NovelToon NovelToon

Conexão

Cap1- Quando criança...Morro Dosnove

Zoe...

Nasci numa cidadezinha no interior do Nordeste. Morava numa casa simples com meus avós, minha mãe e três tios. Minha mãe era a caçula de seis filhos e nasceu com uma deficiência na perna direita, o que a fazia mancar. Dois dos meus tios eram casados: um morava na mesma cidade com a família que constituiu, e minha tia Denise, que morava no Rio de Janeiro, era casada, mas não teve filhos.

Nunca conheci meu pai, e sempre ouvi várias especulações: diziam que ele tinha sido apenas um namoradinho de mainha, que ela havia sido abusada e silenciado, ou até mesmo que eu era filha de um dos meus tios e que mainha havia assumido minha criação. Mas ela mesma sempre me dizia que meu pai foi um homem bom, que a ajudou a ser mãe solo. Sei que ela não gostava muito que eu perguntasse sobre ele, mas devo admitir que fui criada com muito amor. Apesar de todas as dificuldades, minha mãe, meus tios e meus avós sempre demonstraram carinho e respeito por mim.

Tia Denise, a filha mais velha, mudou-se para o Rio de

Janeiro ainda jovem e recém-casada. Nunca teve filhos e, desde que ficou viúva, sempre convidava mainha para morar com ela. Só depois que meus avós faleceram — um logo após o outro — é que minha mãe resolveu aceitar o convite. Decidiu mudar de vida e foi viver com minha tia, na expectativa de conseguir um bom trabalho na cidade grande. Meus três tios seguiram com suas vidas, brigando entre si pela casinha que os meus avós deixaram. Tia Denise trabalhava como servente em um conceituado hospital particular na zona sul do Rio de Janeiro e nos recebeu de braços abertos em seu lar. Mudamos, mas a realidade não foi muito diferente do interior de onde viemos — e foi difícil para minha mãe arrumar um emprego, principalmente por causa de

suas limitações. Para não ficar parada e também ajudar nas despesas, maínha resolveu vender flau — ou, como os cariocas chamam, sacolé.

Morávamos no Morro Dosnove, uma comunidade no

coração do Rio de Janeiro. O morro tinha esse nome porque, no alto, havia duas pedras em forma de número nove. A parte alta era o centro da comunidade, e nossa casinha ficava na descida de uma viela.

Maínha passou a produzir e vender os sacolés ali mesmo, em casa — e logo se tornaram um sucesso entre a garotada da comunidade. Até os meninos do movimento sempre compravam.

Dois anos se passaram desde a mudança, e maínha ainda tinha muito medo de me criar ali. Presenciamos alguns confrontos, mas nada que prejudicasse diretamente os moradores. Até se poderia dizer que era uma comunidade meio pacífica... se não fosse pelo constante fluxo de clientes armados batendo no portão para comprar os sacolés.

O Morro Dosnove era dominado pelo tráfico, e quem

comandava tudo era o chefão Petruchio — um homem bem peculiar e famoso não apenas por sua posição, mas por sua história.

Eu até gosto de morar no Rio de Janeiro, apesar de ter sido criada de forma mais reclusa aqui do que no interior, por causa dos cuidados excessivos de maínha, que enxerga o Rio como o estado mais perigoso do Brasil.

Mesmo morando numa comunidade, era difícil me

acostumar a ver armamento pesado na minha frente. Quando algum “dos meninos” vinha comprar sacolé, eu sempre ficava paralisada, observando aquelas armas. Eram de todos os tipos e tamanhos. Era raro ver algum menino com menos de 14 anos no movimento — diziam que Petruchio não aprovava. Mas, às vezes, apareciam uns franzinos que mal conseguiam segurar um fuzil.

***

Essa pequena introdução era para narrar o início da minha história.

