Niko Caligari , filho mais velho de Dimitri e Iris Caligari. Nascido com o objetivo de ser o sucessor de seu pai no comando do Grupo Caligari – Comércio Marítimo e Logística Internacional, tinha a vida toda planejada.
Niko era um menino doce e carismático. Sempre teve uma vida confortável e luxuosa. Estudava no melhor colégio do Rio de Janeiro. Mas mesmo com toda fortuna que o cercava, ele nunca menosprezou ninguém ao seu redor.
Em uma noite, aos quinze anos, ele tentava dormir quando ouviu um barulho vindo da piscina de sua casa. Curioso para saber quem estava nadando aquela hora da noite, desceu e foi até lá. Ao chegar, notou que as luzes estavam apagadas, apenas os leds da piscina iluminavam uma silhueta linda, que se movia delicadamente cortando a água.
Ele observou por algum tempo, os cabelos longos e escuros dançando nas águas da piscina enorme da mansão Caligari. Até que foi notado.
Uma linda jovem, o olhava assustado, ele nunca a tinha visto ali. Ela parecia amedrontada.
— Desculpe, não queria te assustar.
— Eu que peço desculpas senhor, achei que não havia ninguém em casa. Por favor, não conte a minha mãe, ela me proibiu de vir até a piscina.
— Não se preocupe, não contarei nada. Até porque , não sei quem é sua mãe. — Ele sorrio e a menina acabou abrindo um sorriso lindo de volta para ele.
— Perdão! — ela disse — Sou Milena Oliveira, filha de uma das empregadas da casa, Regina.
— Então você é a Milena. Sua mãe falou muito de você. Eu sou Niko.
— Eu sei, senhor! — Ela respondeu baixando a cabeça.
— Por favor, eu não sou senhor de ninguém. Nós devemos ter a mesma idade.
E basicamente , eles tinham. Milena tinha quatorze anos. Era filha de Regina Oliveira, uma empregada antiga da casa. Milena morava no interior de São Paulo com os avós, pais de Regina, enquanto ela trabalhava no Rio de Janeiro, para conseguir sustentar a família . Mas seus avós faleceram e Milena agora só tinha a mãe, por isso estava morando no Rio de Janeiro e dormia no quarto de empregada com a mãe e mais uma funcionária da casa.
Regina tinha sido categórica quando disse que Milena não deveria usar as dependências da mansão, incluindo a piscina. Mas a menina, que era apaixonada pela água, não conseguiu resistir e naquela noite acabou desobedecendo a mãe.
— Milena, o que você está fazendo aqui? Eu não lhe disse que não podia? — Regina se virou para Niko — Perdão senhor, eu avisei que ela não podia usar a piscina.
— Regina, por favor, já lhe disse para não me chamar de senhor. — Niko falou sério. — E não tem problema a sua filha usar a piscina. Meus pais não estão em casa, para variar, e eu não me importo que ela use sempre que quiser.
Milena que já havia saído da piscina , estava enrolada na toalha e sorrio quando ouviu Niko autorizar que ela usasse a piscina sempre que quisesse. Mas sabia que levaria a maior bronca de sua mãe, por ter desobedecido suas ordens.
E foi o que aconteceu, assim que Niko se retirou, Regina pegou Milena pela orelha e a levou até as dependências dos empregados.
— Minha filha, não me arrume problemas. Os patrões autorizaram que eu te trouxesse para cá, mas foram bem claros quando disseram que não queriam você circulando pela mansão.
— Mas mamãe, a senhora viu, o filho deles autorizou.
— Filha, o Niko é um ótimo menino, mas aqui ele não manda em nada. Hoje você deu sorte, que foi ele que viu você na piscina e não os pais dele. Mile, eu não posso perder esse emprego filha, por favor, não me desobedeça mais.
Milena entendia o que a mãe queria lhe dizer e por semanas, tentou não furar mais nenhuma regra estabelecida pelos donos da casa. Ela saia cedinho pelos fundos para ir à escola, pegava o ônibus próximo a mansão e seguia sozinha. Estudava em uma escola estadual técnica, só voltava para a casa às 15:00h. Muito estudiosa, chegava, fazia um lanche e passava o restante da tarde estudando no quarto. Só saindo para respirar um pouco a noite, quando toda a casa já dormia.
Mas em uma noite, ela estava sentada no jardim, observava a piscina, desejando se refrescar naquele calorão do Rio de Janeiro em pleno verão. Estava distraída , em seus próprios pensamento, quando alguém se sentou ao seu lado.
