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2#Dark Moon - Lua Negra

Passado de sangue

...Quando o Tempo Sangra...

Parecia que eu havia sido arrastada de volta para dentro de um pesadelo antigo — daqueles em que tudo depende da sua velocidade, mas seu corpo se recusa a responder. As pernas pesam como concreto, o ar se torna viscoso, e a linha entre vida e morte estreita-se a cada batida do coração.

Mas desta vez não era um sonho.

Eu não corria por mim.

Corria por alguém ainda mais precioso do que a própria vida.

A realidade era cruelmente vívida. Cada passo que tentava dar parecia preso a uma corrente invisível. O tempo escorria pelos meus dedos como areia fina, impiedosa, e eu sabia — no fundo, eu sabia — que talvez já fosse tarde demais.

Ágata havia me avisado que a possibilidade da morte estava à nossa espreita.

Talvez isso pudesse ter sido evitado se eu tivesse escutado minha intuição.

Mas agora... o destino já estava em movimento.

A igreja ressoou ao longe, sua torre soando o primeiro toque da meia-noite. A vibração percorreu o chão como um aviso ancestral, reverberando sob meus pés vacilantes. O segundo toque ecoou, e a lua posicionou-se bem acima de nós, brilhando como testemunha silenciosa de tudo o que estava prestes a acontecer.

Nunca me imaginei pensando em como seria morrer. Embora os últimos meses tivessem me dado motivos suficientes para isso, jamais supus que meu fim poderia se parecer com este momento.

E, estranhamente, morrer no lugar de alguém que amo não me parecia um destino injusto.

Talvez até fosse um gesto digno. Um sacrifício que, mesmo entre toda a dor, faria sentido. Algo que eu pudesse deixar para trás como prova de que meu amor foi real.

Mas perdê-la?

Perder aquela que tornou cada batida do meu coração suportável, que me deu cor em meio à escuridão, que acalmou minha tempestade interior?

Isso… seria o verdadeiro fim.

Porque não existe glória em um poder vazio. Nenhuma conquista vale a pena se ela não estiver comigo.

E a ideia de viver em um mundo onde ela não respira, onde sua risada não ecoa, onde seus olhos não se encontram mais com os meus... é simplesmente insuportável.

Dizem que morrer é difícil.

Mas morrer por dentro... é infinitamente pior.

Agora eu compreendo.

Não é a minha vida que temo perder.

É a dela.

E isso... isso muda tudo.

Uma semana havia se passado desde o baile, e, surpreendentemente, tudo parecia calmo demais. Karen não deu sinais de retorno, e a cidade, em sua rotina silenciosa, parecia tentar apagar os vestígios da noite em que tudo quase saiu do controle.

Sarah e eu nos encontrávamos às escondidas quando possível, testando feitiços simples, tentando ampliar meu domínio sobre os poderes que, apesar de latentes, pareciam cada vez mais instáveis.

Hoje, no entanto, não era dia de treinos.

Hoje, Trevor e eu partiríamos em busca de respostas.

Catherine havia me dado um endereço, e era até lá que estávamos indo.

Preferi não levar Riley e Bruck — elas ainda não sabiam de meu passado, e muito menos do universo sombrio e perigoso que se entrelaçava à minha realidade.

No carro, o silêncio parecia mais denso do que o habitual.

— Estou um pouco ansiosa para conversar com essa mulher — confessei, apertando com mais força o volante.

— Se quiser, posso dirigir um pouco — sugeriu Trevor com um tom gentil, quase cauteloso.

— Não, está tudo bem. Dirigir me acalma. Gosto de sentir que estou no controle, pelo menos de alguma coisa.

Ele riu baixinho, lançando-me um olhar que dizia mais do que palavras.

— Percebi... Mas, sinceramente, não sei se vamos sair de lá com algo concreto.

— Ainda assim, vale a pena tentar. É nossa única chance. Nossa esperança.

— E mesmo que saíamos de mãos vazias, vamos dar um jeito de descobrir o que realmente aconteceu com você. Não importa quanto tempo leve — prometeu.

Virei o rosto em sua direção e sorri com os olhos marejados.

— É tudo o que eu mais quero, amor.

Algumas horas depois, chegamos a Port Angeles. O endereço nos levou até uma rua tranquila, um bairro comum, onde nenhuma casa se destacava da outra.

Estacionei o carro em frente à residência indicada.

— Parece... comum demais — comentei, franzindo o cenho.

— Às vezes, os maiores segredos se escondem nos lugares mais simples — disse Trevor, saindo do carro e estendendo a mão para mim.

Agarrei seus dedos como se fossem âncoras. Caminhamos até a porta da frente. Respirei fundo e toquei a campainha.

Segundos depois, a porta se abriu.

Uma mulher de meia-idade, com cabelos grisalhos bem penteados e olhos atentos, nos fitou com estranheza.

— Pois não?... Minha nossa... é você, Aurora?

Arregalei os olhos, confusa.

— Me desculpe... meu nome é Sophie. Sophie Histon.

— Então... o que desejam?

— Precisamos conversar com a senhora. É algo importante. Podemos entrar?

Ela nos observou por alguns segundos que pareceram eternos, como se buscasse alguma mentira em nossos rostos. Então, sem dizer nada, abriu a porta e fez um gesto com o braço para que entrássemos.

— Prometo não tomar muito do seu tempo. Não queremos incomodar.

