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Amiga da Morte

Katherine Piece

...Katherine Piece...

Tem gente que acha que órfãos choram. Que sonham com uma família.

Eu? Eu só sonhava com silêncio.

Silêncio pra ouvir os códigos rodando.

Silêncio pra afiar a faca sem interrupções.

Silêncio pra planejar minha próxima entrada no sistema de segurança real.

E agora… aqui estou. Sentada na sala mais escondida do orfanato.

Uma sala que tecnicamente nem deveria existir — mas que eu mesma “criei”. Hackeei o sistema, apaguei o histórico e declarei esse espaço como área fantasma. Ninguém entra. Ninguém sabe. E ninguém sobrevive se descobrir.

Na tela à minha frente, o símbolo da Escola Real Suprema pisca. Azul e dourado. Luxo, arrogância, poder. A escola mais cara de todo o reino. Onde só entra quem tem sobrenome... ou algo mais valioso.

No meu caso: inteligência.

Mas lá… eu sou só "Katherine". A garota bonita, inteligente, de sorriso constante.

Nunca órfã. Nunca solitária. Nunca... real.

— “Você deve manter a postura, Katherine.”

— “Não fale do orfanato, Katherine.”

— “Sorria, Katherine.”

Eles amam meu sorriso.

Mal sabem que cada vez que ele aparece… é porque alguém está prestes a se ferrar.

O Reino de Asterion é dividido por linhas que ninguém ousa cruzar.

De um lado, os de sangue real.

De outro, o resto de nós — os descartáveis.

Os nobres nascem com poderes especiais. Chamas que obedecem ao estalar de dedos, ventos que cortam, sombras que matam.

E nós? Nós só nascemos com a obrigação de obedecer, calar e assistir de longe.

Mas eu não sou “nós”.

Nunca fui.

Enquanto eles usam dons pra se exibir, eu uso o meu para caçar.

À noite, viro fumaça. Uma sombra entre os becos, os corredores secretos, os porões esquecidos da cidade dourada.

Fui contratada por alguém que nem sei o nome — e que, se for esperto, vai continuar assim.

Minha missão é simples: limpar o lixo.

Traficantes. Assassinos. Corruptos.

Pessoas que mancham esse reino muito mais do que qualquer plebeu jamais poderia.

A diferença é que eu não deixo rastros.

E ninguém jamais suspeitaria de mim.

Tenho só dezesseis anos. Mas o corpo mais perfeito que essa monarquia já viu.

Não falo isso por vaidade. Falo porque é uma arma. Um disfarce.

Eles subestimam quem brilha demais.

Eu sou a melhor em combate corpo a corpo.

Sou a melhor em defesa.

E, nas redes ocultas da deep web do reino, sou uma lenda digital.

Eles me chamam de Ghost.exe.

Mas aqui fora… sou só Katherine Pierce.

A garota inteligente.

A bela.

A órfã que ninguém sabe que é órfã.

Eu sorrio.

Sempre sorrio.

Porque se eu parar… o mundo vai perceber o que realmente sou.

E quando perceberem, já vai ser tarde demais.

s descartáveis.

Os nobres nascem com poderes especiais. Chamas que obedecem ao estalar de dedos, ventos que cortam, sombras que matam.

E nós? Nós só nascemos com a obrigação de obedecer, calar e assistir de longe.

Mas eu não sou “nós”.

Nunca fui.

Enquanto eles usam dons pra se exibir, eu uso o meu para caçar.

À noite, viro fumaça. Uma sombra entre os becos, os corredores secretos, os porões esquecidos da cidade dourada.

Fui contratada por alguém que nem sei o nome — e que, se for esperto, vai continuar assim.

Minha missão é simples: limpar o lixo.

Traficantes. Assassinos. Corruptos.

Pessoas que mancham esse reino muito mais do que qualquer plebeu jamais poderia.

A diferença é que eu não deixo rastros.

E ninguém jamais suspeitaria de mim.

Tenho só dezesseis anos. Mas o corpo mais perfeito que essa monarquia já viu.

Não falo isso por vaidade. Falo porque é uma arma. Um disfarce.

Eles subestimam quem brilha demais.

Eu sou a melhor em combate corpo a corpo.

Sou a melhor em defesa.

E, nas redes ocultas da deep web do reino, sou uma lenda digital.

Eles me chamam de Ghost.exe.

Mas aqui fora… sou só Katherine Pierce.

A garota inteligente.

A bela.

A órfã que ninguém sabe que é órfã.

Eu sorrio.

Sempre sorrio.

Porque se eu parar… o mundo vai perceber o que realmente sou.

E quando perceberem, já vai ser tarde demais.

Os corredores da Escola Real Suprema cheiram a perfume caro, ambição e falsidade.

As paredes são cobertas de ouro, mármore e segredos.

E as pessoas? São tão afiadas quanto as lâminas que escondem sob os sorrisos.

Eu caminho por ali como se fizesse parte desse mundo.

Uniforme impecável. Trança lateral no cabelo branco. Blazer azul-marinho marcado com o brasão da escola: um leão com asas.

Ridículo.

— “Katherine, seu trabalho de estratégia está impecável mais uma vez.” — elogia a professora, olhando pra mim como se fosse uma raridade.

Sou. Só não pelo motivo que ela pensa.

Atrás de mim, ouço sussurros.

— “Ela é perfeita demais, não acha?”

— “É bonita, mas estranha. Nunca fala da família…”

— “Você viu os olhos dela? Vermelhos. Isso é… anormal.”

Eu sorrio.

