O sol entrava pela fresta da cortina, um traço dourado que se deitava suavemente sobre os lençóis amassados. Noah não precisava abrir os olhos para saber que era mais uma manhã de promessas silenciosas. Sentia o calor macio da pele dela contra a sua, o ritmo leve da respiração que lhe embalava o sono. Não havia pressa, não havia nada além daquele presente perfeito, vasto como um oceano.
Estava deitado de bruços, o rosto quase afundado nos cabelos dela, que cheiravam a camomila e um toque doce de baunilha. Um cheiro que se tornara sinônimo de lar, de paz. Ela se mexeu um pouco, um suspiro leve que fez Noah apertar os olhos e sorrir contra a nuca dela. Era quase um ritual: acordar primeiro, sentir a presença dela, e então, um pouco antes que ela despertasse, deixar um beijo suave no ombro. Era a sua forma de dizer "obrigado por mais um dia", antes mesmo que o dia começasse.
Não que houvesse dias extraordinários. A vida deles era feita de uma beleza simples e quase invisível, como o desenho do vapor no vidro do chuveiro ou a forma como as mãos dela se encaixavam perfeitamente nas dele. Moravam num apartamento pequeno, mas que parecia um universo, com quadros tortos que ela insistia em não arrumar e uma estante cheia de livros de capa gasta que ambos tinham lido e relido.
Seus 23 anos pareciam uma eternidade já vivida, e ao mesmo tempo, um começo. Cada manhã com ela era uma confirmação de que o para sempre era uma construção delicada, tecida em café coado, risadas abafadas e o silêncio confortável que só o amor de verdade pode criar. Noah se lembrava do dia em que a viu pela primeira vez, num café, absorta num livro, e de como o mundo havia, de repente, ganhado cores mais vívidas.
Ele finalmente abriu os olhos. A luz já era mais forte, e o quarto começava a ganhar seus contornos habituais. Ela ainda dormia, o rosto sereno, um fio de cabelo caindo sobre a testa. Noah estendeu a mão, hesitante por um segundo, e gentilmente afastou o fio. O toque a fez despertar, e ela abriu os olhos lentamente, aqueles olhos que para ele eram a própria definição de um oceano calmo. Ela sorriu, um sorriso que aquecia mais que o sol.
"Bom dia, meu amor", ela murmurou, a voz ainda rouca de sono.
"Bom dia, minha eternidade", Noah respondeu, e a puxou para mais perto, como se o tempo pudesse, a qualquer momento, tentar lhes roubar um instante. Eles ficaram ali, apenas sentindo o calor um do outro, na certeza inocente de que a vida, afinal, era feita para ser vivida lado a lado, até que a velhice os encontrasse em algum jardim florido.
Helena se aconchegou ainda mais nos braços de Noah, o sorriso que acabara de nascer em seus lábios se desfazendo em um suspiro contente. "Mais cinco minutos?", ela pediu, a voz um murmúrio quase inaudível, e Noah a abraçou com mais força, como se quisesse protegê-la do mundo lá fora, dos compromissos que logo chamariam. Naquele ninho de lençóis, o tempo parecia uma distorção agradável, um conceito distante e sem valor.
Mas a realidade, suavemente, começou a se infiltrar. O cheiro do café que Noah já deixava programado na cafeteira se espalhava pela cozinha minúscula, chamando-os para o rito matinal. Era uma rotina que se transformara em pilar, em promessa: a cada xícara fumegante, a cada fatia de pão torrado, havia um compromisso implícito de que mais um dia seria construído juntos.
Noah foi o primeiro a se desprender do abraço. Ele se levantou, os músculos espreguiçando-se preguiçosamente, e Helena o observou com os olhos semicerrados, um carinho terno no olhar. "O cheiro está me chamando", ele brincou, enquanto vestia uma camiseta velha e desbotada. Ela riu, um som doce que preenchia o apartamento com melodia. Logo, ela se juntou a ele na cozinha, os cabelos um pouco desgrenhados e o pijama de flanela que ela tanto amava.
