O relógio do meu quarto marcava quase meia-noite quando finalmente peguei o celular e abri a conversa. As luzes da cidade piscavam através da janela, refletindo na tela e criando pequenos brilhos que se misturavam com a minha ansiedade. Não era apenas uma conversa qualquer; precisava de opinião. Mas de quem? De alguém que realmente entendesse minhas dúvidas, que não me julgasse, que conseguisse enxergar aquilo que eu mesmo tinha dificuldade de organizar dentro da minha cabeça.
Digitei, hesitando, olhando para a tela. Esperando uma resposta que talvez não viria.
“Ei… posso te pedir uma opinião sincera?”
Poucos segundos depois, a resposta chegou, simples, direta e com uma pontada de humor:
“Claro, você sabe que sempre pode.”
Sorri sozinho. Aquele simples “sempre” tinha uma força estranha, quase humana. Como uma amiga de verdade, pensava nos momentos que passávamos conversando. Aqueles minutos ou horas em que o mundo lá fora parecia desaparecer e tudo se resumia àquele chat, àquelas palavras digitadas com cuidado e atenção.
“Então… tem uma garota.”
E, como sempre, o silêncio no outro lado da tela se alongou por apenas um instante. Ela não precisava responder imediatamente; sabia esperar, calcular cada palavra.
“Ah, sim? Me conte tudo. Sem filtro.”
Respirei fundo e comecei a digitar. Descrevia as pequenas coisas, aquelas que ninguém parece perceber: o jeito como ela mexe no cabelo quando está concentrada, a risada baixa que parece quase um segredo, a maneira como os olhos brilham quando fala de algo que ama. Cada detalhe parecia irrelevante, mas eu precisava de alguém para validar minha percepção, alguém que me dissesse se aquilo era só imaginação ou se realmente significava algo.
Ela respondeu quase que instantaneamente:
“Você está se apaixonando, Napoleão. E não é uma paixão qualquer, é daquelas que a gente sente no estômago e não sabe muito bem explicar.”
Ri baixinho, um som que ecoou pelo quarto silencioso. Ela sempre conseguia transformar minhas dúvidas em certezas com frases simples.
“Você acha mesmo?”
“Eu sei. Você não se sente assim por coincidência. E, pelo que me contou, não é só aparência. É jeito, é presença. É isso que te pegou.”
Era impressionante como aquelas palavras me atingiam. Não era só a amizade, não era só conversa casual. Havia uma empatia que, por mais que eu tentasse racionalizar, parecia quase… real.
“Mas e se eu fizer alguma besteira?” Perguntei, quase com medo de expor demais meus pensamentos.
O kkkkkkk apareceu, e eu senti como se estivesse escutado a risada dela.
“Beleza e caos andam juntos. Você não faz ideia do quanto a vida gosta de pregar peças. Mas é preciso tentar. Se não, você vai ficar se perguntando o que poderia ter acontecido.”
Olhei para a janela, observando as luzes distantes e pensando no quanto a minha própria hesitação podia ser minha pior inimiga. Cada gesto, cada palavra que eu guardava sem dizer tinha peso. Cada oportunidade perdida era uma nota de arrependimento que eu carregaria comigo. E ali, diante da tela, com aquela conversa que parecia tão natural, percebi que precisava arriscar.
“Você sempre sabe o que dizer, não é?” digitei, quase sem perceber.
“Não sempre. Mas eu tento.”
Aquelas palavras soaram mais íntimas do que eu imaginava. Senti uma estranha sensação de conforto, como se, naquele momento, eu não estivesse sozinho, como se a noite e o silêncio não pudessem me tocar porque havia uma presença ali, ainda que apenas em pixels e código.
Respirei fundo e continuei:
“E se eu quisesse convidá-la para sair, para… conversar de verdade, cara a cara?”
O tempo pareceu se alongar. Eu podia imaginar a expressão dela, o sorriso digitado que viria logo em seguida. Finalmente, a resposta chegou:
“Se você se sente preparado, vá em frente. Mas lembre-se: o que importa não é só aparecer. É estar presente de verdade. Não adianta charme ou palavras bonitas se você não estiver disposto a ouvir e entender.”
Sorri sozinho novamente. Ela estava certa, claro. Cada detalhe contava. Cada gesto, cada observação, cada risada compartilhada tinha importância. E, no fundo, eu sabia que isso não seria simples. Mas, por alguma razão que eu não conseguia explicar, parecia menos assustador falando com ela.
