NovelToon NovelToon

Dois Corações, um Destino

Aurora

Roma, 7h da manhã.

O som do despertador tocou suavemente no quarto arejado, onde a brisa matinal invadia pelas janelas abertas. Cortinas de linho esvoaçavam como véus encantados, e o aroma de lavanda pairava no ar, vindo do difusor sobre o criado-mudo. No centro do cômodo, um casal repousava em silêncio.

Aurora Bellini abriu os olhos devagar. Seu corpo delicado ainda envolvido no calor dos lençóis brancos. Ao lado dela, Dante Moretti dormia de lado, com a testa ligeiramente franzida, como se mesmo em sonho estivesse envolto em preocupações. Era raro vê-lo tão vulnerável. Ali, no silêncio da manhã, era possível enxergar o homem por trás do império.

Ela ficou alguns segundos apenas o observando. A luz do sol acariciava os traços definidos do rosto dele — o maxilar forte, os lábios firmes, os cílios longos que contrastavam com sua habitual frieza. Com os outros, ele era distante, calculista, até cruel. Mas com ela… ele sorria. Era a única que o fazia rir, a única que via o Dante por trás do CEO.

Aurora

Aurora se sentou lentamente, puxando os cabelos castanho-claros em um coque frouxo. Caminhou em silêncio até a varanda. De lá, via-se o coração pulsante de Roma: o Coliseu à distância, a vida urbana começando a se mover como uma coreografia de dança. Ela respirou fundo. Aquela cidade não era sua, mas era o lar que construíra com Dante nos últimos dois anos e meio.

Com uma xícara de chá nas mãos, ela sorriu ao lembrar da noite anterior. Havia se apresentado num espetáculo beneficente e, pela primeira vez em meses, Dante apareceu para vê-la dançar. Seus olhos fixos nela no palco pareciam absorver cada movimento. Depois, ele a elogiou de um jeito que ainda fazia seu coração disparar.

Mas também havia algo estranho nos últimos dias…

Ele andava calado demais. Distraído. Seu toque, ainda presente, estava diferente. Como se uma sombra o rondasse.

Ao retornar para o quarto, Dante já estava sentado na beira da cama, vestindo uma calça de alfaiataria escura e abotoando os punhos da camisa branca. Seu cabelo castanho-escuro ainda molhado do banho, e a expressão... distante.

— Bom dia — disse ela com suavidade, sentando-se ao lado dele.

— Dormiu bem? — ele perguntou sem olhar diretamente em seus olhos.

Dante

Ela assentiu, mas algo dentro dela se contraiu. Ele não a beijou, não sorriu, não tocou seu rosto como sempre fazia. Apenas se levantou e pegou o paletó no armário.

— Vai sair cedo hoje?

— Reunião com investidores em Milão. Preciso ir direto para o aeroporto.

Aurora se levantou, o robe esvoaçando sobre sua pele clara. Aproximou-se devagar.

— Quer que eu vá com você?

Ele hesitou. Apenas por um segundo. Mas bastou para que ela sentisse a resposta antes mesmo de ouvi-la.

— Melhor não. Volto amanhã. — Ele desviou.

Ela forçou um sorriso e o abraçou. Dante permitiu o abraço, mas não o retribuiu como antes. Era como se um pedaço dele estivesse distante, ausente. E ela não sabia o motivo.

Naquela tarde, Aurora foi até o Centro de Dança da Villa Borghese, onde ensaiava com seu grupo de balé e também treinava patinação artística, sua paixão desde a infância. A música clássica ecoava pelas paredes enquanto ela girava com graça, executando cada passo com precisão impecável.

Mesmo em meio à leveza da dança, seu coração estava inquieto.

— Você está bem? — perguntou Chiara, sua melhor amiga, que acabava de chegar, tirando o casaco enquanto observava Aurora girar no centro da pista de patinação.

Chiara

— Não sei... Dante está estranho. Frio. E eu sinto que tem algo que ele não me conta.

