Ela voltou àquela cidade pequena e silenciosa, seu coração apertado como nunca. Fazia exatamente um ano desde aquele dia, o dia em que ele se foi. Um ano que parecia uma eternidade de dor sufocante.
Com as mãos trêmulas, segurava um buquê de flores vermelhas. Flores que ela queria deixar ali, perto dele, como um último gesto de amor e despedida. Mas, ao chegar ao cemitério, um nó se formou em sua garganta.
Ela parou diante da lápide. O nome dele, gravado em pedra fria, a encarava com uma frieza que parecia esmagar sua alma. Os olhos se encheram de lágrimas antes que ela pudesse pensar. Só conseguiu chorar — uma dor silenciosa e profunda, e sem querer, deixou que as flores escorregassem das mãos e caíssem ao chão.
Desesperada, virou-se e correu, sem olhar para trás. Aquele lugar não era feito para ela. Era demais. Ela não conseguia aceitar que ele tivesse partido. Não conseguia falar sobre o que aconteceu, nem olhar nos olhos dos pais dele. A culpa a sufocava.
Ela sabia que ele estava indo atrás dela naquela tarde fatídica. Eles tinham brigado, sim, mas o amor entre eles era mais forte que qualquer desentendimento. Ele tentava voltar com o relacionamento, consertar o que estava quebrado. Eles se amavam, mesmo na dor.
Mas a pista estava escorregadia. E então o carro deslizou e caiu do penhasco. Um acidente que ninguém poderia prever.
E, agora, tudo o que restava era esse silêncio pesado e a impossibilidade de dizer adeus.
Ela se sentou no banco do carro estacionado perto do cemitério, o corpo trêmulo e o coração apertado. A chuva fina começava a cair, como se o céu também chorasse com ela. As lágrimas escorriam sem controle, misturando-se com a água que molhava seu rosto.
Cada segundo ali parecia como uma faca perfurando o seu coração. A dor da perda, o peso da culpa, tudo se misturava em sua mente como um turbilhão impossível de conter. Ela repetia mentalmente o que poderia ter feito diferente, o que deveria ter dito, como poderia ter impedido que ele saísse naquela tarde.
Mas nada mudaria o passado.
Ela fechou os olhos, tentando afogar o sofrimento, tentando se convencer de que ainda havia esperança, que talvez aquilo tudo fosse um pesadelo do qual pudesse acordar. Mas não era.
O som de passos se aproximando a fez abrir os olhos rapidamente. E ao olhar pelo retrovisor do carro, era a mãe dele e voz suave dela chamou a sua atenção quebrando o silêncio como um fio tênue de consolo.
— Eu sei que dói — disse ela, com a voz embargada — Mas ele sempre vai estar aqui, dentro da gente. No amor que vocês compartilhavam.
Ela virou o rosto para não chorar na frente daquela mulher que também sofria. As palavras, embora verdadeiras, não apagavam a angústia que consumia seu peito.
— Eu só queria poder dizer adeus direito — sussurrou, quase para si mesma.
— Ele sentia o mesmo — respondeu a mãe dele, segurando a mão dela com força, já com o vidro do carro baixo — E a gente vai aprender a viver com essa falta, um dia de cada vez.
O vento trouxe o cheiro das flores vermelhas que ficaram no chão, um símbolo silencioso do amor que ainda resistia, mesmo na ausência.
Ela respirou fundo, sabendo que a caminhada para a cura seria longa, mas que, ali, naquele pequeno cemitério, havia a primeira semente de um recomeço.
O tempo parecia congelado naquela cidade que, um dia, fora o cenário dos seus momentos mais felizes. As ruas por onde ela caminhava agora pareciam mais vazias, como se carregassem o silêncio pesado da ausência dele.
Ao voltar para a casa onde haviam compartilhado tantos sonhos, ela se sentiu invadida por memórias que lhe cortavam o peito. Cada objeto, cada canto, era um lembrete cruel do que havia perdido — e do que não poderia mais recuperar.
Sentou-se na sala, observando o telefone no canto da mesa. Aquele aparelho que, um ano atrás, havia recebido a última mensagem dele, o último pedido de desculpas, o último “eu te amo” que jamais seria respondido.
Ela tentou chamar a atenção para o presente, para as tarefas do dia, mas tudo parecia sem sentido. A dor apertava o coração, e um sentimento de culpa insistia em sussurrar que, talvez, se ela tivesse cedido naquela briga, ele estaria vivo.
Não conseguia compartilhar o peso do seu luto — nem com a própria família, que tentava ser forte, nem com os amigos que evitavam tocar no assunto para não a magoar.
Ela sentia-se sozinha, naufragada em um mar de tristeza, esperando encontrar um porto seguro que parecesse real de novo.
Mas, no fundo, sabia que só ela poderia dar esse passo. Olhar para aquela dor, aceitar que o amor deles havia sido verdadeiro, e aprender a seguir com ele — não ao lado dele, mas com os momentos que viveram dentro de si, para não esquecê-los.