Ela fechou a porta com firmeza.

— Sentem-se. E me digam... o que posso fazer por vocês?

Nos acomodamos em um pequeno sofá próximo à lareira apagada.

— Como disse, sou Sophie Histon, e este é Trevor Belmont. — Estendi a mão com educação. — E a senhora?

— Que cabeça a minha... Me chamo Margot Vellin.

— Um prazer conhecê-la. Vou ser direta, Margot. Eu fui adotada quando era bebê, e estou buscando informações sobre minha mãe biológica. Acredito que ela fazia parte de uma ordem... antiga.

Margot empalideceu. Seus olhos se arregalaram levemente antes que ela se levantasse num movimento quase súbito.

— Eu sabia. Eu sabia que era você no momento em que abri aquela porta! — aproximou-se, emocionada. — Posso ver seu pescoço?

— Meu... pescoço? Claro. — Levantei os cabelos, confusa.

Ela inclinou-se, passando os dedos com suavidade atrás da minha orelha, como se buscasse uma marca invisível. Um sorriso escapou de seus lábios.

— Sim... você é ela. Você é Aurora Orlov.

Trevor se ajeitou no sofá, claramente alarmado.

— O quê?

— Não estou entendendo — falei, engolindo em seco.

Margot afastou-se devagar, sentando-se novamente à poltrona.

— Eu conheci sua mãe, Lúcia. Ela foi instrutora da minha filha, Felipa, na ordem. Lúcia era uma mulher intensa, poderosa... mas também gentil. Eu... eu nunca quis que Felipa seguisse aquele caminho, mas ela escolheu por vontade própria.

— Então é verdade... a senhora realmente conheceu minha mãe?

— Sim. — Ela assentiu lentamente. — Lúcia vinha aqui de vez em quando, para observar Felipa fora do ambiente da ordem. Nessas visitas, nos tornamos amigas. Ela me falava sobre a filha... sobre você.

Meus olhos começaram a arder. Uma emoção antiga e confusa apertava meu peito como um grito silencioso.

— Ela falava de mim?

— Muito. — Margot sorriu, embora seus olhos estivessem marejados. — Dizia que, mesmo longe, podia sentir sua presença. Que havia algo em você que mudaria tudo. Que era mais do que apenas sangue... era destino.

Trevor pegou minha mão sem dizer uma palavra. Eu nem conseguia agradecer. Estava absorvendo cada palavra como se fossem pedaços perdidos de mim mesma.

E naquele instante, percebi...

A verdade sempre esteve à espreita.

Só estava esperando que eu fosse corajosa o bastante para procurá-la.

— E você... poderia me falar um pouco mais sobre ela? — perguntei, com a voz trêmula, como se estivesse implorando por pedaços de uma história que nunca me pertenceram de verdade.

Margot suspirou fundo. Seus olhos pareceram viajar no tempo antes que sua voz saísse, carregada de lembrança e dor.

— Lúcia foi a única filha mulher de Ravena... sua avó. Na época, Ravena era a dirigente máxima da ordem. Uma mulher severa, inflexível... temida até mesmo entre as outras integrantes. Ela obrigou sua filha a entrar para a ordem. Lúcia nunca quis fazer parte daquilo — ela fez uma pausa. — Mas a vontade de Ravena era uma sentença. E ninguém se opunha a ela.

Trevor interveio com um olhar atento:

— E por que ela não fugiu? Por que não abandonou tudo?

Margot riu, mas sem humor.

— Ah, meu jovem... não é tão simples. Uma vez dentro da ordem, não se pode simplesmente sair. Elas matam qualquer uma que tente desertar. Elas caçam. Silenciosamente. E ninguém escapa com vida.

Trevor assentiu, visivelmente impactado.

— E... meu pai? A senhora chegou a conhecê-lo?

— Não. Lúcia chegou aqui numa noite chuvosa, em desespero. Estava prestes a dar à luz. Pediu ajuda... havia fugido da ordem. Eu a acolhi. E naquela noite... você e sua irmã vieram ao mundo.

— Espera... irmã? Eu tenho uma irmã gêmea? — perguntei, engolindo em seco.

Margot assentiu com delicadeza, mas seus olhos ficaram sombrios.

— Sim. O parto foi horrível. Achei que Lúcia fosse morrer naquela noite. Ophelia estava atravessada, impedindo a passagem. Eu precisei usar um feitiço para que ela virasse... passamos horas em agonia. Quando finalmente nasceu, Lúcia a nomeou Ophelia, que significa socorro. Ela queria que o nome fosse uma prece.

Meu corpo ficou imóvel. Cada palavra parecia me abrir por dentro.

— E depois... eu nasci?

— Sim. Logo após o sol surgir no horizonte. Você veio sem dor, em silêncio... como se o mundo tivesse parado para te receber. Por isso Lúcia te chamou de Aurora. Significa esperança... a luz que nasce após a escuridão.

Meu coração parecia pequeno demais para aguentar tantas emoções.

— E por que... ela me deixou na floresta?

Margot abaixou os olhos, como se a resposta lhe pesasse nos ombros.

— Porque você nasceu marcada. Com o sinal divino atrás da orelha. Lúcia contou que o real motivo do nascimento de vocês era um ritual... um sacrifício à deusa Ísis. Ou Lilith, como preferir. Mas ela se recusou. Fugiu para protegê-las. Só você nasceu com a marca.