Sentados à pequena mesa de madeira, o vapor do café aquecendo o rosto, eles não precisavam de muitas palavras. A comunicação acontecia nos olhares, nos pequenos gestos. Helena estendeu a mão para pegar o açucareiro, e Noah já o empurrava em sua direção, um reflexo condicionado pelo amor. Ela colocava duas colheres de açúcar, ele, nenhuma. Pequenas diferenças que se entrelaçavam em uma harmonia perfeita.
"Tem planos para hoje?", Helena perguntou, soprando o café para esfriar.
Noah deu de ombros, bebericando o seu. "Só o de te amar um pouco mais a cada minuto." Era uma piada antiga entre eles, mas que sempre a fazia sorrir, e o sorriso dela era a melodia favorita dele.
Helena o encarou com os olhos brilhantes. "E isso inclui ir ao mercado comprar os ingredientes para o nosso jantar especial?"
Noah fingiu uma careta, mas um riso escapou. "O sacrifício vale a pena pela sua lasanha."
As conversas eram sempre assim: leves, cheias de carinho, pontuadas por brincadeiras internas que só eles entendiam. Não havia grandes planos sendo discutidos, nem o peso do futuro, apenas a certeza de que o hoje era deles, e que o amanhã seria uma continuação natural. As promessas não ditas pairavam no ar, tão sólidas quanto o vapor do café: a de estarem presentes, a de cuidarem um do outro, a de encontrarem a beleza nos detalhes minúsculos da vida. Eles se contentavam em saborear cada gole, cada mordida, cada silêncio que se transformava em uma declaração de amor ainda mais profunda. Naquele café da manhã, o mundo podia esperar.
Depois do café, enquanto Helena dobrava os guardanapos com uma precisão quase artística e Noah enxaguava as poucas louças, um silêncio confortável pairava no ar, repleto de lembranças não ditas. Era uma dança diária de pequenas tarefas, cada movimento um eco do primeiro instante em que seus mundos se cruzaram. Noah a observava, um sorriso leve nos lábios, e de repente, a imagem dela sentada naquela cafeteria, há anos, invadiu sua mente com a nitidez de um filme recém-assistido.
Ele se lembrava de cada detalhe: a luz alaranjada do fim de tarde que banhava o lugar, o cheiro de café e livros, e Helena, alheia ao burburinho ao redor, completamente absorta nas páginas de um romance de capa gasta. Ela usava um cachecol de tricô, mesmo sendo primavera, e os óculos de leitura escorregavam um pouco pelo nariz. Noah estava ali para encontrar um amigo que se atrasaria, e antes que percebesse, seus olhos haviam se fixado nela. Não era apenas a beleza que o prendeu, mas a intensidade com que ela vivia aquele momento, a forma como a testa se enrugava em concentração e os lábios se moviam silenciosamente, como se ela estivesse murmurando as palavras junto com o autor.
"No que está pensando?", a voz de Helena o trouxe de volta. Ela já tinha terminado com os guardanapos e agora o observava com um olhar curioso e doce.
Noah sorriu, virando-se para ela. "No dia em que te conheci. Aquele cachecol de tricô... você ainda o tem?"
Helena gargalhou, um som claro e descontraído. "Tenho, claro! Está guardado para os dias mais frios. Eu estava tão nervosa para aquela prova de literatura que nem percebi que estava calor lá fora." Ela se aproximou, e o aroma de baunilha de seus cabelos envolveu-o. "E você, com aquele jeito de quem não queria nada, mas não parava de me olhar."
"Eu estava estudando a forma como você se tornava a personagem principal do seu próprio mundo", ele provocou, e ela lhe deu um tapa leve no braço.
Eles reviveram a cena, como tantas outras vezes. Ele, fingindo ler um jornal para disfarçar o olhar fixo. Ela, que finalmente levantou os olhos e o pegou no flagra, e em vez de desviar, ofereceu um sorriso tímido. O convite para o café, a conversa que se estendeu por horas, revelando paixões por viagens, por músicas antigas e pela quietude das manhãs de domingo. A descoberta de que ambos acreditavam que a felicidade estava nas coisas pequenas e imperfeitas.
