...Antigamente, existia o conceito de liberdade,...
...e de igualdade. ...
...Agora, sua vida toda vale dígitos ...
...de uma conta bancária. Bem-vindo ao meu mundo!...
... China, 2050....
Os Centros de criação funcionam a todo vapor. Crianças para lá e cá, ainda muito novas para entender o destino que carregam. Algumas brincam de esconde-esconde ou de pega-pega, sempre aos olhares atentos de seus cuidadores.
Enquanto isso, um rapaz que acaba de completar seus dezoito anos acorda com vontade de sonhar de novo. Ele geralmente não demora para se levantar, mas hoje é um dia especial.
— Lin Wei, acorda, meu querido — diz uma voz doce batendo na sua porta. — Temos que te arrumar para a cerimônia… Esqueceu?
— Ah… a cerimônia? — o rapaz franze os lábios ao lembrar disso. “Hoje é o dia, finalmente. Se eu pudesse ter mais um dia de folga”. — Já vou, tia Lian Ming, já estou indo…
Mas tudo o que Lin Wei quer é ficar na cama. Para que obedecer sabendo que seria OBRIGADO a ir de qualquer jeito? Ele sabe que não tem como fugir… A cerimônia, o leilão… a consumação da venda… Tudo isso o deixa de estômago gelado.
“E se doer? E se eu não aguentar na hora? As tias dizem que não dói tanto, mas… o que elas sabem? Nenhuma delas foi obrigada a passar por isso…” Lin Wei se levantou e foi ao banheiro se lavar, usando sua bengala como guia. Escovou os dentes com cuidado, depois arrumou seus cabelos brancos e sedosos com calma.
Ele é um belo jovem, isso todos do Centro podiam confirmar. Apesar de ser cego e precisar de cuidadores que o ajudassem de vez em quando, ele ainda desfrutava de alguma independência no Centro.
Quando Lin Wei abre a porta, a cuidadora está o esperando de braços abertos. Ela faz um cafuné nos seus cabelos. Mas ele permanece preocupado e com vontade de chorar.
— Tia Lian Ming… — ele tateia a procura de sua mão, até finalmente achá-la. Ele a aperta com ternura. — Estou com medo.
— Eu sei, meu amor, todo jovem da sua idade tem medo na primeira vez… — ela sussurra docemente, o abraçando. — Mas isso faz parte… Quem escolher ficar com você será muito feliz!
Lin Wei morde os lábios ao ouvir isso. “E a minha felicidade? E se eu… não gostar? Isso realmente não importa, né?”
Ele tenta conter o choro, mas quando ouve as vozes dos seus amigos se despedindo dele com abraços e carinhos, Lin Wei entra em crise.
— N-não… Eu não quero ir embora daqui! — ele se ajoelha e agarra a sua cuidadora. — Por favor, tia, não deixe que eles me levem… Eu não quero! Vocês são minha família!
— Lin Wei, querido, se comporte — a tia o levanta do chão, já não tão gentil assim. — Você precisa ir, todos estão te esperando lá fora.
— Não, não… — ele chora, sendo arrastado por um homem forte para fora do Centro de
Criação que passou seus dezoito anos vivendo como se fosse um príncipe. — NÃO! NÃOOOOOOOOO!!!!
O medo toma conta dele. Ele não quer uma vida nova, ele quer ficar com seus amigos e brincar com eles, cuidar das suas plantas e…
— Lin Wei, vai ficar tudo bem — diz Hao Ming, um dos seus melhores amigos, correndo atrás do homem que o arrastava. — Me disseram que os nossos donos serão como se fossem nossos pais.
“A gente não teve pai. Que merda está dizendo?! Pais não… fazem coisas estranhas com os filhos!” Lin Wei pensa ainda sendo arrastado aos prantos.
Hao Ming pega a sua mão com carinho e fala para o homem ser mais gentil com seu amigo. O homem não lhe dá atenção e continua arrastando Lin Wei como se fosse um saco de batatas, pois o jovem era realmente leve.
— Lin Wei, a gente ainda vai se encontrar lá fora! — grita Hao Ming, sendo deixado para trás. — E ainda vamos ser amigos, está bem?
Lin Wei ainda estava tremendo, mas ao sentir a mão delicada de Hao Ming acariciando a sua mão ficou mais relaxado. Ele adora os seus amigos, principalmente Hao Ming.
— Está bem — foi tudo o que conseguiu dizer antes de soltar a sua mão e desaparecer pelos corredores, porque o homem forte ainda estava o arrastando.
Logo, o rapaz é colocado dentro de um carro luxuoso, junto com a sua bengala, já que não consegue andar sem ela. Lin Wei respira fundo, várias e várias vezes, apertando a sua bengala com força. O carro começa a se mover para fora do Centro de Criação.