Levei a mão ao local instintivamente.

— A mancha... essa marca que tenho atrás da orelha?

— Exatamente. A marca da linhagem sagrada. Mas Lúcia não teve tempo de explicar tudo. Três dias depois, Ravena a encontrou... e levou vocês duas embora.

— Mas... além de mim e Ophelia, havia outra criança. Ágata. A senhora a conheceu?

— Lúcia mencionou uma terceira menina... Ágata. Mas eu jamais a vi.

O nome dela soava como uma âncora em minha alma. Sempre presente. Sempre distante.

— A senhora... poderia me colocar em contato com sua filha, Felipa? Talvez ela saiba mais...

Os olhos de Margot se encheram de dor. Um silêncio pesado pairou entre nós.

— Eu gostaria de poder... mas não posso. Felipa tentou deixar a ordem. Depois do que viu... depois de presenciar a morte de Lúcia... ela não aguentou. Fugiu. Mas elas a encontraram. E... a mataram.

— Meus sentimentos. De verdade — disse Trevor, com pesar.

— Perdoe-me, eu não queria reabrir feridas — falei com a voz embargada.

— Não se preocupe, Sophie. A dor, com o tempo, se transforma em silêncio. Já aprendi a viver com isso.

— Há... há algo mais que saiba sobre a ordem?

Margot hesitou, como se medisse cada palavra.

— Não. Nada concreto. Só o que minha filha me contou em cartas. Mas... meu conselho é que não vá a fundo. Se te queriam antes, ainda te querem agora. E isso não vai mudar.

— Elas me procuram, sim... mas Ágata me protege. Ela tem afastado as sombras. É o que ela diz.

— Vocês se encontram?

— Não pessoalmente. Mas em sonhos. Sempre em sonhos.

Margot fez um leve aceno com a cabeça.

— Então ela é esperta. É assim que deve ser. Nos sonhos, não deixam rastros.

Levantei devagar.

— Eu agradeço... por nos receber, por compartilhar tudo isso.

— Espere um instante.

Ela se levantou e subiu as escadas sem dizer mais nada.

Olhei para Trevor, o coração ainda em guerra.

— Eu tenho uma irmã gêmea... Trevor. E se... e se foi ela quem me encarou aquele dia no espelho do banheiro?

Ele se aproximou, tocando meu ombro com firmeza.

— Eu não tenho dúvidas de que tenha sido. Você precisa estar atenta. A partir de agora, cada passo importa.

Margot retornou com uma pequena caixa de madeira nas mãos. Estendeu-a para mim com um gesto solene.

— Sua mãe deixou isso para trás naquela noite. Disse que era seu. E agora... é hora de tê-lo de volta.

Recebi a caixinha com reverência. Abri com cuidado.

Lá dentro havia um colar antigo. Um relicário. Com dedos trêmulos, o abri.

Dentro, uma foto desbotada. Lúcia sorria com o olhar perdido no tempo. Ao seu lado, uma menina com os olhos exatamente iguais aos meus.

Ágata.

— Obrigada... não sei como retribuir.

Margot me olhou com seriedade.

— Me agradeça... não indo atrás da ordem.

Ela nos acompanhou até a porta. A abracei com um aperto verdadeiro, carregado de tudo o que eu não sabia como dizer. Entramos no carro e seguimos de volta a MistFalls.

Trevor dirigia, atento à estrada silenciosa. Eu permanecia com o relicário preso ao pescoço, observando a foto como se tentasse absorver tudo o que havia descoberto.

Uma irmã. Uma mãe. Um nome. Uma maldição.

Agora... nada mais seria como antes.

E a única certeza que eu tinha, era de que esse era apenas o começo.

Tratado de Espírito

Fiquei olhando a foto dentro do relicário por longos minutos... ou seriam horas? Era como se o tempo tivesse parado entre os contornos daquele rosto — o dela, o de Ágata — e o sorriso apagado da minha mãe.

Senti os dedos de Trevor tocarem de leve minha mão, trazendo-me de volta.

— Está bem? — a voz dele veio baixa, mas cheia de cuidado.

Pisquei algumas vezes, voltando ao presente.

— Oi? Me desculpa... eu só estava imaginando como teria sido viver com elas. Crescer ao lado delas. Ter uma família de verdade.

Trevor se ajeitou no banco, virando o corpo um pouco em minha direção.

— Eu só quero saber como você está... depois de tudo que descobriu.

Suspirei, com um pequeno sorriso que não chegou aos olhos.

— Digamos que... extasiada. É uma mistura caótica de sentimentos. Curiosidade, dor, esperança. Mas... estou bem.

Ele me olhou com aquele jeito que sempre usava quando tentava decifrar o que eu não dizia em voz alta.

— Fico feliz que tenha encontrado algumas respostas. Mas... também estou preocupado. Com o que isso pode fazer com você.

Segurei sua mão com firmeza, entrelaçando nossos dedos.

— Eu estou bem, Trevor. De verdade.

— Eu só... não quero que isso te afunde. Gosto de te ver sorrindo. Você não faz ideia do quanto isso significa pra mim.

Me aconcheguei em seu braço, como se ele fosse meu porto — e era.

— Só quero entender tudo. Por completo. E então... talvez possamos ter um pouco de paz.

Quando chegamos à casa de Trevor, estacionei o carro com lentidão. Havia um veículo diferente parado em frente à garagem.

