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Sob a Pele do Chefe

Capítulo 1 – Primeiras Impressões Ardentes

O som dos saltos ecoava como um relógio impaciente pelo corredor de mármore. Cada passo de Aurora Vidal era medido, firme — embora seu coração batesse como se estivesse correndo uma maratona.

Ela ajeitou a saia discreta, respirou fundo e ergueu o queixo. A recepcionista havia avisado que ele estava de mau humor. Ótimo. Seu primeiro dia de trabalho, e já teria que encarar Dante Vasconcellos no modo “furacão”.

Aurora entrou na sala e foi atingida por um silêncio espesso.

O escritório parecia mais uma galeria de arte minimalista com vista para o céu de São Paulo. Vidros altos, móveis escuros, tudo impecável — menos o homem à frente dela.

Sentado atrás de uma mesa imensa, Dante digitava algo com a mandíbula cerrada. O paletó pendia na cadeira, revelando a camisa social sob medida que moldava os ombros largos. O relógio prateado em seu pulso brilhava discretamente, mas o que mais chamava atenção era a frieza calculada no olhar que se ergueu para ela.

— Você está atrasada. — A voz dele era cortante, sem emoção.

Ela consultou o relógio por reflexo. Oito horas em ponto.

— Não estou, senhor Vasconcellos. O relógio do saguão pode estar adiantado.

Ele arqueou uma sobrancelha, como se não estivesse acostumado a ser corrigido — principalmente por uma recém-contratada.

— Tem certeza de que quer começar assim?

Ela engoliu seco, mas não desviou o olhar. Era filha de um pedreiro e de uma costureira, criada entre boletos e filas do SUS. Já tinha enfrentado coisa pior do que um olhar gelado de chefe bonito.

— Tenho certeza de que quero começar com clareza — respondeu, com um leve sorriso profissional.

Silêncio. Ele analisou cada centímetro dela como quem avalia uma peça de xadrez. Aurora era diferente. Não havia bajulação em seus olhos, nem submissão na postura. Era como se não soubesse com quem estava lidando.

E isso o irritava mais do que deveria.

— Sente-se — ordenou, com um gesto breve.

Ela o fez, mantendo a postura ereta. Seu currículo era modesto, mas impecável. Secretariado técnico, inglês intermediário, dois anos como recepcionista em um hospital público e, agora, a chance de ouro de trabalhar na Vasconcellos Corporation, uma das maiores holdings do país.

— Você sabe que essa vaga era para alguém com mais experiência, não sabe?

— Sei — respondeu com firmeza. — Mas sei aprender rápido. E trabalho duro.

— Hum.

Dante se recostou na cadeira de couro, cruzando os braços. Seus olhos estavam mais escuros do que ela esperava — e perigosamente atentos.

— Espero que sua ousadia não venha acompanhada de erros. Sou intolerante com falhas.

Ela assentiu.

— Sou intolerante com desperdício de tempo. Podemos começar?

Foi rápido — um movimento sútil, quase imperceptível — mas os cantos dos lábios dele se curvaram. Um traço de sarcasmo. Ou admiração.

O primeiro dia de Aurora seguiu como um teste silencioso.

A maioria dos novos funcionários recebia orientação da equipe de Recursos Humanos. Aurora não. Dante, aparentemente, preferia observar o desempenho em tempo real — como quem avalia uma peça de reposição.

Às nove da manhã, ela já havia revisado contratos, arquivado documentos físicos e digitais, respondido e-mails e organizado a agenda dele com precisão militar.

Às dez, entregou um relatório com a programação completa da semana. Ele sequer agradeceu, apenas olhou o papel como se procurasse um erro.

Não encontrou nenhum.

— Você leu todos os arquivos do sistema antes de vir? — ele perguntou, sem erguer os olhos.

— Fiquei até as duas da manhã estudando. Achei que valia a pena perder algumas horas de sono para não perder esse emprego.

Dante recostou-se, cruzando as mãos sobre o queixo. Havia algo intrigante nela — uma mistura de disciplina e honestidade bruta que não combinava com o mundo artificial em que vivia.

— Não me dê motivos para me arrepender de ter aceitado sua contratação.