Eu me chamo Zoe, tenho 12 anos, estudo na Escola

Municipal Dr. Aluísio Vieira e estou no 7º ano do Fundamental I. Hoje, minha turma foi liberada mais cedo. A minha colega Bia e eu voltávamos para casa, subindo o morro, quando vi a minha mãe no salão da tia Selma.

ZOE: Olha minha mãe ali no salão da sua!

Corremos e entramos no salãozinho...

SOLANGE: Zoe, o que houve? Por que saíram cedo?

BIA: Dois professores faltaram. Olá, tia Selma!

SELMA: Olá, Zoe! Bia, e seus irmãos?

BIA: Só a nossa turma foi liberada.

ZOE: Mãe, tô com fome!

SOLANGE: Espera um pouco, filha, já tô terminando aqui.

SELMA: Vocês não almoçaram na escola?

ZOE: Hoje foi só achocolatado com biscoito de sal.

Maínha estava fazendo relaxamento no cabelo — uma química pra diminuir o volume e alisar cabelo cacheado ou crespo — no salão da Selma, que é uma das cabeleireiras da comunidade, amiga da minha tia e da minha mãe. As duas começaram a conversar sobre as precariedade da merenda nas escolas públicas...

BIA: Vamos lá em casa, Zoe. Detesto esse cheiro de química.

ZOE: Posso, mãe?

SELMA: Pode ir, Zoe.

SOLANGE: Sem bagunça na casa da Selma, hein!

Nos cômodos dos fundos ficava a casa. A Bia trocou de roupa e ligou a televisão. Fiquei lá, meia hora entediada, vendo desenhos com ela e então voltei pro salão.

A Bia é a filha mais velha de três irmãos. Ela está na minha turma, mas já tem 13 anos — repetiu o primeiro ano. Depois dela vem a Rebeca, que é minha melhor amiga e tem 11 anos, mas ainda está no 6º ano. Os mais novos são a Natália, de 9, e o Kauã, de 7.

No salão, peguei uma revista e comecei a folhear, fingindo que não prestava atenção na conversa das duas. Mas estavam falando do dono do morro, e não sei por quê, esse assunto sempre me interessava...

SELMA: Dizem que ele era apenas um vendedor ambulante tentando ganhar a vida quando se apaixonou por uma riquinha da Zona Sul. Daí ela engravidou dele, mas foi embora do país. Ele entrou para o tráfico e desde então, toda mulherada aqui tenta dar o golpe da barriga pra virar a primeira-dama do morro.

SOLANGE: Já ouvi dizer que tem um monte de criança aqui que é filho dele. É por isso que ele faz a festa do Dia das Crianças na comunidade?

SELMA: Acho que é mentira! Desde essa história da patricinha grávida até esse monte de filho espalhado. Falam que ele até fez vasectomia.

SOLANGE: E a festa, então?

SELMA: Acho que ele só gosta mesmo de criança…

SOLANGE: Ou... talvez seja a forma dele homenagear esse tal filho que nunca conheceu.

SELMA: Só sei que ele é um homem perigoso e charmoso. rs

SOLANGE: Ele é um homem bonito, sim! Não sei quanto a história da moça rica... mas as daqui nunca duvidei quando falam que fulano e sicrano são filhos dele.

SELMA: Essa mulherada daqui se ilude… tudo querendo

privilégios.

SOLANGE: A Denise disse que esse ano vai ter até show com uns MCs famosos.

SELMA: Essa festa se supera a cada ano! Meus filhos já estão contando os dias. Será que você vai deixar a Zoe participar dessa vez?

SOLANGE: Você sabe que eu tenho medo dela solta por aí. Ainda mais nesse dia, que vem gente de tudo quanto é canto...

Ao voltarmos pra casa, minha mãe começou logo a

preparar os sacolés pro dia seguinte. Sempre tinha alguma criança gritando no portão pedindo, e quase sempre era eu quem atendia.