Franzi o cenho.

— Você está esperando alguém?

— Não. E sinceramente, não faço ideia de quem seja — respondeu ele, já atento.

Descemos do carro. Trevor me puxou para perto com um gesto protetor e seguimos até a porta.

Ao abrirmos, vozes altas ecoavam da sala. A tensão estava no ar antes mesmo que atravessássemos o limiar.

— ...eu não acho que sua atitude seja nobre — dizia uma voz feminina, firme. — Muito menos algo que beneficie a tribo.

Trevor parou na porta da sala com o olhar endurecido.

— Gina. O que você está fazendo aqui?

A mulher virou-se, com a expressão altiva.

— Oi, Trevor. Vim tratar de assuntos da tribo do sul com você.

Ao lado dela, um homem de postura imponente se levantou lentamente do sofá. Seus olhos eram escuros como a noite e carregavam um peso ancestral.

— Sophie, este é Kaleo Watson. O alfa da tribo do sul — apresentou Trevor com um leve aceno.

Estendi a mão com naturalidade.

— Prazer... Sophie Histon.

— O prazer é todo meu, minha jovem — disse Kaleo, com um sorriso educado. — Espero que esteja se sentindo segura por aqui.

— Podemos conversar a sós, Trevor? — ele acrescentou, voltando sua atenção ao anfitrião.

— Claro. Só... tem algo me incomodando — Trevor olhou em direção ao canto da sala, onde seu avô observava tudo em silêncio. — Não entendo por que você, Kilian, apareceu no mesmo dia dessa visita.

Kilian arqueou uma sobrancelha e deu um passo à frente.

— Estava com Kaleo. Se é isso que está pensando com essa cabecinha desconfiada.

— Eu sabia que tinha dedo seu nisso — resmungou Trevor, cruzando os braços.

— Só estou zelando pelo bem da tribo, neto. Você deveria fazer o mesmo.

Antes que qualquer outra palavra fosse dita, uma risada suave cortou o ar. Uma garota belíssima surgiu pela porta lateral conversando com Robin, como se o ambiente não estivesse carregado de tensão.

— Boa tarde, Sophie — disse Robin, com um sorriso amigável.

— Trevor! Que saudade! — disse a garota, em um tom doce e íntimo demais para meu gosto.

Antes que eu pudesse reagir, ela correu até ele... e o beijou.

Na boca.

Vi os braços dela se enroscarem em seu pescoço como se fossem donos daquele espaço. Meu corpo congelou. O som ao redor pareceu desaparecer.

Senti meu coração apertar, e o ar que eu respirava virou algo denso, impossível de engolir.

Ele não correspondeu. Mas também não a afastou imediatamente.

Respirei fundo. A única explicação para aquela intimidade... é que ela era quem eu temia.

— Só pode ser ela... — murmurei para mim mesma.

Trevor enfim a segurou pelos ombros e afastou delicadamente, visivelmente constrangido.

— Maya? O que está fazendo aqui? — a voz dele soou mais surpresa do que qualquer outra coisa.

Ele me olhou, e pude ver a tensão no fundo dos seus olhos.

— Vim acompanhar meu pai! — ela disse, com um sorriso provocador. — Não está feliz em me ver, amor?

Amor? Quem essa garota pensa que é pra chamar o MEU namorado assim? Eu vou arrancar cada fio desses cabelos pretos reluzentes dela se continuar com isso...

— Claro que fico feliz em te ver, só não esperava... — Trevor rapidamente voltou o olhar para mim, segurando minha mão com firmeza. — Deixa eu apresentar vocês.

— Maya, essa é a Sophie... minha namorada.

Ela cruzou os braços, me encarando dos pés à cabeça com aquele olhar afiado que só uma mulher determinada a causar tem.

Dei um sorriso forçado, sem abaixar o olhar, e estendi a mão.

— Prazer em conhecê-la, Maya.

— Digo o mesmo, Sophie. — Ela ergueu uma sobrancelha, como se me medisse.

Não. Eu definitivamente não gostei dela. Isso vai virar um problema. E dos grandes.

— Então, Trevor... podemos conversar agora? — interrompeu Kaleo, voltando sua atenção para o filho.

— Claro — respondeu Trevor, com o tom endurecido. — Vamos para o escritório.

Trevor seguiu para o corredor e Kaleo o acompanhou. Robin, que havia observado a cena toda, fez uma careta para mim e se aproximou com um sorrisinho solidário.

— Quer dar uma volta?

— Por favor! — respondi, aceitando de bom grado.

Regina suspirou, saindo da sala em direção à cozinha. Maya se jogou no sofá como se fosse dona da casa e continuou a me fitar com aqueles olhos carregados de ressentimento.

Ignorei.

Saí com Robin pela porta dos fundos, sentindo o ar fresco da tarde aliviar minha tensão.

— Onde está Luara? — perguntei, só para aliviar o peso no peito.

— Ficou em casa com a mãe. Vou pra lá daqui a pouco. Maya foi bem direta, hein? Me desculpa por ela — disse Robin, com o tom simpático.

— Vou fingir que não vi o show de horrores. Você sabe o que Kaleo quer com Trevor?

— Ouvi meu pai comentando sobre um antigo acordo que ele e o pai de Trevor fizeram antes de morrer.

— Mas esse acordo ainda vale? Trevor já é o novo alfa, não?

