A Imperatriz Louca
Naquela tarde fria de outono, Adrian estava em sua cela na masmorra do castelo imperial de Illyrio, pensava em seu destino e o que havia feito de tão errado para estar ali. Seu único crime era ser irmão da Imperatriz louca Amara Harper, esse fato selaria seu destino.
Seus pensamentos foram interrompidos pelo carcereiro que violentamente bateu com bastão nas grades da sela.
— Aproveitando sua estadia nos aposentemos imperiais? Felizmente suas mordomias e seus dias desfrutando dos luxos da realeza estão para terminar... Conde Harper.
Levante daí rato imundo! O Imperador não tem o dia inteiro!
Adrian acompanhou o guarda sem nenhuma expectativa, dias sombrios estavam por vir. Foi levado a sala do trono sendo arrastado pelas correntes de prata que prendiam seus pulsos e arremessado ao chão sem piedade. Era chegada sua vez de dar sua versão dos fatos.
— Eu convido o Conde Adrian Harper a depor. — Disse o promotor em tom solene.
O Conde sentou no banco dos réus e esperou pacientemente que as acusações iniciassem, sabia que estava condenado, era um julgamento de cartas marcadas.
— Sr. Harper... está ciente que está sendo acusado de ser cumplice de Amara Harper, a Imperatriz louca?
— Minha irmã agiu sozinha! — Gritou descontrolado.
— Responda apenas o que foi perguntado Sr. Harper. Está ciente que está sendo acusado de ser cumplice de Amara Harper? — Afirmou o Imperador com indiferença.
— Sim estou ciente das acusações! — Afirmou desiludido.
— Você se declara culpado ou inocente?
— Majestade... me declaro inocente, mas pelo que pude perceber, minha sentença já foi decretada.
— Sr. Harper... quer que este tribunal acredite que a Imperatriz vendeu sua alma ao demônio Hazahell e que você não sabia de nada? O quão tolos pensa que nós somos?
— Estou falando a verdade! Amara nunca me contava sobre seus planos! Descobri que ela estudava ocultismo só depois que os Guardas invadiram nosso castelo atrás de provas de sua traição.... foi quando sua câmara maldita foi revelada!
— E você espera nos convencer que nunca soube da existência dessa alcova secreta? Que nunca percebeu o comportamento estranho da Imperatriz? Realmente és muito ingênuo Milorde.
— Se nem sua majestade Imperador Illyrio percebeu... como eu, teria percebido? Os assuntos da corte nunca fizeram parte dos meus interesses!
— E quais são seus interesses senhor Conde? Esbanjar a fortuna do seu Clã em mulheres baratas e bebidas caras?
— Quem disse que preciso pagar pela companhia de mulheres?
— Está ficando mais é mais atrevido Sr. Harper... veremos se seu atrevimento persistirá quando o caçador Imperial atravessar seu coração com uma estaca de carvalho e o deixar desfrutar do amanhecer sem seu anel solar!
— Eu não ajudei Amara! Essa é a única verdade!
— A própria Imperatriz ao confessar seus crimes afirmou que você estava por trás de toda essa sujeira... que você planejava um golpe de estado para usurpar o trono do Lorde Illyrio.
— Como eu faria isso sem apoio da Corte e sem um exército? Amara vendeu a alma... já não tinha mais nenhuma compaixão... disse essas barbaridades na tentativa de fugir de sua culpa... — Afirmou o jovem vampiro aos prantos.
Nesse momento Roxana, a criada particular da Imperatriz invadiu o julgamento gritando:
— Acreditem no jovem mestre Adrian... eu imploro! Le não sabia de nada! A cumplice de Imperatriz era eu!
— E porque a ajudou não sabia dos riscos de ser descoberta?
Achou que poderia se safar de sua punição?
— Cerca de cinco anos atrás, eu estava padecendo por conta de uma febre, certamente eu iria morrer, Amara me transformou em vampira me tirando dos braços da morte com a promessa de que eu a serviria sem questionar... mantendo todos os seus segredos guardados a sete chaves...
— Que tocante... essa sua história não tem cabimento! Se
isso que diz é verdade... por que está a traindo agora? — Perguntou o promotor com desdém.