Sou uma menina alegre e obediente, mas maínha não me deixa brincar na rua. Então, passo a maior parte do tempo aqui no quintal, com o som ligado bem alto ouvindo meu artista favorito desde o comecinho da carreira: Lorenzo Cooper. Às vezes, fico brincando de casinha ou finjo que sou uma cantora famosa, ou apresentadora de TV entrevistando o Lorenzo — que,

na verdade, é meu ursinho de pelúcia com uma camiseta velha dele que ganhei numa promoção de rádio.

Só posso brincar aqui no quintal de casa, no portão ou,

quando maínha deixa, na casa da tia Selma.

Meus amigos mais próximos são os filhos da tia Selma e duas meninas vizinhas aqui da viela. A Denguinho, que tem a minha idade, e a Grazi, irmã mais velha dela, que já tem 14 anos e até namora um menino da escola — mas maínha diz que esse papo ainda não é pra mim.

Minha melhor amiga é a Rebeca. Ela vem sempre aqui no portão, e a gente brinca de Barbie ou joga tabuleiro. Quando a Bia e a Grazi estão junto, aí é adedonha ou jogo da verdade, mas a maioria das vezes elas só querem conversar sobre meninos, o

que eu acho meio sem graça.

Agora que o Dia das Crianças tá chegando, todo mundo só fala da festa do morro. É o maior evento da comunidade. Dizem que esse ano vai ser ainda maior, com brinquedos infláveis, música e até show de verdade.

Eu fico animada, mas no fundo sei que maínha ainda não decidiu se vai me deixar ir...

CAP.2 -FESTA DAS CRIANÇAS

Acordei com o barulho de muitos fogos de artifício. O grande Dia das Crianças havia chegado! Mas eu não estava tão animada assim… Minha mãe quase nunca deixava eu ir na festa.

Ela estava ocupada trabalhando, porque tinha recebido uma grande encomenda de sacolé para levar ao hospital onde minha tia trabalha.

A festa já rolava desde as nove da manhã. Eu tinha acabado de almoçar e estava cabisbaixa, sentada no portão com o rosto encostado na grade, ouvindo o alvoroço lá em cima: gritos, risadas, música, brinquedos infláveis e o cheiro de algodão-doce no ar.

Minha mãe chamava-me, mas eu não ouvia. Então, veio até o portão me procurar.

SOLANGE: Zoe! Você tá surda, menina? Tô te chamando faz tempo!

ZOE: Desculpa, mãe… eu não ouvi.

SOLANGE: Vai lá na Selma entregar esses sacolés pra mim.

ZOE: Tá!

SOLANGE: E se arruma!

ZOE: Se arrumar?

SOLANGE: Vou deixar você ficar um pouco na festa.

ZOE: Jura, mãe?!

SOLANGE: Sim. Mas ó... sobre os olhos dela! Fica perto da Selma e não vá desobedecer!

ZOE: Tá, mãe! Vou tomar banho!

SOLANGE: E se a Bia e aquela menina, a Grazi, ficarem zanzando pelo morro, não quero que vá atrás delas!

Corri toda empolgada pra me arrumar. Tomei banho rapidinho, vesti minha melhor roupa e peguei a sacola com os sacolés. Subi a viela com o coração batendo forte de tanta felicidade.

Quando cheguei ao salão da tia Selma, entreguei os sacolés com um sorriso no rosto e os olhos brilhando para a festa que acontecia logo ali, bem diante de mim.

Tinha muitos brinquedos e muitos doces sendo distribuídos. Estava bem cheio e animado. A Rebeca estava com o rosto pintado com uma linda borboleta, e o Kauã comia pipoca sentado na calçada.

ZOE: Que linda essa pintura!

SELMA: Zoe, quero você e as meninas aqui por perto, onde eu possa ver. Nada de subir lá pra cima!

ZOE: Tá, tia!

REBECA: Vamos pra fila fazer a sua! A Natália está lá. O que você vai querer?

ZOE: Humm... não sei!

Enquanto eu esperava na fila pra pintura de rosto, conversávamos animadas sobre tudo da festa. Participei da dança das cadeiras e ganhei uma Barbie — não era original, mas era linda! O Kauã estava com umas cinco bolas, e até precisei ajudá-lo a carregar.

