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ATÉ QUE O PRÊMIO NOS UNA

CASAMENTO ÀS ESCURAS

A câmera desliza pela mansão envidraçada como um predador silencioso. A trilha é doce, mas carregada de tensão — como se o próprio ar soubesse que amor e guerra andam de mãos dadas ali dentro.

É o primeiro dia de gravação de Compromisso às Cegas, o novo reality queridinho da comunidade LGBTQIAP+, produzido por uma equipe majoritariamente queer, para afetos múltiplos e histórias plurais. E desta vez, a proposta é ousada:

Doze participantes. Seis casais formados por sorteio aleatório. Trinta dias de convivência intensa.

Desafios diários. Festas temáticas. Dinâmicas emocionais. Sessões de terapia. Votos simbólicos.

E, no final, uma cerimônia de casamento — ou não.

Quem disser "sim" divide meio milhão de reais.

Quem desistir, sai sem nada… exceto a exposição nacional.

As portas se abrem.

E ela entra.

Luna Oliveira, 28 anos, modelo, 1,74m, pele dourada, vestido branco com decote profundo, fenda marcada e tatuagens que sobem delicadamente pelo braço esquerdo como se dançassem sobre sua pele. Seu cabelo castanho desce em ondas longas e bem cuidadas, e o olhar felino passeia com autoconfiança.

Ela não está ali por amor. Está ali pelas câmeras. Pelo buzz. Pela fama que escorreu entre seus dedos nos últimos anos.

Luna caminha até o jardim principal, cercada de luzes e flores artificiais, e posa como quem espera aplausos. Seu sorriso é provocador, sua energia, magnética.

Mas seu semblante muda quando vê a mulher que se aproxima.

Isadora.

Isadora Nunes, 30 anos, advogada criminalista, cabelos castanhos escuros cortados curtos, postura reta, ombros tensos. Usa um terno preto impecável, de alfaiataria justa, sem nenhum enfeite — só ela, dura como ferro, fria como pedra.

Isadora queria ser sorteada com Maya, outra advogada com quem dividira bancos de faculdade e afinidades. Mas o sorteio foi cruel.

A sorte — ou o roteiro — colocou Luna em seu caminho.

Luna ri primeiro. É provocação, charme e desafio tudo junto.

— Olá, ouvi dizer que vou me casar com você? — diz ela, com voz baixa e carregada de ironia.

Isadora a analisa como se fosse um caso difícil no tribunal.

— Ótimo. Espero que você saiba seguir regras — retruca, seca.

O impacto entre as duas é imediato.

Não é faísca. É incêndio.

Mas nenhum dos dois lados quer queimar primeiro.

As câmeras capturam tudo. E do outro lado da tela, o público LGBTQIAP+ reage em tempo real: nos bares queer, nas redes sociais, nos grupos de apostas.

...OUTROS CASAIS CONCORRENTES...

Thalita & Manu: influenciadoras bissexuais, carismáticas, lindas e cheias de segredos.

Rafa & Diego: homem trans e gay não-binário. Uma conexão sensível com histórias de superação.

Joana & Pietra: uma drag king e uma ativista vegana explosiva. Brigam por absolutamente tudo.

Vini & Lucas: pansexuais com energia caótica e libido nas alturas. Se beijaram no primeiro dia.

Maya & Rebeca: o casal que quase foi. Maya e Isadora já se conheciam, e Rebeca parece saber disso.

...O APRESENTADOR...

Dudu Ventura, 34 anos, ex-estrela queer da televisão, agora em seu auge. Não-binário, com cabelo platinado, delineado neon e figurinos entre o teatro e a passarela.

— Sejam bem-vindes ao lugar onde máscaras caem, emoções explodem e quem resistir até o fim… talvez encontre algo parecido com amor. Ou pelo menos, um bom Pix no bolso.

...REGRAS DO PROGRAMA...

Convivência obrigatória como casal, 24h por dia.

Desafios diários: físicos, íntimos, emocionais.

“Jantares da Verdade” semanais, para avaliar a conexão.

Votações do público e da produção indicam casais favoritos.

No fim, cada dupla deve decidir: dizer "sim" ou sair sem nada.

O quarto tem um armário compartilhado, um banheiro de casal e apenas uma cama king-size.

Isadora abre o armário com expressão neutra. Lá dentro, vê rendas e lingeries de um lado, e do outro, suas camisas brancas, sapatos sociais e gravatas.