— E o senhor não me dê motivos para procurar outro lugar — ela rebateu com delicadeza, mas firme.

Ele franziu o cenho.

Aurora sentiu um frio na espinha, mas manteve a postura. Ela precisava daquele emprego. O tratamento do pai havia sido negado pelo plano. As sessões de hemodiálise e os medicamentos estavam pesando nas contas da família, e o salário na Vasconcellos Corporation poderia fazer toda a diferença.

Ela não ia permitir que o gênio difícil de um bilionário a derrubasse.

Mais tarde, já perto do almoço, Dante recebeu uma ligação. A assistente da presidência da filial de Nova Iorque cancelara a videoconferência de última hora, o que o irritou visivelmente.

— Ridículo — murmurou ele. — Gente que não leva compromisso a sério devia ser removida do cargo.

Aurora, do outro lado da sala, sem que ele percebesse, já estava reprogramando a reunião, sugerindo três novos horários e acionando a equipe técnica para adaptar a agenda virtual.

Cinco minutos depois, ela se aproximou e pousou um tablet sobre a mesa.

— Já reagendei a videoconferência. Confirmei com o fuso de Nova Iorque e reservei um espaço sem interferência de sinal. O novo link está aqui.

Dante levantou os olhos lentamente.

— E eu nem precisei pedir.

Ela sorriu.

— Fui contratada para facilitar o seu trabalho, não para esperar ordens.

Por um instante, ele a encarou com um olhar que misturava surpresa, desconfiança e… algo mais.

Era como se, pela primeira vez em muito tempo, alguém o estivesse desafiando sem medo — e com eficiência.

Na hora do almoço, Aurora aproveitou a pausa para ligar para casa.

— Oi, mãe… Como ele está?

Do outro lado da linha, a voz cansada da senhora Vidal carregava tristeza e esperança em igual medida.

— Dormiu um pouco. Mas está pálido, filha… O remédio novo custa quase quinhentos reais. Vamos ter que escolher: ou o remédio, ou a conta de luz.

Aurora fechou os olhos, sentindo um nó no peito.

— Eu vou resolver isso, tá? Confia em mim.

De volta ao escritório, enquanto organizava alguns documentos confidenciais, ela ouviu Dante em uma conversa ríspida no telefone, atrás da porta semiaberta.

— Se ele quiser sair do contrato, que arque com as multas. Eu não negocio com amadores.

Houve uma pausa. O tom dele baixou, mas soou mais frio ainda.

— E não me traga problemas. Traga soluções.

A ligação terminou com o som seco do telefone sendo jogado sobre a mesa.

Ele saiu da sala segundos depois, os olhos cerrados, os passos decididos. Quando passou por Aurora, parou por um instante.

— Você parece ter uma boa memória. Consegue digitar rápido?

— Muito rápido.

— Ótimo. Me acompanhe. Quero que participe da reunião com o financeiro. Hoje você vai ver como o verdadeiro jogo corporativo é jogado.

Aurora se levantou, surpresa com o convite.

— É normal a secretária participar dessas reuniões?

Ele a olhou de lado.

— Não. Mas você já percebeu que eu não faço nada do jeito tradicional, não é?

Ela apenas assentiu, pegando seu bloco de notas e o tablet.

Dante Vasconcellos, o homem que não confiava em ninguém, estava levando uma novata para uma reunião estratégica.

E ele ainda não sabia o porquê.

Mas algo naquela mulher estava sob sua pele.

E era só o primeiro dia.

Capítulo 2 – Sob Pressão

O elevador subia silenciosamente até o 28º andar, reservado para reuniões de diretoria e negociações de alto nível. Aurora se sentia deslocada ali — entre os ternos sob medida, perfumes caros e olhares que a escaneavam como se fosse um erro de RH.

Mas Dante, à sua frente, parecia alheio a tudo. Andava com passos firmes, sem olhar para trás, como se o mundo devesse segui-lo naturalmente.

E, de algum modo, ele fazia isso acontecer.

Entraram em uma sala ampla, com uma mesa de madeira escura em formato oval e telas gigantes nas paredes. Já havia seis pessoas ali — entre eles, diretores, conselheiros e o CFO da empresa.

