Sob o Mesmo Teto
A volta
Minhas sapatilhas de balé deslizavam suavemente sob o chão frio do meu quarto, enquanto eu praticava os novos passos que aprendi na última aula. Cada movimento perfeitamente sincronizado com a música clássica que tocava alto em meus fones, barrando qualquer outro barulho externo que pudesse me desconcentrar.
Após repetir a mesma sequência de movimentos pelo menos três vezes seguidas, finalmente abaixei os fones e me sentiu em minha cama, permitindo-me descansar e beber um pouco d'água. De repente, minha porta se abre um pouco e vejo o rosto da minha mãe.
Elizabeth
Angelina, vá tomar banho e se arrumar, deixe os ensaios para outra hora.
Logo respondo. Mas uma dúvida ressoa em minha cabeça, então levantei o olhar novamente e a olhei, antes dela sair do quarto
Angelina
Espera... Me arrumar?
Perguntei sem entender, era uma quarta-feira, no fim de tarde. O que teria para fazer hoje de tão importante para ela me pedir para me arrumar?
Elizabeth
Teremos visitas, em menos de uma hora eles estarão aqui.
Respondi lentamente, estava com sono e um pouco lenta, mas logo acordo para vida ao escutar minha mãe exclamar.
Elizabeth
Vamos. Agiliza, Angelina!
Rolei os olhos discretamente e me apressei para ir me arrumar.
Após o banho, coloquei uma roupa simples, mas bem arrumada. Usava uma saia branca de pregas e uma camisa preta de botões, coloquei brincos prata e fiz uma maquiagem leve. Nunca fui muito fã de me arrumar muito, para ser mais exata, eu odeio chamar atenção.
Em frente ao espelho, penteei e sequei meu longo e liso cabelo preto, que contrastava lindamente com minha pele clara, ainda mais agora no inverno. Não é de se surpreender que eu seja muito pálida. Aqui em Mitsdale, o sol não aparece por muito tempo, nem mesmo muitas vezes no ano.
Até é uma cidade grande, bem, pelo menos para mim é..Mas sempre está chovendo ou nublado, tudo parece em preto e branco
capítulo dois
Após um tempo, terminei de me arrumar e desci até a sala, me sentei no grande sofá cinza, em frente à lareira e à TV. Liguei meu celular, assistindo e vendo posts nas minhas redes sociais, me comparando com qualquer blogueira estúpida, com a vida mais irreal e claramente programada para gerar esse sentimento em pessoas como eu. Vendo aquilo, me fazendo lembrar do quão medíocre e sem graça é a minha vida.
Convivo com o mesmo sentimento 90% do tempo, o tédio, ele me assombra incansavelmente.Tudo oque desejo é um pouco de adrenalina.
Suspirei e continuei assistindo no celular, mas ouço a porta se abrindo e minha mãe logo grita
Elizabeth
Angelina, vem aqui!
As visitas chegaram, revirei os olhos discretamente e me levantei do sofá, indo até à porta, ficando ao lado da minha mãe
Eram a Tia Luciana e Tia Esther! As melhores amigas da minha mãe, que moravam super longe
Elas se conheceram quando tinham minha idade, 15 quase 16. E não se separaram até hoje, a não ser pela distância. Esther mora em Madrid, na Espanha, e Luciana, Em Roma, na Itália. Foram morar fora e construíram suas famílias
Luciana
Ange! Quanto tempo, querida!
Disse Luciana me abraçando fortemente com um sorriso no rosto. Automaticamente retribuí o abraço e sorri para ela
Esther
Faz o quê? Uns três anos que não a vemos?
Completou Esther sorrindo e passando a mão em meu rosto
Esther
Ela tá tão grande!...
Sorri para elas e concordei com a cabeça. Levantei os olhos até a porta e então congelei por completo, arregalei os olhos, quase me engasguei em seco.
Parados, encostados ao batente da porta, me deparei com Gustavo e Luigi..
Os filhos das melhores amigas da minha mãe. Os conheço desde criança, sempre via eles nas visitas quase mensais que suas mães faziam à minha, além de sempre passar minhas férias e datas comemorativas com eles.
Já havia me acostumado com eles há muito tempo, mas ficamos três anos sem nos vermos, longe e sem notícias, agora eles estavam completamente diferentes.
Luigi, filho da Luciana, vindo da Itália, com cabelos castanhos claro e olhos azuis, tinha por volta de 1,78 de altura. Era lindo de se ver, tinha uma expressão serena no rosto como sempre. Quando percebeu meu olhar, apenas sorriu gentilmente para mim.
Gustavo, filho da tia Esther, tinha cabelos pretos, pele levemente bronzeada, os olhos escuros e penetrantes, algumas tatuagens nos braços e pescoço, ele nem parece ter 17 anos. Ele já me encarava fixamente, antes mesmo de eu olhar para ele.
Seus olhos escuros me fuzilavam, observando atentamente.
Disse enquanto se aproximava de mim com um sorriso grande. Senti meu batimento cardíaco acelerar um pouco com a proximidade. Não o via fazia muito tempo, ele estava mais alto e bonito..
