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Contrato Obsessivo

Prólogo — Contrato Obsessivo

lLorena Duarte sempre teve sede de liberdade. Desde criança, seu corpo parecia pequeno demais para conter os sonhos que rodopiavam em sua mente inquieta. Em cada traço que desenhava, havia um grito silencioso por espaço, por ar, por vida. O lápis era seu instrumento de fuga. O design, sua forma de protesto. Cresceu em um lar onde o afeto era tão raro quanto as flores em um deserto. A mãe, rígida, moldava sua rotina com uma frieza quase clínica. O pai, uma sombra ausente, aparecia e desaparecia, deixando no ar o cheiro de promessa quebrada.

Mas Lorena aprendeu cedo que sua maior proteção era o silêncio. O silêncio e a arte.

Quando tinha 15 anos, conheceu Leonardo Ferraz. Ele era o garoto que morava na casa ao lado, um jovem com os ombros carregados de um peso que ninguém via. Parecia esculpido em granito, sempre observando de longe, com olhos de um homem que carregava segredos grandes demais para a idade. Lorena se incomodava com o modo como ele a olhava, uma mistura de curiosidade faminta e cuidado não dito.

Ela, impulsiva e teimosa, costumava ignorá-lo. Chegava a rir de suas tentativas de aproximação, lançando comentários cortantes que o faziam estremecer. Não era maldade. Era defesa. Lorena sempre acreditou que amar era um risco que ela não estava disposta a correr. E, no fundo, talvez porque sentia a força magnética dele a puxando para um lugar do qual ela não sabia se sairia inteira.

Numa tarde de verão, Leonardo tentou se aproximar. Ofereceu um presente simples: um sketchbook, com capa preta, comprado com as poucas economias que tinha. Ele sabia do amor dela pelos desenhos, sabia que aquele caderno poderia abrigar o universo particular de Lorena. Mas ela, dominada pelo medo de se deixar tocar, rejeitou. Riu. Disse que não precisava de esmolas.

Naquele momento, Leonardo aprendeu a lição mais dolorosa da juventude: às vezes, a pessoa que mais queremos proteger é aquela que mais nos fere.

Ele partiu na semana seguinte. Uma viagem repentina para estudar no exterior, anunciada como uma oportunidade de ouro, mas que, na verdade, era fuga. Uma tentativa de calar o coração que pulsava alto demais toda vez que a via caminhar pela rua, com o cabelo solto, como uma chama viva.

Anos se passaram. Lorena cresceu, ergueu-se sozinha. Tornou-se uma designer de interiores requisitada, colecionando prêmios, contratos e admiradores. Mas por trás dos sorrisos ensaiados em eventos, existia uma mulher exausta de lutar contra as próprias emoções. Cada ambiente que criava era um reflexo do refúgio que ela mesma buscava. Cada textura, cada cor, era um convite silencioso para alguém que ela fingia não esperar mais.

Lorena acreditava que finalmente havia enterrado todas as memórias do garoto vizinho. Ela construiu muros tão altos ao redor do coração que se esqueceu de que, por trás de cada muralha, existe apenas uma mulher ainda querendo ser vista.

Então, Leonardo voltou.

Ele não era mais o adolescente calado, de olhos tristes. Agora, era o CEO de uma das maiores corporações do país, um homem de presença esmagadora, com passos que reverberavam pelo chão como um trovão contido. O terno escuro parecia uma extensão da própria pele. E o olhar... ah, o olhar. Ainda o mesmo: devorador, protetor, devastador.

O reencontro aconteceu num evento de gala. Lorena estava lá para assinar um contrato com uma nova construtora, sem saber que Leonardo era o rosto por trás do império. Quando o viu, o ar se dissolveu nos pulmões. O mundo girou. Ele caminhou em direção a ela com uma calma perigosa, como se soubesse exatamente onde cada célula do corpo dela estava.

Ela tentou fingir indiferença, mas falhou no primeiro segundo. Leonardo sorriu. Não um sorriso gentil ou amigável. Um sorriso que gritava vitória silenciosa.

— Lorena Duarte.

Ele disse seu nome como se saboreasse cada sílaba.

— A mulher que transformava espaços, mas sempre deixou o próprio coração vazio.