Dante sentou-se na cabeceira. Aurora, à direita dele.

— Iniciem — disse ele, sem cumprimentos.

O clima era tenso. O setor financeiro havia identificado um rombo inesperado: um investimento alto que não gerou o retorno previsto. Os rostos sérios denunciavam o peso da situação.

Aurora ficou em silêncio, observando e anotando, até que um dos executivos questionou os dados do relatório que ela mesma havia organizado horas antes.

— Isso aqui está incompleto — resmungou ele, folheando a planilha impressa. — Faltam as despesas indiretas dos fornecedores terceirizados.

Antes que Dante pudesse intervir, Aurora se inclinou levemente.

— Estão na segunda aba do arquivo digital. Como o senhor preferiu imprimir, deve ter deixado de lado. Posso enviar agora para seu e-mail, se desejar.

O homem arregalou os olhos. Dante, ao lado, não esboçou reação — mas ela notou o pequeno músculo em sua mandíbula se movendo.

— Faça isso — disse o executivo, sem encará-la.

Ela o fez em segundos. A sala caiu em um breve silêncio constrangido.

Dante então falou, com a calma cortante que era sua marca.

— Contratem pessoas melhores para o seu time, Moreira. Não vou tolerar erros por falta de atenção.

O tal Moreira ficou vermelho, mas engoliu seco.

A reunião seguiu por mais quarenta minutos, e Aurora manteve-se atenta, profissional, invisível quando necessário e precisa quando chamada. Ao final, Dante levantou-se sem olhar para ninguém.

— Vidal. Comigo.

Ela o seguiu de volta ao escritório. Quando a porta se fechou atrás dos dois, ele virou-se para encará-la. Havia algo em seu olhar — não era irritação. Era… curiosidade desconfiada.

— O que exatamente você fazia no hospital onde trabalhou?

— Era recepcionista da ala de oncologia e nefrologia. Fazia triagens, arquivos, e às vezes ajudava pacientes com os formulários.

— E aprendeu tudo isso sozinha?

— Ninguém me ensinou — respondeu, dando de ombros. — Mas eu prestava atenção em tudo.

Dante se aproximou um passo.

— Você é… incomum.

Ela arqueou uma sobrancelha.

— Isso é um elogio ou um aviso?

Ele não respondeu. Apenas desviou o olhar, como se odiasse ser surpreendido.

Mais tarde, já perto das cinco da tarde, Aurora recebeu uma ligação urgente no celular. Vinha do hospital público onde seu pai fazia tratamento. Ela pediu licença para sair um pouco mais cedo e explicou brevemente a situação.

Dante apenas assentiu, de forma seca.

— Vá. Mas me avise quando retornar. Detesto surpresas.

Ela agradeceu, pegou a bolsa e saiu às pressas. Seu coração estava disparado — não pelo Dante, mas pelo pai.

O hospital tinha cheiro de éter e urgência. Aurora encontrou a mãe sentada no banco do corredor, chorando baixinho.

— Foi uma crise — disse ela, com os olhos vermelhos. — O médico disse que ele precisa ser internado por alguns dias. E precisa do medicamento novo. Amanhã.

Aurora apertou a mão da mãe, tentando passar uma força que não sentia.

— Eu vou conseguir, mãe. Eu prometo.

Mais tarde naquela noite, quando Aurora finalmente voltou para casa, encontrou uma mensagem no celular. Era de um número desconhecido.

“Vidal. Você deixou sua pasta aqui. Pegue-a amanhã cedo. — D.V.”

Ela soltou uma risada cansada. Ele havia decorado o número dela? E o bilhete… curto, direto, como tudo nele. Mas ainda assim, ele notou sua ausência. E isso, vindo de Dante Vasconcellos, era quase intimidade.

Na cobertura elegante de Dante, ele caminhava de um lado para o outro, camisa social aberta no colarinho, whisky na mão. Os olhos presos na noite através dos vidros.

Não conseguia tirar da cabeça a imagem de Aurora saindo às pressas. Havia algo na maneira como ela falava com a mãe ao telefone. Desespero contido. Um tipo de dor que ele conhecia — mas jamais admitiria.

Ele odiava sentir. E aquela garota… fazia ele sentir.

