Eu não deveria estar nervosa.
Quer dizer, é só uma entrevista para o trabalho de conclusão do semestre... É só isso. Mas cada vez que meus olhos encontram o nome dela impresso na pasta que seguro entre as mãos suadas, meu coração dispara como se eu estivesse prestes a pular de um penhasco.
Victoria Blake.
O nome dela soa quase como uma sentença. Ou uma promessa.
Ela é uma lenda no mundo dos negócios. Bilionária, CEO do Blake Group, uma das maiores holdings do país. Jovem, poderosa, inacessível. Há centenas de matérias sobre ela — algumas elogiosas, outras… carregadas de especulações. Ninguém realmente conhece Victoria. E quem tentou, não conseguiu ir muito longe.
E agora, aqui estou eu, subindo no elevador de um prédio de vidro, onde as paredes refletem mais os meus próprios medos do que a paisagem da cidade lá fora.
— Andar 25. Escritório da Sra. Blake. — A voz digital anuncia, e minhas pernas quase vacilam.
Respiro fundo. Você consegue, Lia. É só uma entrevista.
Quando as portas se abrem, sou recebida por um ambiente que mais parece uma galeria de arte moderna misturada com um templo de luxo corporativo. Mármore preto polido, lustres pendentes minimalistas, e um silêncio que pesa mais que o ar.
A recepcionista — uma mulher tão impecável que me sinto uma adolescente desleixada diante dela — sorri levemente, embora seus olhos analisem cada detalhe meu.
— Nome? — ela pergunta, sem desviar o olhar do tablet.
— L-Lia Carvalho. Eu tenho uma entrevista agendada com a Sra. Blake.
Ela desliza o dedo pela tela, confirma algo e então se levanta.
— Me acompanhe, por favor. — Seu tom é neutro, profissional.
O som dos saltos dela ecoa no piso liso, enquanto eu a sigo, tentando não tropeçar nos próprios pés. Passamos por uma série de portas de vidro até que ela para diante de uma maior, de madeira escura, com detalhes dourados.
Ela bate duas vezes, pausadamente, antes de abrir.
— Sra. Blake, a senhorita Carvalho chegou.
— Pode deixá-la entrar. — A voz que vem de dentro é... Meu Deus. Baixa, grave, aveludada. Há uma autoridade natural ali. Uma que não pede... ordena.
Meu coração dispara. A recepcionista me dá espaço para entrar, e quando faço... meu mundo simplesmente para.
Ela está de pé, de costas, observando a cidade através da parede de vidro que ocupa toda a lateral do escritório. Seu terno preto se ajusta perfeitamente à silhueta esguia, e o salto alto só acentua o poder que ela carrega sem esforço.
Então ela se vira. E eu juro, por um segundo, esqueço como se respira.
Seus olhos são de um azul cortante, quase cruel. O rosto esculpido, cabelos lisos, longos, negros como a noite. A expressão... fria. Inatingível. Mas absolutamente linda.
Ela me analisa dos pés à cabeça, sem disfarçar.
— Lia Carvalho. — Ela pronuncia meu nome lentamente, como se testasse seu sabor. — Pontual. Gosto disso.
Sinto meu rosto esquentar.
— S-sim... Claro... — tropeço nas palavras como uma idiota.
Seus lábios se curvam levemente, mas não sei se é um sorriso ou... algo mais.
Ela dá dois passos na minha direção. Cada movimento dela é calculado, seguro, elegante. E quando para diante de mim, tão perto que sinto seu perfume — uma mistura de âmbar, jasmim e algo indecifrável —, percebo que estou completamente fora do meu controle.
— Me diga, senhorita Carvalho... — Sua voz baixa, rouca, dança entre meus ouvidos. — Está pronta para isso?
Eu nem sei exatamente o que ela quer dizer. Mas uma coisa é certa.
Não... Eu não estava pronta para Victoria Blake.
Nem um pouco.
O silêncio que se instala é quase insuportável. Meu coração bate tão forte que tenho certeza que ela consegue ouvir. Victoria me observa. Não de forma casual. É uma análise minuciosa, precisa... invasiva.
Seus olhos percorrem cada detalhe meu: meus cabelos soltos, minha roupa simples — uma blusa branca, jeans e uma jaqueta preta —, minhas mãos trêmulas segurando a pasta. E, por algum motivo, essa análise me faz sentir... exposta.
Não sexualmente, não ainda. É algo mais profundo. Como se ela visse além da minha aparência. Como se me despisse... por dentro.
— Sente-se. — Sua voz é um comando suave, porém inegociável.
Faço o que ela manda, meio atrapalhada, me acomodando na cadeira de couro diante da mesa impecável. Nenhum papel fora do lugar. Tudo nela — no ambiente, no jeito, no tom — grita controle.
Ela dá a volta, senta-se do outro lado, e cruza as pernas de maneira quase ensaiada. Seu olhar não vacila nem por um segundo.
