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Entre Sombras e Desejos

O encontro na escuridão

A noite parecia respirar junto comigo. O vento soprava pelas ruas estreitas como um sussurro frio, carregando o cheiro de chuva prestes a cair. Eu não deveria estar ali — não naquele lugar esquecido atrás da antiga igreja, onde os vitrais quebrados pareciam olhos que observavam cada passo. Mas havia algo na escuridão que me puxava, como se uma parte de mim sempre tivesse pertencido a ela.

A cada passo, o som dos meus sapatos ecoava contra as paredes úmidas. O silêncio era tão profundo que até minha respiração parecia alta demais. Apertei os braços em torno do corpo, tentando me convencer de que podia voltar a qualquer momento. Que não havia motivo para estar ali. Mas, no fundo, eu sabia que estava procurando por algo… ou por alguém.

Foi então que o vi pela primeira vez.

No fim do corredor, entre a penumbra e o brilho fraco de um poste quebrado, havia uma silhueta imóvel. Ele não se escondeu, não se mexeu, não pareceu surpreso com minha presença. Apenas estava ali, como se me esperasse.

O coração disparou em meu peito, mas meus pés se recusaram a recuar. Eu não conseguia desviar os olhos dele.

Era alto, os ombros largos delineados sob o casaco negro. O rosto estava parcialmente coberto pela sombra, mas seus olhos… aqueles olhos me prenderam como correntes invisíveis. Eram cinza, intensos, de um brilho quase metálico, que refletiam a pouca luz com uma frieza impossível de ignorar.

Tudo nele inspirava perigo. E, ao mesmo tempo, havia uma estranha gravidade que me puxava mais para perto.

— Perdida? — a voz dele quebrou o silêncio, baixa, grave, carregada de ironia.

Tentei falar, mas nada saiu. Minha garganta secou. Limitei-me a encará-lo, como se cada segundo diante dele fosse uma escolha entre fugir ou me deixar cair no abismo que ele representava.

Ele deu um passo para frente, e a luz revelou parte do seu rosto. Traços perfeitos, mas severos. Um maxilar marcado, a boca firme, os olhos ainda mais penetrantes agora que podiam me observar sem esforço.

Adrian Blackthorne.

O nome me atravessou a mente como um eco distante. Já o havia escutado antes — em conversas sussurradas, em histórias que pareciam lendas. O herdeiro de uma família amaldiçoada por tragédias, envolvida em negócios obscuros, envolta em rumores que ninguém ousava confirmar. Diziam que os Blackthorne carregavam sangue manchado, que atraíam a destruição onde quer que passassem.

E, ainda assim, ali estava ele, de carne e osso diante de mim.

— Você não deveria estar aqui. — Ele inclinou a cabeça, estudando cada detalhe do meu rosto. — Este lugar não é para pessoas como você.

Engoli em seco.

— Pessoas como eu?

Um sorriso lento e sombrio curvou os lábios dele.

— Inocentes demais para andar entre monstros.

Aquelas palavras me feriram mais do que eu gostaria de admitir. Mas, ao mesmo tempo, havia algo de fascinante em ser vista daquela forma. Como se ele me conhecesse melhor do que eu mesma.

Dei um passo para trás, mas a parede de pedra fria estava logo atrás de mim. Adrian percebeu. Seus movimentos eram calculados, quase predatórios, quando avançou mais um pouco. A distância entre nós diminuiu, e eu senti o calor do seu corpo contrastando com o frio da noite.

Seu perfume era intenso, amadeirado e escuro, como fumaça queimando devagar. Eu deveria ter sentido medo. Mas o que dominava meu peito era outra coisa: um desejo inexplicável, perigoso, que ameaçava consumir qualquer bom senso que me restava.

— Não deveria brincar com monstros, Elena — murmurou ele, pronunciando meu nome como se já o conhecesse há séculos. — Eles não sabem parar quando começam.

Meu coração bateu tão forte que doeu. Ele sabia meu nome. Como? Por que parecia já saber tudo sobre mim, até mesmo que eu estaria ali naquela noite?

Fiquei em silêncio, presa ao olhar dele, como se palavras fossem inúteis.

Adrian ergueu a mão devagar e pousou-a na parede ao lado do meu rosto. Não me tocou, mas a proximidade era devastadora. Sua respiração misturava-se à minha, quente, irregular, como se ele também lutasse contra algo dentro de si.