Ela estremeceu. O tom baixo, firme, arranhou a pele dela por dentro.

— Achei que você estivesse perdido em algum canto do mundo.

Ella retrucou, erguendo o queixo.

— E que fosse inteligente o bastante para ficar lá.

Ele aproximou-se mais. O perfume amadeirado, intenso, invadiu os sentidos dela. Leonardo inclinou-se, seus lábios quase roçando a orelha de Lorena.

— Inteligente?

Ele murmurou.

— Eu sempre fui inteligente. Por isso estou aqui. Por você.

Aquela noite foi o começo de uma guerra silenciosa.

Leonardo fez questão de se tornar o maior cliente da empresa de Lorena. Ela tentou recusar. Não conseguiu. O contrato era irrecusável, financeiramente, artisticamente, emocionalmente. Ele sabia exatamente o que fazer para prendê-la. Não apenas com cláusulas legais, mas com cada palavra, cada olhar.

Nos dias que se seguiram, Lorena tentou se manter fria. Mas Leonardo era uma tempestade elegante, impossível de evitar.

Havia momentos em que ele a observava trabalhar em silêncio. Ela sentia os olhos dele percorrendo suas costas, o pescoço, cada curva, como se já a tivesse decorado em outra vida. Ele falava pouco, mas quando falava, derrubava cada escudo.

— Você ainda desenha?

Ele perguntou uma tarde, segurando o sketchbook preto, intacto, que ela havia recusado anos antes.

Lorena perdeu o ar. O objeto parecia carregar toda a dor do passado. Ele segurava com cuidado, como se fosse um pedaço do coração dela.

— Eu não preciso disso.

Ela murmurou, virando o rosto.

Leonardo se aproximou, puxando-a suavemente pelo queixo para encará-lo.

— Não é uma questão de precisar. É sobre querer. E eu sempre quis você.

O toque dele queimava. O corpo dela, traidor, inclinava-se, pedindo mais. Mas a mente gritava para fugir.

A relação entre os dois se tornou um campo minado. A cada passo, uma provocação. A cada silêncio, um grito contido. O desejo era tão denso que parecia material, preenchendo o ar como fumaça.

Ele a provocava com gestos mínimos: um roçar de dedo na cintura ao passar, um olhar demorado que incendiava cada parte dela. Lorena respondia com farpas afiadas, tentando se agarrar ao orgulho. Mas, em cada confronto, deixava um pedaço de si mesma.

Em um dia chuvoso, presos juntos em um estúdio de projeto, aconteceu o que ambos fingiam evitar. Lorena reclamava da cláusula absurda do contrato que previa disponibilidade para reuniões a qualquer hora. Ele apenas a olhava, com a calma predadora de quem já ganhou a batalha antes mesmo de começar.

— Você me odeia tanto assim?

Ele perguntou, a voz baixa como um trovão distante.

— Eu não te odeio, Leonardo. Eu só me odeio por querer você.

As palavras escaparam antes que ela pudesse contê-las. Foi como soltar uma corrente invisível. Ele avançou, colou os lábios nos dela. O beijo não pediu licença. Não pediu desculpas. Era urgente, voraz, um reencontro de almas e feridas.

Lorena se agarrou ao terno dele, como se fosse a última âncora. Ele a ergueu facilmente, pousando-a sobre a mesa de trabalho, espalhando plantas e desenhos pelo chão.

Ali, entre rabiscos e projetos, eles se redescobriram. A entrega foi absoluta, sem roteiros. Ele explorava cada centímetro dela como se quisesse tatuar sua marca em cada curva. Lorena sentia o corpo inteiro vibrar, cada músculo em guerra com a razão.

Quando tudo terminou, ela chorou. Não pelas mãos dele, não pelo desejo. Mas porque, naquele instante, entendeu que nunca mais seria livre dele.

Leonardo segurou o rosto dela com as duas mãos, olhando direto em seus olhos, como se enxergasse até a alma.

— Eu sempre estive aqui. Mesmo quando você não me queria. Mesmo quando você ria de mim. Eu sempre voltei por você.

Ela não conseguiu responder. Não havia palavras que coubessem na garganta.

