Megan Renault – 12 anos atrás
Limpo as mãos sujas de barro na minha camisa e saio correndo para ver a família do patrão do meu pai chegando. Papai trabalha aqui há muito tempo, mas só agora o chefe resolveu trazer a esposa e os filhos para morar na mansão.
O carro para bem na nossa frente. Todos os empregados estão alinhados para dar boas-vindas. Sorrio tanto que meu maxilar dói. Papai comentou que a filha caçula deles tem sete anos—três anos mais nova que eu! Fiz as contas várias vezes e tenho certeza de que acertei.
— Essa é a mansão, pai? — resmunga um menino saindo do carro, a cara emburrada como se tivesse acabado de mastigar um limão.
Dou uma olhada na casa. É maravilhosa. Enorme. Perfeita. Mais ainda quando se está dentro dela. Me pergunto o que tem de errado com esse ingrato. Papai sempre diz que nunca devo reclamar da comida, porque há muita gente passando fome. Também não devo fazer birra por algo que ele não pode pagar, porque isso o deixa triste.
Então, o que esse jumento quer? Essa casa tem tudo! Ele deveria agradecer a cada segundo da vida. Imagine se fosse filho do meu pai... Vivia de castigo.
— Sim, e se reclamar vai para o internato.
Internato? Mas isso é castigo desde quando? Se fosse eu, já estaria com as malas prontas! Conhecer novas pessoas, fazer amigos... Um sonho! Mas papai não tem dinheiro e, além disso, ele ficaria triste por ficar longe de mim.
— Tanto faz. — O menino fecha a porta do carro com força.
Que mal-educado! Além disso, é feio. As roupas são tão largas que poderiam servir no meu pai. Ele me encara feio, então faço questão de lhe mostrar a língua.
— Essa pirralha me deu língua! — ele reclama.
— Ela é só uma criança. Agora vá para o seu quarto, Logan. Ainda não esqueci do que você aprontou no avião.
A voz doce sai de dentro do carro, e então vejo uma mulher ruiva, linda, elegante. Ela carrega uma menininha adormecida nos braços.
— Amor, vou colocar Antonella na cama. Depois resolvemos a situação do Logan.
A patroa sobe as escadas da varanda e some dentro da mansão.
— Minha esposa fará uma reunião com todos vocês mais tarde. Muito obrigado por deixar o jardim do jeito que ela queria, Seu José.
Olho para meu pai e sorrio. Que orgulho!
— Estou aqui para isso, Senhor Paulin.
O patrão entra na casa, e os funcionários voltam ao trabalho.
— Papai, quando vou poder brincar com aquela menina? — pergunto ansiosa.
— Se o patrão deixar, mais tarde. Mas pode ser que ele não goste.
Entro na cozinha e sento no banco. Meu pai sempre me levanta para que eu alcance a mesa.
— Mas eu queria brincar com ela, pai... — faço um biquinho.
Sou filha única e, sinceramente, isso é muito chato. As crianças da escola são sem cérebro e vivem comendo coisas do chão. Nojento!
— Vou falar com os patrões, mas quero ver esse prato vazio!
Como tudo, até repito.
— Obrigada, Dona Anna. Sua comida estava deliciosa! — abraço a cozinheira.
Mais tarde, estou no jardim, brincando com meu ursinho e minha boneca. O urso já foi costurado várias vezes, mas continua sendo meu favorito.
Vejo uma movimentação e, quando me aproximo, encontro a menininha ruiva dirigindo um carro de brinquedo rosa. Meu Deus, aquilo deve ter custado uns 10 dólares!
— Oi! Eu me chamo Megan. — paro na frente do carro.
— Eu sou Antonella.
Ela sorri, revelando um buraco onde deveriam estar seus dentes da frente. Tão fofa!
— Então, é você que vai me dar uma carona para casa? — digo, já entrando no banco do passageiro sem pedir permissão.
— Onde você mora? — franze o cenho.
— Atrás da sua casa.
Ela sorri e me leva até lá. Mostro meu quarto, que tem só uma cama e um armário, e ela continua sorrindo. Foi ali que soube que seríamos melhores amigas.