— Diga que vai embora — ordenou em um tom baixo, quase um sussurro. — Agora.

Eu deveria ter obedecido. Eu deveria ter corrido.

Mas o que saiu da minha boca foi o oposto:

— E se eu não quiser?

Um silêncio pesado caiu entre nós. Os olhos dele se fecharam por um instante, como se fosse atormentado por uma guerra interna. Quando voltou a me encarar, havia algo quebrado, quase vulnerável, escondido naquela máscara de frieza.

Ele aproximou o rosto, e nossos lábios quase se tocaram. O mundo pareceu parar.

— Então você vai se perder em mim. —

E naquele instante, percebi duas verdades que mudariam tudo:

Adrian não era apenas um homem. Ele era um enigma perigoso, feito de sombra e fogo.

E eu já estava perdida demais para fugir.

A marca do perigo

O silêncio depois das palavras dele me engoliu inteira. Não deveria brincar com monstros.

O mundo parecia ter parado naquele instante. O vento cessara, o som distante da cidade havia desaparecido, e tudo o que restava era o bater do meu coração, tão rápido e alto que eu tinha certeza de que ele também podia ouvir.

Adrian não desviava os olhos de mim. Sua presença era sufocante, como se enchesse cada espaço ao meu redor, me impedindo de respirar direito. Havia algo em seu olhar que não era apenas desejo — era domínio, era ameaça, era a promessa de um perigo do qual eu jamais conseguiria escapar se desse um único passo em falso.

Mas, apesar disso, eu não conseguia me mover.

— Você me conhece? — consegui perguntar, minha voz trêmula, mas mais firme do que eu esperava.

Um sorriso lento curvou os lábios dele. Não era um sorriso amigável; havia crueldade ali, um divertimento sombrio diante da minha ousadia.

— Eu conheço mais sobre você do que gostaria.

Arrepios percorreram minha espinha. Como ele podia saber meu nome, a minha presença ali, como se tivesse antecipado cada decisão que eu tomaria até aquele momento?

— Isso é impossível — sussurrei, quase para mim mesma.

Ele inclinou a cabeça, os olhos cinzentos faiscando sob a pouca luz.

— Nada é impossível quando se trata de você, Elena.

Minha respiração falhou. Ele não disse de pessoas como você. Disse de você. Como se eu fosse diferente, marcada, escolhida de alguma forma que eu ainda não compreendia.

Adrian deu um passo à frente, e, instintivamente, recuei. O choque da parede fria em minhas costas me lembrou que eu estava encurralada. Ele sabia disso. Estava me prendendo ali de propósito, e não fazia questão de disfarçar.

Sua mão se ergueu devagar, pousando na parede, ao lado do meu rosto. Não me tocou, mas a proximidade era devastadora. Sua presença queimava como fogo, e, ao mesmo tempo, era gelada como gelo cortando a pele.

— Você devia ter ficado longe — disse, a voz baixa, como um rugido contido. — Mas procurou a escuridão… e a escuridão sempre responde.

O timbre dele tinha algo de hipnótico, algo que entrava fundo nos meus ossos e fazia meu corpo esquecer de lutar.

Quis perguntar por que eu?, mas não consegui. Em vez disso, as palavras que escaparam dos meus lábios foram ainda mais perigosas:

— Talvez eu nunca tenha pertencido à luz.

Por um instante, os olhos dele se estreitaram, como se eu tivesse revelado uma verdade que ele já conhecia. Então, Adrian se aproximou ainda mais, o rosto a centímetros do meu. Sua respiração se misturou à minha, e meu corpo inteiro pareceu implorar por um toque que ele não dava.

— Diga que vai embora — ordenou em um tom rouco, quase suplicante, mas firme. — Agora.

Eu deveria ter dito. Eu deveria ter corrido. Mas havia algo dentro de mim que queimava, que pedia para ficar, para mergulhar cada vez mais fundo no abismo que ele representava.

— E se eu não quiser? — retruquei, a voz mais ousada do que o medo que me corroía por dentro.

O silêncio que se seguiu foi tão pesado que quase pude tocá-lo.

Os olhos dele se fecharam por um instante, como se travasse uma guerra contra si mesmo. Quando os abriu novamente, havia neles um brilho partido, uma vulnerabilidade escondida sob camadas de frieza e arrogância.