“Será que onde vou morar tem um jardim? Eu queria poder cuidar das flores ainda…”, como se as flores fosse a única coisa que deveria se preocupar! Uma lágrima escorre de seus olhos e ele tenta se conter. Seus amigos, os cuidadores… a única família que conhecia… está sendo deixada de lado por algo desconhecido…
Quando o carro para, Lin Wei é guiado até uma sala espaçosa, onde várias mulheres se ocupam de vestir e maquiar “os lírios” a serem vendidos.
— Uou, que gatinho esse daqui! — diz uma voz feminina alisando o cabelo de Lin Wei, o que o deixa muito desconfortável. — Olha como o cabelo dele é macio e sedoso!
E Lin Wei sente seu cabelo ser tocado por várias mãos femininas. Ele não pode revidar nem nada, então apenas fica vermelho com os toques, porque não está acostumado com essa intimidade.
— Que lindinho… Que pena que eu não tenho dinheiro para comprar você, gracinha, pois você seria tratado como rei por mim! — diz outra voz feminina, apertando as suas bochechas suaves. — Olhe os olhos dele, Yin An! Eles são rosados!
— É mesmo? Então deve ser daquele modelo novo feito geneticamente… soube que custa mais do que o anterior, bem mais!
“Elas conversam como se eu não existisse. Isso é irritante” Lin Wei se dá conta que ele, comparado àquelas mulheres, não tem direito a falar o que pensa porque não foi feito para isso. Ele aperta os punhos com força, ressentido.
— Ei, querido, você pode erguer os braços? Vamos te vestir agora.
Lin Wei ergue os braços e as mulheres começam a lhe vestir com um tipo de quimono vermelho, todo bordado com figuras de flores e dragões.
Depois, colocam um leve batom em sua boca, já bastante vermelha naturalmente, e arrumam os seus cabelos longos, fazendo um leve coque com um broche dourado. Elas não precisaram branquear o seu rosto. Lin Wei já é branco como a neve.
— Acho que você deve deixar essa bengala de lado, queridinho — diz uma delas. — Os compradores não querem a bengala, e sim você.
— Mas como eu… — Lin Wei começa.
— A gente vai te ajudar em tudo, fique tranquilo! — uma delas diz, confiante. — Além disso, lírios como você não precisam de bengalas. O seu futuro dono vai achar um ajudante para você.
“Futuro dono…” Aquilo o assusta mais do que deveria. Ele sempre soube que quando atingisse dezoito anos… sua vida seria outra. Então, por que está contendo as lágrimas de novo?
— Não chore, gracinha! Vai borrar a maquiagem! — diz uma moça, o acompanhando até a sala, onde será leiloado. — Além disso, não é todo mundo que tem a chance de ser vendido por um grande bilionário. Deveria se sentir feliz. Anda, dá um sorriso!
Lin Wei força um sorriso, mas não consegue o sustentar por mais de um minuto, pois ele sente que centenas de homens o estão olhando nesse exato momento. E nenhum deles quer ser apenas seu amigo. Disso ele tem certeza.
Ele respira fundo quando seu nome é chamado e é guiado por uma dama até um palco onde ele é a grande atração. “Esse é peso de centenas de pessoas me olhando e eu não podendo ver nenhuma delas” Pensa ao ouvir tantos murmúrios e cochichos baixinhos dentro daquele mar de escuridão.
E então, o leilão começa com o primeiro lance.
∞∞∞
Horas depois…
Um jardineiro poda as rosas cuidadosamente para o seu chefe. Ele trata as flores melhor do que as pessoas ao seu redor.
Quando termina seu trabalho, vê seu chefe chegar em casa com um belo rapaz com cabelos brancos e olhos rosados, vestido de quimono vermelho e maquiado, como se fosse uma linda mulher. E ele realmente poderia ser facilmente confundido com uma.
“Ele parece uma rosa branca. Perfeita, delicada… mas ele parece que estava chorando” Pensa o jardineiro.
— Tian Cheng, seu trabalho já acabou — diz seu chefe ao passar por ele com aquela beldade segurando sua mão. — O que ainda está fazendo aqui na minha frente?
— Desculpe, senhor, é que você mandou tirar os espinhos das roseiras e…
— Não me interessa, apenas vá embora — diz o homem segurando a mão delicada do rapaz ainda.
— Aqui tem rosas? — pergunta o rapaz com voz quase apagada.
— Tem, meu docinho — o homem acaricia a sua face com suas mãos grossas. O seu sorriso é malicioso e carrega uma dose de divertimento — Você pode caminhar pelo jardim amanhã. Agora, quero que conheça a nossa casa.
“Ele é mais outro pra coleção desse pervertido” Pensa Tian Cheng, vendo o rapaz com rosto delicado. “Mais outro lírio a ser usado e jogado fora”
Aquela situação lhe dava nojo toda vez que olhava para um deles… Mas não podia fazer nada. Ele é um pária miserável. O que poderia fazer?
— Eu… posso pegar uma rosa pra mim? — insiste o rapaz, como se até perguntar fosse fazer o mundo desmoronar.
— Claro, por que não? Tian Cheng, aproveita que você não tá fazendo nada e corte uma rosa sem espinhos para ele.