Luna entra no quarto. Descalça. Vestida com um robe branco que realça cada curva.

Ela encosta no batente da porta com um sorriso preguiçoso.

— Não sabia que advogadas dormiam com calça de moletom — diz, com olhar brincalhão.

Isadora nem vira o rosto.

— E eu não sabia que modelos usavam tão pouco tecido fora da passarela.

Luna ri. Um som suave, provocador.

Ela se aproxima, devagar, como uma pergunta que sabe que será mal recebida.

— Vai ser divertido te ver tentando resistir a mim.

Isadora fecha o armário com força e se vira.

— Pode tentar. Mas eu não sou boa em perder.

E quando seus olhares se encontram —

— não é mais ironia.

É faísca crua.

Tensão. Tesão. Ódio. Curiosidade.

Tudo embaralhado, pronto para explodir.

E do lado de fora, o Brasil inteiro assiste.

A noite cai sobre a mansão como um manto pesado. As luzes coloridas do jardim se apagam uma a uma, restando só os refletores discretos e o som das câmeras reposicionando suas lentes. Lá dentro, os participantes ainda se ambientam. Alguns já se tocam como se estivessem apaixonados. Outros fingem melhor.

Mas no quarto de número quatro, o clima é tudo menos romântico.

Luna joga sua nécessaire sobre a cama com um suspiro irritado.

— Achei que a produção ia caprichar mais — comenta, encarando o quarto com desdém. — Nem uma champanhe de boas-vindas?

Isadora, sentada na beira da cama com um livro nas mãos, não responde. Só vira a página com a calma calculada de quem está contando até dez.

— Vai fingir que não me ouviu? — Luna insiste, olhando diretamente para ela. — Que gracinha. Você finge bem. Tem certeza que não é atriz?

Isadora fecha o livro devagar e o coloca sobre o criado-mudo.

— Eu estou tentando manter a paz. Por enquanto.

— Engraçado, porque você tem cara de quem quer me enforcar com o próprio colarinho — diz Luna, com um sorriso torto. Ela começa a tirar o robe, revelando uma lingerie branca, sem pressa, ciente do efeito que causa. — Mas tudo bem. Você pode olhar. Não custa nada.

Isadora desvia o olhar imediatamente.

— Acha que isso funciona comigo? A pose, o teatrinho?

— Com quase todo mundo, sim. Com você… ainda não sei — responde Luna, agora se aproximando do armário. — Você é do tipo que se apaixona por controle?

— Eu sou do tipo que se afasta de gente que acha que o mundo gira ao redor do próprio umbigo.

Luna dá uma risada seca.

— Jura que você é assim fria mesmo, ou é só defesa?

— Jura que você é assim insuportável mesmo, ou é só medo de ninguém gostar de você de verdade?

Silêncio.

Denso.

Áspero.

Até o som das câmeras parece cessar.

Luna para, respira fundo e responde num tom diferente:

— Eu não vim aqui pra fazer amizades.

— Eu também não. Vim pelo prêmio. E não pretendo ser eliminada por causa de birra.

— Então ótimo. Que tal você parar de agir como se estivesse num tribunal e aceitar que vamos ter que dividir a cama pelos próximos trinta dias?

— Só se prometer não roncar — Isadora diz, seca, pegando uma camiseta larga e entrando no banheiro.

Luna revira os olhos.

— Ótimo. Já vi que vai ser como dormir com um cacto de perna cruzada.

A porta do banheiro se fecha com um estalo.

Luna se joga na cama. Os olhos encaram o teto, mas a mente está longe. E, mesmo que não admita, uma parte dela... se diverte.

Com o embate.

Com o desafio.

Com Isadora.

Dentro do banheiro, Isa apoia as mãos na pia e encara o espelho. Respira fundo.

Ela sabe que precisa manter o foco.

Esse reality é só um degrau.

Fingir por trinta dias. Só isso.

Mas a verdade é que Luna a desarma. E ninguém gosta de se sentir desarmada.

Luz apagada. As duas deitadas. Um abismo entre seus corpos na cama grande demais para o silêncio.

— Boa noite, Advogada. — diz Luna, num sussurro debochado.

— Boa noite, Miss Ego. — responde Isadora, com a voz abafada pelo travesseiro.

Elas viram para lados opostos.

Mas o clima, o calor... permanece entre elas.

Não de amor. Ainda não.

Mas de algo que não será fácil ignorar.

...💬 Ei, você aí com esse dedo lindo parado!...