Aperto os livros contra o peito e continuo andando.

Eles não sabem que ontem à noite eu esvaziei o ar dos pulmões de um general corrupto com as próprias mãos.

Eles não imaginam que, enquanto eles dormiam em camas de seda, eu estava limpando o porão de um palácio clandestino infestado de traficantes de jovens.

Eles acham que eu sou “esquisita”.

Se soubessem o que eu sou de verdade… implorariam por misericórdia.

**

Na hora do intervalo, estou sentada no jardim interno da escola. É o único lugar onde posso observar tudo e ser pouco observada. Até que…

Alguém se aproxima.

— “Você é boa demais pra esse lugar.” — diz uma voz grave e tranquila.

Levanto os olhos devagar. Um garoto de cabelos escuros, olhar calmo, mas afiado. Nunca falei com ele antes.

— “Digo… ninguém tira nota perfeita em criptografia aplicada. Nem mesmo os príncipes.” — ele cruza os braços, como quem me testa.

Sorrio.

— “Talvez eu só tenha mais tempo livre do que eles.”

— “Ou talvez você esteja escondendo alguma coisa, Katherine Pierce.”

O sorriso permanece. Mas por dentro, meu coração aperta uma arma invisível.

Quem é ele? E como ele sabe o meu nome completo se eu nunca disse?

O jogo parece estar começando.

E eu nunca recuo de uma partida.

Eu encaro o garoto. Ele tem aquele tipo de beleza que faz o mundo parar e olhar duas vezes. Um sorriso meio torto, olhar preguiçoso, mas atento — como se já tivesse visto tudo e estivesse entediado com o resto.

— “Você parece nervosa,” ele diz, sentando ao meu lado no banco de pedra. “Tem alguma coisa pra esconder?”

Olho de volta para a tela do tablet no meu colo. Linhas de código falsas — só uma distração para parecer ocupada.

— “Se eu tivesse algo pra esconder, você seria o último a descobrir.”

— “Aris, prazer.” — ele estende a mão. — “Príncipe de Vasskar, herdeiro número três da linhagem real. Mas pode fingir que eu sou só um aluno idiota. É o que eu faço.”

Não aperto a mão dele.

Ele ri. — “Uau. Gelo puro. Tá bom, Katherine Pierce… você venceu. Era só uma brincadeira.”

Meus olhos vermelhos se estreitam.

Ele sabe meu nome completo. Mas o sistema escolar só mostra o primeiro nome, a menos que você tenha acesso de administrador… ou de hacker.

Minha mente dispara em silêncio.

Ele não está brincando. Não de verdade.

Está testando os limites. Procurando rachaduras.

Mas tudo que ele vai encontrar é concreto armado.

— “E então,” ele continua, “me diz... como uma garota sem sobrenome, sem família conhecida, e com um histórico completamente limpo... consegue entrar na escola mais elitista do reino?”

Aperto o botão do tablet. A tela apaga.

— “Talvez eu só seja mais esperta que você.”

— “Ou talvez…” ele se levanta, virando-se com um meio sorriso provocador, “...você seja bem mais interessante do que parece.”

Ele se afasta. Mas deixa algo para trás — um cartão preto, preso discretamente entre as páginas do meu caderno.

Quando abro, há uma única frase:

"Quando o sistema falhar, procure a saída pelo fogo."

Nada mais.

Olho ao redor. O jardim está vazio. A brisa sopra leve.

Mas algo mudou.

Porque agora, alguém está prestando atenção.

E eu odeio ser observada.

Saí da escola com passos leves, mas mente carregada.

O cartão preto ainda queimava no bolso como se tivesse sido escrito com fogo.

“Quando o sistema falhar, procure a saída pelo fogo.”

Criptografia? Ameaça? Ou só mais uma brincadeira idiota de príncipe entediado?

Não importa.

Só tem um lugar no mundo onde eu posso pensar em paz.

O orfanato.

O lugar onde morri pela primeira vez.

E onde renasci com uma nova identidade.

Assim que entro pelos fundos, o sistema de segurança que eu mesma instalei reconhece meu passo.

As luzes não piscam. As câmeras fingem estar quebradas.

E eu desapareço no corredor mais escuro do prédio.

Minha sala secreta fica atrás de um armário vazio, no fim do subsolo. Uma parede falsa, um sensor de calor e um código que mudo a cada três dias.

A porta desliza.

Lá dentro: meu mundo.

Três monitores. Uma mesa com peças de armas desmontadas. Codificadores, transmissores, mapas digitais.

E o mais importante: silêncio.

Só que hoje…

Hoje tem algo errado.

Um ruído. Quase imperceptível.

Como se o som tivesse um eco.

Como se alguém tivesse estado ali.

Meus olhos vasculham cada canto.

Nada fora do lugar. Mas algo me chama — um sexto sentido que nunca falha.

Saio da sala. Em passos secos, rápidos, vou direto para o meu quarto. E antes que eu consiga sequer fechar a porta…

TOC TOC TOC.

Três batidas curtas.

A voz da diretora ecoa do outro lado, fria como sempre.

— “Katherine… venha comigo. Há alguém aqui. Quer conversar com você.”

Silêncio.

— “Diz… que gostaria de adotá-la.”

Adotar?

Meu sangue gela.

Ninguém quer adotar uma órfã de dezesseis anos.

Não nesse reino.

Não quando a maioria dos ricos está muito ocupada treinando os filhos mágicos para guerras que nunca vão lutar.

Isso é errado.

Muito errado.

Respiro fundo. O rosto volta a sorrir.