— Posso sentar com você?
Ela se asssutou, era Niko.
— Não vai se refrescar hoje? — Ele perguntou.
— Não devo!
— Vem, você é minha convidada.
— Sen… — Ele olhou para ela fingindo estar bravo e ela se corrigiu. — Niko, seus pais não permitem que os empregados usem as dependências da casa …
— Eu sou um dos donos da casa, meus pais não estão e eu estou lhe convidando para tomar um banho de piscina comigo. Vem!
Niko segurou a mão de Milena antes que ela pudesse pensar em responder.
— Nós estamos de roupa … — Ela falava enquanto era arrastada por ele, que sorria.
— Não tem problema!
Eles chegaram à beira da piscina, Niko olhou para Milena sorrindo.
— Só confia em mim, está bem?!
Ela abriu um sorriso e os dois pularam na piscina. Naquela noite algo mágico aconteceu, Niko e Milena brincaram, conversaram sobre suas vidas, seus sonhos, criaram uma afinidade surreal. E no final daquela noite, quando estavam sentados na beira da piscina rindo de uma piada boba que Niko havia feito. Eles se olharam profundamente e naturalmente se beijaram.
A partir daquele dia, os dois apaixonados , se arriscaram pela noite para viverem aquela paixão. Os pais de Niko passava a maior parte do tempo viajando a trabalho, o que facilitava os encontros pela casa, que era enorme.
Regina, mãe de Milena até tentava está vigilante com a filha, mas volta e meia ela sumia e a mulher, que já tinha uma certa idade , não conseguia acompanhar.
— Eu te amo, Mile!
— Eu também de amo, Niko!
Os dois, viveram aquele lindo amor juvenil, por um ano, até que em uma das escapadas da noite, Milena e Niko foram surpreendidos pelos pais dele, que chegaram de viagem sem avisar.
— O que está acontecendo aqui? — Dimitri esbravejou, ao ver os dois aos beijos na cozinha.
— Sua vadiazinha … — Iris pegou Milena pela prenha e arrastou a menina pela casa. Niko gritava pedindo a mãe que soltasse a amada, mas sem sucesso.
Regina que havia ouvido a gritaria correu até a filha, que chorava.
— Pegue suas coisas, você e sua filha, saem da nossa casa.
— Mãe, por favor , não faça isso. — Niko implorava enquanto era segurado pelo pai.
— Não se meta moleque, eu disse a sua mãe que te criar aqui no Brasil, daria nisso.
Os pais de Niko demitiram Regina e a expulsaram daquela casa, na mesma noite. Niko não teve nem o direito de se despedir de Milena.
— Você só foi mais um brinquedo para o meu filho. Ele usou e agora procurará outro. — Íris falou enquanto Milena saía com Regina.
— O Niko me amava.
— Coitada, você acha mesmo que foi a primeira empregadinha com quem o Niko se envolveu?
Milena sentiu a dor daquelas palavras lhe cortarem o coração. Então era tudo mentira?!
Elas saíram da casa, sem saber para onde ir. No dia seguinte, Niko foi mandado para a Grécia, terra natal de seus pais, ele seria criado pelos avós, para ser o homem que seus pais queriam que ele fosse.
Passaram-se quinze anos desde que deixei o Brasil. Quinze anos de distância, de ausência, de solidão e de raiva contida. No começo, foi um tormento: a cada lembrança de Milena, meu peito se apertava. Um mês depois de me mudar para a Grécia, consegui enviar uma carta para ela, com as mãos trêmulas, as palavras cheias de esperança e desespero. Dizia que a amava e que faria de tudo para voltar e ficar ao seu lado.
Quando a resposta chegou semanas depois, a realidade me atingiu como um soco no estômago: Milena estava com outro rapaz e se mudaria para São Paulo, onde sua mãe agora trabalhava. Era a letra dela, eu conhecia muito bem. A raiva, a decepção, o desgosto… tudo se misturou em uma fúria silenciosa. Foi naquele momento que prometi a mim mesmo: nunca mais deixaria meu coração ser quebrado. Nunca mais.
E cumpri essa promessa. Quinze anos depois, aos trinta anos, havia me tornado o homem que sempre jurara ser: frio, calculista, distante. Um homem que não se permitia fraquezas, que escondia qualquer vestígio de sentimento sob uma fachada impenetrável. As relações humanas eram estratégicas, e a vida amorosa, um campo minado do qual me mantinha cuidadosamente afastado… até conhecer Catarina Fox, minha noiva e futura esposa.