Ganhávamos tantas coisas que, a todo momento, íamos guardar os brinquedos e doces no salão da tia Selma e voltávamos correndo para brincar mais. A festa estava maravilhosa, e mesmo sem circular por todo o morro, era divertido estar ali, só naquele pedaço.

Por volta das cinco da tarde, a festa ainda estava bem animada, com várias atrações no palco e nas tendas. Rebeca, Natália e eu nos sentamos numa calçada, a uns dois metros do salão, e comíamos algodão-doce quando vimos a Graça e a Bia passando perto do palanque — aquele que a tia Selma tinha dito pra gente não ir.

Fiquei observando os passos delas, curiosa, quando começou um alvoroço perto do palanque: era a chegada de Petruchio.

Ele se sentou numa cadeira, numa mesa de bar improvisada, e começou a tomar cerveja junto com uns seis caras do movimento. Todos tinham armas — discretas, mas dava pra ver.

Eu o via sorrindo, cercado por muitas pessoas que o bajulavam — especialmente mulheres lindas de todos os tipos: negras, loiras, morenas, todas vestindo micro-shortinhos, vestidinhos e croppeds. Elas o rodeavam, conversando animadas.

Ele era um homem de presença marcante, não apenas por ser o dono do morro, mas também por sua beleza e carisma — tanto com os moradores quanto com a criançada da comunidade.

REBECA: Natália, vai tirar o Kauã do pula-pula e leva ele pra mamãe. Fala que ele não tá obedecendo!

Assim que Natália levou o irmão, Rebeca ficou esticando o pescoço, procurando por algo — ou alguém.

REBECA: Não estou mais vendo a Bia.

ZOE: Elas desceram a viela do Gil e estavam com dois garotos.

REBECA: Nada passa despercebido por você! [rindo] Vou agora mesmo contar pra mamãe. Me espera aqui!

Assim que Rebeca foi embora, me deixando sozinha, continuei observando as pessoas na festa. Mas algo chamou minha atenção de forma especial: havia um garoto bonito, de olhos azuis, um pouco mais velho que eu, parado perto do bar onde estava o Petruchio. Ele também olhava fixamente para o chefão.

De repente, fogos de artifício começaram a estourar, causando alvoroço entre os rapazes. A correria tomou conta do lugar, e o menino que antes observava o Petruchio ficou parado, perdido, sem saber o que fazer.

Por impulso, corri até ele, peguei sua mão e puxei-o para tirá-lo dali.

ZOE: Não fica aí parado! Vem comigo, corre!

Sem conseguir voltar para o salão por causa do tumulto, acabamos correndo em direção à subida principal do morro — bem na hora em que começou uma troca de tiros com a polícia, que invadia a comunidade.

Sem outra opção, empurrei o menino para debaixo de um carro. Vi também uma criança, da idade do Kauã, chorando. Puxei-a para perto, e ela mesma rolou para debaixo do carro. O menino dos olhos azuis ainda estava agachado, paralisado de medo.

ZOE: Vai! Se esconde! Faz como ele!

E ele obedeceu. Mas, no momento em que eu ia me abaixar para me proteger também, senti um forte impacto. Caí diante de um par de olhos azuis aterrorizados e cheios de lágrimas. O garoto esticou a mão para mim, mas antes que eu pudesse reagir, senti outro baque — e então, a escuridão me envolveu.

🔸🔸🔸🔸🔸🔸🔸🔸🔸🔸🔸🔸🔸🔸🔸🔸🔸🔸🔸

📌 Olá, leitores... Irei liberar dois capítulos toda segunda e sexta. Deixe sua curtida e comentários!

LisAndrade ❣️

Cap.3- Reviver

Abro os olhos e vejo a claridade. Pisco várias vezes e ouço sussurros. Viro o rosto para o lado e vejo minha mãe e minha tia abraçadas, chorando, com umas três pessoas vestidas com uniformes brancos ao meu redor.