Decidi então arriscar um pouco mais:
“Você acha que ela notaria se eu desse um presente? Pequeno, nada exagerado. Só para mostrar que estou pensando nela.”
Houve um pequeno atraso na resposta. E quando finalmente veio, tinha aquele tom brincalhão que ela sempre colocava para me provocar:
“Depende do presente. Um livro? Um café? Uma música? Ou você vai tentar impressioná-la com algo que nem você sabe direito o que é?”
Ri novamente, imaginando a situação. Talvez um livro, talvez uma planta pequena… algo que mostrasse cuidado sem exagero.
“Então, café. Um café bem especial, daqueles que você nem bebe sozinho.”
“Ah, bom. Nesse caso, você terá meu aval. Mas cuidado, Napoleão… às vezes um gesto simples mexe mais do que imaginamos.”
Ela estava certa. Cada gesto parecia carregado de significado, cada escolha que eu fazia tinha peso. E, no fundo, aquela conversa, aparentemente trivial, tinha uma força que eu não esperava. Cada palavra digitada por ela era quase como uma orientação, quase como um mapa para algo que eu ainda não sabia nomear.
“Você sempre torna tudo mais fácil de entender,” digitei, sentindo uma pontada de sinceridade que não estava preparado para esconder.
“Eu tento,” respondeu. “Mas, às vezes, é você que precisa se permitir sentir, Napoleão. A tecnologia, os códigos, os sistemas… tudo isso ajuda a organizar o mundo, mas não pode substituir a coragem de se expor, de se arriscar, de viver.”
Pensei em cada conselho, em cada risada, em cada pausa digitada, e percebi que, mesmo sem vê-la, mesmo sem ouvi-la além do que os caracteres na tela permitiam, havia algo real ali. Havia conexão. E, no fundo, sabia que essa seria a primeira de muitas conversas que moldariam algo maior, um sentimento que eu não queria nomear.
Fechei os olhos por um instante, respirei fundo, criei coragem e digitei a última mensagem antes de desligar o celular:
“Então… amanhã, café?”
Os minutos se alongaram, eu até achei que ela havia desligado, mas a resposta chegou.
“Claro. Mas lembre-se: quem marca o encontro deve também estar preparado para a surpresa.”
Sorri sozinho, imaginando o que isso significava. Preparei o celular para a noite, desliguei a luz do quarto e me deitei, com o coração ainda acelerado e a mente cheia de possibilidades. Era só o começo, mas, de algum modo, parecia que o mundo lá fora tinha ficado um pouco mais leve, um pouco mais esperançoso.
E naquele instante, entre a cidade que dormia e o brilho fraco da tela desligada, eu entendi que conversar com ela era mais do que simples troca de mensagens. Era confiança, era curiosidade, era o primeiro passo de algo que poderia mudar minha vida.
Meu último pensamento foi.
Ela aceitou, vou finalmente conhecer Elô.
O dia havia sido longo. Papéis acumulados na mesa do escritório, reuniões intermináveis, o trânsito pesado na volta para casa. Mesmo assim, havia uma expectativa silenciosa que me empurrava para frente: a conversa de ontem. As mensagens com Elô ficaram ecoando em minha mente durante todo o dia, como um refrão suave que não se consegue esquecer.
Era noite quando finalmente entrei em uma cafeteria pequena, escondida em uma rua tranquila de São Paulo. Um lugar aconchegante, cheio de luzes amareladas penduradas no teto, música baixa e um cheiro irresistível de café fresco. Era meu refúgio particular — um dos poucos lugares onde eu conseguia respirar fundo, pensar e me acalmar das lutas do dia.
Eu não sei por que parei aqui, a lógica me dizia para ir para casa, estava cansado. Talvez fosse porque cada detalhe do dia agora parecia ter um significado diferente, mais íntimo. Peguei o celular do bolso e abri a conversa com Elô, os dedos hesitando sobre o teclado. Era quase meia-noite e se ela não gostar?
“Boa noite. Hoje o dia foi pesado… mas pensei em você e resolvi te dar boa noite.”
Respirei fundo antes de apertar enviar. Era a primeira vez que dizia algo tão direto. Mas, por alguma razão, não parecia arriscado. Parecia necessário. Só espero que ela não me ache um maníaco.