— Amanhã eu te mostro meu quarto!
Saímos do quarto e voltamos para o carro. Passeamos pelo jardim e, toda vez que vejo meu pai, dou tchau para ele.
Até que paramos na varanda... E lá está ele.
— Antonella, o que você faz com essa sem educação? — Logan me encara.
Desço do carro e dou um chute na canela dele.
— Você que é mal-educado! Aposto que nem sabe o significado dessa palavra. Papai diz que é feio ser burro na sua idade.
E foi naquele momento que eu soube: odiaria Logan Paulin pelo resto da minha vida.
E, 12 anos depois... Nada mudou.
Personagens
Megan Renault
Tem 22 anos, ajuda o pai no trabalho como jardineira e não conseguiu concluir a faculdade de administração. Cativante, encantadora e estonteante, mas também impulsiva, intensa e, às vezes, um furacão de raiva quando alguém a estressa.
Logan Paulin
Tem 29 anos e é um dos CEOs mais cobiçados de Nova York. Excelente irmão, mas um péssimo exemplo quando o ciúme exagerado entra em cena. Divertido e brincalhão com amigos e família, mas um ogro, genioso e controlador no restante do tempo.
Antonella Paulin
Tem 19 anos e estuda jornalismo. Carinhosa, sonhadora e determinada. Sempre foi apaixonada pelo melhor amigo do irmão, mas nunca teve coragem de confessar seus sentimentos.
Giovanni Delyon
Tem 27 anos e trabalha com Logan. Sempre gostou de Antonella, mas acha que ela nunca olharia para ele por ser mais velho... e por ser amigo do irmão dela, o que já é um problema por si só.
Megan Renault
Chegar em casa sabendo que tenho apenas alguns minutos para uma soneca é desanimador.
Isso tem se repetido nos últimos meses. Acordo cedo, cuido das responsabilidades do meu pai para que não fiquemos sem emprego e sem um lugar para morar. Quando termino, vou ao hospital ficar com ele, que, a cada dia, parece não melhorar. Ele tem feito quimioterapia, um tratamento que custa o que eu tenho de mais precioso.
Meu pai se recusa a aceitar ajuda, não quer que eu converse com o patrão e peça um empréstimo. Isso me irrita profundamente. Eu sei que sou tão orgulhosa quanto ele, mas não consigo aceitar vê-lo sofrer sem fazer nada.
Passei semanas procurando pelo chefe dele, que, por acaso, é irmão da minha melhor amiga. Eu e Logan nunca nos suportamos desde que eu era criança. Fui atrás dele, sem qualquer pretensão de me humilhar, mas a situação do meu pai vem em primeiro lugar.
Nunca encontrei o Logan em casa desde o dia em que meu pai piorou. Quando perguntei a Antonella, ela me disse que ele estava em uma viagem de negócios. Giovanni, seu braço direito, não pôde ir.
Sim, já faz semanas que estou esperando o Logan voltar. Eu pediria ajuda à Antonella, mas ela ainda não tem acesso à herança dos pais, por não ter atingido a maioridade. E, além disso, meu pai me fez prometer que não contaria a ninguém sobre sua doença. Nunca me senti tão frustrada com ele.
Me arrumo na frente do espelho. O reflexo me mostra a expressão cansada no meu rosto. Passo corretivo nas olheiras e ajeito a franja. Olho para minha estante cheia de livros da faculdade, que, infelizmente, não terminei. Não me arrependo de ter trancado, já que tomei essa decisão por causa do meu pai.
Depois do café da manhã com dona Ana, vou até o jardim cuidar das minhas rosas. No meio do dia, meu celular toca cinco vezes, me avisando que preciso levar o cheque ao hospital para que meu pai comece o tratamento. As contas estão cada vez mais apertadas, e eu me vejo forçada a dar um jeito de pagá-las, para que meu pai não precise voltar para casa.
— Oi, franjinha, sabia que meu irmão chegou hoje de madrugada? — Antonella me abraça logo ao chegar.
— Ele chegou na melhor hora. Ele ainda está em casa? — Pergunto, parando de regar as rosas.
— Você não vai me contar por que está querendo tanto falar com meu irmão? — Ela levanta uma sobrancelha, esperando uma resposta.