E então, naquela tarde, ela se levantou devagar, tentando sacudir a névoa que parecia envolver sua mente. Caminhou até a cozinha, onde os utensílios e ingredientes estavam ali, quase como se esperassem por ela.
Com as mãos ainda trêmulas, começou a preparar o prato favorito dele: lasanha de carne. Enquanto cortava a cebola e refogava o molho, as memórias vinham em ondas — ele rindo da maneira como ela queimava a borda da lasanha, ou reclamando, com um sorriso torto, que ela colocava muito queijo.
O cheiro do molho tomando conta da cozinha trouxe um conforto estranho, uma sensação de proximidade que parecia quase mágica. Era como se, por um instante, ele estivesse ali, naquela casa, naquela cozinha, compartilhando aquele momento simples, mas cheio de significado.
Ela colocou a lasanha no forno e, enquanto esperava, sentou-se à mesa. Pegou o celular, abriu a conversa antiga, relendo as últimas mensagens. O último “me perdoa” dele ficou ali, preso na tela, uma lembrança dolorosa do que nunca pôde ser consertado.
Um nó apertou sua garganta, mas ela respirou fundo. Por um momento, pensou que estava cozinhando para ele — um jeito de pedir desculpas por não ter conseguido salvá-lo. Mas não era para ele que ela cozinhava, nem apenas para a saudade que a consumia, e sim para si mesma. Para tentar aceitar que o amor que sentia podia continuar vivo, mesmo que ele não estivesse mais.
Quando o timer do forno apitou, ela serviu a lasanha em um prato branco, com cuidado, e levou até a mesa sozinha, tentando se reconectar com os momentos bons, com a força que o amor deles ainda podia lhe oferecer para ficar bem consigo mesma.
Os dias começaram a se misturar, como se o tempo tivesse perdido a vontade de seguir. Pela manhã, ela ainda se pegava olhando para o lado da cama, esperando encontrar o calor dele, apenas para se lembrar, com um aperto no peito, da ausência definitiva.
O caderno tornou-se um refúgio. Todas as noites, antes de dormir, ela escrevia para ele. Às vezes, cartas longas e carregadas de sentimentos; outras, apenas uma frase curta, mas sincera: "Sinto sua falta" ou "Hoje pensei em você o dia todo". Não importava o tamanho — escrever era a única forma de conversar com ele.
A cada página preenchida, sentia que um pequeno peso era retirado dos ombros. Mas, junto com o alívio, vinha um medo silencioso: o de que, com o tempo, a lembrança dele se tornasse distante. Por isso, ela guardava cada detalhe — a maneira como ele franzia a testa ao se concentrar, o riso que ecoava quando algo realmente o divertia, o calor das mãos grandes segurando as dela.
Certo dia, ao folhear o caderno, percebeu que estava criando uma coleção de memórias. Não apenas sobre o que viveram, mas também sobre como ele a ensinou a amar e a ser amada.
Naquela tarde, decidiu voltar à cozinha. Fez novamente a lasanha — o prato favorito dele. Não para alguém, mas para si mesma. Enquanto preparava o molho, lembrou de como ele dizia que o segredo estava em deixar o tomate cozinhar devagar, para o sabor se intensificar. Seguiu à risca, como se ele estivesse ali, supervisionando com aquele olhar orgulhoso.
Quando se sentou para comer, sozinha à mesa, sentiu um misto de tristeza e gratidão. Tristeza por ele não estar ali; gratidão por ter vivido um amor que valia a pena ser lembrado.
Naquela noite, os sonhos vieram. Ela o viu em um campo florido, com o mesmo sorriso de sempre. Ele não disse nada, apenas a olhou como quem diz: "Você vai ficar bem". Ao acordar, não chorou. Pela primeira vez, sentiu paz.
Os dias seguintes não foram livres de dor, mas algo nela havia mudado. Era como se estivesse aprendendo a caminhar novamente, um passo de cada vez.
Ela decidiu ir a praça, e encontrou uma senhora idosa. Elas conversaram por um tempo. A mulher contou sobre o marido que havia perdido há décadas, e como ainda conversava com ele em pensamento.
— O amor não acaba, minha filha. Ele só muda de forma — disse a idosa, apertando sua mão com delicadeza.
E naquele instante, ela entendeu que seguir em frente não significava esquecer. Significava carregar aquele amor dentro de si e permitir que ele fosse a força que a manteria de pé.
Guardou essa certeza no coração e, ao voltar para casa, abriu o caderno. Escreveu apenas uma frase:
"Hoje entendi que você nunca foi embora de verdade."
E pela primeira vez, não sentiu que estava escrevendo para alguém ausente. Sentiu que ele estava ali, em cada batida do seu coração, porque mesmo no silêncio que morava naquela casa ela podia ouvir o seu coração chamar por ele.
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