— Só se foi selado perante o Sr. Xamã.

— Ótimo. Justo agora que estou começando a entender quem sou, vem mais confusão.

Robin assentiu, pensativo.

— Trevor me contou sobre a bruxa. Como foi lá?

— Descobri que tenho uma irmã mais velha chamada Ágata... e uma irmã gêmea: Ophelia. E, pra resumir o pesadelo: eu fui gerada como oferenda a Ísis.

— Caramba, Sophie... isso é pesado. Mas o mais importante é que as peças estão aparecendo. As respostas estão vindo.

— Pelo menos isso.

O cheiro da terra úmida misturava-se com o frescor das folhas. Andávamos devagar, sob o sussurrar do vento entre os galhos altos. O céu começava a se tingir com as cores suaves do entardecer, e mesmo assim, meu peito parecia uma tempestade prestes a desabar.

Robin chutava uma pedrinha no caminho, como se pensasse no que dizer. Eu quebrei o silêncio primeiro:

— Robin... quem exatamente são Kaleo e Maya?

Ele soltou um suspiro longo, como quem se preparava pra contar uma história antiga.

— Kaleo... Kaleo é o filho mais velho da tribo do sul. — Ele me lançou um olhar rápido, depois voltou os olhos para o caminho. — Muito tempo atrás, éramos uma única tribo. Mas o irmão de Kilian, decidiu que não concordava com o Conselho das Quatro Famílias. Achava que deveria existir apenas um único líder. Um alfa soberano.

— E Kilian... ficou do lado do conselho?

— Sim. Mesmo jovem, ele não compactuava com o pensamento do pai. Decidiu ficar, se afastar da ambição que dividiu a tribo. — Robin passou a mão nos cabelos, pensativo. — O tempo passou... Kaleo se casou, teve Maya. E como o destino adora brincar com a gente, Maya e Trevor cresceram praticamente grudados.

Meu coração bateu mais forte.

— Eles eram próximos?

— Muito. Kaleo e Billy, pai do Trevor, eram melhores amigos. Um vivia na casa do outro. A infância deles foi compartilhada em todos os sentidos. Brincadeiras, treinos, decisões... E claro, Maya e Trevor acabaram se tornando inseparáveis também.

A trilha estreitou. Subimos por uma elevação de pedras cobertas de musgo. O som distante de um riacho se misturava aos meus pensamentos.

— Eles namoraram? — minha voz saiu mais baixa do que eu esperava.

Robin deu uma risada contida.

— Tiveram um namorico de jovens... sabe como é. Aquela coisa de primeiro beijo, primeiro amor. Mas eram muito novos. Não durou muito.

— E então o irmão de Kilian morreu — completei, lembrando do que ouvi no escritório.

— Exato. A morte do irmão forçou Kaleo a assumir a liderança da tribo do sul. Ele tinha deixado tudo pra trás, mas precisou voltar... assumir o posto, manter a ordem. Maya foi com ele.

Respirei fundo, tentando processar.

— Então Maya é... a ex de Trevor, uma loba alfa... filha do líder da outra tribo...

— E neta do homem que quase destruiu a unidade de todas as tribos. — Robin completou com um olhar mais sério.

— Bastante atributos, né? — murmurei, sentindo uma pontada no estômago.

Caminhamos em silêncio por alguns passos. O vento bateu no meu rosto e mexeu os galhos das árvores. Não era só o passado de Trevor que estava à minha frente — era uma ameaça em potencial, uma ferida antiga se abrindo de novo.

— Robin... — falei, sem esconder minha vulnerabilidade. — Isso tudo me deixa... desconfortável. Como se eu tivesse invadido uma história que já existia antes de mim. Como se, a qualquer momento, ela pudesse tomar meu lugar.

Ele parou, se virou pra mim com firmeza no olhar.

— Sophie, você não invadiu nada. Você chegou quando a tribo mais precisava de você. Trevor está contigo. Eu nunca vi ele olhar pra alguém como olha pra você.

Baixei os olhos, sentindo as emoções turvarem minha visão. Aquela insegurança teimosa ainda pesava no meu peito. Mas as palavras de Robin, ditas com tanta verdade, aqueceram algo dentro de mim.

— Obrigada por ser honesto — sussurrei.

— Sempre serei. E... não se esquece de uma coisa: Maya pode ter história com ele, mas você é o presente. E talvez... o futuro.

Ecos do passado

...Trevor Belmont...

Fechei a porta do escritório com um estalo seco. O som reverberou nas paredes como um aviso: essa conversa mudaria tudo.

Me sentei na poltrona de couro envelhecido, mas a rigidez do encosto não era nada comparada à pressão que se instalava no meu peito. Kaleo ocupava a cadeira à minha frente com aquele ar calculado e contido — como se carregasse uma bomba no colo e fingisse que era só mais um artefato antigo.

— Pode começar — murmurei, a voz mais grave do que eu esperava.

Ele cruzou os braços devagar, os olhos sustentando os meus.

— Seu avô me procurou. Disse que a tribo do norte tem sofrido ataques cada vez mais frequentes... e que chegou a hora de cumprirmos a promessa que selamos com seu pai. A promessa de unirmos as tribos... como era a vontade dele.

Fiquei em silêncio por um segundo. Depois ri. Um riso seco, curto, amargo.