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...Beijos da autora,...

...Gabs Oliver, aquela que acredita no amor... mas também em tretas bem escritas. 😘...

ENCONTRO À PROVA DE BOM S

As luzes do restaurante do hotel eram mornas, douradas como vinho branco sob o pôr do sol. Um violino tocava ao fundo, tentando criar o clima romântico que a produção tanto desejava.

Mas havia uma guerra fria prestes a estourar na mesa número cinco.

Isadora chegou pontualmente, como sempre. Vestia um macacão de alfaiataria preto e discreto, o cabelo impecável. Sentou-se com a postura ereta, mãos no colo, olhos atentos.

Luna, por outro lado, apareceu dez minutos depois, com um sorriso debochado e um vestido curto com brilho nos lugares certos. O salto estalava no piso como se ela estivesse entrando numa passarela. Sentou-se de lado, cruzando as pernas devagar, deixando a câmera pegar o melhor ângulo.

— Atrasada — comentou Isadora, com a voz neutra.

— Você percebeu? Achei que estivesse entretida contando as taças de cristal — rebateu Luna, pegando o cardápio como se não se importasse. Mas importava. E como.

O garçom deixou um vinho na mesa. Desafio do dia: “Encontro romântico com conversa íntima”. A produção queria emoção. Ia conseguir discórdia.

— Vamos começar com algo simples — disse Isa, tentando seguir o roteiro da produção. — O que você gosta de fazer no tempo livre?

— Festas. Baladas. Shows. Gosto de sentir a vida pulsando, sabe? — respondeu Luna, sorrindo e servindo o vinho. — E você? Deixa eu adivinhar... chá, livros e playlist de piano?

— Leituras profundas, músicas que me fazem pensar. O contrário de barulho sem propósito — respondeu ela, com um sorriso que cortava. — Gosto de controle, de silêncio. De profundidade.

Luna ergueu uma sobrancelha, entediada.

— Parece emocionante. Deve ser ótimo dormir na primeira página.

— E deve ser incrível não conseguir manter a atenção em mais de duas frases.

O garçom apareceu no meio da tensão. Sorriu sem graça. Serviu as entradas. Saiu rapidamente.

— Eu não vim aqui pra ser diminuída — disse Luna, mais séria, agora.

— E eu não vim aqui pra lidar com alguém que vive de imagem — Isa rebateu. — Isso aqui é um reality, não um desfile.

— Pra você é só dinheiro, né?

— E pra você, é só se mostrar.

O silêncio que caiu entre elas era denso, cheio de coisas não ditas e julgamentos lançados como farpas.

Mas os olhos... os olhos contavam outra história.

Era ódio, sim. Era provocação, também. Mas havia algo naquele embate — um fogo incômodo, quente demais pra ser ignorado.

As câmeras captaram cada segundo.

O público surtou.

...(confessionário):...

🎥 Câmera fechada em Luna.

— Ela me tira do sério. Com aquele jeitinho de “eu sei de tudo”, como se ser organizada fosse algum tipo de superpoder. Eu só queria... dar um susto nela. Tipo, quebrar essa muralha.

🎥 Câmera fechada em Isadora.

— Ela é tudo o que eu desprezo. Superficial, inconsequente. Mas... é estranhamente magnética. E isso me irrita mais do que tudo.

O clique da porta soando quando elas entram no quarto soa quase como um aviso: cautela, isso pode explodir.

Isadora entra primeiro, os passos firmes, o rosto impassível.

Luna vem atrás, tirando os brincos e jogando-os no criado-mudo com descaso.

— Que ótimo encontro — Isadora diz, já abrindo o armário com força contida. — Super romântico. Um sucesso.

— Ah, sim — rebate Luna, jogando os saltos no chão. — Do jeitinho que você gosta: sem risadas, sem bebida, só críticas gratuitas. Uma delícia.

— Alguém precisava colocar limites. Você fala como se fosse o centro do mundo.

— Eu sou o centro do meu mundo. E olha... até que é um lugar divertido de viver — responde Luna, puxando o zíper do vestido com uma sensualidade involuntária.

Isadora revira os olhos. — Sabe, é engraçado. Você posa como se fosse liberdade em forma de pessoa, mas eu nunca vi alguém tão desesperada por aprovação.

Luna para. Vira devagar.

— E eu nunca vi alguém tão medrosa quanto você. Toda dura, toda controlada... deve ser horrível nunca se permitir sentir.