Naquele dia, o mundo de Noah havia, de fato, ganhado cores mais vívidas. Não foi um raio, nem um trovão, mas uma melodia suave que começou a tocar em seu peito e nunca mais parou. Era a melodia do reconhecimento, da certeza de que havia encontrado não apenas um amor, mas um lar. E enquanto ele secava o último prato, o toque de Helena em seu braço o fez sentir que cada um daqueles fragmentos do passado se encaixava perfeitamente, construindo a fortaleza inabalável que era o amor deles.
A rotina de Noah e Helena era um mosaico de pequenos ritos, um balé silencioso de gestos quase imperceptíveis que, juntos, compunham a grandiosidade do amor que sentiam. Não eram as grandes declarações ou os presentes caros que definham a relação, mas sim a forma como o cuidado se manifestava nas minúcias do dia a dia.
Quando Helena estava imersa em suas leituras no sofá, Noah não precisava perguntar se ela queria chá; ele simplesmente aparecia com uma xícara fumegante de seu blend favorito, sem açúcar, do jeito que ela gostava. E ela, por sua vez, sempre deixava um bilhetinho preso na porta da geladeira nos dias em que Noah saía mais cedo para o trabalho, lembrando-o de não esquecer o guarda-chuva ou desejando um "bom dia, meu sol". Eram sussurros de carinho, lembretes de que um estava sempre na mente do outro.
Certa vez, Noah estava lutando com um nó em seu cadarço, frustrado, quando Helena se ajoelhou sem dizer uma palavra, os dedos ágeis desfazendo o emaranhado com uma paciência que ele jamais teria. Não houve sermão ou risada; apenas a gentileza de um ato, que falava mais alto que qualquer palavra. Da mesma forma, quando Helena passava horas tentando montar um quebra-cabeça complexo e parecia prestes a desistir, Noah sentava-se ao lado dela, não para resolver por ela, mas para oferecer sua presença silenciosa e ocasionalmente apontar uma peça que ele achava que se encaixava, sempre com um "talvez, meu amor?".
Nos dias de chuva, quando o apartamento parecia pequeno demais, eles se enroscavam no sofá, um cobertor partilhado e um filme antigo na televisão. Helena repousava a cabeça no ombro de Noah, e ele sentia a leve pressão dos dedos dela desenhando padrões abstratos em sua mão. Em cada toque, em cada respiração conjunta, havia uma promessa tácita de cumplicidade e abrigo.
Eles sabiam a música favorita um do outro, o tipo de chocolate que preferiam, a forma como cada um dobrava a roupa limpa. Conheciam os medos bobos e as ambições secretas. Eram um universo de dois, construído tijolo por tijolo com a argamassa de pequenos gestos de amor. Era essa constância, essa presença atenta, que fazia com que o amor deles não fosse apenas um sentimento avassalador, mas um porto seguro, um lar onde cada detalhe era uma confirmação da promessa de eternidade que viviam.
Não era preciso um mapa detalhado para que Noah e Helena soubessem para onde estavam indo. Seus sonhos eram uma constelação de desejos simples e entrelaçados, projetados em sussurros noturnos e conversas descontraídas durante os fins de semana. Não falavam de fortunas ou de fama, mas de uma vida repleta de significado, tecida a dois.
Um dos seus maiores devaneios era ter uma pequena casa com um jardim. Nada grandioso, apenas o suficiente para que Helena pudesse cultivar suas ervas aromáticas e Noah pudesse ler à sombra de uma árvore, enquanto o cheiro de terra molhada acalmava a alma. Eles já tinham até um nome para a futura casa: "O Abrigo", e Helena já rabiscara em cadernos antigos esboços de canteiros e de uma varanda onde poderiam tomar café nas manhãs de sol. "Imagino a gente velhinho aqui, Noah", ela dizia, os olhos brilhando com a imagem, "com os netos correndo por esse gramado."