Ele me encarou como se eu fosse a maior tentação e a pior maldição de sua vida.

— Então você vai se perder em mim. — A voz dele saiu baixa, grave, carregada de um peso que parecia uma sentença.

E, pela primeira vez, percebi que talvez fosse exatamente isso que eu queria: me perder em Adrian Blackthorne.

Porque, no fundo, algo dentro de mim já sabia. Aquele não era apenas o início de uma história. Era o começo do meu fim.

O peso do passado

Depois daquela noite, eu deveria ter esquecido Adrian Blackthorne.

Deveria ter enterrado sua voz, seus olhos e a sensação sufocante que ele deixara em mim. Mas não consegui.

Havia algo nele que me perseguia em cada sombra, em cada silêncio. Eu fechava os olhos e ainda sentia o calor de sua respiração tão próxima da minha. As palavras dele ecoavam como um aviso impossível de apagar: “Você vai se perder em mim.”

Talvez eu já tivesse começado.

Duas noites depois, voltei ao mesmo lugar. Não sabia se por impulso, teimosia ou uma necessidade que me corroía por dentro. Parte de mim queria respostas; a outra parte só queria vê-lo de novo, mesmo que isso custasse caro demais.

A antiga mansão Blackthorne erguia-se no alto da colina, como um fantasma que se recusava a desaparecer. Janelas fechadas, cortinas pesadas, um portão de ferro enferrujado que parecia mais uma barreira simbólica do que real. A cidade inteira a evitava. Eu, ao contrário, atravessava seus portões com a respiração presa e o coração acelerado.

Ele estava me esperando. Eu sabia.

Quando a porta se abriu, não precisei de palavras. Adrian estava ali, imponente, com a mesma aura de perigo e mistério. O casaco negro caía sobre seus ombros como uma segunda pele, e seu olhar cinzento pareceu me despir até a alma.

— Você não aprende, não é? — Sua voz soou fria, mas havia um traço de algo escondido, como se minha presença o incomodasse e o atraísse ao mesmo tempo.

— Talvez eu não queira aprender — respondi, tentando soar firme, embora minha voz denunciasse o turbilhão dentro de mim.

Um músculo em sua mandíbula se contraiu, e, por um instante, vi algo além da máscara. Cansaço. Dor. Um fardo invisível que ele carregava com orgulho e raiva.

— Você não entende quem eu sou, Elena — disse, mais baixo. — Nem o que significa estar perto de mim.

— Então me faça entender. — Minhas palavras saíram rápidas, como se eu tivesse medo de que, se demorasse, perderia a coragem. — Me diga por que todos têm medo de você.

Adrian riu, um som sem humor, quase amargo.

— Porque eles sabem o que eu carrego. O nome Blackthorne é uma maldição. Onde quer que um de nós vá, a destruição segue.

Ele deu as costas, caminhando até uma estante de madeira antiga. Pegou uma garrafa de uísque, serviu-se e ficou em silêncio por alguns segundos antes de continuar:

— Meu pai morreu de forma brutal. Minha mãe… nunca se recuperou. Meu irmão desapareceu sem deixar rastros. E eu… sobrevivo. Só isso.

A maneira como ele disse sobrevivo doeu mais do que qualquer ameaça.

— Isso não explica por que você me conhece — sussurrei, incapaz de esconder minha inquietação.

Ele virou-se, e seu olhar cinzento se acendeu como lâmina.

— Eu conheço você porque estive observando muito antes de você perceber.

Meu estômago se revirou. Parte de mim deveria ter se assustado com aquilo. Mas outra parte — a parte mais perigosa — se sentiu desejada. Como se eu fosse importante de uma maneira que ninguém nunca me fizera sentir antes.

Adrian se aproximou lentamente, deixando o copo sobre a mesa. A cada passo, o ar parecia mais pesado, mais denso. Quando parou diante de mim, estava perto o suficiente para que eu sentisse a vibração de sua presença.

— Eu deveria afastar você. — Seus olhos queimavam. — Mas não consigo.

E, antes que eu pudesse responder, sua mão roçou minha pele pela primeira vez. Um toque breve, quase hesitante, mas que incendiou cada parte do meu corpo.

Foi nesse instante que compreendi: a escuridão não apenas responde quando você a chama. Ela envolve, prende e nunca devolve.

E eu já estava dentro dela.

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