Chiara franziu o cenho. — Já conversaram?

— Tento, mas ele escapa. Fala de trabalho, finge normalidade. Eu o conheço. Tem algo errado.

Chiara se aproximou, segurando suas mãos. — Aurora, se algo te machucar, você sabe que pode ir para casa. Florença é seu lar. Seus pais, Leo... todos sentem sua falta.

Aurora sorriu com ternura. — Eu amo Dante, Chiara. Mas algo está mudando. E eu não sei se estou preparada para descobrir o que é.

Mais tarde, naquela noite, ao deitar-se sozinha na cama enorme e fria, Aurora tentou não pensar demais. Mas a inquietação crescia como uma nuvem escura sobre sua alma. Dante não respondeu suas mensagens. E uma sensação estranha se instalou — como se uma tempestade estivesse prestes a cair.

Ela não sabia ainda, mas a sombra que rondava seu relacionamento tinha nome, rosto... e estava prestes a reaparecer.

Continua….

Dante

O avião particular cortava as nuvens em velocidade constante, mas a mente de Dante Moretti estava longe dali. Ele observava o céu escurecido pela janela, os olhos fixos no vazio, enquanto o silêncio preenchia a cabine. O telefone repousava ao lado, desligado. Pela primeira vez em semanas, ele não quis responder ninguém.

Nem mesmo Aurora..

E isso o assustava.

Dante não nasceu frio — ele se tornou. Filho de um dos empresários mais poderosos da Itália, cresceu sob o peso de expectativas impossíveis. Desde pequeno, ouviu de Lorenzo Moretti que sentimentos eram fraquezas, que amor era uma distração, e que o sucesso exigia sacrifício.

— “Você será maior do que eu, Dante. Mas para isso, precisa ser implacável.” — A voz do pai ecoava como uma maldição.

Sua mãe, Vittoria, era elegante e silenciosa, sempre presente em jantares e aparências, mas ausente na essência. O único afeto real que Dante conheceu foi da irmã mais nova, Bianca — com quem dividia confidências escondidas nos corredores do Palazzo Moretti.

Aos vinte e oito anos, já era um CEO imbatível. Comandava cinco empresas, investia em imóveis, moda, tecnologia e arte. Tinha tudo… exceto paz.

E então, Beatrice apareceu. Linda, culta, perfeita para os padrões da sociedade. Por dois anos, foram o casal mais comentado de Roma. Mas na véspera do casamento, ela fugiu. Deixou apenas um bilhete e um silêncio ensurdecedor.

“Desculpe, Dante. Meu mundo não pode ser o seu. Não como esperávamos.”

A humilhação pública o destruiu.

Foi quando ele conheceu Aurora Bellini, por acaso, numa exposição de arte em Florença. Ela dançava em um número de abertura. E quando sorriu para ele no fim da apresentação, algo dentro dele — algo adormecido — despertou.

E ele sorriu de volta.

Aurora era luz. Ela não fazia parte do seu mundo sombrio, mas ainda assim, se encaixava nele. Por dois anos e meio, ele se reconstruiu ao lado dela. Ela era calor. Doçura. A única que via o homem por trás da frieza. Mas agora...

Agora Beatrice havia voltado.

Ela surgiu inesperadamente no escritório de Milão uma semana atrás. Com a mesma elegância de sempre. Disse que havia cometido o maior erro da vida, que tinha sido coagida a fugir, e que nunca o esqueceu. Ele não quis ouvir. Mas... a ferida se abriu.

Beatrice e Aurora tinham os mesmos olhos cor de mel. A mesma leveza no rosto. E ele odiava admitir: talvez tivesse se apaixonado por Aurora justamente por isso.

Esse pensamento o corroía por dentro.

Ao pousar em Milão, Dante foi direto ao hotel onde aconteceria a reunião com investidores asiáticos. Mesmo com a mente à deriva, sua postura era impecável. Paletó alinhado, relógio de ouro escuro no pulso, olhar firme. Nenhum de seus sócios ousava questioná-lo — exceto Giovanni.