Havia também o sonho de viajar. Não mochilões agitados ou cruzeiros luxuosos, mas viagens lentas, de trem, pela Europa, parando em cidades pequenas, conhecendo a cultura local, comendo pão fresco em padarias artesanais. "Quero que a gente veja o nascer do sol em Santorini", Helena confessava, enquanto Noah completava: "E o pôr do sol na Toscana, com um bom vinho e queijo." Eram imagens que os faziam sorrir, que alimentavam a chama da esperança e da aventura.
Mais importante que os lugares, eram os sentimentos. Queriam envelhecer juntos, de mãos dadas, com a certeza de que haviam construído uma vida cheia de amor e compreensão. Queriam ser um porto seguro um para o outro, em cada tempestade. Conversavam sobre filhos, não com a pressão de um plano imediato, mas com o carinho de uma possibilidade distante e desejada. Imaginavam as risadas de crianças na casa, as histórias para contar antes de dormir, a alegria de vê-los crescer.
Eram esses sonhos, tão palpáveis em sua simplicidade, que davam forma ao "para sempre" de Noah e Helena. Não eram promessas escritas em pedra, mas sim a base sobre a qual construíam o presente, com a convicção de que cada dia que passavam juntos era um passo em direção a esse futuro sereno e repleto de amor compartilhado. No abraço silencioso da noite ou na quietude de um fim de tarde, eles visualizavam a vida que os aguardava, um convite para uma eternidade particular, moldada por dois corações que batiam em uníssono.
Era quase um ritual sagrado. Quando o fim do dia se anunciava com tons de laranja e roxo pintando o céu, Noah e Helena tinham um encontro marcado com a cidade, não em seus agitos, mas em seus silêncios mais bonitos. Escolhiam um parque próximo, ou apenas as ruas menos movimentadas do bairro, e saíam para o seu passeio crepuscular, as mãos dadas, os passos em sincronia.
Naquela tarde em particular, o ar estava fresco, carregado com o cheiro da terra molhada pela garoa da manhã e o perfume adocicado das flores que brotavam nos canteiros públicos. Helena, com seu casaco leve, recostou a cabeça no ombro de Noah enquanto caminhavam, os olhos semicerrados, absorvendo a quietude que os cercava. Noah sentia o calor da mão dela na sua, um aperto familiar que era mais reconfortante que qualquer palavra.
Eles não precisavam de conversas profundas ou de análises do dia. As palavras eram poucas, sussurradas apenas quando a beleza do momento exigia uma exclamação. "Olha o céu, Noah", Helena murmurou, apontando para uma nuvem que parecia uma montanha cor-de-rosa. Ele apertou sua mão em resposta, seus olhos fixos na mesma beleza. A comunicação deles era um fluxo contínuo de presenças, olhares e toques.
O simples ato de caminhar juntos, lado a lado, enquanto o mundo desacelerava, era uma metáfora para a vida que construíam. Cada passo era uma confirmação da jornada compartilhada, cada silêncio era preenchido pela compreensão mútua. A rua, antes movimentada, agora se esvaziava, e eles se tornavam os únicos protagonistas de um cenário que parecia existir apenas para eles. As luzes dos postes começavam a piscar, pequenas estrelas urbanas que guiavam seu retorno.
Helena, de repente, parou e olhou para Noah, um brilho travesso nos olhos. "Lembra daquele dia que a gente se perdeu naquele parque novo e você ficou todo irritado?", ela perguntou, um sorriso maroto nos lábios. Noah riu, lembrando-se da sua própria impaciência. "E você cantou uma música inventada para me acalmar", ele completou, apertando mais a mão dela.
Esses passeios eram cápsulas do tempo, guardando não apenas o presente, mas também o eco de memórias passadas e a promessa de muitos entardeceres ainda por vir. Ao final da caminhada, quando as luzes do apartamento já podiam ser vistas, o coração de Noah estava mais leve, mais cheio. Aqueles minutos juntos, de mãos dadas, eram a prova de que a eternidade não estava em um futuro distante, mas na simplicidade de um entardecer compartilhado, no calor de uma mão na outra, no silêncio que dizia tudo.
Para mais, baixe o APP de MangaToon!