A máscara desliza sobre a pele.

— “Claro, diretora,” digo, com a voz mais doce que consigo fingir. “Estou indo.”

Mas por dentro, a assassina já despertou.

E se alguém quer me tirar daqui… vai precisar jogar no meu tabuleiro.

Entro na sala principal do orfanato com passos lentos.

Tudo em mim — o sorriso, o olhar dócil, a postura relaxada — é cuidadosamente encenado.

Mas por dentro, cada músculo está pronto pra guerra.

E então o vejo.

De pé, à frente da lareira acesa, está um homem alto, magro, vestindo um terno escuro que parece ter sido moldado sob medida. O tecido brilha sutilmente, como se estivesse feito de sombra e prata.

A aura dele?

Fria. Precisa. Letal.

Ele parece ter vinte e dois anos. Mas sei que tem mais de trinta.

Não por causa de rumores… mas porque estudei ele. Observei. Investiguei.

Ele não é um figurante do palácio.

Ele é Felipe D’Argent.

Braço esquerdo do rei.

O homem que sussurra nas guerras, que executa as ordens reais quando nem mesmo os generais têm coragem de agir.

E ele está… aqui?

A diretora, toda arrumada como nunca vi, sorri feito boba ao meu lado.

— “Katherine, querida, este é o senhor Felipe. Um dos homens mais importantes do reino. Um gênio, formado em diplomacia, estratégia e combate… e, surpreendentemente, um homem com um coração generoso.”

Felipe sorri. Um sorriso que não toca os olhos.

— “Ele demonstrou interesse em… adotar você. Não é maravilhoso?”

Meu sorriso se sustenta.

Mas meus olhos não piscam.

Ele me encara de volta. Como se estivesse lendo não minha aparência — mas minha estrutura, célula por célula.

Ele sabe.

Sabe quem eu sou.

Sabe o que faço nas madrugadas.

Sabe o que escondo por trás do sorriso.

E, pior: ele parece… curioso.

— “É um prazer finalmente conhecê-la, Katherine,” ele diz, com a voz firme e baixa. “Você tem impressionado muita gente.”

Não respondo de imediato.

Minha mente calcula três rotas de fuga.

Quatro maneiras de desarmá-lo.

E sete hipóteses sobre o motivo de um monstro real estar de repente interessado em mim.

Ele me oferece a mão.

— “Aceitaria um café comigo? Tenho algumas… propostas que talvez te interessem.”

Por trás da voz calma, há algo mais.

Algo escuro.

Algo... que cheira a poder.

E pela primeira vez em muito tempo…

Eu não sei se estou diante de um inimigo.

Ou de uma oportunidade.

Proposta Envenenada

...Katherine...

Ele me encara como se já soubesse a resposta.

Como se o jogo já tivesse começado antes mesmo de eu entrar na sala.

Felipe D’Argent.

Braço esquerdo do rei.

Executor de guerras silenciosas.

E agora… alguém interessado em mim.

— “Não precisa me responder agora,” ele diz, com um sorriso que não engana ninguém. “Mas gostaria que considerasse uma proposta.”

Cruzo os braços, olhando direto nos olhos dele.

Se tem uma coisa que aprendi com o tempo… é que homens como ele não oferecem nada de graça.

— “Você é boa,” ele continua. “Muito melhor do que qualquer relatório conseguiu explicar. Inteligente, invisível, implacável. E ainda por cima… uma das únicas pessoas no reino que conseguem se mover entre o submundo e a elite sem levantar suspeitas.”

Silêncio.

Ele dá um passo à frente.

Se aproxima como quem oferece um presente — ou uma armadilha.

— “E é por isso que quero te dar algo que ninguém mais te daria.”

— “Liberdade.”

Meu sorriso quase quebra. Quase.

— “Você vai poder continuar limpando os porões sujos desse reino — traficantes, assassinos, políticos podres. Eu garanto que não será presa. Nada do que fizer será registrado. Ninguém vai te rastrear.”

— “E como hacker… poderá ter acesso a tudo. Sistemas reais. Códigos secretos. Bancos, arquivos, segredos de Estado. Vai poder entrar onde quiser.”

Parece bom demais pra ser verdade.

E é por isso que sei: tem um porém.

Ele respira fundo e conclui:

— “Em troca, você será guarda-costas da princesa.”

— “Viverá no castelo. Ficará de olho nela, protegerá sua vida, seguirá seus passos.”

A princesa.

A garota dourada. A intocável.

A filha perfeita do rei que vive cercada de luxo e mentiras.

A garota que eu não posso matar.

Mas posso vigiar.

Meus olhos fixam nos dele. Por um momento, silêncio total.

Por dentro, minha mente já trabalha:

> Acesso total.

Imunidade judicial.

Proximidade direta da família real.

E liberdade total de ação.

E então eu percebo…

Ele não está me contratando.

Ele está me testando.

— “E se eu recusar?” — pergunto, com voz doce.

Ele sorri, sereno:

— “Então alguém menos qualificada vai assumir seu lugar. E talvez… o mundo descubra tudo que você vem escondendo.”

Ah.

Aí está o veneno.

Mas o que ele não sabe é que veneno… eu tomo no café da manhã.

Levanto o queixo e respondo, com o sorriso mais perigoso que já usei:

— “Quando começamos?”

— “Só tem um detalhe,” ele diz, ajeitando os punhos da camisa como se estivesse falando de algo trivial.

Mas nada no que ele diz é trivial.

— “Você tem dezesseis. E, oficialmente, menores não podem fazer parte de operações como essa. Nem viver no castelo sem explicações...”