— Eu sinto. Só não ajo como uma adolescente bêbada.

— Uau. Que elogio maduro. Me deixa até com vontade de discutir sobre Proust.

— Você sabe quem é Proust?

— Não. Mas aposto que ele não era tão chato quanto você.

Isadora suspira alto. Vai até a cama, pega seu travesseiro e caminha até o sofá.

— Não acredito que vai dormir separada por causa de uma DR de gosto musical — diz Luna, cruzando os braços.

— Estou me protegendo do seu ego. Ele ocupa metade da cama — responde Isa, já se deitando com uma manta fina.

Luna bufa, se joga na cama com o robe ainda amarrado na cintura. Encarando o teto por alguns segundos, ela murmura, só para provocar:

— Sabe o que é pior? No fundo, você gosta quando eu mexo com você.

— No fundo, eu estou me perguntando se 500 mil reais valem a pena.

— Valem. Eu sou quase divertida quando você para de ser tão... juíza do universo.

— E você quase faz sentido quando cala a boca.

As duas se viram de costas uma para a outra. Uma no sofá. Outra na cama.

O silêncio que se instala não é pacífico — é tenso, carregado de pensamentos não ditos.

E mesmo assim, há um sorriso torto nos lábios de ambas. Porque, apesar das farpas...

... aquilo está longe de ser o fim.

Na verdade, é só o começo.

VINGANÇA EM DOSE DUPLA

O aviso da produção surgiu no aplicativo interno do programa com a mesma suavidade de um tiro:

Desafio da Semana: Passeios Românticos em Turnos. Um dia, cada integrante do casal escolhe uma atividade “especial e significativa”.

Luna sorriu maliciosamente ao ler.

Isadora ergueu uma sobrancelha.

O campo estava aberto. E a guerra também.

...A NOITE NA BOATE...

O transporte do reality deixou as duas na frente de uma casa noturna iluminada por néons azuis e vermelhos. O som das batidas eletrônicas já fazia o chão vibrar antes mesmo de entrarem.

— Isso aqui é sua ideia de passeio romântico? — pergunta Isadora, de braços cruzados, encarando a fachada como se fosse uma sentença.

— Claro — diz Luna, com um sorriso malicioso e o vestido colado ao corpo. — Amor se constrói com suor, música alta e umas doses de tequila.

Dentro da boate, Luna era como uma estrela em órbita: se movia com graça, acenava para as câmeras escondidas e para os curiosos no bar, e dançava como se o mundo estivesse ali para vê-la.

E Isadora... estava visivelmente deslocada. Sentada no canto, copo com gelo na mão, olhos vigilantes, postura ereta como se aquilo fosse uma audiência.

— Vem dançar comigo — disse Luna, estendendo a mão.

— Tô bem aqui. Observando a decadência da civilização.

Luna riu alto. Ignorou a recusa e começou a dançar em frente a Isa.

Perto. Muito perto.

Corpo curvado, quadril insinuando, os olhos presos nos dela.

— Isso aqui não é sobre dança — disse Isadora, irritada. — Você só quer me provocar.

— E tá funcionando?

Isadora levantou-se, empurrando Luna levemente com o ombro ao passar.

— Parabéns, Luna. Você venceu. Conseguiu me irritar.

— Obrigada. Foi mais fácil do que eu esperava.

...O DIA DA TRILHA...

Foram dormir às três da manhã.

Às cinco, Luna foi acordada com uma luz de lanterna no rosto.

— Levanta. Nosso passeio romântico começa agora — disse Isadora, com uma mochila nas costas e um sorriso quase angelical. Quase.

— Você tá louca? Isso é castigo, não é passeio!

— Considera uma meditação ativa. Vem, Barbie da Montanha.

A trilha começava no pé da serra e ia até uma cachoeira isolada. A produção deixou uma câmera fixa no alto de uma árvore — privacidade suficiente para parecer espontâneo, mas o suficiente para capturar boas cenas.

Luna reclamou desde o primeiro passo.

— Minhas pernas doem.

— Tá quente.

— Isso aqui tem mosquito.

— Você tá fazendo isso pra se vingar.

— Eu sei.

— Claro que estou — respondeu Isadora, impassível. — Mas pense pelo lado bom: sua maquiagem vai sair e vamos descobrir como você realmente é.

— Ah, querida... até suada eu sou linda.

Isadora riu.

— Isso é o que me irrita em você. Esse narcisismo desavergonhado.

— E o que me irrita em você é que... você se diverte me irritando.

