E SE EU TIVESSE TE CONTADO?
1
Felix sabia onde Hyunjin estava só de olhar para o céu.
Se as nuvens estavam baixas e o vento era suave, era certeza: ele estaria no parque, deitado na colina onde o sol batia de leve no rosto, os fones de ouvido no lugar e uma das mãos jogadas na grama. Era quase como se Hyunjin pertencesse à natureza — sempre calmo, sempre leve, sempre bonito de um jeito que doía.
Hwang Hyunjin
— Você demorou
Disse Hyunjin, sem abrir os olhos, quando Felix chegou.
Lee Felix
— Tive que passar em casa pra pegar seu livro de poesia. Você esqueceu de novo.
Felix sentou ao lado dele, tentando parecer casual. Tentando não encarar demais. Não sorrir demais.
Hwang Hyunjin
— Você é meu cérebro extra. O meu lado esquerdo.
Hyunjin abriu um olho e o encarou com aquele meio sorriso que fazia o coração de Felix pular no peito.
“Não sou só isso”, ele queria dizer. Mas apenas riu, como sempre fazia.
Eles passavam horas assim, às vezes sem dizer nada. Outras, falavam sobre tudo: seus sonhos, seus medos, os garotos da escola que pareciam robôs, as provas que odiavam, o futuro que parecia longe demais.
Hwang Hyunjin
— Você acha que vai se mudar daqui um dia?
Hyunjin perguntou, virando o rosto para o céu, o cabelo loiro-escuro bagunçado pelo vento.
Lee Felix
— Só se você for junto
Felix respondeu, antes de perceber que tinha dito em voz alta.
Hyunjin riu. Riu como se fosse uma piada. Como se não soubesse que, para Felix, era a verdade mais crua.
Às vezes ele queria odiar o jeito despreocupado do Hyunjin. Queria que ele percebesse como cada palavra dele deixava marcas no peito. Mas ao mesmo tempo… Felix não conseguia desejar outra coisa senão estar ao lado dele, mesmo que doesse um pouco. Mesmo que doesse muito.
Mais tarde, na casa de Hyunjin, estavam jogando videogame, um deitado no tapete e o outro no sofá, pernas se tocando sem querer — ou de propósito, no caso de Felix.
Hwang Hyunjin
— A gente vai ser assim pra sempre, né?
Hyunjin perguntou de repente.
Hwang Hyunjin
— Tipo… juntos. Mesmo quando formos adultos. Mesmo quando todo mundo mudar.
Felix olhou pra ele. Hyunjin parecia sério, os olhos fixos na tela, como se quisesse esconder que aquilo era importante pra ele.
Lee Felix
— Mesmo se você esquecer todos os outros, vai se lembrar de mim. Porque eu nunca vou sair daqui.
Ele apontou o próprio peito, e por um segundo, Hyunjin desviou os olhos da tela e olhou bem dentro dos dele.
Felix queria congelar aquele instante. Queria dizer que o amava. Que já tinha tentado não amar, mas era tarde demais.
Mas, como sempre, não disse nada.
2
Acordar cedo sempre foi difícil para Felix. Mas em dias em que ele sabia que veria Hyunjin logo cedo, parecia mais fácil.
Naquela manhã, o despertador nem tinha tocado ainda quando ele abriu os olhos. Olhou para o teto do quarto e ficou ali por alguns segundos, tentando organizar os pensamentos.
Hoje era quarta. Quarta significava café da manhã com Hyunjin antes das aulas — uma tradição que eles mantinham há dois anos.
Felix vestiu qualquer coisa e saiu com passos apressados, o vento ainda gelado da manhã batendo no rosto. Quando chegou na cafeteria de sempre, lá estava ele. Hyunjin, de moletom largo, cabelo preso em um coque malfeito, segurando uma caneca de chá com as duas mãos como se estivesse aquecendo o coração.
Hwang Hyunjin
Você tá atrasado, Bichinho do Sol
Hyunjin sorriu assim que o viu, usando o apelido que tinha inventado anos atrás.
Felix sorriu também, mesmo com o coração pulando. Ele sempre sorria por Hyunjin. Era automático.
Mentiu, mesmo tendo corrido até ali só para não perder nem um segundo com ele.
Sentaram-se na mesa da janela, como sempre faziam, e Hyunjin começou a falar de tudo e de nada ao mesmo tempo. Felix apenas ouvia, memorizando cada expressão, cada detalhe da voz, cada olhar distraído.
Hwang Hyunjin
— Você nunca fala muito
Hyunjin comentou, mexendo distraidamente no croissant com a ponta dos dedos.
Hwang Hyunjin
— Tipo… quando estamos só nós dois, você escuta mais do que fala.
Lee Felix
— Gosto da sua voz
Felix respondeu, sem pensar. E quando percebeu, já era tarde demais.
Hyunjin arqueou uma sobrancelha, curioso.
Hwang Hyunjin
— Você tem cada resposta…
Murmurou, meio rindo, mas com um tom leve de algo mais que Felix não conseguiu decifrar.
Ele desviou o olhar, envergonhado, fingindo beber o café que já estava quase frio. O peito apertava de novo. Doía amar tanto alguém e fingir que era só amizade.
Depois da escola, foram direto para a casa do Hyunjin. Sempre iam juntos — fosse para estudar ou para fazer absolutamente nada. A mãe do Hyunjin já nem perguntava mais, apenas sorria e dizia: “Felix, tem comida na geladeira, como sempre.”