— A cidade tem enfrentado ataques, é verdade. Vampiros, crinos, até espectros em algumas noites. Mas lidamos com tudo. Eu lidei. E desde que Sophie chegou, nossa força dobrou. Ela não é só uma aliada... ela é parte de nós.

Kaleo arqueou uma sobrancelha, desconfiado.

— E quem é essa garota, Trevor? Por que você a trouxe pra dentro da sua tribo?

Inclinei-me à frente, o olhar firme.

— Eu não “trouxe”. Eu reconheci. Sophie é peeira. Ela nasceu pra isso. E mais: é minha parceira. Ela é minha escolha. Meu futuro.

Kaleo inspirou fundo como se precisasse controlar alguma coisa dentro dele. Então deixou cair a verdade:

— Esse futuro que você escolheu... talvez não seja possível.

— Como assim? — minha voz saiu afiada, fria.

— Seu pai e eu... fizemos um acordo. Um pacto selado por Xamã e pelos espíritos da linhagem. Um tratado ancestral. Quando assumi meu posto como alfa do sul, sabíamos que um dia precisaria haver união entre nossas tribos. E essa união... viria através de vocês. De você e Maya.

Um silêncio denso caiu entre nós. A lembrança do beijo no hall da minha casa ainda queimava no fundo da minha mente. Respirei fundo, tentando conter o turbilhão.

— Isso foi há anos— murmurei, me levantando. — Eu e Maya não somos mais os mesmos. Nem de longe. E eu amo Sophie.

— Maya se manteve casta por causa desse tratado, Trevor. Ela acreditou nesse destino desde sempre. Honrou o pacto que seus pais fizeram.

Fechei os punhos, sentindo meu maxilar travar.

— Eu não fiz esse pacto, Kaleo! Eu não dei minha palavra. E se você acha que pode chegar aqui, jogar o passado na minha cara e apagar tudo o que vivi com Sophie... está enganado.

— Você não pode simplesmente recusar — ele disse com calma perigosa. — Essa não é uma escolha comum. Não estamos falando de sentimentos, Trevor. Estamos falando da sobrevivência da linhagem.

Virei de costas, indo até a janela. As árvores da reserva balançavam suavemente ao vento, mas naquele momento, tudo parecia sufocante. A floresta, a casa, o sangue nas minhas veias.

— Eu não quero unir tribos por obrigação — falei com os olhos fixos nas sombras do entardecer. — E não quero perder quem eu sou por causa de um tratado que eu nunca aceitei.

— Eu entendo. — A voz dele suavizou. — E é por isso que... vou te dar um mês. Apenas um. Pense com clareza, com cabeça fria. Tempos sombrios estão vindo, Trevor. Eu estive com Xamã há pouco. Ele falou de escuridão se aproximando. De linhagens sendo corrompidas. Você sabe que ele não fala por falar.

Fechei os olhos, sentindo o peso do que estava por vir me pressionar o peito.

— Eu também estive com ele — confessei. — E as visões que ele compartilhou... me deixaram inquieto. Muito.

— Então você entende a gravidade. — Kaleo se levantou. — Ficarei na reserva por um mês. Na casa da minha prima, Iasmin Griffin. Dê-me sua resposta até lá.

Fiquei em silêncio.

Ele já estava na porta quando disse, com a voz mais baixa, mais densa:

— Maya ainda te ama, Trevor. Está animada com o tratado. Com o que isso pode significar. Ela acredita que é o destino de vocês... e quer lutar por ele. Pense nisso antes de escolher. Pense com sabedoria.

A porta se fechou com um clique seco.

E o silêncio que ficou... parecia mais alto que qualquer grito.

Me joguei na cadeira e levei as mãos às têmporas, massageando com força, como se aquilo pudesse aliviar a pressão que latejava dentro da minha cabeça.

Meu avô passou semanas fora. Foi até o sul, se meteu onde não devia e voltou trazendo um legado que não me pertence.

Um tratado selado anos atrás, sem meu consentimento, agora ameaça arrancar tudo o que construí com Sophie.

Como se cada passo que dou em direção a ela... o universo conspirasse para me puxar de volta.

Amo aquela garota. Amo com uma intensidade que queima por dentro. E justo agora que ela se entregou, que nossos corações finalmente caminham no mesmo ritmo... querem nos separar?

Solto o ar com força, os olhos fechados, os punhos cerrados.

Não... Não vão.

Mas então, a lembrança me golpeia. Um momento esquecido, enterrado... até agora.

FLASHBACK

O topo do Monte do Lobo Vermelho nos envolvia num silêncio acolhedor, quebrado apenas pelo som do vento varrendo as árvores. Estávamos sentados lado a lado, observando as luzes suaves de MistFalls se acendendo aos poucos lá embaixo. O céu tingido em tons dourados e violeta refletia a inquietação dela.

— Trevor... eu não quero ir embora. — A voz de Maya saiu embargada, pequena, frágil.

Virei o rosto para ela e segurei sua mão com firmeza.

— Eu também queria que você ficasse. Mas... não tem como convencer seu pai a ficar. A tribo precisa dele no sul.

Ela apertou os lábios, tentando conter as lágrimas.

— Eu sei... mas eu preciso de você. E eu sinto — ela engoliu seco — que a gente não vai se ver mais.

Você é meu melhor amigo. Eu te amo. Não conheço ninguém na outra tribo... vou me sentir sozinha.