— É sobre o jardim, quero fazer algumas mudanças com a permissão dele. — Mesmo que eu o deteste, ele continua sendo meu chefe, e não posso simplesmente fazer o que quero por ser amiga da irmã dele.
Meu peito aperta ao ver Antonella sorrir, acreditando em mais uma das minhas mentiras. Não suporto mentir para ela, mas preciso esconder a doença do meu pai.
— Ele foi para a empresa cedo, mas voltou antes do almoço. — Ela diz, seus olhos brilhando. — Ele veio com o Giovanni.
— Você deveria falar com ele, pedir para sair, sei lá... — Digo, enquanto ela nega histericamente.
— Eu só acho ele bonito, nada demais, Megan. — Ela tenta me convencer.
— Você usa o mesmo perfume que ele e passa no travesseiro todas as noites antes de dormir. — Ela olha para os lados, pedindo que eu fale mais baixo.
— Você quer que meu irmão me mate?
— Ele deve estar no escritório. — Digo, rindo pela primeira vez no dia, e olho para o jardim. — Não tem ninguém aqui, Antonella.
— Mesmo assim, agora vou à biblioteca da faculdade pegar uns livros. Você vai falar com meu irmão. — Ela me abraça, se despedindo.
Vou para a cozinha lavar as mãos. Quando me aproximo da sala de jantar, ouço as vozes de Logan e Giovanni.
— Aquela louca não seria uma boa mãe, você viu o histórico dela? — Logan diz, e ouço papéis sendo mexidos.
Se alguém me pegar ouvindo uma conversa alheia, vou estar em sérios problemas.
— Ela é garota de programa, Logan, com certeza não vai querer estragar o corpo por causa de um bebê. — Giovanni diz, e meus olhos se alargam, não acreditando que Logan faz parte de algo tão sujo.
Megan Renault
Não é ilegal quando há consentimento, mas a dura realidade é que muitas mulheres, infelizmente, acabam sendo forçadas a se tornar garotas de programa.
Eu continuo ouvindo a conversa até que uma funcionária novata entra correndo, fazendo a bandeja cair no chão. Sem pensar, vou até ela, quase invadindo a sala de jantar, e peço desculpas pela surpresa.
— Você estava escutando a nossa conversa? — Giovanni pergunta, com um sorriso travesso.
— Claro que não. — Apanho tudo do chão e volto à bandeja.
— Você estava na porta, olhando para a sala. Foi por isso que eu me assustei. — Ela me encara com aquele olhar de “não tente me enganar”.
— E você nunca vai aprender a ser educada, mesmo? — Logan solta, com o tom de sempre, entre irritado e debochado.
— Eu estava vindo da cozinha para falar com o senhor. — Mesmo sem querer, mantenho o tom respeitoso, porque sei muito bem o quanto ele se importa com isso na sua casa.
Às vezes, pelo menos.
— Vou resolver uns assuntos na empresa, nos vemos mais tarde, Logan. — Giovanni diz, sorrindo discretamente enquanto se levanta e vai embora.
Olho para Logan e, num momento de fraqueza, acabo deixando escapar:
— Eu não sabia que você queria ter filhos.
— Você realmente estava escutando algo que não devia. — Ele se levanta de forma abrupta, como se a conversa tivesse terminado ali.
— Eu ainda não terminei o que queria dizer. — Fico parada, a frente dele, sem mais o que perder.
— Não tenho tempo a perder com a pirralha amiga da minha irmã. — Abro a boca para soltar algum xingamento, mas a fecho rapidamente. Não vale a pena.
— Eu preciso de um empréstimo, tipo, hoje. — Pego a postura de quem não vai sair dali sem uma resposta.
Ele me olha, uma mistura de confusão e estresse estampada no rosto. Conheço esse olhar.
— Para eu te dar um aumento, seria no dia que você engravidasse do meu herdeiro. Ou seja, nunca. — Ele diz com a ironia típica.
— Como você se tornou tão... amargo? — Dou um empurrãozinho de brincadeira no peito dele, e ele foca nas minhas mãos, como se fosse escapar de alguma mágica.
