Na escola Saint Liora, onde alfas, betas e ômegas estudavam juntos, os corredores pareciam sempre ecoar os passos firmes de Dante, o típico alfa que ninguém ousava contrariar. Alto, moreno, de olhar afiado e jeito intimidador, ele era conhecido por resolver tudo com um olhar torto ou um empurrão bem calculado. Era o tipo que fazia o silêncio cair onde passava.
Só que havia um único garoto que não parecia afetado pela aura ameaçadora de Dante.
Theo.
Theo era um ômega no segundo ano, de cabelos loiros macios, olhos esverdeados brilhantes e sempre com um sorriso enorme no rosto. Usava pulseiras coloridas, falava com todo mundo, abraçava até os professores e adorava andar descalço na sala de dança.
E, por algum motivo que ninguém entendia, Theo sempre sorria para Dante. Pior: dava tchauzinho. Chamava de "Trovãozinho".
— Oi, Trovãozinho! — Theo acenou outra vez naquela manhã, comendo um muffin de mirtilo e balançando a lancheira de corações. — Dormiu bem?
Dante, parado no meio do corredor, o fitou como se fosse um alienígena. A testa franzida, o maxilar travado, e os punhos cerrados. Ele odiava ser chamado de “Trovãozinho”. Mas… por algum motivo, ele nunca tinha coragem de mandar Theo calar a boca.
— Para de me chamar assim, ômega ridículo — resmungou Dante, virando o rosto.
— Isso é quase um bom dia vindo de você, hein? Progresso! — Theo riu, saltitando pelo corredor.
Dante virou o rosto, tentando disfarçar o calor que subia pela nuca. Era impossível lidar com aquele ômega esquisito. Ele era todo… luz. Barulho. Cheiro doce. E Dante odiava como seu lobo alfa ficava alerta e interessado toda vez que Theo se aproximava.
No treino de luta mais tarde, Dante quase arrebentou o saco de pancadas de tanto socar. Mas a imagem do Theo sorrindo e dançando no pátio da escola continuava grudada na sua mente.
“Por que ele me olha daquele jeito?”, pensava. “Com tanta doçura… como se eu não fosse uma ameaça.”
Na saída, já quase anoitecendo, Dante pegou um atalho pelos fundos da escola. Foi quando ouviu vozes mais adiante.
— Dá aqui essa bolsa, ômega! Você acha que pode sair desfilando com esse cheiro de feromônio doce, hein?
Dante parou.
Theo.
Três garotos do terceiro ano o cercavam, um deles tentando arrancar a mochila rosa de suas costas.
— Eu só quero ir pra casa… — Theo dizia, firme, mas com a voz trêmula. — Me solta.
Dante sentiu um estalo dentro do peito. Seu lobo rugiu por proteção.
— Larga ele — Dante rosnou, surgindo como um raio por trás dos agressores.
Os três deram um passo para trás ao ver quem era. Dante não falou mais nada — só lançou um olhar tão afiado que os caras desapareceram sem dar tchau.
Theo estava com os olhos arregalados, ainda segurando firme sua lancheira.
— Você… você veio me ajudar?
— Cala a boca. Eu só… passei aqui por acaso.
Theo sorriu. Aquele sorriso de sempre. Brilhante, doce, irritante.
— Obrigado, Trovãozinho.
— Eu avisei pra não me chamar assim.
— Mas combina tanto com você — disse Theo, se aproximando. — Forte por fora, barulhento… mas por dentro, acho que é só um pouquinho de chuva.
Dante engoliu em seco.
A brisa da noite passou entre eles. Theo cheirava a morango e chá doce. E Dante… estava completamente ferrado.
— Vai pra casa — disse o alfa, virando o rosto. — Antes que eu me arrependa de não te dar uma bronca.
Theo riu, mas obedeceu. E ao se afastar, jogou um beijo no ar:
— Boa noite, Dante!
O alfa ficou parado ali. Coração acelerado. Mandíbulas tensas.
E, pela primeira vez… sorriu de leve.
No dia seguinte, Dante chegou cedo à escola — o que era estranho, até pra ele.
Ficou parado perto do portão, fingindo olhar o celular, quando na verdade estava esperando... ele.
E então lá vinha Theo, com sua mochila de pelúcia, fones pendurados no pescoço, e o habitual sorriso de quem acordou ouvindo música animada e tomando leite com achocolatado.
— Oi, Trovãozinho! — Theo acenou, os olhos brilhando. — Não sabia que você acordava antes do sinal solar nascer!
Dante resmungou algo ininteligível, enfiando as mãos no bolso.
— Só vim cedo porque... o treino mudou. — Mentira. Mas Dante não mentia bem. E Theo percebeu.
— Que gracinha, você me esperou?
— C-claro que não! Eu nem sabia que você vinha por aqui.
— Aham, claro. E o céu é verde.
Theo riu e, antes que Dante pudesse dizer qualquer coisa, já estava andando ao lado dele, falando de uma nova receita de cookies que tinha feito com a tia.
— Fiz cookies com gotas de caramelo e flor de sal. Trouxe um pra você.
— Eu não quero... — Dante começou, mas Theo já estava abrindo a lancheira.
O aroma doce se espalhou no ar e... maldição. Feromônios.
Theo corou levemente, envergonhado.
— Droga. Acho que exagerei no perfume... ou é o açúcar. — disse, tímido.
Dante engoliu seco. O cheiro de Theo era delicado, quente, envolvente… e o deixava inquieto.
— Você devia tomar mais cuidado. Ômegas soltos assim… são alvos.