Depois daquela noite, nada foi igual. O contrato se tornou mais do que um papel. Tornou-se um elo invisível, feito de lembranças, beijos, suspiros e segredos. Lorena tentava resistir, mas cada toque, cada confissão, era uma nova corrente.

O passado deles, que ela jurava ter enterrado, voltou a florescer. As memórias do garoto de olhos famintos, do sketchbook rejeitado, dos olhares silenciosos na adolescência, invadiram cada pensamento.

E pela primeira vez, Lorena sentiu medo de si mesma. Medo de quem ela era ao lado dele. Medo do poder que Leonardo tinha para despedaçar e reconstruir seu mundo.

Eles não eram apenas um CEO e uma designer. Eram duas almas costuradas por um destino impiedoso, atraídas por uma força maior do que orgulho ou razão.

Lorena não sabia se aquilo era amor ou condenação. Só sabia que, de algum modo, sempre pertenceu a ele.

E Leonardo? Ele nunca teve paciência para amores frágeis. Não queria um romance suave. Queria guerra. Queria alma. Queria Lorena inteira, mesmo que isso significasse reduzi-la em cinzas antes de reconstruí-la.

Essa era a dança deles: um passo à frente, dois para trás, e um mergulho profundo no desejo que consumia ambos.

Quando Lorena finalmente percebeu que não podia mais fugir, já era tarde. O contrato não era apenas profissional. Era um laço escrito em pele, suor, memórias e sonhos interrompidos.

E, no silêncio do quarto, entre a respiração entrecortada e as mãos que a seguravam firme, ela entendeu: não existia saída. Só existia ele.

A partir dali, cada escolha seria um risco. E cada risco, um convite para se perder mais um pouco.

Era o começo de uma história que queimaria cada resistência.

Uma história de rendição, de cicatrizes e de um amor que jamais aceitou ser domado.

Capítulo 1 — O Monstro de Terno

Lorena nunca foi do tipo que se intimidava com portas de vidro espelhado, seguranças com auriculares ou recepcionistas de sorriso mecânico. Ela carregava no olhar a firmeza de quem aprendeu cedo a não abaixar a cabeça. Mesmo assim, naquele dia, ao entrar no edifício Ferraz Tower, sentiu a pele eriçar como se antecipasse um toque que ainda não existia.

O saguão principal era uma obra de arte em mármore negro, linhas minimalistas e lustres que refletiam no chão polido como estrelas presas ao teto. As paredes altas guardavam segredos em silêncio. E, em cada canto, o ar pesado de exclusividade lembrava a qualquer visitante que ali só entrava quem era convidado — ou quem fosse suficientemente corajoso para se convidar.

Ela caminhou com passos firmes, os saltos ecoando como batimentos cardíacos em ritmo acelerado. Cada olhar que a seguia parecia julgar cada movimento, cada fio de cabelo ruivo preso em um coque elegante. Mas Lorena sabia, desde pequena, que as pessoas só respeitam quem se impõe.

A assistente a guiou por corredores silenciosos, tão silenciosos que ela podia ouvir a respiração da mulher à sua frente. O cheiro do perfume caro, a tensão nos ombros... Tudo denunciava o que vinha a seguir.

Quando parou diante da porta dupla, Lorena inspirou fundo. Ali dentro, encontraria Leonardo Ferraz — o homem que assinava contratos com o mesmo descaso com que esmagava corações. O homem que transformava rivais em poeira, que comandava empresas como um regente conduzindo uma sinfonia sombria. O homem que ela acreditava conhecer apenas pelos jornais, mas que já a observava muito antes de ela imaginar.

— Senhorita Duarte, ele a espera.

A assistente abriu a porta e saiu como quem foge de uma tempestade.

Lorena entrou.

O escritório era uma cápsula suspensa sobre a cidade. Vidros do chão ao teto deixavam São Paulo parecer um tabuleiro iluminado. A mesa, minimalista e escura, parecia uma extensão do homem que a ocupava. E ali estava ele, de costas, observando a paisagem, como se a presença dela fosse apenas mais um detalhe irrelevante na agenda.

— Feche a porta.

A voz dele era um comando suave, quase um sussurro, mas carregado de aço.

