor eterno.
Fui puxada para baixo, para dentro do meu túmulo, por uma força invisível. Meu espírito foi aprisionado no meu corpo frio, e eu me debati, sentindo os bichos passando pelo meu corpo e o frio daquele inferno úmido. Quantos dias passaram neste inferno?
Vocês podem me ouvir?
Ouçam o meu amargo lamento.