— Está distraído, Dante — disse o amigo, já no lounge do hotel. — O que está acontecendo?

Giovani

— Nada com o que você precise se preocupar.

— Isso tem nome? Ou melhor… tem olhos cor de mel?

Dante o encarou por longos segundos. Suspirou.

— Beatrice voltou.

— Merda…

— Exato.

— E Aurora?

Dante apertou a mandíbula.

— Não sabe. Não ainda. Mas… eu não sei se estou com ela por inteiro. E se tudo isso… for uma ilusão que eu criei para substituir o que perdi?

— Você está falando da mulher que te abandonou no altar… ou da mulher que te fez voltar a sorrir?

Dante não respondeu. Só encarou o copo de whisky como se quisesse encontrar ali as respostas.

Mais tarde, no terraço do hotel, reencontrou Matteo, um amigo antigo da universidade, agora também sócio de um fundo de investimentos em Roma. Ao lado dele, Giovanni insistia em manter a conversa leve. Mas Dante… estava em outro mundo.

— E aí, vai contar ou vamos ter que adivinhar? — provocou Matteo. — Desde que a Beatrice reapareceu, você virou uma sombra.

Dante soltou um sorriso amargo.

— Talvez… eu nunca tenha superado. E talvez... eu só esteja com a Aurora porque ela preencheu esse vazio. Porque ela se parece demais com a Beatrice.

O silêncio foi instantâneo.

Giovanni franziu o cenho. — Cuidado com o que diz.

Dante deu de ombros.

— É só entre nós. Ninguém precisa saber.

Mas o que ele não sabia… era que alguém ouviu.

Longe dali, em Roma, uma mensagem havia chegado para Aurora:

“A reunião em Milão não acabou bem. Beatrice estava lá.”

Era de Bianca.

Bianca

E o destino já havia começado a mudar.

Continua….

Tempestade invisível

Roma, dois dias depois.

Aurora estava sentada no chão do estúdio de dança, as costas encostadas no espelho, as pernas esticadas e ainda com os patins. A música havia parado, mas ela continuava imóvel, o olhar perdido no reflexo trêmulo à sua frente. O que antes era um lugar de refúgio, agora parecia sufocante.

Na tela do celular, a mensagem de Bianca permanecia aberta. As palavras eram simples, mas cortantes:

“A reunião em Milão não acabou bem. Beatrice estava lá.”

Beatrice.

O nome ecoava como um trovão em sua mente. Era inevitável. Ela já tinha percebido o distanciamento de Dante. Mas agora... tudo começava a fazer sentido. O comportamento estranho, os olhares vazios, o silêncio.

E o pior não era o retorno da ex. Era o que Aurora temia profundamente: que seu lugar no coração dele nunca tivesse sido realmente seu.

Naquela noite, ela chegou em casa antes dele.

A cobertura estava silenciosa. As luzes do hall estavam apagadas, a sala imersa em sombras douradas e frias. Ela caminhou em silêncio até o quarto, tirou os sapatos, o coque frouxo se desfez, deixando os cabelos caírem nos ombros.

Ela não jantou. Não ligou a TV. Só se sentou no sofá da varanda e esperou.

Às 22h13, ouviu a porta da frente se abrir.

Dante entrou com passos pesados, falando baixo ao telefone.

— Sim, Giovanni… eu sei que falei demais. Ela não estava lá, não ouviu nada. Está tudo sob controle.

Aurora congelou.

Seu coração disparou. O sangue pareceu escoar pelas pontas dos dedos. Ele… ele estava falando sobre ela?

— Não — continuou Dante do outro lado da sala, sem saber que ela ouvia —, eu só falei a verdade. A Beatrice me deixou marcas. E, sim, talvez eu só tenha me apegado à Aurora por causa disso. Por causa das semelhanças. Embora Beatrice esteja loira isso não muda o fato de elas se parecerem tanto! Mas isso não significa que eu não goste dela. Só que… não sei se é amor de verdade.