— Vou te pagar quando o dia chegar. — Ele dá meia-volta, indo em direção à porta principal.
E agora? Como vou conseguir esse dinheiro para o meu pai? Esse homem é a única solução.
— Como você pretende ter um filho? — Pergunto, sentindo a tensão crescer. Meu coração acelera, a esperança se esvaindo.
— Inseminação. — Ele responde, sem nem olhar para mim.
— E se eu encontrar alguém que se encaixe nos seus padrões para gerar seu herdeiro, quanto você pagaria? — Ele me observa em silêncio, mas não vai embora.
— Você seria uma pessoa bem sortuda, se encontrar alguém que não fosse só confiável, mas que, depois de anos, não aparecesse aqui para me fazer chantagem.
— Eu preciso do dinheiro, senhor Logan. — Suspiro, minha voz carregada de um cansaço que não sei mais disfarçar.
— E eu preciso de um herdeiro. — Ele continua indo em direção à porta, mas antes de sair, minha boca age sem pensar:
— Eu posso te dar um filho. Posso carregar o bebê por nove meses e te entregar depois. — Meu coração se parte com as palavras, algo que nunca imaginei dizer. Não era a hora, e certamente não era o plano.
Mas quem precisa de planos quando a pessoa que você ama está à beira de perder tudo?
Logan Paulin
Ficar na Itália no lugar do Giovanni é uma porcaria. Eu odeio essa parte dos negócios, então decidi aproveitar e conhecer umas italianas. Três semanas de farra até que a culpa começasse a bater na porta.
Mas com o Giovanni viajando para resolver o problema com a caçula, e eu no papel de “babá” da minha irmã, as noites não estavam tão divertidas assim. No fundo, eu estava mais preocupado com o fato de ela estar sozinha em casa. Só que a cada mulher diferente que aparecia na minha cama, o dilema da família se afastava um pouco mais da minha cabeça.
Eu sabia que estava ficando mais velho, e a ideia de ser pai estava se tornando urgente. Queria herdeiros antes dos 50. Claro, a prioridade estava lá embaixo no meu ranking de coisas a fazer.
Agora, com a Megan na minha frente, desesperada por um aumento e disposta a carregar meu filho, fico alerta. Algo nela me diz que é mais do que uma simples proposta financeira.
— Estamos falando de um contrato envolvendo milhões e meu filho, senhorita Renault. — Viro o corpo para olhá-la com mais atenção.
— É o certo a se fazer. — Ela estende a mão com uma confiança que me faz questionar se ela está realmente pensando no que está pedindo. — Mas eu preciso de uma parte do dinheiro agora.
Ela fala o valor, e eu, ainda em choque, faço o cheque.
— Mais tarde, você vai assinar o contrato. — Ela assente e sai, cabeça baixa, como se carregasse um fardo invisível.
Agora, tenho que perguntar à minha irmã se ela já viu a melhor amiga dela usando drogas. Algo não está certo.
Megan Renault
Chego ao hospital do meu pai, aliviada por finalmente conseguir o dinheiro. O médico me diz que ele começará a quimioterapia amanhã.
Converso com ele um pouco, e logo depois, vou até o quarto do meu pai.
— Pensava que não viria mais visitar o velho, hein? — Ele sorri, e eu vou até seus braços, abraçando-o apertado.
— Eu estava arranjando o dinheiro. — Me afasto um pouco, ainda tentando manter a compostura.
— Então, você conseguiu?
— Pedi o dinheiro emprestado ao patrão. Ele deu sem hesitar, porque tem muita consideração por você. — Minto, tentando fingir que o peso da mentira não me atinge.
Durante todo o caminho até o hospital, me perguntei: se tivesse sido honesta com o Logan, ele teria me dado o empréstimo?
— Mas eu pedi para você não contar a ninguém. — Ele diz, a voz carregada de mágoa.
— Eu não podia deixar a única família que eu tenho morrer. — As lágrimas começam a cair, misturadas entre a dor por meu pai e a culpa por fazer algo que jamais imaginei.
— Desculpa, filha. Eu não estava pensando em você. — Ele me puxa para um abraço apertado. — Você não fez nada de errado.
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