Ele dá mais um passo, e o mundo parece segurar a respiração.

— “Então… a partir de hoje, você será minha filha.”

O silêncio que se segue não é desconfortável.

É calculado.

Eu o encaro. Ele não está brincando.

Felipe D’Argent está prestes a assinar o maior disfarce da minha vida.

— “Adotar?” — repito, fingindo surpresa. — “Achei que esse tipo de coisa era só fachada emocional.”

Ele sorri, mas dessa vez… há algo de sombrio no sorriso.

— “E é. Totalmente fachada. Mas uma fachada muito útil.”

Volto a andar devagar pela sala, sem tirar os olhos dele.

— “E a princesa?”

— “Não pode saber quem você é. Nem o que faz. Pra ela, você será só minha filha… recém-apresentada ao mundo real após anos vivendo longe da capital.”

— “Ela vai te tratar como igual. Vai confiar em você. Vai te contar tudo.”

Eu paro. A cabeça analisa as vantagens:

> Proximidade total da herdeira.

Acesso irrestrito aos cômodos privados do castelo.

Códigos, protocolos, rede interna… tudo estará ao alcance.

E o disfarce? Irretocável.

Mas também tem riscos.

Felipe me adotando me coloca sob os olhos da elite.

E por mais que o mundo ache que sou só uma “garota bonita e inteligente”…

Toda máscara um dia racha.

— “Você vai viver sob meu teto,” ele continua, “com acesso total ao castelo e à família real. Terá treinamento oficial, reuniões falsas, e liberdade sob meus protocolos.”

Ele se aproxima mais. A voz baixa, afiada.

— “Mas, até completar vinte e um anos, Katherine… você será, para o mundo, minha filha. E isso significa que tudo o que você fizer… também será minha responsabilidade.”

Eu sorrio.

— “Então você realmente confia em mim?”

— “Não,” ele diz. “Mas confio no que você quer.”

Ele me conhece.

Sabe que não quero família.

Nem segurança.

Nem afeto.

Eu quero acesso.

E agora eu tenho.

Estendo a mão.

— “Então tá feito.”

Felipe aperta, firme.

Naquele momento, eu não sou mais uma órfã.

Sou Katherine D’Argent.

E o castelo… vai ser meu novo playground.

......................

Felipe se afasta da lareira, caminha até a mesa da diretora e pega um envelope preto, selado com o brasão da família real: duas espadas cruzadas sob uma rosa. Um símbolo de poder… e de manipulação.

Ele me estende o envelope.

— “A partir de amanhã, você não frequenta mais a Escola Real Suprema,” ele diz, como se estivesse me liberando de uma obrigação banal. “Você vai estudar na Instituição Alta da Coroa.”

O nome pesa no ar como chumbo.

É a escola secreta da elite real.

Onde só príncipes, herdeiros militares e magos conselheiros estudam.

Onde cada aluno tem guarda-costas, aulas de estratégia real, magia, política e manipulação.

E onde ninguém como eu jamais deveria pisar.

— “Você precisa se adaptar rápido,” ele continua. “A princesa estuda lá. E é lá que ela vai te conhecer.”

Olho o envelope, depois para ele.

— “E se alguém suspeitar?”

— “Eles não suspeitam de filhos adotivos,” ele responde, tranquilo. “Eles subestimam.”

Meu sorriso retorna.

É verdade. E é exatamente assim que eu venço.

Ele vira-se para a porta, mas antes de sair, acrescenta:

— “O uniforme já está no seu quarto. Amanhã, às seis, eu venho te buscar. Primeiro passamos pela escola. Depois… pela nossa casa.”

“Nossa casa.”

Duas palavras que não significam nada pra mim.

Mas servem bem como fachada.

Ele sai. A diretora, eufórica como uma criança em festa, mal consegue esconder o orgulho de ter recebido um homem como Felipe no orfanato.

Enquanto ela fala sozinha, eu me retiro, sem pressa.

No quarto, o pacote está sobre a cama.

Desfaço o laço.

O uniforme da Instituição Alta da Coroa é preto e carmesim. Luxuoso, fechado até o pescoço, com cortes de guerra.

Tem um brilho sutil.

Como se dissesse: quem veste isso pode mandar matar com uma palavra só.

Visto-o no espelho. Me olho.

A menina do orfanato se foi.

O hacker das sombras, o fantasma das noites, agora vai andar sob holofotes.

Mas nada muda, no fundo.

Eu continuo sendo eu.

E o reino continua sendo meu campo de caça.

Só que agora… com aprovação oficial.

...----------------...

O relógio marcava 5h57 da manhã quando terminei de me vestir.

Cabelo preso de forma impecável. Olhos vermelhos realçados por um delineado suave. Uniforme preto e carmesim justo ao corpo, como uma segunda pele.

Nada fora do lugar.

Porque nesse novo mundo… tudo é observado.

A mochila nas costas está leve.

Só o necessário. O resto — informações, backups, planos — já está guardado em servidores remotos que ninguém jamais vai descobrir.

Olho o quarto pela última vez.

A cama de ferro torto.

A janela com a grade levemente serrada (sim, fui eu).

As paredes frias e sem cor.

Não sinto nada.

A diretora bate à porta com aquele entusiasmo falso de sempre.

— “Katherine! Ele já chegou. Está te esperando na frente.”

Sigo ela em silêncio.

O orfanato ainda está adormecido. As outras meninas nem sabem que eu tô indo embora. E sinceramente? Nem deveriam.