Deitou-se tarde, inquieto. Mas antes de dormir, pensou pela primeira vez em anos em algo que não era trabalho.

Pensou nela.

Aurora chegou à empresa antes das sete.

As olheiras denunciavam a noite mal dormida, mas ela manteve o batom discreto e o coque alinhado. Se havia uma coisa que aprendera trabalhando em hospitais era que dignidade se carrega nos ombros, mesmo quando tudo dentro da gente está desmoronando.

Subiu os andares com a pasta esquecida em mente — e com a imagem de Dante lendo a mensagem no celular dela.

Como ele tinha o número? Provavelmente pegou do sistema interno. Claro. Ele era o tipo que controlava tudo. Mas mesmo assim… havia algo de pessoal na mensagem. Algo que escapava do usual tom corporativo dele.

Quando entrou na sala, encontrou a pasta sobre sua mesa, ao lado de uma xícara com um líquido escuro ainda fumegante.

Café.

Ela olhou para os lados, desconfiada, e então viu a tampa da garrafa térmica aberta sobre o aparador. Ele havia servido.

Ela não sabia se ria ou se assustava.

O CEO mais arrogante de São Paulo havia colocado café em sua mesa?

Na dúvida, tomou um gole.

Amargo, forte. O tipo que mantinha executivos acordados por três reuniões seguidas.

Minutos depois, Dante entrou. Terno escuro, expressão inabalável. Passou direto por ela, mas antes de fechar a porta de sua sala, disse:

— Chegou cedo.

Aurora respondeu, sem desviar os olhos do computador:

— E o senhor também.

Ele não replicou.

Mas sorriu. Um sorriso rápido, involuntário, que ela quase não viu — mas viu.

Mais tarde, naquele mesmo dia, Aurora recebeu um e-mail com o título:

"Verba emergencial: autorização liberada"

Ela estranhou. Não tinha solicitado nada.

Ao abrir, encontrou um voucher com liberação para uma “ajuda de custo excepcional”, no valor exato do medicamento que o pai precisava. Estava no sistema da empresa, registrado como bônus por “atuação destacada no início de funções”.

Aurora congelou.

O valor. A rapidez. O momento. Tudo indicava a mesma fonte.

Levantou-se, atravessou a sala e parou diante da porta do escritório de Dante. Bateu duas vezes, entrou sem esperar.

Ele estava de pé, ao telefone. Encerrando a chamada.

Ela ergueu o celular, mostrando o e-mail.

— Isso foi o senhor?

Ele cruzou os braços.

— Está reclamando?

— Estou perguntando.

— Então aceite como um reconhecimento. Você tem feito um bom trabalho.

Ela se aproximou mais um passo.

— O senhor não parece o tipo que distribui recompensas generosas a secretárias novatas.

— E você não parece o tipo que aceita ajuda sem lutar contra.

Os olhos de ambos se encontraram — duros, intensos, quase elétricos.

Aurora respirou fundo. Queria agradecer. Queria se afastar. Queria gritar que não precisava da piedade dele, mas também sabia que aquele dinheiro salvaria o pai.

— Obrigada — disse por fim, quase num sussurro.

Ele apenas assentiu.

— Volte ao trabalho, Vidal.

Ela saiu, deixando para trás uma atmosfera densa — carregada de tudo o que não podia ser dito.

No fim do dia, enquanto organizava a papelada da reunião seguinte, recebeu uma notificação no celular.

Mensagem da mãe:

"O médico disse que começaremos o novo remédio amanhã. Ele sorriu hoje. Disse que vai lutar mais."

Aurora segurou o celular com as duas mãos, sentindo os olhos marejarem. Pela primeira vez em meses, sentia que as coisas estavam começando a mudar.

E parte dessa mudança vinha… dele.

Do homem que era seu chefe. Seu desafio diário. Sua linha tênue entre raiva e fascínio.

Na cobertura de Dante, naquela noite, ele encarava a cidade pela varanda, como sempre. Copo na mão, gravata solta, a escuridão refletindo seus pensamentos.

Não sabia por que havia feito aquilo. Nunca interferia na vida de funcionários. Mas havia algo em Aurora… um senso de honra, talvez. Um fogo sob controle. Ela lembrava uma versão de si mesmo que ele havia enterrado anos atrás.