O nó na minha garganta apertou. Maya sempre foi forte. Vê-la assim... me desmontava.

— Olha, vamos fazer uma promessa — falei, segurando os dois lados do rosto dela e forçando um sorriso. — A gente jura nunca deixar que nada destrua nossa amizade, ok?

Você vai ser pra sempre essa menina doce e forte que eu amo. Sempre vou estar aqui por você, Maya.

Ela assentiu e apoiou a cabeça no meu ombro. Ficamos ali, em silêncio, apenas sentindo a conexão. O mundo podia mudar... mas aquele momento parecia eterno.

— Promete mesmo? Que nada vai nos afastar? Que vai sempre estar aqui? — Ela ergueu o dedinho, os olhos marejados. — Mesmo se um dia eu estiver longe, ou se você tiver outra pessoa...

— Eu prometo — sussurrei, entrelaçando meu dedo no dela.

Ela sorriu, mas era um sorriso triste, um adeus disfarçado.

— Às vezes... eu queria que existisse um botão. Um que pulasse direto as partes ruins da vida. Só as ruins. E levasse a gente logo pra parte feliz... — disse com a voz trêmula.

— Não dá pra pular a jornada, Maya. — Toquei o queixo dela com carinho. — A jornada é o que torna o final... inesquecível.

Ela riu fraco, e depois suspirou fundo.

— É como estar presa no melhor sonho... e no pior pesadelo, tudo ao mesmo tempo. Eu não quero te deixar, Trevor.

— Então finge que é só uma viagem de férias com sua família, e logo você vai estar de volta.

Quem sabe a gente se encontre antes do que imagina.

Ela se levantou com relutância, limpando as lágrimas.

— Está quase na hora... temos que voltar. Meu pai não gosta de esperar.

Antes de dar o primeiro passo, ela se virou e me abraçou com força, como se quisesse guardar meu cheiro, minha presença... pra sempre.

— Promete que não vai me esquecer... nunca? — sussurrou contra meu pescoço.

— Eu prometo.

E naquele fim de tarde, com as estrelas começando a surgir sobre nossas cabeças... eu achei mesmo que seria só um até logo.

Claro que não posso negar... Maya foi um grande amor. Uma amiga de infância, alguém com quem compartilhei lembranças que ainda vivem em mim.

Prometemos nunca deixar nada nos afastar. E não deixamos — mas o que restou entre nós foi só isso: amizade.

Aquele beijo… serviu como uma resposta. Um lembrete silencioso de que o que sinto por ela agora é apenas carinho.

Não amor.

Mas e quanto ao acordo?

O que fazer com algo selado por juramentos antigos, quando meu coração clama por algo que ninguém mais pode me dar… além de Sophie?

...Sophie Histon...

O céu começava a se tingir de dourado, anunciando o fim da tarde. A cada passo, o som dos nossos sapatos se misturava com o som abafado da natureza.

— Acho melhor voltarmos, Robin — murmurei, ainda sentindo o peso daquela presença que parecia não querer me soltar.

— Claro — ele respondeu, com um aceno suave de cabeça.

Seguimos pelo caminho de volta, a floresta sussurrava com o farfalhar leve das folhas, como se o próprio vento estivesse em suspense...

...até que, ao longe, um carro prateado chamou minha atenção.

Estacionado à beira da trilha, era grande e reluzente. Kaleo já estava ao volante, com o semblante sério.

E então a vi.

Maya surgiu na entrada do carro — e por um instante, tudo ao redor pareceu desacelerar.

Sua silhueta era esguia, com postura altiva. Tinha a pele dourada pelo sol, traços marcantes e um ar sereno e ancestral que me fez pensar imediatamente em algo mais... antigo, mais profundo. Seus longos cabelos negros caiam em ondas pesadas até a cintura, e quando ela virou levemente o rosto para mim, o que me prendeu foram seus olhos — olhos de um verde vivo, intensos como se carregassem uma floresta inteira dentro deles.

Ela me olhou com uma calma inquietante, como se não precisasse falar nada para deixar claro o que sentia. Não havia gritos, nem gestos — só aquele olhar, agudo, como uma lâmina fria: uma mistura de desdém e desafio contidos num rosto que, de tão sereno, assustava mais do que se tivesse gritado.

Engoli em seco, desviando o olhar como quem tenta se proteger do frio.

— Vocês são amigos? — perguntei a Robin, tentando soar casual, mas minha voz traiu um leve tremor.

— Maya? — ele arqueou as sobrancelhas, como se pensasse no que dizer. — Não exatamente... ela é minha prima de segundo grau.

— Ah... — murmurei, sem conseguir esconder o amargor no fundo da garganta. — Então é de família esse olhar atravessado?

Robin riu, sem graça.

— Ela não parece ter gostado de mim...

— Também tive essa impressão — ele suspirou, passando a mão pelos cabelos. — Mas... espero que ela não te cause problemas. Já temos encrenca demais pra lidar, Sophie. De verdade.

— Nem me fale — respondi, dando uma última olhada por cima do ombro.

O carro já tinha arrancado, mas a sensação de que aqueles olhos ainda estavam cravados em mim... permaneceu.

Como se Maya não fosse apenas uma loba alfa.

Como se ela fosse uma ameaça velada.

Ou pior... uma sombra prestes a crescer.

Assim que entramos, percebi a porta do escritório ainda fechada. Trevor não tinha saído de lá.