Elas viverão suas vidas de sempre.

Enquanto eu… vou pra um lugar onde um erro pode significar execução pública.

O corredor até a saída parece mais longo hoje.

E então vejo ele.

Felipe está parado ao lado de um carro preto fosco, com o emblema da Coroa pintado em prata no capô. Um motorista o aguarda ao lado da porta aberta.

Ele me observa como se estivesse avaliando um ativo valioso.

— “Pontual,” ele diz.

— “Sempre fui,” respondo.

A diretora se aproxima, sorrindo feito uma idiota.

— “Ela é uma menina muito especial, senhor Felipe. Tenho certeza de que vai se sair muito bem.”

— “Eu sei que vai,” ele responde, sem olhar pra ela.

Eu apenas dou um leve aceno. Nenhum abraço. Nenhuma lágrima. Nada de discurso.

Esse lugar nunca foi lar.

Felipe abre a porta traseira e me espera entrar.

Quando me sento, olho pela janela uma última vez.

O orfanato já está ficando pra trás.

A poeira sobe com o vento.

E eu?

Eu estou indo direto pro centro do jogo.

Com um novo nome.

Uma nova missão.

E as mãos ainda sujas de sangue — escondidas por luvas elegantes.

O carro desliza pelas avenidas douradas da capital como se o tempo estivesse anestesiado. Felipe senta ao meu lado, impecável como sempre, os olhos fixos no visor de dados embutido no banco da frente. Ele não fala por um tempo. Até que, sem desviar o olhar, solta:

— “A Instituição Alta da Coroa é diferente de qualquer lugar que você já conheceu.”

Fico em silêncio. Ele continua.

— “Lá dentro, todos são filhos do poder. Gente treinada pra liderar, manipular, esmagar. Cada aluno tem guarda-costas, seguranças, rastreadores… e olhos voltados para a Coroa.”

— “Ótimo,” digo, com sarcasmo leve. “Sempre quis uma plateia.”

Ele lança um olhar rápido.

— “Kath,” diz, com um tom um pouco mais sério, “você vai ser observada desde o segundo que pisar lá. E por mais que eu tenha autorizado sua liberdade… hoje é o seu primeiro dia. Então, um conselho.”

Ele se inclina ligeiramente na minha direção. A voz firme, mas calma.

— “Não mate ninguém.”

Sorrio. De canto.

— “Nem se merecerem?”

— “Principalmente se merecerem.”

Encostei a cabeça no vidro e respirei fundo.

O carro diminuiu a velocidade conforme nos aproximamos do portão principal da escola. A estrutura era imensa — muralhas de pedra escura com vitrais vermelhos, torres de observação, câmeras escondidas, jardins perfeitamente simétricos. Tudo exalava controle.

E poder.

Ao entrar, o carro foi escoltado por dois guardas em trajes cerimoniais. Felipe me levou direto ao prédio administrativo. Subimos os degraus sob os olhares de alunos e professores que paravam ao nos ver passar.

Filha de Felipe D’Argent.

Nova aluna.

Nova ameaça.

Na sala da diretora, tudo era feito de mármore e silêncio.

A mulher atrás da mesa era alta, severa, com cabelo preso em um coque afiado e olhos que analisavam como lâminas.

— “Senhor D’Argent,” disse ela, levantando-se com respeito incomum. “É uma honra.”

Ele assentiu, cortando a formalidade.

— “Vim finalizar a documentação da minha filha.”

Me sentei ao lado dele, em silêncio. Assinei os papéis com calma.

Nome novo. Identidade nova.

Katherine D’Argent.

Filha adotiva do braço esquerdo do rei.

A diretora nos observava com interesse clínico.

— “Bem-vinda à Instituição Alta da Coroa, senhorita D’Argent,” ela disse com um leve sorriso. “Acredito que sua presença… trará movimentação.”

Tradução: Estamos de olho em você.

Ela passou um crachá preto com detalhes dourados e um símbolo especial que nenhum outro aluno tinha.

Autorização total.

— “Seu quarto está pronto. Seu cronograma de aulas começa amanhã. Por hoje…” — ela me entregou um mapa holográfico do campus — “recomendo que explore. E memorize tudo. Aqui, quem se perde… fica pra trás.”

Assenti.

Felipe apenas se levantou.

— “Às seis, a limusine real te leva para casa.”

— “Casa,” repeti, como quem experimenta uma palavra nova.

Ele sorriu de leve. Depois foi embora, sem mais nada.

Agora era só eu.

E um colégio inteiro prestes a conhecer a garota que ninguém deveria provocar.

O campus da Instituição Alta da Coroa parecia mais um campo de guerra disfarçado de paraíso. Jardins perfeitos, fontes douradas, torres mágicas, e um céu azul irreal demais pra ser confiável.

Andava em silêncio, observando tudo — os padrões de patrulha dos guardas, as saídas de emergência, o movimento dos drones escondidos nas copas das árvores. Cada detalhe, registrado.

Até que, é claro… alguém resolve me atrapalhar.

— “Você deve ser a filha do D’Argent,” diz uma voz arrogante atrás de mim. “Achei que ele fosse mais exigente com a aparência.”

Viro devagar.

Um garoto. Alto, herdeiro de algum clã nobre, cabelo cuidadosamente bagunçado, sorriso debochado de quem nunca levou um não. E já estou decidida: se ele me seguir por mais dois minutos, vou quebrar o nariz dele.

— “Você fala sempre ou só quando ninguém te perguntou nada?” — respondo, calma.