Theo parou e o olhou nos olhos. Pela primeira vez, sem o sorrisinho brincalhão.
— Mas eu não tô sozinho, né?
Dante sentiu um arrepio subir pela espinha.
Theo estendeu o cookie.
— Aceita. Tá quentinho ainda. E… é com carinho.
Dante pegou o doce sem saber por quê. Mordeu. Estava absurdamente bom.
— Hm. Não é horrível.
— Isso vindo de você é quase uma declaração de amor — Theo disse, rindo de novo.
Dante tossiu, engasgando com o pedaço de cookie.
— Para de dizer essas coisas!
— Mas é tão divertido te ver assim… — Theo inclinou o rosto. — Meio vermelho, meio bravo. Você fica fofo.
Dante se virou, emburrado, e acelerou o passo.
Mas Theo correu atrás, rindo.
— Espera! Você vai comer outro cookie ou posso dar pro professor João? Ele tá de dieta, mas eu sempre saboto!
No pátio, todos começaram a notar. O alfa solitário, temido e antissocial... agora andava com um ômega falante e risonho do lado.
E ele não espantava o garoto. Não o empurrava. Não rosnava.
Às vezes, até… sorria.
Mais tarde, no intervalo, Theo apareceu na arquibancada do ginásio, onde Dante sempre se escondia pra evitar gente.
— Você sempre fica aqui?
— Sim. Sozinho.
— Agora não.
Theo sentou-se ao lado dele, tão próximo que os ombros se encostaram. Dante travou. A presença de Theo era quente, gentil. E o alfa começou a perceber que... não se importava mais em ficar “sozinho”.
Theo tirou da mochila dois suquinhos de caixinha.
— Uva ou pêssego?
— ...Uva.
— Boa escolha. Sabe que você tá virando um alfa fofo, né?
— Cala a boca.
Theo riu de novo, e se deitou ali, apoiando a cabeça no ombro de Dante como se fosse o lugar mais natural do mundo.
— Você tem cheiro de trovão depois da chuva — Theo murmurou, baixinho, os olhos fechando. — Acho que por isso fico calmo perto de você.
Dante ficou em silêncio. O peito batia rápido, mas ele não afastou Theo. Nem um centímetro.
E ali, com um suco de uva na mão e um ômega risonho dormindo no seu ombro, Dante teve certeza de uma coisa:
Estava perdido.
Perdido naquele sorriso, naquela risada… e no cheiro doce que agora reconhecia de longe.
Na manhã seguinte, Theo acordou com o celular vibrando.
📲 “Leva casaco. Vai esfriar. — Dante.”
Theo sorriu, abraçando o travesseiro. Dante agora mandava mensagens. Curtas, ranzinzas… mas se preocupava. E isso deixava o coração do ômega feito gelatina doce.
Na escola, o dia começou estranho. Alguns alunos olhavam Theo e cochichavam. Dante percebeu.
— Estão falando o quê?
— Ah, nada demais — Theo tentou disfarçar. — Só disseram que “até o Dante caiu na rede do ômega do jardim encantado”.
— Que rede?
— Eu tenho um grupo de amigas que dizem que meu cheiro é calmante… e que sou tipo um “isco de alfa”. Bobeira.
Dante estreitou os olhos.
— Isco de alfa? Você tá me chamando de peixe?
— Talvez um tubarãozinho... — Theo provocou, rindo.
Dante rosnou baixinho e o agarrou pelo pulso com firmeza, mas sem machucar.
Foi quando algo aconteceu.
Ambos congelaram.
Uma onda quente percorreu os braços dos dois. O toque do pulso parecia brilhar. Literalmente.
Theo olhou para baixo e arregalou os olhos: um brilho suave, azul-púrpura, tremia ali na pele onde o alfa o segurava. Dante largou rapidamente, como se tivesse tocado fogo.
— O que foi isso?
Theo olhou para o próprio pulso, depois para o de Dante. O brilho desapareceu… mas o cheiro de ambos ficou mais forte no ar. Os alunos começaram a sussurrar.
— Dante... você acha que isso foi…?
— Ligação de fado — Dante completou, engolindo em seco.
Theo sentiu o estômago revirar. Aquilo não era brincadeira. Ligações de fado eram raras. Só aconteciam entre alfas e ômegas compatíveis… destinados. Era coisa de alma. De laço. De eternidade.
— Isso... não pode ser.
— Por que não? — Dante perguntou, de repente. — Você tá me dizendo que não pensou nisso nenhuma vez?
— Eu… pensei. Mas achei que era coisa da minha cabeça. Ou que você ia me ignorar pra sempre.
Dante deu um passo à frente. Os olhos escuros fixos nos dele.
— Eu tento. Juro que tento. Mas seu cheiro me acalma… e me enlouquece ao mesmo tempo.
Theo sorriu, tímido.
— Então... você também sente?
— Desde o primeiro “Trovãozinho”.
O sinal tocou, mas nenhum dos dois se moveu. Estavam ali, no meio do corredor, parados no tempo.
— Dante… e agora?
O alfa suspirou e coçou a nuca.
— Agora... a gente vê onde isso leva. Mas uma coisa é certa: se for mesmo uma ligação de fado… você é meu.
Theo arregalou os olhos, as bochechas queimando.
— Que jeito mais rústico de dizer “quero ficar com você”, hein?
Dante puxou o capuz da blusa de Theo e o cobriu inteiro.
— Fica quieto, Isquinho.
Theo riu alto lá de dentro.
E enquanto caminhavam para a próxima aula, um com o coração disparado e o outro tentando parecer durão, ambos sabiam: nada mais seria o mesmo.
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