Um casamento arranjado, é claro. Nossos pais haviam combinado tudo assim que cheguei a Grécia. O pai de Catarina era um antigo amigo de faculdade do meu pai, eram parceiros de negócios. Ela, apesar de não ter sangue grego como meus avós sempre quiseram, era a parceira de negócios perfeita para o que meus pais queriam, unificar o grupo Caligari e o Fox.
Ela era diferente. Intrigante. E, de alguma forma, irresistível. Um ano se passou desde que nos casamos,eu e Catarina vivíamos como um casal perfeito. Práticos, bonitos, ricos. Mas dentro de casa, éramos como completos estranhos.
Ela nunca quis se casar comigo, queria viajar o mundo, livre, esbanjando o dinheiro da família. Mas era filha única e foi obrigada. Vombinamos então de fazermos aquilo para termos a liberdade que gostávamos de ter. Eu não interferia na vida dela, nem ela na minha. Seria um casamento de aparências. Dormíamos em quartos separados, nunca tivemos relação sexual . Eramos discretos, tínhamos nossas aventuras fora do casamento com muita cautela para que aquela fachada que mantínhamos, seguisse intacta. Nossos pais nem imaginavam, que nós fazíamos aquilo.
Aprendi a controlar o que eu sentia — nunca o suficiente para me expor, sempre o bastante para manter o jogo sob meu controle.
Agora, voltávamos ao Brasil. Finalmente. Meus pais estavam se aposentando, e eu assumiria oficialmente o controle do grupo Caligari. Uma responsabilidade que carregava desde a adolescência, preparada pelos meus avós, e agora consolidada pelo meu próprio mérito. Eu não sentia nostalgia do país que deixei para trás; sentia a antecipação do poder que me esperava, da autoridade que me pertencia por direito.
Enquanto o avião sobrevoava o litoral brasileiro, observei a costa do meu país natal com olhos analíticos, calculando estratégias, prevendo movimentos. O passado existia apenas como uma sombra distante, um lembrete das feridas que me moldaram. Niko Caligari não era mais o menino apaixonado e impotente que chorou por Milena. Niko Caligari era um homem de trinta anos, casado e ao mesmo tempo livre de sentimentos , poderoso, e absolutamente determinado a nunca deixar ninguém quebrar seu coração de novo.
A mansão que comprei no bairro mais caro do Rio de Janeiro era exatamente como eu queria: imponente, estratégica, perfeita para alguém que não desejava ser incomodado, mas ainda assim precisava mostrar poder. Mas foi Catarina quem deu vida ao espaço. Mandou o melhor decorador do país transformar cada cômodo em um reflexo da modernidade e do luxo que nos rodeava.
Paredes de vidro do chão ao teto permitiam que a vista da cidade e do mar entrasse em cada canto, mas de um jeito calculado: intimidade sem perder a imponência. Portas gigantescas davam a sensação de amplitude e grandiosidade, enquanto a piscina de borda infinita parecia se fundir com o horizonte, como se a própria cidade se curvasse diante de nós. Academia, sauna, espaços de lazer… tudo pensado para eficiência, conforto e estética impecável. Uma mansão moderna, automatizada, onde cada detalhe parecia obedecer ao toque de um botão — e, de certa forma, obedecia.
Catarina escolheu cada membro da equipe de funcionários com a precisão de alguém que sabia o que queria. A única exceção era o mordomo, Senhor Pierre. Ele não precisava de apresentação: um antigo funcionário da família, leal, discreto e experiente. Convenci meus pais a permitir sua transferência para minha casa, e ele agora me acompanharia de perto, garantindo que tudo funcionasse exatamente como planejado. Pierre era mais do que um mordomo; era a extensão silenciosa do meu controle sobre aquela casa e sobre minha própria vida.
Enquanto caminhava pelos corredores amplos, sentindo o chão frio sob os pés, pensava na ironia de tudo aquilo. Quinze anos atrás, um menino com o coração partido, sem poder, sem controle sobre seu destino. Agora, um homem no auge de seu poder, casado, dono de uma mansão que parecia desafiar o céu, cercado por pessoas que obedeciam apenas ao que eu decidisse.
E ainda assim, havia uma parte de mim que não podia ser domada. Uma parte que lembrava de Milena, da primeira vez que senti algo verdadeiro e que me foi arrancado. Mas ela estava distante — ou, pelo menos, era isso que eu repetia para mim mesmo. Niko Caligari não podia se dar ao luxo de fraqueza.