Mas também era mais do que isso.

Era irritante. Era linda. Era um risco.

E mesmo assim, ele queria ver até onde aquilo iria.

Mesmo sabendo que devia parar.

Capítulo 3 – Território Pessoal

Na manhã de quinta-feira, a rotina começou como qualquer outra: Aurora revisando a agenda do dia, respondendo e-mails, organizando documentos. Tudo em ordem, até a mensagem aparecer na tela do computador:

"Reunião às 11h. Sala de Estratégia. Levar bagagem para dois dias. – D.V."

Aurora franziu o cenho. “Bagagem para dois dias”?

Poucos minutos depois, Dante passou por sua mesa, parando por exatos três segundos.

— Arrume suas coisas. Vamos para o Rio.

— Perdão?

— Reunião com investidores. Preciso que acompanhe.

Ela o seguiu, confusa.

— Não há nada disso na agenda, senhor.

— Porque foi decidido ontem à noite. E você é eficiente, não é? Vai se adaptar.

Ele entrou no elevador sem esperar. Aurora suspirou fundo.

Dois dias ao lado de Dante Vasconcellos. Um desafio. Uma tortura. Um risco para o coração — se é que o dela ainda estava sob controle.

Horas depois, já no jato executivo da Vasconcellos Corporation, Aurora observava pela janela a cidade ficando pequena.

O silêncio reinava na cabine. Dante lia um relatório, óculos de leitura baixos no nariz, impecável como sempre. Ela, ao lado, tentava parecer relaxada, mas o coração acelerava sempre que ele se movia.

Quando o avião balançou por causa de uma turbulência, o braço dele roçou no dela. Um toque breve. Mas intenso o suficiente para fazê-la prender a respiração.

— Algum problema, Vidal? — ele perguntou, sem erguer os olhos.

— Nenhum. Só não costumo viajar em aviões particulares com meu chefe.

Ele virou o rosto em sua direção, finalmente.

— Costuma viajar com outros chefes?

Ela sorriu, desafiadora.

— Nem todos são chefes que me mandam mensagens à noite.

Por um segundo, o ar entre eles mudou. Havia algo não dito ali. Algo perigoso. E Dante sentiu.

Mas, como sempre, se fechou.

— Concentre-se no trabalho.

Chegaram ao hotel cinco estrelas no final da tarde. Aurora foi levada a uma suíte executiva ao lado da de Dante.

Assim que entrou no quarto, o telefone tocou.

— Vista algo formal. Jantar com investidores em uma hora.

— Alguma exigência específica?

— Algo que impressione. Mas sem parecer que está tentando.

Ela riu, mesmo sozinha. Ele era impossível.

Mas ao mesmo tempo… ela adorava aquele jogo não declarado.

O jantar foi em um restaurante sofisticado de frente para a praia. Luz baixa, ambiente elegante, conversa carregada de cifras e termos técnicos. Aurora ficou a maior parte do tempo em silêncio, observando, anotando mentalmente cada expressão, cada dado relevante.

Até que um dos investidores dirigiu-se diretamente a ela:

— E você, senhorita Vidal? O que acha da projeção da Vasconcellos Corporation para os próximos trimestres?

Aurora engoliu seco. Olhou para Dante, esperando que ele interviesse. Mas ele apenas observava, como quem dizia: “Mostre do que é feita.”

Ela ajeitou a postura e respondeu com clareza, citando dados que ouvira nas reuniões internas e uma análise sucinta, porém inteligente, da movimentação de mercado.

Os homens na mesa assentiram, satisfeitos.

Dante, no entanto, manteve-se impassível.

Até que, ao fim do jantar, quando já estavam sozinhos no carro de volta, ele disse:

— Você roubou a cena.

— Eu achei que estava ali só para fazer anotações.

— Eu também. Até hoje.

Ela sorriu, mas não respondeu. Havia um elogio ali. Um raro. E vindo de Dante, era quase uma declaração.

Naquela noite, no quarto do hotel, Aurora tirou os saltos, soltou o cabelo e ficou um tempo olhando o reflexo no espelho.