Tian Cheng obedece na hora, pega o galho de rosa cortada e coloca na palma do rapaz com cuidado, tocando os seus dedos finos sem querer. O jovem cheira a flor com delicadeza e diz:
— Obrigado, Tian Cheng — e pela primeira vez vê o rapaz sorrir, ainda segurando a rosa e a acariciando.
“Nossa, ele é mais lindo sorrindo assim!” Pensa Tian Cheng, vislumbrado. “E lembrou meu nome bem rápido”
O seu chefe não gostou muito de ver o rapaz sorrindo e dizendo “obrigado” para um mero jardineiro.
— Vamos, meu querido — o seu chefe arrasta o rapaz para longe de Tian Cheng. — E você, Tian Cheng, vai embora imediatamente.
— Sim, chefe… — responde Tian Cheng, vendo o belo rapaz ser guiado por aquele homem ríspido.
“Ele é cego, dá para perceber… Mas por que seu sorriso tinha que ser tão lindo?” Pensa meio ressentido. “Alguém assim, que lembrou do nome de um mero jardineiro e agradeceu gentilmente, realmente deveria pertencer a esse homem?”
Tian Cheng sabe muito bem o que vai acontecer com esse “lírio” hoje à noite, e quer não ser cúmplice nesse crime. Então, sai da mansão rapidamente, sentindo indignação de si mesmo, por trabalhar para esse tipo de pessoa desprezível.
Se ele pudesse, nunca mais voltaria para a mansão, mas…o mundo não é feito de rosas. Isso ele percebeu desde pequeno.
Lin Wei:
A rosa que o jardineiro me deu ainda está na minha mão, enquanto meu dono me segura firmemente na outra. Ele sabe que não vou fugir – isso é basicamente impossível com um chip implantado no seu corpo - mas quer ter total controle sobre meus passos.
— Aqui é a sala, meu querido — diz meu senhor, me guiando para um cômodo espaçoso. Consigo deduzir isso por causa do som que não é abafado. Ele guia minha mão até as poltronas com tecido macio, os sofás muito fofos e confortáveis. — Você tem permissão para andar por toda essa casa, enquanto eu estiver fora. Sinta-se como se a casa fosse sua.
— Está bem, meu senhor… — digo, tateando os móveis com cuidado. Percebo que existem algumas esculturas que imitam pessoas nuas. Toco os seus rostos com atenção. — Essas estátuas… parecem bastante realistas…
— E são, meu anjo — ele diz, tocando o meu pulso de leve e guiando minha mão até o seu rosto. — Não tem interesse de saber como é o rosto do seu senhor? Pode tocar, se quiser.
Sinceramente, não quero tocar seu rosto, mas como não posso fazer desfeita, tateio o seu rosto com cuidado. Sua pele é de um homem de uns 30 anos, sobrancelhas grossas, lábios carnudos, pele macia, apenas com algumas rugas aqui e ali na testa. Ele tem uma leve barba. Seu cabelo parece ser macio e liso…
— O que achou? — ele pergunta.
— Meu senhor deve estar em ótima forma — digo, tentando sorrir. — Seu rosto não tem imperfeições.
— Advinha quantos anos tenho.
— 30 anos?
— Errado.
— 35?
— Quase.
— 38?
— Chegando perto.
— 40?
— Acertou — ele diz, acariciando o meu rosto. — Fico feliz que achou que tenho 30.
— Bem, só pareceu ao toque… — sussurro, envergonhado, vendo que está agarrando minha cintura com força. — Por favor…
— O que foi? — ele sussurra, me cheirando no pescoço. — Você cheira a leite…
— Por que o senhor mandou cortar os espinhos das rosas? — pergunto, tentando disfarçar meu nervosismo ao ser tocado por ele.
— As rosas são lindas, mas não precisam de espinhos para existir… Espinhos só servem para atrapalhar e ferir quando pegamos. Me dá essa flor da sua mão. Amanhã você pode pedir outra…
— Eu gostei dessa — digo, afastando minha mão quando ele tenta retirar a rosa dela. — Quero guardar para mim.
— Ok, faça como quiser… — ele diz, lambendo meu pescoço. — Vamos para o quarto, não estou aguentando mais…
— O que…
E antes que eu pudesse terminar minha frase, ele me puxa pelos corredores com uma mão agarrando o meu braço. Meu coração bate forte que parece que vai sair da boca. Eu sei o que ele vai fazer. Eu só queria que não fosse hoje, logo no primeiro dia.
Depois de alguns passos, ouço uma porta se abrir e ele me puxa para dentro de um cômodo logo em seguida.
Escuto a porta ser trancada rapidamente, o que me dá uma sensação de sufocamento. Ainda estou segurando a rosa que Tian Cheng me deu. Tenho medo de soltá-la e não aguentar mais.
— Você sabe o que vai acontecer agora, né? — diz meu senhor, me empurrando para uma cama que imagino ser enorme. — Seus cuidadores te avisaram, não é mesmo?
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