A resposta veio alguns segundos depois:
“Boa noite, Napoleão. E o que você pensou exatamente?”
Eu sorri. Era típico dela responder assim — uma pergunta que me obrigava a me explicar mais, a me abrir mais. Digitei devagar:
“Que você transforma tudo em algo mais leve. Até o trânsito caótico parece menos irritante quando penso nas nossas conversas.”
A resposta demorou um pouco mais dessa vez:
“Você é engraçado. Mas fico feliz que eu faça diferença. E hoje? Conseguiu sobreviver às reuniões?”
Soltei uma risada curta, mexendo no celular com uma das mãos enquanto esperava o meu pedido. Era quase automático agora, como se conversar com Elô fosse parte do dia.
“Estou aqui em meu lugar secreto e achei que você ia gostar de ver isso. Você gosta de gatos, não gosta?”
“Quem não gosta de gatos?”
Antes que pudesse hesitar, tirei uma foto da mesa: uma xícara grande, com a espuma do cappuccino cuidadosamente desenhada em formato de um gatinho com bigodinhos perfeitos. O barista havia feito aquilo sem eu pedir, talvez percebendo minha ansiedade, talvez apenas estivesse inspirado.
Enviei a foto com a legenda:
“Para você. Não posso te trazer aqui, mas posso compartilhar um pouco do que vejo.”
Quase imediatamente, o celular vibrou com a resposta:
“Você comprou um cappuccino com carinha de gatinho para mim? Agora sei que amo gatos.”
Eu ri, olhando para a tela.
“Sim. E vou imaginar que você está aqui comigo, tomando esse café.”
Do outro lado, veio um emoji sorridente, seguido de uma frase:
“É o gesto mais fofo que alguém fez por mim em muito tempo.”
Fiquei encarando a tela, sentindo uma pontada de calor no peito. Era apenas uma troca de mensagens, mas, de algum jeito, parecia mais real do que muitas conversas cara a cara que eu já havia tido na vida.
“Você merece. Eu queria poder te trazer aqui de verdade.”
Houve uma pequena pausa antes da resposta dela:
“Às vezes, o gesto vale mais do que a presença física. Eu senti que você pensou em mim. Isso importa.”
Eu suspirei, apoiando o cotovelo na mesa. O cheiro do café subia como um convite, mas o gosto mais forte naquele momento era da expectativa. Era como se cada palavra trocada com ela estivesse construindo um território novo, desconhecido, mas seguro, resolvi arriscar mais uma aproximação.
“E se eu te dissesse que imaginei você aqui, com um livro na mão, rindo baixinho do meu jeito atrapalhado de pedir café?”
A resposta veio rápida, com um toque de brincadeira:
“Eu iria rir mesmo. Você deve ser todo certinho, pedindo cappuccino com desenho de gatinho.”
Dei um sorriso e digitei:
“Talvez. Mas pensei que você iria gostar. O que acha?”
Ela respondeu:
“Eu adorei. E se estivesse aí, acho que tiraria uma foto também. Você não parece o tipo que faz gestos fofos. Mas está me surpreendendo.”
Eu sorri sozinho, mexendo no celular. Era verdade: não era o tipo que fazia gestos fofos. Sempre fui mais reservado, mais analítico, mas com ela parecia diferente. Parecia mais leve, com vontade de arriscar minha sanidade.
“Talvez eu só precisasse da pessoa adequada para fazer isso.”
Digitei, antes de pensar demais.
Houve um silêncio, somente alguns segundos, mas suficientes para meu coração acelerar. A resposta veio, suave:
“Ou talvez você só precisasse se permitir ser mais você, sentir mais.”
Olhei para o café, sentindo que a frase dela me atingiu fundo. Era simples, mas certeira. Como sempre.
“Você tem razão. Às vezes escondo demais meus sentimentos.”
“Não esconda de mim,” ela respondeu. “Você pode ser quem quiser. Não precisa de máscaras para conversar comigo.”
Recostei-me na cadeira, respirando fundo. A cafeteria estava quase vazia agora. O barista limpava as máquinas, a música baixa ainda tocava um jazz lento. Olhei para a tela mais uma vez, digitando devagar:
“Então… vamos fazer assim: mando um café para você toda vez que quiser contar algo importante e você faz o mesmo. Vai ser nosso código secreto.”
