O Espelho da Casa Abandonada
Havia uma casa no fim da Rua dos Cedros que ninguém ousava visitar. Cercada por árvores retorcidas e um portão enferrujado que rangia ao vento, era conhecida como a Casa Holloway. Diziam que nela vivia um homem obcecado por espelhos, chamado Edgar Holloway, que desaparecera misteriosamente décadas atrás, deixando para trás apenas o vazio e rumores sombrios.
Era uma noite de outubro quando Lucas, um jovem fotógrafo fascinado por lendas urbanas, decidiu explorar a casa. Ele adorava registrar lugares abandonados, especialmente aqueles que carregavam histórias sinistras. Sua câmera era sua única companhia, uma testemunha silenciosa de suas aventuras.
Ao passar pelo portão, sentiu um frio cortante, embora a noite estivesse amena. O caminho até a porta estava coberto por folhas secas que estalavam sob seus pés. Quando empurrou a porta, esta se abriu com um rangido perturbador, como se estivesse esperando por ele.
O interior da casa estava coberto de poeira e teias de aranha. Os móveis estavam intocados, como se os antigos moradores tivessem saído às pressas. Mas o que mais chamou a atenção de Lucas foram os espelhos. Estavam por toda parte: grandes, pequenos, com molduras ornamentadas ou simples. Alguns estavam rachados, outros cobertos com panos velhos.
Enquanto caminhava, sua câmera capturava os reflexos estranhos nos espelhos. Havia algo de errado com eles. As imagens refletidas pareciam ligeiramente... distorcidas. Em um deles, Lucas jurou ter visto uma sombra se mover atrás de si, mas ao se virar, não havia nada ali.
No andar de cima, encontrou um espelho particularmente grande, com uma moldura dourada intricada, cheia de símbolos estranhos. Ele parecia estar em perfeito estado, como se o tempo não tivesse tocado sua superfície. Lucas sentiu uma atração inexplicável por aquele espelho. Ele se aproximou e, ao tocar a moldura, ouviu um sussurro.
— Ajude-me...
Lucas recuou, seu coração disparado.
— Quem está aí? — perguntou, sua voz ecoando pela casa vazia.
O espelho permaneceu silencioso. Ele tentou se convencer de que fora apenas sua imaginação, mas quando olhou novamente, viu algo que gelou seu sangue: sua própria imagem no reflexo... sorrindo.
Mas ele não estava sorrindo.
De repente, a porta do quarto se fechou com um estrondo, e o ar ficou pesado, quase impossível de respirar. A luz de sua lanterna começou a piscar, e o reflexo no espelho se moveu de forma independente, caminhando em direção à moldura. Lucas recuou, mas tropeçou em algo no chão e caiu.
Quando ergueu o olhar, viu que o reflexo não estava mais no espelho. Ele estava do lado de fora.
Era sua cópia exata, mas havia algo profundamente errado. Seus olhos estavam completamente negros, e o sorriso era largo demais, quase cortando o rosto. A figura estendeu a mão para ele.
— Venha... você pertence a este lado.
Lucas gritou e correu para a porta, tentando abri-la, mas ela não cedia. O reflexo começou a se aproximar lentamente, cada passo ecoando como um tambor em sua mente. Desesperado, Lucas agarrou um pedaço de madeira quebrada e golpeou o espelho com toda a sua força.
O som de vidro quebrando foi ensurdecedor, e por um momento, tudo ficou em silêncio. Quando olhou novamente, o reflexo havia desaparecido, e a porta estava aberta.
Ele não pensou duas vezes antes de sair correndo da casa, deixando sua câmera para trás.
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Na manhã seguinte, Lucas decidiu revisar as fotos que tinha no cartão de memória, curioso para entender o que havia acontecido. Mas ao abrir os arquivos, o horror retornou: em todas as fotos que tirara dentro da casa, podia ver o reflexo de si mesmo. Só que o reflexo estava sempre olhando diretamente para a câmera, sorrindo, mesmo quando Lucas não estava focado no espelho.
E na última foto, tirada antes de quebrar o espelho, viu algo que o fez jogar o cartão de memória longe: o reflexo estava parado do lado de fora da moldura, estendendo a mão, como se estivesse vindo em sua direção.
Desde aquele dia, Lucas não voltou à Casa Holloway. Mas algo começou a mudar em sua vida. Em reflexos de espelhos, vitrines e até em poças d'água, ele começou a perceber movimentos que não acompanhavam seus próprios gestos. O sorriso errado. A sombra que não deveria estar ali.
Uma noite, enquanto se preparava para dormir, olhou para o espelho do banheiro e viu seu reflexo parado, olhando fixamente para ele, embora estivesse se mexendo. Antes que pudesse reagir, o reflexo sorriu novamente e disse, com uma voz baixa e arrastada:
— Agora é a minha vez.
E a luz se apagou.
Na manhã seguinte, Lucas não foi mais visto. Seus amigos o procuraram, mas tudo o que encontraram foi seu apartamento vazio. No espelho do banheiro, havia marcas de mãos, como se alguém tivesse tentado sair de dentro dele.
A câmera de Lucas foi encontrada mais tarde, na casa Holloway. Quando a polícia revisou as fotos, todas estavam borradas, exceto a última: a figura do reflexo, sorrindo, com uma única mensagem escrita no espelho ao fundo:
"O espelho guarda os que ousam enxergar além."
Desde então, ninguém mais se atreveu a entrar na Casa Holloway. Mas, em noites de lua cheia, alguns juram ver rostos nos espelhos da casa, rostos de pessoas desaparecidas... todos sorrindo, como se esperassem o próximo visitante.