— Exato — respondeu Isadora, com um brilho nos olhos que Luna, mesmo ofegante, percebeu.

O som da água caiu como um alívio nos ouvidos cansados.

Isadora jogou a mochila no chão e tirou a camiseta, ficando apenas de top esportivo e shorts.

— Vai entrar? — perguntou, sem olhar.

Luna já estava de calcinha e sutiã rendados.

— Se você não olhar, vai perder um espetáculo.

— Tô acostumada com espetáculo. Quero ver se tem conteúdo.

Elas entram na água fria. Um choque no corpo e, estranhamente, um alívio.

O clima muda.

Luna deita numa pedra submersa, cabelos molhados grudando no rosto.

Isadora senta ao lado, os joelhos junto ao peito.

Por alguns minutos... silêncio.

Até Luna falar, com uma voz mais baixa do que o normal:

— Sabia que eu cresci em Pindaré-Mirim? Interior do Maranhão. Sem asfalto, sem sinal de celular... Mas tinha rio, manga no pé e céu de verdade.

Isadora a encara, surpresa.

— Interior de Minas. São João do Pacuí. Sete mil habitantes e cinquenta igrejas. A única coisa que unia o povo era a rádio local e as fofocas na mercearia.

Luna ri.

— E agora a gente aqui, fingindo que tá se apaixonando.

— A gente tá fingindo? — pergunta Isadora, mas é mais para si mesma.

Elas se encaram.

E por um segundo, não tem provocação.

Não tem briga.

Só um eco da infância, da simplicidade que ambas deixaram para trás.

A câmera lá em cima grava tudo.

Mas naquele momento, pela primeira vez, elas não estão a interpretar.

A água ainda escorria pelos corpos quando Isadora olhou o relógio à prova d’água no pulso.

— Já deu. Vamos voltar antes que a produção precise vir resgatar a Barbie perdida no mato.

— Eu sou uma Barbie com GPS — rebateu Luna, levantando devagar, cabelos grudando na pele molhada. — E, sinceramente, o único perigo aqui... é você.

Isadora ignorou a provocação. Puxou a toalha da mochila, entregou uma para Luna, virou-se para começar a trilha de volta.

— Anda logo, princesa. Se cair, a floresta não tem passarela pra você desfilar.

— Pode deixar, Rainha dos Espinhos. Estou indo.

Elas começaram a subir a trilha de pedras escorregadias, os pés molhados deixando marcas no chão. O cansaço pesava nos músculos, mas nenhuma das duas admitiria.

Foi numa curva, entre uma raiz e uma pedra torta, que Luna escorregou.

— Merda!

O grito saiu alto.

Isadora virou rápido e a segurou pelo braço no reflexo. Os corpos se chocaram.

Luna escorava-se nela com força.

As mãos de Isadora em sua cintura.

Os rostos... muito próximos.

As respirações pesadas.

Os olhos se prenderam.

Por um segundo — um segundo real — o tempo congelou.

A boca de Luna fica a centímetros da de Isadora.

O susto ainda no peito.

O desejo? Talvez. Mas nunca admitido.

Isa foi a primeira a quebrar.

Soltou Luna, rápida, colocando-a de pé como se o toque tivesse queimado.

— Cuidado, porra. Vai quebrar o tornozelo e me fazer carregar você serra abaixo.

— A culpa é sua! — rebateu Luna, ainda com o coração acelerado. — Me trouxe pra essa trilha infernal, de propósito!

— Eu te segurei, Luna. Queria que eu deixasse você cair e ralasse esse joelho de comercial de hidratante?

— Eu preferia o tombo do que esse sermão.

— Ótimo. Na próxima, eu deixo você rolar pela mata. Talvez assim você cale a boca por dois minutos.

— E você, talvez aprenda a relaxar e não agir como se tivesse um diploma de superioridade no bolso!

— Relaxar?! Eu tô carregando o peso da sua birra desde que esse programa começou!

As palavras saíam como balas. A tensão entre elas voltava a se incendiar, alimentada pelo susto, pela proximidade, pela quase... qualquer coisa.

Luna ajeitou o cabelo molhado com raiva. Isadora ajeitou a mochila com um suspiro exasperado.

Elas voltaram a andar. Separadas por dois passos e dezenas de farpas silenciosas.

Mas nenhuma das duas conseguia parar de pensar naquele quase-beijo.

Ou no que ele teria sido... se alguém tivesse cedido.

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