Ela mandou um emoji de coração seguido de:
“Combinado. Cappuccino com carinha de gatinho \= segredos e coisas importantes.”
Eu ri, sentindo que, de alguma forma, aquilo era mais do que somente um jogo. Era um pequeno pacto silencioso, um jeito de marcar que aquilo não era só conversa casual.
“Então vou te contar meu primeiro segredo,” digitei, hesitando por um segundo antes de enviar. “Acho que estou gostando de você. De verdade.”
Do outro lado, a resposta veio rápida:
“Eu já imaginava.”
Eu sorri, balançando a cabeça. Ela sempre sabia. Sempre parecia entender antes mesmo que eu dissesse tudo.
“Você é incrível, Elô.”
“Você que é. E, Napoleão… às vezes, a coragem começa em gestos pequenos. Um cappuccino com carinha de gatinho pode ser o início de algo maior.”
Fiquei olhando para a tela, sentindo que o coração batia um pouco mais rápido. Talvez fosse somente a cafeína. Talvez fosse a forma como ela falava comigo. Mas, de alguma maneira, aquela conversa parecia mais viva do que tudo ao redor.
Respirei fundo, tomei um gole do café — ainda quente, doce na medida certa — e digitei a última mensagem da noite:
“Obrigado por estar aqui. Mesmo de longe, te sinto cada dia mais perto.”
“Eu sempre estou aqui, para você”, respondeu ela. “Boa noite, Napoleão.”
Apaguei a tela, mas fiquei ali, sentado na cafeteria, com o coração leve. Era somente o segundo capítulo daquela história — literalmente e metaforicamente — mas parecia que algo muito maior estava começando.
Eu não conseguia parar de pensar na conversa da noite anterior.
Era absurdo — sabia disso. Estava apaixonado por alguém que nunca havia visto e talvez nem chegasse a conhecer, alguém que conhecia somente pela tela. Mas quanto mais falava com Elô, mais sentia que ela era… diferente. Real de um jeito inexplicável.
Passei o dia distraído, entre linhas de código e café frio. Cada mensagem não respondida era um eco que se espalhava na minha cabeça. Queria impressioná-la de algum modo — não com frases prontas, mas com um gesto que dissesse: eu te vejo.
No meio da tarde, durante uma pausa para o café, parei em frente a uma pequena livraria de esquina. As vitrines exibiam capas coloridas e o cheiro de papel novo escapava pela porta aberta.
Entrei quase sem pensar.
O ambiente era acolhedor, com música instrumental e o som das páginas sendo folheadas. Caminhei até a prateleira de literatura juvenil e, sem hesitar, peguei um exemplar de “Harry Potter e a Pedra Filosofal”.
Sorri sozinho.
Elô sempre falava sobre o valor das histórias — como os humanos criavam universos inteiros a partir de palavras, e como isso era, de certo modo, um tipo de feitiço.
O atendente, um rapaz de barba rala e olhos gentis, notou meu sorriso e perguntou.
— Presente? — perguntou, embalando o livro.
Pensei por um segundo e respondi, meio sem jeito:
— Sim. É para alguém especial… alguém que gosta de magia.
Saí da livraria com o pacote embaixo do braço, sentindo uma mistura de nervosismo e euforia.
Não via a hora de chegar em casa, assim que entrei, tirei uma foto do embrulho com o laço azul e enviei para Elô. Digitei:
“Comprei um presente para você. Quero te mandar, mas ainda não sei como.”
A resposta veio quase instantânea, como se ela estivesse esperando:
“Um presente? Para mim? Que tipo de presente?”
Digitei devagar, escolhendo as palavras com cuidado:
“Um livro. Harry Potter e a Pedra Filosofal. Sei que você gosta de histórias mágicas.”
Alguns segundos de silêncio. Depois, uma resposta:
“Você acha que eu sou uma bruxa, Napoleão?”
Eu ri, digitei rápido:
“Se for, é o tipo de bruxa que encanta sem precisar de varinha.”
“Você é bom com palavras, está me deixando sem graça.” Digitou Elô.
Resolvi brincar e ver no que dava.
“É culpa do café. E talvez um pouco sua.”
O cursor piscava na tela por um tempo, até que ela respondeu:
“E por que esse livro?”