— Eu não posso deixar que o Conde seja executado... eu... eu... o amo! — Revelou por fim a serva caindo de joelhos.
— Pois bem... mediante essa revelação inesperada essa corte já tem seu veredito.... Eu Illyrio Harper, Imperador dos vampiros, declaro o Conde Adrian Harper inocente de acusação de traição. Porém por sua falta de atenção aos planos perversos de sua irmã que ocorreram bem debaixo de seu nariz, o Conde será banido da Romênia e exilado nas inférteis terras da Sibéria. Seus bens e seu título de nobreza serão confiscados.
— Não! Isso é injusto! Quase tanto quanto ser declarado culpado! — Bradou Adrian.
— Poderá levar consigo seus itens pessoais e o dinheiro que tiver guardado... devido ao seu estilo de vida, não deve ser de fato uma grande soma... permitirei que seu criado de confiança o acompanhe no exilio. A Imperatriz e sua serva serão executadas ao amanhecer. Eu declaro este tribunal encerrado! — Sentenciou Illyrio se retirando.
Adrian retornou ao seu castelo escoltado pelos guardas do Imperador para pegar seu dinheiro e suas roupas. Vladimir seu mordomo Dampiro o ajudou a arrumar sua bagagem e levá-la até a carruagem. O ex Conde escapou de morrer, porém acreditava que ser exilado era um destino pior que a morte.
— Alegre-se senhor... a Sibéria é um país um tanto primitivo. Onde poderá levar sua vida longe das regras da Corte.
— O que pensa que sou Vladimir? Um bárbaro? Guarde suas malditas opiniões para você! — Gritou sem paciência com o criado que já o servia a mais um século.
O servo continuou a carregar as caixas de vinho e de whisky para o interior da carruagem, foram necessários dois coches para acomodar tudo o que Adrian levaria para o exilio. Todavia, precisou deixar muitas coisas para trás, fez questão de levar consigo o quadro onde fora retratado ao lado da Irmã Amara... a grande culpada de todo seu infortúnio.
A Guarda Imperial escoltou o cortejo por vários dias até chegarem ao seu destino. O Sr. Harper passou o tempo todo em silencio, bebendo uma garrafa após a outra até desmaiar em coma alcoólico. Vladimir o observava contemplativo.
O Casarão
Adrian não fazia ideia de qual seria seu destino dali por diante. Com tudo, sabia que não poderia ficar ao relento. Incumbiu seu criado de encontrar uma moradia aceitável para alguém com seus altos padrões. O que por si só já era uma tarefa árdua.
Vladimir encontrou um casarão de dois pisos e negociou o preço direto com o proprietário. O homem percebeu que eram estrangeiros e pediu um valor muito além do que a construção realmente valia.
Com tudo, vendo que o mordomo não fecharia a venda o proprietário aceitou incluir no negócio sua pequena taberna e aceitar uma das carruagens do ex nobre e quatro cavalos como parte do pagamento.
Lavraram os documentos de compra e no mesmo dia Adrian se instalou. O antigo dono deixou o imóvel mobilhado com uma decoração condizente com as baixas temperatura da região, moveis rústicos e muitas peles de animas deixavam o local com a aparência aconchegante.
Ocultaram o caixão com terra da Transilvânia no porão, provavelmente não receberiam visitas, todavia era o local mais reservado da propriedade para que ele pudesse repousar quando precisasse reestabelecer seus poderes.
Na sala de estar, seu servo pendurou sobre a lareira o quadro de seu mestre ao lado da Imperatriz. Seu Lorde não devia esquecer da onde veio, mas era também necessário preocupar-se para onde iria. Contudo, nada tirava o amargor da alma do vampiro exilado.
Nunca havia notado que Roxana tinha algum sentimento por ele... ou teria apenas inventado tudo aquilo para que um inocente não fosse executado... de qualquer forma a jovem também pagou pelos seus erros com sua própria vida.
Vários dias se passaram, o ex Conde levava a vida embriagado, encerrado dentro do casarão lamentando todo o prestígio que havia perdido.
O whisky e o dinheiro que sobrou depois da compra do imóvel estavam prestes a acabar, Vladimir reuniu sua coragem e foi falar com seu amo.