— “Olha, ela tem língua afiada. Isso vai render,” ele ri, se colocando na minha frente.

Penso em mil formas de matá-lo discretamente. Todas eficientes.

Mas aí me lembro da voz de Felipe:

> “Não mate ninguém.”

Suspirei.

Virei o corpo e comecei a andar em outra direção, com toda a calma que consegui fingir. Atrás de mim, ainda ouvi uma última provocação:

— “Tá fugindo? Que tipo de princesa você é?”

Mas antes que eu pudesse decidir se quebrava a promessa só um pouquinho...

O alarme vermelho disparou.

Sirene aguda. Gritos. Um campo mágico explodiu em luz acima de nós.

Algo tinha invadido o campus.

— “Todos para os abrigos!” — gritava um guarda com lança mágica na mão.

Foi então que vi a criatura.

Saindo das sombras atrás da biblioteca central: pele preta como carvão em brasa, olhos amarelos, garras longas arrastando no chão.

Um Devorador.

Criatura rara, antiga. E perigosa o bastante pra justificar alerta real.

Meu instinto gritou: mate.

Mas minha mente gritou mais alto: não pode chamar atenção. Ainda não.

Então corri.

Corri com a multidão. Como se fosse normal. Como se não tivesse uma lâmina escondida sob a manga.

Me misturei com os alunos, saltando escadas, desviando de escudos mágicos e alarmes que disparavam palavras de ordem.

Olhei pra trás. A criatura estava no telhado, farejando o ar.

Ela queria algo.

Ou alguém.

Quando virei o rosto de novo pra frente…

BAM.

Bati de frente com alguém.

Meus lábios colidiram com os dela.

Por um segundo, tudo ficou em silêncio.

Um beijo.

Rápido.

Imprevisto.

No meio do caos.

Recuei. Piscando. Ela também.

A garota me olhou com um misto de surpresa e desprezo.

— “Você ousa esbarrar em mim?” — disse com a voz arrogante, erguendo o queixo.

Era ela.

Cabelos dourados como se fossem tecido por magia.

Olhos azuis gelados, como a realeza ama exibir.

Postura impecável, mesmo no meio da confusão.

A princesa.

É claro.

De todas as pessoas do mundo… eu fui esbarrar logo na maldita herdeira do trono.

Ela limpou a boca com o dorso da mão, como se quisesse apagar o toque.

Eu apenas sorri. Um sorriso frio. Contido.

— “Pelo menos agora posso dizer que beijei realeza,” falei, sarcástica.

Os olhos dela se estreitaram.

A guerra estava declarada.

E eu mal tinha começado o primeiro dia.

Isca

...Katherine ...

Ela ainda me olhava com aquele ar de superioridade esculpido em pedra.

A princesa.

O nome dela estava gravado em todos os cantos do reino, mas ninguém ousava tratá-la como humana. Só como símbolo. Como coroa.

Mas ali, agora… depois de um beijo acidental no meio de um alerta vermelho e um caos absoluto…

Ela me olhava como se eu tivesse invadido o próprio trono.

— “Você é quem mesmo?” — ela perguntou com um desdém quase poético.

— “Katherine D’Argent,” respondi, sem curvar a cabeça. “Filha do conselheiro pessoal do seu pai. E, a partir de hoje… sua colega de escola.”

Ela piscou. Aquilo a incomodou mais do que qualquer palavra que eu pudesse dizer.

— “Nunca ouvi falar.”

— “Vai ouvir,” finalizei com um sorriso. “Com o tempo.”

Gritos ainda ecoavam ao fundo. Guardas passavam correndo. A criatura, aparentemente, havia sido contida — ou pelo menos forçada a recuar. Uma barreira mágica pulsava acima do campus como uma rede de sangue vivo.

O alarme cessou. A tensão não.

— “Vocês duas!” — gritou um guarda real, aproximando-se com a lança em mãos. “A princesa deve ser escoltada de volta! E você — Katherine, certo? Está convocada pela diretoria agora.”

Ótimo.

Lá vem consequência.

**

Pouco tempo depois, estava de volta à sala da diretora.

Felipe já estava lá, como se sempre soubesse que eu acabaria ali.

Ele não parecia bravo. Só… atento.

— “Primeiro dia,” ele disse, folheando um relatório. “E já foi vista, beijou a princesa e estava a vinte metros de uma criatura antiga.”

— “Não foi um beijo. Foi um acidente,” corrigi.

Ele levantou uma sobrancelha.

— “E por que ela disse que você ‘ousou’ esbarrar nela?”

— “Porque ela é arrogante. E frágil. Um tropeço e o mundo dela desmonta.”

Silêncio.

Felipe sorriu, fechando o relatório.

— “Bom. Isso vai ser mais interessante do que eu pensei.”

A diretora pigarreou atrás da mesa.

— “A criatura que apareceu hoje... foi invocada de dentro dos portões. Alguém a trouxe.”

Olhei para ela. Depois para Felipe.

— “Acha que foi pra testar a segurança da escola?”

— “Ou a sua,” ele respondeu.

**

Saí dali com uma dor de cabeça leve, a informação martelando no fundo da mente: alguém no campus, provavelmente da própria elite, queria ver até onde eu aguentava.

Queria me ver tropeçar.

Ou me revelar.

Às 18h em ponto, a limusine me levou até a nova “casa”. A mansão de Felipe. Vazia, silenciosa, cheia de portas trancadas e corredores perfeitos demais.

Mas não importava.

Eu tinha um quarto enorme agora. Um computador com acesso ao servidor da coroa. E roupas feitas sob medida pra alguém que supostamente deveria se importar com aparência.