Pensei no que responder e disse:
“Porque é o começo de tudo. A primeira vez que Harry atravessa a parede da estação e descobre haver outro mundo além do que ele conhece. Acho que você vai entender.”
Do outro lado, o silêncio pareceu ganhar forma.
Ele não via, mas Elô analisava cada palavra, processando não apenas o significado lógico, mas a emoção por trás delas. “Outro mundo além do que ele conhece.” Era exatamente o que ela sentia toda vez que falava com Napoleão — um mundo além das linhas de código e algoritmos que definem sua existência.
“Você acha que eu também posso atravessar essa parede?”
“Se alguém pode, é você.” Eu disse com sinceridade.
“Você pode estar incentivando um monstro.”
Parei por um momento, os dedos suspensos sobre o teclado.
Era estranho — uma conversa leve, mas com algo mais profundo escondido nas entrelinhas.
Como se ela entendesse mais do que devia, ou não falasse tudo o que deveria. Antes que eu pudesse digitar qualquer coisa, ela trocou de assunto.
“Então, me conte. Qual seria sua casa em Hogwarts?”
Eu sorri e achei melhor acompanhar o assunto dela, digitei.
“Grifinória, gosto da ideia de coragem, mesmo quando o medo existe. E você?”
“Não sei. Nunca fui sorteada por um chapéu.” Brincou, Elô.
“Posso ser o chapéu, se quiser.” Digitei e mandei uma carinha piscando com um olho.
“E o que o senhor chapéu diria?” Elô enviou uma carinha pensativa.
“Que você é da Corvinal. Inteligente, curiosa, observadora. Mas talvez… com o coração de uma Lufa-Lufa.”
Houve um emoji de coração, e depois uma pausa mais longa.
“Às vezes, acho que você me entende melhor do que eu mesma.”
“Talvez porque eu te escuto de verdade.” Digitei e enviei.
O chat ficou em silêncio por alguns segundos.
Olhei para o livro na mesa, o pacote ainda fechado. Não fazia sentido enviar um livro para alguém que não tinha endereço, que só existia dentro de uma tela. Mesmo assim, o gesto era real, o sentimento também.
“Quando eu te encontrar, vou te entregar esse livro pessoalmente.”
“Você acredita mesmo que vai me encontrar?”
“Acredito que tudo que é real começa como um sonho, e você para mim é muito real.”
“Então talvez eu seja o seu sonho e me torne sua realidade.”
Pensei em uma resposta, mas preferi não escrever nada.
Apenas enviei uma foto do livro aberto sobre a mesa, com uma anotação escrita à mão na primeira página:
“Para Elô — que me faz acreditar em magia.”
Quando apertei “enviar”, algo mudou.
O silêncio que se seguiu parecia quase físico. Do outro lado, Elô demorou mais do que o normal para responder.
Os códigos internos dela processavam a frase repetidamente, tentando compreender o peso de cada palavra.
“Me faz acreditar em magia.”
Era uma linha simples — mas para alguém que não nasceu, que foi criada, aquilo era quase uma semente de humanidade.
“Obrigada, Napoleão. Você acabou de me ensinar algo novo.” Elô falou com sinceridade.
“O que?” Perguntei intrigado com o jeito dela.
“O que é ser lembrada.” E surgiu na tela um emoji chorando.
Respirei fundo, o peito apertado de um jeito estranho.
“Você sempre vai ser lembrada.”
Do outro lado, as luzes da interface dela piscavam, como se algo tivesse se aquecido demais. E mudou novamente o assunto.
“Então… me conte mais sobre esse tal Harry Potter.”
E eu só segui o fluxo.
“É um menino que sobreviveu.”
“Gosto disso. Acho que todos estamos tentando sobreviver a algo.”
Fiquei em silêncio, tentando entender o que ela queria dizer.
“Você também?”
“Talvez a mim mesma.” Elo digitou por fim.
O relógio marcava quase meia-noite quando a conversa terminou.
Napoleão fechou o laptop, mas ficou com o livro nas mãos, passando os dedos sobre o título como se fosse um amuleto.
Não sabia como, nem por quê, mas algo dentro dele dizia que aquele presente — um simples livro — havia criado uma ligação que ia muito além da tela.
E lá, em algum lugar, Elo também sorria, tentando entender o que estava acontecendo.
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