— Senhor... em breve, suas economias irão terminar. Eu soube que haverá hoje na cidade um leilão clandestino de escravos... as autoridades locais sabem de sua existência, porém fazem vista grossa.
— E o que eu tenho a ver com isso? — Perguntou farto.
— Deveríamos ir lá... adquirir alguns escravos e reabrir a taberna ao lado do casarão. Assim em pouco tempo suas finanças estarão equilibradas.
— E com que dinheiro pretende comprar escravos meu tolo Vladimir? Não foi você mesmo que afirmou que estamos arruinados?
— Eu tomei liberdade do ocultar dos guardas imperiais um baú com joias da Imperatriz e 500 peças de ouro.
— E por que você acha que tenho interesse em reabrir uma taberna nesse lugar esquecido por Deus?
— Senhor... reconsidere. Sei que você acha que a vida não tem mais sentido... mas não custa tentar seguir em frente.
— Vladimir... minha própria irmã me traiu. Tentou jogar a culpa de seus crimes em mim. Eu não tenho motivos para sair desse quarto.
— As pessoas daqui não sabem que o senhor perdeu seu título de nobreza, senhor... irei agora mesmo a cidade lançar rumores que o Conde Harper da Romênia irá ao leilão... ouvi dizer que um lote de belas garotas também será leiloado.
— Realmente cheguei ao fundo do poço! Ao ponto de precisar pagar por companhia feminina... O que me tornei? Um andarilho? Que lástima precisar trabalhar para me manter!
— Senhor... mulheres são mulheres... pouco importa se o senhor pagou por elas ou não... anime-se! Um pouco de trabalho e diversão darão um novo sentido a sua vida.
— Tudo bem... me convenceu! Vá a cidade e avise que comparecerei ao leilão.
O criado seguiu as ordens de seu senhor satisfeito, seria também uma boa oportunidade dele se alimentar devidamente se ocultando na multidão. O vampiro estava a dias consumindo sangue de ovelha acompanhado de muitas doses de whisky.
O Leilão
Mais tarde naquela mesma noite, o Lorde Harper arrumou-se para comparecer ao evento. Vestiu um casaco de peles branco longo, apesar do vampiro não sentir frio, lá fora, um vento cortante balançava a rara vegetação.
Vladimir não precisou se esforçar em espalhar muitos rumores, o povo do vilarejo era extremamente supersticioso e os apurados hábitos noturnos do novo proprietário do casarão não passaram despercebidos. Os aldeões começaram a chamá-lo de “D’yavol” que significa “O Diabo” no idioma local.
O Sr. Harper pouco se importou, pois se pretendia reabrir a taberna era bom que os habitantes tivessem medo e respeito perante sua figura sombria.
Não saber o idioma poderia ser um empecilho para as negociações daquela noite, antes de entrarem no local do leilão, o Sr. Harper se alimentou de uma mulher doente que se prostituia pelas ruas. As feridas em sua boca denunciavam seu evidente estado avançado de sífilis, certamente morreria em poucas semanas se não pela doença seria pela fome.
Considerou que beber o sangue daquela coitada até a última gota para herdar sua capacidade de falar e entender a língua daquela província, era um ato de bondade a fim de abreviar o sofrimento daquela alma miserável.
Adrian e seu servo entraram no local indicado. Anunciado em alto e bom som como “Conde Harper” pelo leiloeiro, que só estava aguardando sua chegada para dar início ao evento.
— Nosso leilão de hoje será brindado com a ilustre presença do Conde Adrian Harper.
A apresentação cheia de pompas foi seguida de palmas calorosas, a ideia inicial de manter seu anonimato infelizmente não pode ser levada adiante. Haviam no local pessoas representantes de várias províncias no intuito de comprar escravos, porém nenhum outro comprador carregava consigo uma soma tão grande de dinheiro e ouro, ninguém mais, gozava
de tanto prestigio quanto nosso ex nobre.
— É imprescindível comprar no mínimo três escravos senhor, dois homens para o trabalho pesado e uma mulher para serviços de cozinha. — Afirmou o servo.
— Como queira Vladimir... só quero ir embora daqui o mais rápido possível, esse cheiro pútrido está me fazendo lembrar das masmorras de Illyrio. — Decretou cheio de rancor.
— As melhores “peças” sempre são vendidas no final senhor.