Dois meses se passaram aqui no hospital, desde quando acordei. Agora eu já conseguia tomar banho sozinha no chuveiro do hospital. Ainda estranhava o meu corpo e não me reconhecia. Eu, que antes tinha duas bolinhas de gude no peito, agora as tinha do tamanho de uma laranja.

Para mim, parecia que ainda tinha doze anos... mas acordei com dezessete. Fiquei em coma por cinco anos. Levei um tiro na cabeça e outro na perna. Mas eu era um milagre — estava viva, me recuperando, um dia de cada vez.

Minha mãe me contou que, ao me ver ferida, Petruchio se entregou, na tentativa de acabar com o confronto daquele dia. Outras duas pessoas também foram alvejadas, mas sem gravidade. Eu fui a única criança atingida — e a mais prejudicada.

Perguntei pelas crianças que se esconderam debaixo do carro, mas ninguém soube me responder. Graças às conexões da minha tia, fui tratada no melhor hospital particular da cidade, onde permaneci durante todos esses cinco anos.

Encontrei um refúgio interessante aqui. Achei um acesso ao terraço do prédio e, às vezes, me escondia lá. Sentava na beira e admirava aquela vista incrível: as luzes piscando ao longe e a brisa fria da noite me davam uma sensação de vida.

Num final de tarde, dei uma escapada para o meu esconderijo. Sentei-me e aproveitava o pôr do sol, esperando pela noite...

Foi quando um paciente apareceu e subiu direto no parapeito ao meu lado.

PACIENTE: Não tente me impedir!

ZOE: Vai em frente! Só estou aqui pela vista.

PACIENTE: Não está tentando se matar?

ZOE: Eu acabei de reviver. Por que me mataria?

Ele desceu e sentou ao meu lado.

PACIENTE: Como assim?

ZOE: Estive em coma por cinco anos! Desacreditada pelos médicos, mas de repente acordei — e agora estou aqui, prestes a receber alta. Em breve, voltarei pra casa.

PACIENTE: E o que te aconteceu?

ZOE: Levei dois tiros, na festa do Dia das Crianças da comunidade onde moro. Morro Dosnove. Conhece?

PACIENTE: Não... Quantos anos você tem agora?

ZOE: Doze. Quer dizer... dezessete! Ainda é difícil se acostumar. [risos]

Ele olhava atento para o meu rosto, no meio da escuridão, e depois voltou os olhos para frente, de onde os meus não saíam.

PACIENTE: É uma vista incrível mesmo.

ZOE: Por que você quer se matar?

PACIENTE: Por viver uma boa vida... e me preocupar com algo que agora não faz nenhum sentido.

ZOE: [risos] Eu me chamo Zoe!

PACIENTE: Eu, Lorenzo.

Eu olho para encará-lo... e vejo que é o Lorenzo Cooper, meu artista predileto.

ZOE: Ai, meu Deus! Você é o Lorenzo cantor, mesmo?

LORENZO: Em carne, osso e remorso! [risos]

ZOE: Cara! Eu sou sua fã! Amo aquela sua música:

"É apenas outra noite / E estou encarando a Lua / Eu vi uma estrela cadente / E pensei em você..."

LORENZO: Essa é do meu primeiro álbum. Eu lancei mais cinco depois dessa.

ZOE: Cinco?! Eu ainda não conheço os outros... Mas tenho certeza que vou amar também! [rindo]

LORENZO: Obrigado! Já não tenho mais fãs da sua idade que ainda curtem minhas músicas.

ZOE: Como não? Você sempre foi o máximo! [risos]

Uma enfermeira aparece.

ENFERMEIRA: Eu sabia que você estava aqui, Zoe!

ZOE: Ops! Acho que me encrenquei! [risos]

ENFERMEIRA: E ainda trouxe um paciente!

Ela se aproxima, e nós nos levantamos, saindo do parapeito.