Sentia-se exausta. Confusa. E… viva.

Havia algo crescendo ali. Um sentimento que se escondia entre olhares demorados, gestos pequenos, silêncios densos.

E embora soubesse que era perigoso se aproximar de um homem como Dante Vasconcellos… não conseguia evitar.

Na suíte ao lado, Dante encarava o teto.

O rosto dela surgia cada vez com mais frequência em sua mente. Ela era uma distração. Uma irritação. Um enigma.

E ele odiava não ter controle sobre isso.

Mas o pior, admitia para si mesmo, era que não queria mais se afastar.

Pouco depois da meia-noite, Aurora estava quase dormindo quando escutou uma batida suave na porta.

Levou alguns segundos para se sentar, atônita. Quem bateria àquela hora?

Vestia uma camisola leve de algodão, nada provocante — mas mesmo assim sentiu o coração saltar. Caminhou até a porta com passos hesitantes.

Quando abriu, encontrou Dante.

De camisa social aberta no colarinho e sem paletó, ele segurava o celular em uma das mãos. A expressão? Impassível. Como sempre.

— O Wi-Fi do meu quarto está instável. Preciso enviar um documento agora. Posso usar seu sinal?

Aurora piscou, confusa.

— O senhor quer... usar meu Wi-Fi?

— Tecnicamente, o da sua suíte. Sim.

Ela hesitou por um segundo. Mas abriu espaço.

— Entre.

Dante passou por ela, o perfume amadeirado se misturando ao ar do quarto. Sentou-se na escrivaninha com naturalidade, como se invadir a madrugada dela fosse parte da rotina.

Enquanto conectava o notebook, Aurora permaneceu de pé, desconfortável — mais consigo mesma do que com ele.

— Posso te trazer água… ou um pouco de noção de horário — disse ela, tentando aliviar a tensão com humor.

Ele não riu. Mas seus lábios se curvaram num quase sorriso.

— Você sempre responde assim quando está nervosa?

Ela cruzou os braços.

— Eu não estou nervosa.

— Claro que não — murmurou, com ironia.

O silêncio que se seguiu era mais pesado do que qualquer conversa.

Depois de alguns minutos, ele fechou o notebook e levantou-se.

— Obrigado. Está resolvido.

Ela o acompanhou até a porta, e por um momento, os dois pararam, frente a frente.

Tão perto que ela conseguia ver os tons de cinza nos olhos dele. Tão perto que ele podia ouvir o leve acelerar da respiração dela.

— Aurora — ele disse, pela primeira vez usando o nome dela.

Foi um sussurro. Um deslize.

Ela sentiu um arrepio subir pela espinha.

— Senhor Vasconcellos?

Ele hesitou. Como se lutasse consigo mesmo. Como se tivesse atravessado uma linha invisível… e agora não soubesse se queria voltar.

— Boa noite — disse, por fim, saindo do quarto.

Aurora fechou a porta devagar, com o coração disparado.

Aquela noite mudou alguma coisa. Ela não sabia o quê, nem como — mas sabia que nada mais seria igual.

Na manhã seguinte, ao entrarem na sala de reunião com os investidores, estavam diferentes.

Os olhares demoravam meio segundo a mais. As palavras vinham com uma tensão sutil. Havia uma linha invisível conectando os dois — e quem observasse com atenção notaria.

Na volta para São Paulo, Aurora tentou dormir no voo, mas os pensamentos estavam a mil. Já Dante, fitava a janela, aparentemente calmo — mas por dentro, sentia-se invadido por sensações que não sabia nomear.

Ela mexia com ele.

E isso o deixava furioso.

Porque quanto mais ele tentava afastá-la emocionalmente, mais presente ela ficava. Não como secretária. Mas como mulher. Como presença.

Como risco.

De volta ao escritório, os dias seguintes se tornaram uma dança silenciosa entre eles. Proximidade controlada. Palavras medidas. Olhares disfarçados.

Mas bastava um toque acidental, um sussurro próximo demais, uma pausa em meio ao caos corporativo — e o mundo parava por um instante.

Ambos sabiam: estavam entrando em um terreno perigoso.

E talvez… já fosse tarde demais para voltar.

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