Forget-me-not. Alguém decorou o meu quarto com papel de parede amarelo mergulhado nestas minúsculas flores azuis, um cortinado rosa para esconder todos os pés que passam pela minha janela e me espreitam no escuro, e um cavalo de baloiço pintado como aqueles na feira para quando eu crescesse. Um mar de lápis de carvão e folhas embala-me. Escondo a longa fita do cavalo no fundo da gaveta.
Deram-me um relógio. Está parado. Ensinaram-me que aqui o tempo não passa. Aprendi a contar as sombras que vivem nos cortinados. Tantas, por vezes. Em muitos dias, apenas o rosa me sustém.
Cresci, balancei, o cavalo perdeu as cores. Só me resta um lápis. A fita já não mora na gaveta.
Os pés transeuntes marcam o meu tempo, mas são sempre cinco horas. E todos os dias o laço de fita vermelha me olha, dependurado.
Abro o estojo ferrugento e traço a carvão mais um dia.
Amanhã, terei todos os lápis.
*Este texto foi redigido segundo o Acordo Ortográfico de 1945