Luigi me cumprimentou com um abraço, demorei um pouco, por conta de ainda estar surpresa, mas retribuí.
Angelina
Oi, Luigi. Quanto tempo.
Durante as pequenas frações de segundos que duraram o abraço, vi por cima de seu ombro, Gustavo estreitar o olhar com o gesto. Ele me encarou profundamente com aquela expressão fechada típica de sempre.
Após soltar o abraço, sorri para eles. Luigi me retribuiu um sorriso simpático.
Mas, vi Gustavo se aproximando de mim. Meu coração começou a palpitar dentro do peito, cada vez mais rápido, senti acelerar tanto que chegava a doer. Ele me intimidava muito, desde criança. Mas era extremamente bonito, com o olhar profundo e mandíbula marcada
Senti seu perfume masculino impregnar a sala e entrar pelas minhas narinas. Ele nem imaginava, mas tinha um efeito enorme sobre mim, mesmo sem fazer nada.
Ele parou bem na minha frente, com os braços cruzados sobre o peito, estava ainda mais alto, eu tinha que olhar para cima para ver seu rosto. Senti seus olhos queimarem minha pele, ele me olhava atentamente, cada detalhe meu, de cima a baixo. Estreitou um pouco os olhos e passou por mim com indiferença, entrando na casa
Capítulo três
Passei por ela sem dizer nada, ignorei sua presença como sempre fiz, mas agora está ficando cada vez mais difícil fingir indiferença perto dela. Angelina está ficando cada vez mais linda e magnética, ela me atrai tanto...E eu tenho controle disso, eu sempre estive no controle.
Mas não posso negar que agora não tenho tanta certeza de que vou conseguir me manter nos trilhos morando sob o mesmo teto que ela. Nunca nos demos bem, e nunca vamos!..Nós somos iguais, muito iguais, tanto que isso afeta na nossa convivência.
Eu vejo no olhar dela o tédio..a busca por adrenalina, algo que a tire da zona de conforto, ela gosta da sensação do caos..
Meu sangue ferveu ao ver o Luigi abraçando ela, qualquer tipo de contato, o mínimo que seja, me deixa louco, ninguém tem o direito de encostar nela se não for eu. Ninguém.
As coisas só pioram quando me lembro que passei três anos longe, sem poder saber com quem ela se envolveu. Quem a fez sorrir, e o pior, chorar. Quem a tocou..
Eu nunca pude a ter, nunca pude tocar ou falar com ela como o Luigi faz. Então eu me fechei completamente, sem deixar ela se aproximar. Odiar ela foi a única coisa que funcionou para reprimir um pouco o desejo.
Elizabeth
Venham meninos, trouxe a Angelina para vocês conhecerem.
Ela disse com a garotinha no colo. Os meninos a olhavam com os olhinhos brilhando, principalmente Gustavo, que até mesmo quase sorriu, coisa que não fazia com frequência.
Elizabeth foi até o sofá em que eles estavam sentados, para colocar a Pequena no colo deles para se conhecerem. A mulher estava prestes a colocar Angelina no colo de Gustavo.
O Garotinho estava com os braços abertos para receber ela no colo pela primeira vez, mas Esther intervém
Esther
Amiga, melhor não...
Disse ela com a expressão aflita, franzindo o cenho. Segurou o braço de Elizabeth e negou com a cabeça. Fazendo o garoto a olhar confuso e frustrado.
Elizabeth
Mas...por que não?
Ela logo olhou para Esther, tentando achar algum motivo plausível para não deixar o garoto perto da bebê.
Esther
O Gustavo é muito agressivo, tenho medo que ele faça algo a ela, melhor não.
Gustavo (5 anos)
Mas, mãe...
Ele tenta argumentar, mas logo é interrompido pela mãe.
Esther
Sem mas, Gustavo. Você sabe que é verdade, você é explosivo demais. Ela é muito pequena, filho, só tem dois anos.
O menino abre a boca para falar algo, mas como de costume, reprime, a raiva e frustração tomam sua mente.
Luigi(5 anos)
Posso pegar ela, tia?
O Garotinho pergunta sorrindo para Elizabeth, já abrindo os braços para pegar a pequena.
Ela coloca Angelina no colo do menino. Fazendo com que Gustavo olhasse com indignação, não entendendo qual o problema com ele e o motivo de não poder pegá-la também.
Elizabeth
Realmente, é tão bom que eles finalmente possam conhecer ela
Me lembro até hoje do dia em que conheci ela. Eu era apenas uma criança, não entendia o motivo de não poder brincar ou ficar muito perto dela. O que mais acabava comigo era ver ela sendo empurrada para o Luigi desde criança, sempre os dois. Eu era visto como o garoto problemático, não podia brincar com eles.
Eu acabei desenvolvendo uma raiva tão grande dela ao passar dos anos, por sempre estar com o Luigi. Por ser fraca, sempre a achei muito fraca, isso me irritava..
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