Aurora levantou-se, cada palavra que escutava sendo um golpe afiado em sua alma. Sentia o chão sumir sob seus pés. A dor veio como uma enxurrada — rápida, esmagadora.

Dante desligou o telefone e, ao virar-se para o corredor, a viu. Em pé. Silenciosa. Como um fantasma.

— Aurora?

Ela não disse nada. Os olhos ,tão doces, agora estavam tomados por um brilho opaco. Ele deu um passo à frente, mas ela recuou.

— Há quanto tempo, Dante? — a voz dela saiu baixa, mas firme. — Há quanto tempo eu sou só a sombra de outra pessoa?

— Espera, você não entendeu o contexto da—

— Quanto tempo?! — ela gritou, com lágrimas escorrendo. — Desde o começo? Desde a primeira vez que você me olhou? Era ela que você via?

Dante avançou, estendendo a mão, mas ela recuou novamente, o corpo tremendo.

— Aurora, me escuta…

— Não! — ela gritou, mais alto. — Eu te dei tudo. Abandonei Florença, minha família, meus sonhos... por você. E você só me usou pra apagar uma dor que não teve coragem de encarar!

O silêncio caiu como uma sentença.

Ela foi até o quarto. Ele a seguiu. Mas quando entrou, ela já havia trancado a porta do closet, jogando as roupas numa mala com as mãos trêmulas. Chorava em silêncio. Respirava fundo, tentando se manter de pé.

Dante tocou a porta.

— Aurora... por favor...

— Não me procura. Não fala comigo. Não me toca. — Sua voz saiu embargada. — Você acabou com tudo.

Às três da manhã, Aurora desceu pelas escadas do prédio com a mala de rodinhas, uma mochila nas costas e o coração em ruínas. O porteiro tentou intervir, surpreso, mas ela apenas acenou em silêncio, com os olhos molhados.

Ligou para Chiara. Dez minutos depois, a amiga apareceu de carro.

— Para onde você quer ir?

— Florença.

— Tem certeza?

Aurora assentiu, com lágrimas escorrendo. — É onde eu lembro quem eu sou.

Na manhã seguinte, Dante acordou com o celular no modo avião. Tentou ligar para ela. Nenhuma resposta. Foi até o closet e encontrou o lado dela vazio. Como se nunca tivesse existido.

No espelho da penteadeira, havia um bilhete.

"Você disse que me amava. Mas estava olhando para outra."

Horas depois, ele pegou o carro e foi até o aeroporto. Tentou ligar para Leonardo. Para Donatella. Para Salvatore. Nenhum deles atendeu. Bianca o confrontou em casa, furiosa:

— O que você fez com ela?! Ela te deu o mundo, Dante! E você jogou no lixo por causa de uma ilusão!

— Não é assim…

— Então me diga: você ama a Aurora?

Ele não respondeu. Porque naquele momento, não sabia mais nem o que era amor.

Enquanto isso, em Florença, Aurora chegou à mansão da família. Leonardo foi o primeiro a vê-la. Quando abriu a porta, a irmã caiu em seus braços, chorando como uma criança.

Léo

— Ele me usou, Leo… Ele nunca me amou.

Leonardo a segurou firme.

— Ele não merece uma lágrima sua. Mas eu prometo… você vai ficar bem.

Donatella, ao ver a filha tão devastada, quase caiu em prantos. E Salvatore, com os olhos marejados, beijou a testa da filha em silêncio.

— Você está em casa, minha pequena. Aqui, ninguém te machuca.

E enquanto Roma mergulhava na culpa de Dante Moretti…

Florença renascia para Aurora Bellini.

Uma nova fase começava.

E a tempestade ainda estava longe de passar.

Continua

Para mais, baixe o APP de MangaToon!

novel PDF download
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!