Ela obedeceu. Não porque fosse submissa, mas porque aquela ordem soou como um convite irresistível a um jogo que ela não sabia se estava pronta para jogar.

Leonardo se virou devagar.

O terno perfeitamente alinhado, o corte preciso, o relógio suíço reluzindo no pulso , cada detalhe nele gritava. Mas não era isso que paralisava Lorena. Era o olhar. Dois lagos escuros e profundos, onde qualquer um podia se afogar se ousasse mergulhar.

Ela sentiu o ar rarefazer entre eles. Por um segundo, esqueceu como respirar.

— Senhor Ferraz.

A voz dela saiu firme, mas dentro do peito o coração martelava como um tambor em dia de desfile.

Os lábios dele se curvaram em um sorriso lento, quase cruel.

— Lorena Duarte. Finalmente cara a cara.

Ele caminhou ao redor da mesa, aproximando-se sem pressa. Cada passo era um capítulo não escrito.

— Você não parece surpresa.

— Eu esperava alguém intimidador. Você confirma a expectativa.

Ela ergueu o queixo, firme, mas a pele arrepiada denunciava o turbilhão por dentro.

Leonardo soltou uma risada curta, um som que parecia escavar a espinha dela.

— Ainda acha que é apenas um contrato?

Ele se aproximou mais, parando tão perto que ela podia sentir o calor do corpo dele.

— Um contrato é um contrato. Negócios, apenas isso.

Lorena manteve os ombros firmes, mas os joelhos tremiam sob a saia lápis impecável.

Ele inclinou o rosto, o olhar percorrendo cada detalhe dela como se a despisse sem pressa.

— Negócios, Lorena?

O nome dela soou como uma carícia proibida nos lábios dele.

— Você sempre foi boa em negar o que sente.

Lorena congelou. A frase caiu como um raio silencioso.

— Como...

Ela tentou recuar, mas ele segurou seu braço com firmeza, sem violência, mas com uma autoridade que eletrizava.

— Eu te observo há anos. Muito antes de você saber quem eu era.

Ele sussurrou, aproximando o rosto do dela.

— Acha mesmo que você foi escolhida por acaso?

Ela sentiu o mundo estreitar ao redor. Ele sabia. Sabia dos concursos que ela venceu, dos projetos que a destacaram, da exposição que a tornara uma promessa no design. E, agora, tudo parecia uma trilha silenciosa desenhada por ele.

Lorena tentou puxar o braço, mas ele a segurou.

— Você me odeia por isso?

Ele perguntou, os olhos incendiados de desejo contido.

— Eu não sinto nada.

Ela mentiu, as palavras saindo rasgadas.

Ele sorriu, um sorriso que era ao mesmo tempo ternura e ameaça.

— Lorena, você mente mal. Sempre mentiu.

O polegar dele roçou o pulso dela, um toque que parecia acender pequenas explosões sob a pele.

— Desde aquela noite, quando tinha quinze anos, lembra?

O estômago dela despencou. Uma memória que ela guardava como uma fotografia rasgada voltou com violência. Ela, adolescente, cheia de sonhos e arrogância, rejeitando o garoto que a olhava como se ela fosse o sol.

— Você…

O sussurro dela veio quase mudo.

— Eu fui embora por sua causa.

Ele aproximou-se mais, tão perto que ela podia sentir a respiração dele roçar seus lábios.

— E mesmo longe, eu nunca parei de cuidar de você.

Lorena tentou falar, mas o peito dela subia e descia em ondas incontroláveis.

— Eu te vi se formar, vi você abrir o primeiro escritório, vi cada linha que você traçou em cada projeto. E aqui estamos.

Ele soltou o braço dela devagar, como se marcasse um limite imaginário.

— Agora, você vai trabalhar comigo. Ou melhor, para mim.

Ela respirou fundo, o ar arranhando a garganta.

— Você acha que pode me manipular?

Ela ergueu o queixo novamente, tentando reconstruir o escudo que ele desmontava com palavras.

Leonardo deu um passo para trás, observando-a como quem aprecia uma obra rara.

— Manipular? Não. Eu apenas te dou a chance de descobrir quem você realmente é.