ENFERMEIRA: Senhor Cooper! O que faz aqui? É melhor o senhor entrar.

Ele assente com a cabeça para a enfermeira, vira-se para mim, me abraça e fala ao meu ouvido:

LORENZO: Obrigado, Zoe!

Fico sem entender do que ele me agradecia, mas empolgadíssima com o abraço que recebi. Voltamos para os quartos e, no dia seguinte, recebi uma linda cesta com mimos personalizados dele para mim. Tinha frutas, chocolates, uma caneca, uma bandana, uma camiseta autografada e um MP4 com todo o trabalho dele gravado ali.

DENISE: Soube que ele recebeu alta hoje de manhã.

SOLANGE: Ele estava presenteando todos os pacientes?

DENISE: Só a Zoe! Você o conheceu, querida?

ZOE: Sim, tia! Ontem à noite, no terraço.

SOLANGE: Você foi para o terraço de novo, Zoe?

Sorri sem graça e fiquei entretida, mexendo na cesta que ganhei do Lorenzo, até achar um cartão. Abri e li o bilhete dele, escrito à mão:

________________________________________

“A vida é um presente precioso, cheio de oportunidades, experiências e desafios. E por um momento eu me esqueci disso e me vitimizei. Ao te conhecer, pude compreender que esses momentos difíceis da vida são, na verdade, uma oportunidade de aprendizado e crescimento pessoal.

Obrigado, querida Zoe, por estar lá pela vista.

Obrigado por me fazer reviver.”

— Lorenzo Cooper

Tive alta e voltei para casa, onde me tornei a atração e o milagre da comunidade. Estava “famosa” por ter passado por aquela tragédia e sobrevivido. Mas algo não era como antes — eu não conseguia olhar para alguém armado sem começar a suar frio.

Dois meses depois, nos mudamos para uma quitinete próxima ao hospital, fora da comunidade. Minha mãe trabalhava como ajudante de cozinha no próprio hospital onde estive internada. Já fazia dois anos que ela havia conseguido esse emprego e, mesmo assim, ainda vendia seus sacolés por encomenda.

Aos poucos, fui retomando minha vida. Voltei a estudar: fazia supletivo à noite e, durante o dia, continuava o tratamento no hospital, indo três vezes por semana.

Aos dezenove anos, minha saúde já estava totalmente recuperada, mas eu ainda me sentia nervosa ao ver uma arma. Lutava para aceitar que não tinha mais doze anos, e isso dificultava fazer amizades na escola. Estava atrasada nos estudos, ainda cursando o ensino médio, e me sentia ridícula diante dos jovens mais novos. Acabei me fechando.

Em casa, ajudava minha mãe na produção dos sacolés e fazia as entregas.

Certo dia, cheguei da escola e me joguei no sofá, onde fiquei por cerca de meia hora. Depois, levantei e fui fazer o jantar — agora era eu quem cozinhava para a família, enquanto elas trabalhavam fora.

Liguei o som no volume alto e fiquei cantarolando os sucessos do meu querido Lorenzo Cooper, enquanto arrumava a casa. Foi então que meu celular começou a tocar...

ZOE: Oi, mãe!

SOLANGE: Abaixa isso, menina! Não escuto nada!

ZOE: Pode falar agora!

SOLANGE: Zoe, eu deixei separado aí uma sacola verde com 10 sacolés, que era para eu levar pra academia e esqueci.

ZOE: É, está aqui sim!

SOLANGE: Vou te passar o endereço e você entrega pra mim. É na academia do senhor Lázaro.

ZOE: Aquele paciente do hospital que conheci?

SOLANGE: Sim, querida! Passa lá e entrega pra ele, por favor!

Maínha me passou o endereço, e fui de bicicleta fazer a entrega. Chegando ao local, me deparei com um enorme letreiro na fachada escrito:

FRONT – Escola Profissionalizante de Vigilantes e Seguranças

Para mais, baixe o APP de MangaToon!

novel PDF download
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!