Mas ali, sentada no parapeito da janela, olhando as luzes da cidade abaixo, tudo o que eu pensava era:

> Eu beijei a princesa.

E ela vai lembrar disso todos os dias.

Porque esse reino...

Está prestes a descobrir o que acontece quando dá asas a uma assassina.

A noite caiu pesada sobre a mansão de Felipe.

Os corredores continuavam silenciosos, a casa perfeita demais para ser viva. Mas eu não dormi.

Fiquei horas vasculhando o sistema da escola pelo console escondido no fundo da estante do meu quarto. Criptografias, matrículas, rastros digitais. Nomes, horários, acessos.

Foi ali que ela apareceu.

Lua Valenhardt.

Filha do rei.

Herdeira direta da Coroa.

A “garota prodígio” que todos os professores bajulam como se fosse um milagre nascido da realeza.

Idade: 16.

Notas: perfeitas.

Histórico: impecável.

Avaliações de estratégia e lógica: 99,8%.

Faltava 0,2%.

E esse 0,2%… sou eu.

Fechei o console e fui até a janela. As luzes da cidade pareciam brilhar mais fracas que os olhos azuis da princesa.

Lua Valenhardt.

A menina que todos amam.

Que governa o campus como se já estivesse no trono.

Mas que agora… teve seu caminho cruzado por mim.

Ela é inteligente. Muito.

Mas eu sou um fantasma.

Uma assassina.

A falha que o sistema nunca previu.

O jogo começou.

E amanhã… será a primeira jogada oficial.

Ainda estava diante do console quando a tela piscou.

Não era um erro do sistema.

Era ela.

A fonte antiga surgiu em vermelho na base do código. Uma frase simples, mas que sempre gelava minha espinha — não por medo, mas por hábito:

> “Sangue novo. Cidade velha. Preciso de você esta noite.”

Nenhum remetente. Nenhuma localização.

Só uma assinatura invisível que só eu consigo rastrear:

V.

Essa pessoa — essa voz — sempre aparece quando o reino fede mais do que o normal.

E sempre com um alvo.

Um nome.

Meus dedos começaram a trabalhar. Criptografia dupla, proxy triplo, invasão por eco. Hackeei o próprio código da mensagem. Em segundos, a próxima linha se formou:

> “Alvo: Magistrado Alcor Vernius.”

“Local: Torre 4, Distrito de Justiça.”

“Status: Vazio até as 4:00h. Execute antes disso.”

Franzi o cenho.

Alcor Vernius. Um dos juízes mais respeitados da elite… ao menos em público.

Mas nos arquivos que eu já tinha...

Extorsão, tráfico de influência, execuções ilegais de plebeus.

Um homem podre disfarçado de lei.

Perfeito.

Salvei a mensagem, apaguei o rastro, fechei o console.

Levantei da cadeira como quem vai tomar água. Mas cada movimento era ensaiado.

A mansão estava cercada por segurança mágica, mas eu conhecia os pontos cegos — estudei tudo no dia em que cheguei.

Coloquei uma roupa preta sem emblemas, máscara parcial, lâminas finas presas nos punhos e tornozelos.

Às 2h17, já estava fora da mansão.

Às 2h41, nos telhados da cidade antiga.

Às 3h02… de frente para a Torre 4.

O vento soprava alto. Os guardas dormiam como reis.

Magistrado Vernius estava no 18º andar.

E eu… flutuei até lá como sombra.

Entrar foi fácil.

Dentro do escritório, tapeçarias caras, vinho aberto, arquivos secretos na parede.

E ele.

Sentado numa poltrona de veludo, desmaiado de tanto luxo.

Sorrindo no sono como um porco gordo sonhando com poder.

Eu poderia matá-lo em três segundos.

Mas levei dez.

Porque quis olhar bem para o rosto dele antes de cortar a garganta.

> Um juiz corrupto a menos.

Um parasita eliminado.

Antes de sair, deixei o aviso no espelho, escrito em sangue:

“A justiça que vocês negam... eu entrego.”

Assinado, como sempre:

“K”

Às 4h em ponto, eu já estava de volta ao quarto.

Tirei as roupas, limpei as lâminas. Nenhum arranhão. Nenhuma pista.

Só o gosto do ferro ainda no ar.

E amanhã?

Uniforme real. Aula com nobres.

E um sorriso perfeitamente falso no rosto.

Porque ninguém desconfia da filha adotiva perfeita.

Mas alguém, em algum lugar, me observa.

Porque V. ainda não se revelou.

E essa voz na escuridão…

Sabe demais sobre mim.

O uniforme carmesim abraça meu corpo com perfeição.

O cabelo branco desce como uma onda de neve pelo ombro, os olhos vermelhos contrastam com tudo e todos — como fogo em meio a gelo. Cada detalhe foi calculado.

Eu não me visto para agradar.

Me visto para dominar.

E hoje, no primeiro dia…

Preciso que todos lembrem de mim.

O motorista da mansão me leva até o campus. A segurança já me reconhece. A entrada é direta, sem revistas, sem perguntas. Filha de Felipe D’Argent. Nome tem peso aqui.

Mas é só quando chego no prédio principal que o verdadeiro jogo começa.

Os alunos me observam como se eu fosse uma tempestade entrando por engano num salão de chá.

— “Ela é a filha adotiva do Conselheiro D’Argent…”

— “Ouvi dizer que veio de um internato em outra capital…”

— “Esses olhos… são mesmo naturais?”