Ele se virou, voltando para trás da mesa, mas o silêncio parecia manter a conexão entre eles viva, como um fio invisível.

Lorena fechou os olhos por um instante. Uma gota de suor escorreu pela nuca. A mente gritava para correr, mas o corpo parecia fincado ao chão, magnetizado.

— O que você quer de mim?

A voz dela soou mais suave, quase uma confissão.

Leonardo apoiou as mãos na mesa, inclinando-se levemente.

— Quero tudo. O seu talento. O seu orgulho. E, principalmente, a sua rendição.

Os olhos dele ardiam, negros como uma noite sem lua.

Lorena sentiu as pernas fraquejarem. O coração, antes um tambor, agora era um trovão silencioso.

— Isso não vai acontecer.

A frase saiu em um sussurro, mas cheia de uma força frágil.

Ele sorriu. Um sorriso calmo, como quem já conhecia o final de uma história que o outro nem sonhava.

— Não hoje. Mas vai acontecer.

Ele se endireitou, ajeitando a manga do terno como se encerrasse uma reunião qualquer.

— Você pode sair.

Lorena demorou um segundo para entender. Então se virou, cada passo parecendo um esforço sobre-humano. Quando a mão tocou a maçaneta, ela sentiu o calor dele atrás.

— Lorena.

A voz dele foi baixa, quase gentil. Ela virou o rosto

— Não minta para si mesma. Nem para mim.

O olhar dela encontrou o dele. Um segundo que durou uma eternidade. Ali, naquele silêncio, ela percebeu que ele conhecia cada pedaço dela melhor do que ela mesma.

Sem responder, saiu do escritório, os joelhos ainda trêmulos. O corredor parecia mais longo do que antes. Ao atravessar o saguão, a respiração ainda curta, Lorena segurou a bolsa com força.

Do lado de fora, o vento frio a despertou como um tapa suave. Ela olhou para o alto da torre, onde, atrás daqueles vidros, um homem a vigiava.

Um homem que ela conheceu criança. Um garoto que ela humilhou sem entender.

Agora, ele era um CEO impiedoso, um monstro de terno.

Mas o que realmente a fazia estremecer não era o poder dele. Era a lembrança do garoto de olhos escuros, parado na chuva, esperando que ela mudasse de ideia.

O garoto que virou lenda. O garoto que voltou para reivindicar tudo.

Lorena apertou os lábios, o coração martelando contra o peito.

Ela sabia, mesmo que não admitisse: nada na vida dela seria igual depois daquele encontro.

A partir dali, cada projeto, cada linha traçada, cada respiração seria um convite silencioso para um jogo perigoso.

Ela não queria participar. Mas também não conseguia fugir.

A mente dizia "não".

O corpo, em silêncio, já dizia "sim".

Lorena não sabia ainda, mas a semente havia sido plantada.

E, dentro dela, germinava um desejo tão avassalador quanto o medo.

Naquele dia, Lorena não saiu apenas de um escritório.

Ela saiu carregando um segredo que mudaria tudo: o de que, no fundo, uma parte dela sempre quis ser dele.

E Leonardo, com seus olhos de noite profunda, sabia disso desde sempre.

Ele só estava esperando o momento certo para fazer a última jogada.

Capítulo 2 — A Designer Que Não Se Cala

Lorena não dormiu naquela noite.

Cada minuto foi uma batalha entre razão e desejo. Entre querer fugir e querer ficar. Entre odiar Leonardo Ferraz e desejar sentir novamente o calor da mão dele em sua pele.

Ela se revirou na cama, lembrando do olhar que a despia sem piedade. O rosto dele era uma lembrança viva, pulsante, latejando como um segredo proibido. O toque, o sussurro, a promessa velada… Tudo ecoava nela como um sopro quente, teimoso, impossível de silenciar.

Quando o dia nasceu, Lorena se levantou com os olhos marcados de cansaço, mas a postura ainda era firme. Prendeu os cabelos em um coque polido, vestiu um macacão branco de corte impecável, deixando os ombros à mostra — um detalhe sutil que lembrava ao mundo que ela não era mulher de se esconder.