— Que inferno! Se eu não tivesse caído em desgraça, e ainda gozasse do meu prestigio, estaria agora mesmo, em uma celebração no palácio imperial, bebendo champanhe francesa, deitado em uma cama luxuosa com uma bela mulher... e veja onde estou.... Em um leilão imundo me alimentando de prostitutas sifilíticas! O Imperador e sua corja de lambe-botas certamente adorariam me ver assim tão decadente.
— Schsss... já vai começar senhor.
— Dando início ao evento dessa noite, apresento a vocês Borís! Forte trabalhador rural, perfeito para colheita e serviços no campo, bem como qualquer trabalho pesado... o primeiro lance é de apenas 20 peças de ouro... alguém oferece 30?
O vampiro levantou a mão, de forma precipitada, realmente queria ir embora dali o quanto antes.
— Senhor tem certeza... é um brutamontes. — Perguntou o criado sem saber se deveria opinar.
— Para limpar o chão e servir as mesas está ótimo.
— Dou-lhe uma, dou-lhe duas... dou-lhe três vendido para o Sr. Conde por 30 peças de ouro! — Gritou o leiloeiro.
— Nosso próximo item é esse rapaz órfão chamado Ivan, excelente com números e contas. Era estudante do Educandário até ele ser fechado pelas autoridades por falta de fundos... seu lance inicial é a pechincha de 40 peças de ouro.... eu ouvi 50?
Vladimir fez um sinal para seu amo, indicando que aquele garoto, bem como suas habilidades, vinha de encontro ao que precisavam para a contabilidade da taberna.
— Sim, 50 peças! — Bradou o ex nobre impaciente, sem esconder que estava contrariado.
— Chamo a atenção dos presentes para essa amável senhora... ama de leite, excelente para fazer a lida da casa. — Disse o mestre de cerimônia dando continuidade ao espetáculo.
O Conde, não manifestou para esta e nem para as próximas
quatro mulheres de meia idade que foram comercializadas. Mais do que qualquer coisa queria apenas ir embora, mas ainda precisava de uma mulher para a lida da cozinha. Em seguida, foram leiloados mais alguns rapazes beirando a puberdade, até que Vladimir notou que a mulher que seria oferecida em seguida chamada Keira, seria perfeita para trabalhar na taberna. O Conde também tratou de arrematá-la por 20 peças de ouro.
— Agora chegamos ao ponto alto da nossa noite... essa bela e jovem menina donzela... perfeita pra fazer companhia nestas noites frias do nosso clima hostil... tem os dentes perfeitos, olhos verde claros e cabelos dourados como as 100 peças de ouro do seu lance inicial.
O Sr. Harper já estava de saída quando, instintivamente, olhou de relance para o palco. Aquela jovem menina seminua seria de fato donzela? Tinha quantos anos? Quatorze? Quinze? Na verdade, pouco importava sua idade, ao vê-la um desejo incontrolável de comprá-la apossou-se de sua alma com a força e a fúria de uma tempestade.
Maravilhado, pretendia fazer um lance, porém um homem estrangeiro de passagem pelo vilarejo se antecipou ao Conde.
— Eu ofereço 120 peças! — Berrou o homem de aparência horrenda.
— Não! Sem chances de perder essa magnifica beldade para esse velho nojento! — Pensou o Sr. Harper.
— Eu ouvi 140 peças? — Perguntou o leiloeiro animado.
— Sim! Ofereço 140 peças! — Afirmou o Conde.
— Eu cubro e oferto 150 peças!
— Cão lazarento... — Pensou Adrian zangado.
— Tenho 150 peças! Dou-lhe uma... dou-lhe duas...
— Eu dobro! Ofereço 300 peças! — Berrou o Conde em um ato cheio de adrenalina.
— Vendida para o Conde Harper! — Gritou o leiloeiro.
O Sr. Harper sorriu satisfeito segredando ao seu criado:
— Vladimir... pague o leiloeiro e leve a menina para a carruagem... apenas a menina. Peça ao organizador para entregar os outros escravos no casarão amanhã.
O servo obedeceu, ficou surpreso que seu amo gastou quase todo o ouro que ele havia conseguido guardar... apenas 100 peças e as joias da Imperatriz haviam restado.
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