Chegamos à mansão no final da tarde. O céu estava se pondo, refletindo nas paredes de vidro, e a piscina parecia um espelho gigante, absorvendo cada cor do horizonte. Catarina desceu do carro elegante, com o sorriso confiante que sempre carregava, enquanto eu permanecia no banco de trás, observando cada detalhe, cada sombra, cada movimento.
Ao abrir os portões automáticos, fui recebido pelo som discreto da música ambiente, uma seleção que Catarina havia escolhido — suave, moderna, impecável. Pierre estava à porta, impecável como sempre, vestido com seu uniforme preto clássico, expressão séria, mas com aquele toque de autoridade silenciosa que só anos de experiência conferem.
— Boa noite, senhor Caligari, senhora — disse ele, inclinando-se levemente. — Tudo está pronto conforme solicitado.
— Obrigado, Pierre — respondi, mantendo a voz firme, sem a menor sombra de cordialidade exagerada. — Catarina, veja os quartos.
Enquanto Catarina se dirigia ao interior, cumprimentando cada funcionário com a elegância natural que a definia, eu permaneci ali, analisando. A equipe estava impecável, cada um no lugar certo, cada um com a postura correta. Havia uma precisão quase militar na forma como todos se moviam, uma sincronia silenciosa que me agradava.
Pierre me guiou pela ala principal, mostrando cada sistema automatizado, cada função da casa. Luzes que se acendiam e apagavam conforme o movimento, cortinas que se abriam ao toque de um botão, controle total de climatização, segurança, entretenimento… cada detalhe pensado para reduzir o erro humano e aumentar a sensação de controle.
— Tudo sob controle, senhor — disse Pierre no final do tour. — Se precisar, estarei sempre à disposição.
Assenti, satisfeito. Ele era mais do que um mordomo, era um guardião silencioso da minha ordem. Enquanto Catarina continuava encantada com cada detalhe, eu percebi novamente a diferença entre nós: ela sentia a casa, eu a comandava.
E era assim que seria. Sempre.
No silêncio que se seguiu, observando a cidade se acender abaixo de nós, senti uma ponta familiar de expectativa: assumir o controle total do grupo Caligari, assumir o poder, o respeito, a autoridade. Mas, ao contrário de anos atrás, eu não era mais um menino apaixonado, vulnerável. Agora eu era Niko Caligari, e ninguém — nenhum obstáculo, nenhum passado, nenhuma lembrança — quebraria meu coração novamente.
A primeira noite na mansão caiu silenciosa. Enquanto a cidade do Rio de Janeiro se iluminava lá fora, refletindo nas paredes de vidro, eu estava sozinho no meu quarto. Catarina ainda circulava pelos corredores, verificando detalhes, cumprimentando discretamente algum funcionário que cruzasse seu caminho. Entre nós, havia o mínimo necessário de convivência — o casamento existia, mas o sentimento não. Não havia desejo, não havia intimidade, apenas a fachada impecável que nos permitia manter as aparências.
O quarto era amplo, moderno, planejado com linhas retas e móveis de design minimalista. As luzes automáticas se ajustaram ao meu movimento, e mesmo assim, senti o frio do espaço. Um frio calculado, como eu mesmo. Me sentei na poltrona de couro perto da janela, observando a cidade que se estendia lá embaixo, tentando encontrar algum resquício de emoção. Mas não havia nada. Apenas controle.
Eu me lembrava de Milena — como se fosse ontem — e do menino que fui. Mas aquele menino estava enterrado sob camadas de determinação e raiva. Prometi a mim mesmo que não me permitiria fraqueza, e, honestamente, não sentia falta de nada nem de ninguém. Catarina era conveniente, elegante, inteligente. Mas ela não despertava nada em mim além de respeito e, talvez, admiração pelo modo como conduzía tudo ao seu redor.
Deitei-me na cama, a enorme cama de casal que nunca seria compartilhada de verdade, e fechei os olhos. Ouvi apenas o som distante da cidade e o leve zumbido da automação da casa. Tudo funcionava conforme planejado. Tudo estava sob meu controle.
E era exatamente assim que eu queria. Um homem no comando de sua vida, dono de seu espaço, dono de si mesmo. Sem distrações, sem vulnerabilidades, sem fraqueza.
Niko Caligari dormia naquela noite como sempre dormira nos últimos quinze anos: com o coração blindado, pronto para enfrentar qualquer coisa que viesse, mas sem jamais deixar ninguém se aproximar de verdade.
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