Ao chegar ao prédio onde seria a apresentação oficial do projeto, Lorena sentiu cada célula do corpo vibrar. Ela não era apenas uma convidada. Não era apenas uma designer contratada. Ela era a mente por trás do novo conceito arquitetônico que mudaria o skyline de São Paulo.

Mas, acima de tudo, era a mulher que Leonardo Ferraz escolhera , ou melhor, caçara; para entrar no jogo.

O salão de vidro e aço estava repleto de executivos, investidores, jornalistas e curiosos. O ar cheirava a champanhe caro e ambição crua. Cada sorriso era uma faca, cada aperto de mão, uma dança silenciosa de egos.

Lorena cumprimentou algumas figuras conhecidas no meio artístico, mas evitava se deter. O estômago embrulhava ao pensar que a qualquer momento ele apareceria. E apareceu.

Leonardo surgiu como uma tempestade contida. O terno cinza escuro, perfeitamente alinhado ao corpo forte, combinava com a gravata preta e o sorriso lento que nunca era apenas um sorriso. Era uma ameaça silenciosa. Uma promessa não dita.

Os olhos dele encontraram os dela assim que entrou. Lorena sentiu os joelhos fraquejarem, mas manteve a coluna ereta, o queixo erguido. Havia algo felino na forma como ele se movia, como se possuísse cada metro do salão.

— Senhorita Duarte.

Ele se aproximou, estendendo a mão. O tom formal contrastava com o olhar que dizia tudo, menos formalidade.

Ela segurou a mão dele, apertando com firmeza.

— Senhor Ferraz.

O sorriso dela era afiado, quase provocador.

— Está preparada?

Ele perguntou, aproximando-se mais do que o protocolo pedia.

— Sempre.

Ela respondeu, prendendo o ar quando sentiu o polegar dele roçar a palma da sua mão, um gesto rápido, clandestino, mas que incendiou cada nervo do seu corpo.

Eles permaneceram se olhando por segundos que pareceram horas. Até que um assessor interrompeu, anunciando o início da apresentação. Leonardo a soltou, mas Lorena sentiu o calor persistir, como se ele ainda a segurasse.

No palco improvisado, a maquete iluminada do novo prédio ocupava o centro. As câmeras se posicionaram, os convidados se agruparam. Lorena subiu ao microfone, consciente de cada respiração, de cada gota de suor escorrendo na nuca.

Ela respirou fundo. Aquela era a chance de mostrar quem realmente era. Não apenas uma peça no tabuleiro de Leonardo, mas uma mulher capaz de incendiar o próprio caminho.

— Boa noite a todos.

A voz dela soou firme, reverberando no salão.

— Antes de mostrar cada linha desse projeto, quero falar sobre o que realmente importa: liberdade criativa.

Um burburinho percorreu a plateia. Ela viu o olhar de Leonardo se estreitar, curioso, atento.

— Quando aceitei esse desafio, pensei que seria apenas mais um prédio. Mais um arranha-céu brilhante para competir por atenção na cidade. Mas percebi que um espaço só é verdadeiramente vivo quando conta histórias.

Ela fez uma pausa, o olhar percorrendo o público.

— E esse prédio não é só aço e vidro. Ele é sobre pertencimento, sobre coragem de se mostrar sem medo.

O silêncio virou um tapete estendido aos pés dela. Lorena se sentiu maior, invencível.

— Eu não desenho para bajular egos. Não construo para esconder cicatrizes. Eu crio para revelar, para tocar. E se alguém não entende isso, não deveria estar no palco comigo.

Alguns executivos trocaram olhares tensos. O jornalista da primeira fileira digitava furiosamente. Lorena ouviu um leve murmúrio vindo do lado direito do salão.

Leonardo não piscava. Os braços cruzados, o semblante indecifrável. Mas os olhos... os olhos queimavam.

Ela continuou:

— Este projeto é uma ode à transparência. À força de quem ousa existir sem se dobrar.

O olhar dela foi direto para Leonardo.

— E ninguém, absolutamente ninguém, vai me dizer como devo criar ou quem devo ser.

O silêncio se partiu em um aplauso tímido que logo se transformou em uma onda de palmas. Lorena sorriu, agradeceu, e sentiu um calor subir pelas veias.

Quando desceu do palco, Leonardo a interceptou.

— Uma apresentação ousada.