Me aproximei com cuidado e bati.

— Quem é? — a voz dele veio abafada, tensa.

— Sou eu, amor. Posso entrar?

— Pode...

Abri devagar. Ele estava sentado atrás da mesa, os ombros pesados, o olhar perdido — como se tivesse lutado contra o mundo e perdido.

— Está tudo bem? — perguntei, já sentindo no peito que a resposta seria um não.

— Vem cá... me abraça — ele pediu, baixo.

Fui até ele e sentei em seu colo. Ele me envolveu nos braços, soltando um longo suspiro contra meu peito. Levei os dedos aos cabelos dele, afagando com calma.

— Quer conversar?

Ele levantou o rosto e me olhou com uma dor tão exposta que meu coração apertou.

— Por muito tempo... achei que nunca mais amaria de verdade. — A voz dele veio rouca, carregada. — Que minha vida seria dedicada apenas à reserva. À proteção da tribo, da cidade, das pessoas.

O peso de ser líder... de decidir por todos... isso foi me consumindo.

Tentei ser como meu pai. Ou melhor. Mas nunca parecia o suficiente.

— Ei... — levei a mão ao rosto dele, fazendo-o me encarar. — Trevor, nesses meses eu vi você se doar como ninguém. Você carrega o mundo nas costas por todo mundo aqui. E mesmo assim, ainda me deu o melhor de você...

Ele fechou os olhos, como se aquelas palavras o ferissem e confortassem ao mesmo tempo.

— Mas você apareceu, Sophie. E eu tentei — juro que tentei — não me apaixonar.

Só que... acho que me apaixonei no momento em que te vi pela primeira vez.

Você trouxe cor. Vida. Leveza. Você se tornou o meu mundo.

— Eu também me apaixonei por você naquele instante — sorri, apertando sua mão. — Talvez não tenha percebido na hora… mas quando esbarramos naquele corredor, algo dentro de mim mudou.

Ele sorriu de volta e me beijou com carinho, um beijo que dizia tudo o que não sabíamos colocar em palavras.

— Sophie… tantas vezes na vida eu deixei de fazer o que queria... pra fazer o que era certo.

Por todos. Pela tribo.

E agora... me pergunto: será que de novo... eu vou precisar abrir mão do que me faz feliz?

— Me conta o que está acontecendo — pedi com doçura. — Eu tô aqui. Você não precisa carregar tudo sozinho.

Ele hesitou. O silêncio se prolongou.

— Eu quero te contar. Mas... não sei se agora é o momento certo.

— Se for algo que pesa tanto assim... talvez contar alivie um pouco.

Ele me olhou como se estivesse preso entre o amor e o dever, entre o agora e o passado.

E ali, abraçada a ele, eu soube que o que quer que fosse... não era só sobre ele.

Era sobre nós.

Eu seguro o rosto dele com delicadeza e o beijo — um beijo que fala sem palavras: “estou aqui, por você, com você, até o fim.”

Seus lábios me respondem com um calor que me desmonta por dentro, como se nosso toque selasse um pacto silencioso entre nossas almas.

— Independente do que seja… — sussurro contra sua boca — eu vou aceitar sua decisão.

Os olhos de Trevor brilham com um misto de alívio e amor.

— Eu amo muito você, marreta.

Faço uma careta dramática e empurro levemente seu ombro.

— Isso de novo não, Trevor…

— Só pra não perder o costume — ele ri, e beija meu queixo com um carinho que me arrepia inteira.

— Eu preciso ir pra casa.

Ele envolve minha cintura, me puxando contra o peito forte, como se não quisesse me soltar nunca.

— Fica mais um pouco — ele murmura com aquele tom grave e rouco que me desarma toda.

— Amor… eu prometi às meninas que ia levá-las ao shopping de Valley. Não posso furar.

Ele geme baixinho, com a testa colada na minha.

— Tudo bem… mas à noite, depois da patrulha, a gente dorme juntos. Ok?

— Combinado! Mas dessa vez na minha casa. Chego na reserva às dezenove, tá?

— Vai patrulhar com a gente essa noite?

— Preciso encarar meu medo de não conseguir me transformar. Se der ruim… peço ajuda da Sarah.

— Eu vou estar lá. Te espero perto da clareira, às dezenove — ele diz, sério agora, com os olhos fixos nos meus.

— Ótimo.

Dou um beijo leve nele e me afasto.

— Acha mesmo que isso vai me deixar satisfeito? — ele provoca, levantando e me puxando de volta com firmeza.

E então, antes que eu possa responder, seus lábios tomam os meus num beijo quente, cheio de desejo. Um daqueles que fazem a espinha arrepiar e o tempo parar por um instante.

Meu coração dispara. Ele sabe exatamente o que faz comigo.

Quando ele finalmente recua, está ofegante e com aquele meio sorriso que me faz perder a razão.

— Agora sim… pode ir. Te vejo à noite, minha loba.

Sorrio, já com a mão na maçaneta.

— Sophie!

Viro o rosto por cima do ombro, curiosa.

— Eu te amo — ele diz, como uma certeza que atravessa o ar.

Meus lábios se curvam em um sorriso terno, cheio de sentimento.

— Também amo você, Trevor.

Dou uma piscadinha charmosa, e saio com o coração batendo acelerado — como se ele ainda estivesse ali, batendo junto ao meu.

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