Ariel nasceu em silêncio. Nunca ouviu uma canção de ninar, o som da chuva ou o próprio nome sussurrado com carinho. O mundo era feito de gestos, expressões e silêncios profundos. Mas Ariel era forte — aprendeu a se comunicar com o olhar, com os dedos, com o coração. Ainda assim, em seu peito, havia um vazio. Algo que ela não sabia explicar. Como se o mundo tivesse uma parte secreta da qual ela não fazia parte.
Até que Félix apareceu.
Ele era diferente. Não apenas pelos olhos cor de céu nublado, ou pela forma como parecia não pertencer àquele lugar. Ele carregava uma calma estranha, uma presença que parecia... antiga.
Félix não era um homem comum. Era um Tritão — um ser de outro plano, enviado à Terra quando completava seus trinta ciclos de vida, com uma única missão: encontrar sua Destinada, a única pessoa cuja alma era feita da mesma luz que a dele. E, com ela, cumprir o propósito de união entre mundos.
Mas havia uma condição: apenas sua Destinada poderia ouvir sua verdadeira voz.
No instante em que Ariel cruzou o caminho de Félix numa feira de livros usados, algo impossível aconteceu. Um som suave — como vento entre folhas — ecoou nos ouvidos dela. Pela primeira vez... ela ouviu.
Não sons comuns, não o barulho do mundo. Apenas a voz de Félix.
Assustada, ela fugiu. Mas ele a encontrou novamente, pacientemente, dia após dia. E toda vez que falava, ela ouvia. Não com os ouvidos — com a alma. Como se ele sussurrasse direto em seu coração.
Com o tempo, Ariel aprendeu a reconhecer emoções que nunca sentira. Paixão, espanto, medo... e esperança. Félix contou a verdade a ela. Contou sobre seu povo, sobre sua missão, e que seu tempo estava se esgotando. Se Ariel não fosse sua Destinada, ele teria que partir — e esquecer tudo.
Mas Ariel também sentia. Ela não precisava de palavras para saber. Ela era dele. E ele, dela.
No último dia do ciclo de Félix, quando o céu ficou violeta e o tempo parou por alguns segundos, Ariel tomou sua mão e falou — falou mesmo sem nunca ter aprendido a Falar — uma única palavra que ecoou como música entre mundos:
— Félix.
O portal se abriu.
Mas ele não entrou.
Porque, pela primeira vez na história dos Tritão, um deles escolheu ficar. Porque às vezes, o destino não é um lugar ou um chamado divino... mas um par de olhos que te escutam mesmo no silêncio.
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E foi assim que Ariel, a menina nascida do silêncio, ensinou ao mundo que o amor verdadeiro não precisa de som. Só de coragem. Só de alma.
E Félix?
Félix ficou. Porque onde há alguém que nos escuta com o coração… ali é casa.