Ele falou baixo, tão perto que ela podia sentir o perfume amadeirado invadir seus sentidos.

— Eu não nasci para sussurrar, senhor Ferraz.

Ela ergueu o queixo, a voz vibrando.

Ele aproximou-se ainda mais, roçando os lábios na curva da orelha dela.

— E quem disse que eu quero que você sussurre?

Ele murmurou, fazendo cada músculo dela contrair.

— Eu quero ouvir você gritar.

Lorena estremeceu. A respiração dela ficou curta, os olhos buscando um ponto de apoio que não existia.

— Você está ultrapassando limites.

Ela tentou se afastar, mas ele segurou delicadamente o pulso dela.

— E você adora quando eu ultrapasso.

O tom dele era uma carícia perigosa, um convite que queimava por dentro.

Ela puxou a mão, o rosto tingido de raiva e desejo. Ele sorriu, satisfeito, como se aquela reação fosse exatamente o que ele queria.

— Eu sou a profissional aqui.

Ela disse, as palavras saindo afiadas.

— E você não vai me usar como marionete para seu jogo pessoal.

Leonardo inclinou a cabeça, os olhos cravados nela como lâminas suaves.

— Você não é marionete. Você é fogo. E eu pretendo me queimar em você todas as vezes que puder.

Lorena sentiu o coração tropeçar no peito. Era impossível negar o magnetismo dele, o modo como cada palavra parecia uma promessa perigosa.

Ela se virou, decidida a se afastar, mas ele segurou o braço dela mais uma vez, dessa vez com força suficiente para fazê-la parar.

— Não termine essa conversa assim.

A voz dele era baixa, mas vibrava como trovão contido.

— Eu esperei muito tempo para ter você diante de mim de verdade.

Ela virou o rosto, os olhos marejados de raiva e de um desejo que se recusava a morrer.

— Então continue esperando. Porque eu não sou uma peça no seu tabuleiro, Leonardo. Eu sou o tabuleiro inteiro.

Ele sorriu, um sorriso que carregava segredos e saudade, lembranças de noites antigas, memórias que ela preferia esquecer.

— Você sempre foi a única capaz de me derrubar.

Ele falou, aproximando-se mais uma vez, o nariz roçando de leve a bochecha dela.

— Mas também sempre foi a única que eu quis reconstruir.

O toque sutil fez o corpo dela vibrar como uma corda tensa. Lorena queria empurrá-lo, mas ao invés disso, fechou os olhos por um segundo, permitindo-se sentir.

Então, abriu os olhos e se afastou de uma vez, rompendo o laço invisível que ele insistia em puxar.

— Eu não preciso de você para existir.

Ela murmurou, andando em direção à saída.

Ele a seguiu com o olhar, o sorriso nos lábios como se soubesse que aquilo era apenas o começo.

Lorena atravessou o salão sentindo cada passo pesar, cada olhar a seguir. Ela sabia que todos estavam comentando. Sabia que a imprensa transformaria aquela noite em manchetes inflamadas. Mas, no fundo, algo dentro dela ardia de orgulho.

Ela tinha enfrentado o monstro de terno. E não apenas sobrevivido — ela tinha incendiado o jogo dele.

Ao sair, o ar da noite abraçou a pele quente dela. O coração martelava, os pensamentos corriam como faíscas.

Lorena apoiou a mão na parede fria do prédio e respirou fundo. Não havia mais volta. Não depois daquele olhar, daqueles toques, daquelas palavras.

Ela sabia que, a partir daquele instante, tudo ficaria mais intenso. O contrato, o projeto, a convivência. O jogo perigoso que os unia agora tinha uma chama viva — e não havia como apagá-la.

Lorena se afastou, sem olhar para trás. Mas, no fundo, ela sabia: Leonardo Ferraz não era o tipo de homem que aceitava ser desafiado em público. E muito menos o tipo que desistia de quem desejava.

Ela só não imaginava até onde ele seria capaz de ir para tê-la.

E, enquanto caminhava pela calçada vazia, a respiração irregular, Lorena percebeu uma verdade brutal: não era apenas ele que estava obcecado. Uma parte dela também.

Uma parte que já começava a desejar ser dele.

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