Sentados no chão do quarto, jogando cartas aleatórias de um jogo que nenhum dos dois realmente entendia, o tempo foi passando devagar.
Hwang Hyunjin
— Você já se apaixonou por alguém?
Hyunjin perguntou do nada, com um tom tão leve que quase pareceu desinteressado.
O coração perdeu o compasso. Suas mãos tremularam de leve, e ele fingiu embaralhar as cartas só para parecer distraído.
Hwang Hyunjin
— Como assim não sabe?
Lee Felix
— Tipo… acho que não. Nunca aconteceu.
Hyunjin fez uma careta engraçada.
Hwang Hyunjin
— Que estranho. Você é o tipo de pessoa que todo mundo se apaixonaria.
Quis dizer: "e eu me apaixonei por você", mas mordeu a língua. Quis gritar. Quis abraçá-lo até que ele entendesse tudo sem precisar ouvir nenhuma palavra. Mas não disse nada.
Porque perder Hyunjin seria pior do que continuar amando ele em silêncio.
Quando foi embora, já era tarde. O céu estava tingido de laranja escuro, e a rua estava calma. Felix andava devagar, como se cada passo o afastasse de onde ele realmente queria estar: ali, ao lado do Hyunjin. Sempre.
Pegou o celular e abriu a conversa deles, apenas para ver a última mensagem.
Hwang Hyunjin
✉️HJ 🦢: me avisa quando chegar, seu bobo
Lee Felix
✉️Cheguei. Já com saudade.
Depois ficou ali parado, na porta de casa, olhando a tela, esperando qualquer resposta que aquecesse um pouco o vazio dentro dele.
Hwang Hyunjin
✉️HJ 🦢: dorme bem, Bichinho do Sol. 💛
Felix sorriu de novo. Mas dessa vez, os olhos encheram de lágrimas.
Porque no fundo… ele sabia. Aquilo tudo — aquele mundo onde eles existiam só um para o outro — não duraria para sempre.
Mas ele queria aproveitar cada segundo antes que a realidade o obrigasse a soltar a mão que ele amava tanto segurar.
3
Era sexta-feira, e a escola tinha liberado os alunos mais cedo por causa de uma reunião de professores. Isso significava uma coisa: tempo livre. E tempo livre, para Felix, significava Hyunjin.
Hwang Hyunjin
— Vamos fazer algo diferente hoje
Hyunjin anunciou, animado, enquanto arrastava Felix pelos corredores.
Hwang Hyunjin
— Confia em mim.
Felix confiava. Desde sempre.
O “algo diferente” acabou sendo uma trilha curta até um lago escondido nos fundos de uma área residencial abandonada, onde quase ninguém ia. Hyunjin dizia que era seu “lugar secreto”, e agora estava compartilhando com Felix.
Hwang Hyunjin
— Eu venho aqui quando estou triste
Ele disse, se sentando perto da água, jogando pedrinhas e vendo as ondulações se espalharem.
Hwang Hyunjin
— Ou quando preciso ficar longe do mundo.
Lee Felix
— Então por que me trouxe?
Hyunjin olhou para ele. Um olhar direto, calmo, intenso.
Hwang Hyunjin
— Porque com você… eu posso ficar em silêncio sem me sentir sozinho.
Felix sentiu o ar sumir por um instante.
Talvez aquilo fosse amor. Ou talvez fosse só o jeito do Hyunjin. Mas para Felix… aquilo era tudo.
Se deitou na grama ao lado dele, as mãos atrás da cabeça, olhando para o céu que começava a escurecer.
Lee Felix
— Você já pensou se… um dia a gente parar de ser assim?
Hwang Hyunjin
— Assim como?
Lee Felix
— Assim… inseparáveis. Só nós dois.
Hyunjin franziu o cenho, como se aquela hipótese nem fizesse sentido.
Hwang Hyunjin
— Eu nunca vou parar de estar com você, Lix. Nem se o mundo desabar.
Hyunjin estendeu o dedo mindinho, e Felix entrelaçou o dele no gesto infantil e sagrado.
Mas havia uma parte de Felix que sentia medo.
Medo de promessas feitas em dias bonitos. Porque ele sabia que o tempo era traiçoeiro. Que pessoas mudavam. Que sentimentos mudavam. E que, às vezes, o amor de um era muito maior que o do outro.
Naquela noite, dormiram juntos pela primeira vez. Não por necessidade, mas por vontade.
Felix ficou na casa de Hyunjin depois de um filme longo demais e pipocas que queimaram no micro-ondas. Dividiram a cama pequena, rindo dos pés se esbarrando, das cobertas roubadas durante a madrugada.
E em algum momento, já de olhos fechados, Hyunjin murmurou:
Hwang Hyunjin
— Você é minha pessoa favorita no mundo.
Porque se abrisse a boca, ia acabar dizendo que o amava. E tinha tanto medo de perder aquilo — aquele “nós” — que preferia guardar tudo dentro de si.
Mas ali, no silêncio entre as respirações lentas e os corações batendo lado a lado, ele amou Hyunjin com tudo o que tinha.
Dias assim viraram rotina. Era como se vivessem em uma bolha particular. E dentro dela, não existia nada além de risadas, toques sutis e silêncios confortáveis.
Mas Felix não sabia… que aquela bolha estava prestes a estourar.
Mas por alguém que ainda estava por chegar.
Alguém com um sorriso novo. Um jeito doce. Um nome que ele ainda não conhecia
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