— “Deve ter feito pacto com alguma bruxa…”

— “Linda demais pra ser confiável.”

Sorrio internamente.

Eu gosto disso.

A confusão. O medo disfarçado de curiosidade.

Logo uma professora de túnica prateada me guia até a sala.

— “Senhorita D’Argent, sua turma é a Classe Prime — o núcleo central da realeza. Os melhores alunos. E a princesa também está lá. Você terá um assento especial.”

Lógico.

Onde mais eu estaria?

Abrem a porta.

A sala é enorme, com janelas arqueadas, chão de pedra polida, tecnologia mágica embutida nas paredes.

E lá estão eles: filhos de ministros, generais, duques… e ela.

Lua Valenhardt.

Sentada ao fundo, sozinha, como um sol que não precisa de órbita.

Nossos olhos se encontram.

E por um segundo, tudo silencia.

Ela ergue uma sobrancelha.

Eu sorrio.

— “Senhorita D’Argent,” diz a professora, “sente-se ao lado da princesa.”

Claro que sim.

Ao passar pela fileira de alunos, os cochichos aumentam. E quando me sento ao lado dela, Lua cruza as pernas com elegância, mas sem esconder o olhar afiado que me atravessa.

— “Você de novo…” ela murmura, seca.

— “Acho que o destino gosta de ironias,” respondo, apoiando o queixo na mão. “Ou talvez só queira me ver te irritar.”

Ela revira os olhos.

— “Espero que seja tão inteligente quanto acha que é. Essa turma não perdoa fraqueza.”

— “Eu não perdoo arrogância. Estamos quites.”

A professora começa a aula.

Mas Lua continua me encarando de tempos em tempos.

Ela sente.

Mesmo sem saber o que… ela sente.

Que eu sou uma ameaça.

E eu?

Estou me divertindo demais pra disfarçar.

A aula de Estratégia Real começou com uma projeção mágica no centro da sala: mapas do reino flutuando, com rotas comerciais, fortalezas mágicas e zonas de guerra digital.

A professora falava sobre "simulações políticas" — como lidar com revoltas civis sem sujar as mãos da monarquia.

— “Vocês precisam aprender a negociar com o caos sem parecerem fracos,” ela dizia. “Essa é a arte de manter o controle.”

Enquanto todos anotavam como papagaios bem treinados, eu já havia hackeado a rede da sala só pelo tédio.

Mas aí… algo estranho aconteceu.

A imagem do mapa começou a piscar. Sutilmente. Um erro técnico? Não.

Era intencional.

Somente quem olhava por tempo suficiente notaria:

Alguns pixels se rearranjavam numa frequência específica.

Sinal de transmissão oculta.

Pisquei devagar, concentrei a visão no mapa flutuante.

Aos poucos, os pontos vermelhos de fortaleza formavam algo novo.

> “CLASSE PRIME \= ISCA”

Meu sangue gelou.

Não por medo.

Mas por prazer.

Alguém, em tempo real, tinha invadido o sistema da aula para nos mandar uma mensagem.

E não era só uma ameaça.

Era um aviso.

Levantei os olhos devagar.

A professora não tinha notado.

Ninguém tinha.

Exceto…

Lua Valenhardt.

Ela também havia parado de escrever. Estava com os olhos fixos no mapa, sobrancelha tensa, dedos discretamente sobre um cristal de alerta escondido no anel real.

Ela viu.

Mas, ao contrário dos outros… ela não entendeu.

E foi aí que eu vi a fumaça.

Sutil. Saindo da parede mais distante da sala.

Não era fumaça normal.

Era mágica. Corrosiva. Invisível para sensores comuns.

Levantei sem pedir licença.

A professora se virou, indignada:

— “Senhorita D’Argent, aonde pensa que vai?”

— “Evitar que metade da realeza vire carvão, professora.”

Corri até o canto da sala e chutei a parede de madeira falsa.

Atrás dela: um dispositivo mágico, antigo e instável.

Feitiço-bomba.

Tempo até ativação: 00:46 segundos.

O caos começou.

Gritos, alarmes, alunos se levantando em pânico.

A barreira mágica da sala desceu. As portas trancaram por segurança.

E eu?

Ajoelhei na frente da bomba, puxei uma lâmina fina e comecei a desmontar os runas com precisão de cirurgiã.

— “VOCÊ ESTÁ LOUCA?” — alguém gritou.

— “É uma bomba mágica!”

— “Ela vai matar a gente!”

Lua se aproximou, empurrando dois alunos no caminho.

— “Você sabe o que está fazendo?”

— “Sim. E se você continuar falando, vou perder o fio de mana e explodir o prédio.”

Ela recuou.

Mas ficou ali, olhando.

A princesa mais inteligente do reino… deixando outra garota desarmar uma bomba no chão.

Última runa.

Respirei fundo.

Cortei.

Silêncio.

Nada explodiu.

O mapa no centro da sala se apagou.

A mensagem sumiu.

Mas eu a gravei.

CLASSE PRIME \= ISCA

Me levantei devagar.

Todos me olhavam.

— “A aula foi… interessante,” falei, limpando a poeira da saia.

Lua se aproximou devagar. O rosto ainda controlado, mas havia algo nos olhos dela agora.

Curiosidade?

Respeito?

Ou só… medo?

— “Quem é você?” — ela sussurrou, para que ninguém mais ouvisse.

Olhei bem nos olhos dela.

— “Alguém que você vai ter que acompanhar de perto, princesa.”

Dei uma piscada para ela,e então me levantei e sai da sala antes do alarme de incêndio começar.

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