— Então... — ela começa, passando a mão pelos próprios cabelos de forma casual, embora nada nela pareça de fato casual. — Está cursando o último semestre de jornalismo, certo?
— Isso. — Tento parecer firme, mas minha voz sai mais aguda do que eu gostaria.
Ela observa, como se analisasse minha resposta tanto quanto minhas palavras.
— E essa entrevista... faz parte de um trabalho acadêmico? — Sua sobrancelha arqueia ligeiramente.
— Sim... Eu... — engulo em seco. — Eu precisava escolher uma personalidade influente, uma mulher de destaque no cenário empresarial, e... bem... — Solto um sorriso meio sem graça. — Seu nome foi, obviamente, o primeiro da lista.
Seus lábios curvam-se. Um sorriso pequeno. Quase imperceptível. Mas está lá.
— Obviamente. — Ela repete, como se saboreasse a palavra. — E me diga, Lia... — Seu tom suaviza, mas não perde a firmeza. — Está acostumada a estar em ambientes como este?
Seus olhos não piscam. Seu olhar me prende. Me atravessa.
— N-não exatamente. — Confesso. — É... meio novo pra mim.
Ela inclina a cabeça, como se confirmasse uma suspeita interna.
— Eu percebi. — Ela desliza os dedos pelos braços da cadeira, devagar. — Você é... transparente. Eu consigo ler você, Lia. Com facilidade.
Meu estômago dá um nó. Meu rosto esquenta. Eu deveria me sentir desconfortável, talvez até ofendida. Mas, estranhamente... não é isso que sinto. É... outra coisa. Uma mistura de medo, fascínio... e excitação.
Ela então se inclina ligeiramente sobre a mesa.
— E você... — Seu olhar se estreita. — Você se sente confortável com isso?
Meu Deus... Que tipo de pergunta é essa? Ela fala da entrevista? Da forma como me observa? De tudo?
— Eu... não sei. — Minha voz sai mais baixa do que eu pretendia. — Acho que... nunca pensei nisso dessa forma.
O canto dos lábios dela se curva. Agora, definitivamente, é um sorriso. Mas há algo predatório nele. Um tipo de satisfação que me arrepia.
— Hm. Interessante. — Ela se recosta, cruzando os braços, relaxando como se tivesse acabado de confirmar algo muito importante. — Gosto de quem é honesto... mesmo quando não sabe exatamente o que sente.
Sinto minhas mãos suarem. Aperto a pasta no colo, buscando algum tipo de âncora.
— Bem... — tento retomar algum controle da situação — eu preparei algumas perguntas, se não se importar.
Ela acena, lentamente.
— Claro. Está aqui para isso, não é?
Concordo com a cabeça, abro a pasta, mas minhas mãos tremem. E ela percebe. Claro que percebe.
— Nervosa? — pergunta, sem disfarçar o tom de diversão.
Levanto o olhar, encontrando seus olhos novamente. São frios... mas há algo por trás deles. Uma faísca.
— Um pouco. — Suspiro. — A senhora é... intimidadora.
Ela inclina-se ligeiramente, apoiando os cotovelos na mesa, juntando as mãos em frente ao rosto. Seus olhos me perfuram.
— Você não faz ideia... — murmura, quase num sussurro.
E, por um instante, sinto que essa frase carrega muito mais do que eu consigo entender. Muito mais do que eu estou preparada para enfrentar.
— Então... — minha voz sai um pouco trêmula, mas tento manter a compostura — vou começar com algo básico.
Ela não responde de imediato. Apenas observa. A cabeça levemente inclinada, os olhos semicerrados, como se estivesse mais interessada em mim do que nas minhas perguntas.
— Por que escolheu o mundo dos negócios, Sra. Blake? — Tento soar confiante, segurando firme a caneta, que insiste em deslizar entre meus dedos suados.
Por um instante, ela permanece em silêncio. Seus olhos não piscam, e aquele olhar... Meu Deus. É como se ela pudesse atravessar minha pele, meu corpo inteiro, até alcançar minha alma.
Ela desliza uma das mãos sobre a mesa, lentamente, quase como um gesto ensaiado para atrair atenção.
— Poder. — Sua resposta vem seca, direta, carregada de uma segurança que faz meu estômago despencar.
Pisco, surpresa.
— Poder? — repito, mais para confirmar se ouvi direito.
Seus lábios curvam-se lentamente.
— Sim. Desde muito jovem, percebi que, no mundo, existem dois tipos de pessoas, Lia... — Seus olhos prendem os meus, me hipnotizando. — As que controlam... e as que são controladas.
Engulo em seco. Meu corpo inteiro arrepia, como se aquela simples frase tivesse atravessado minha espinha.
Ela se recosta na cadeira, cruzando as pernas novamente, com uma elegância que é quase uma provocação.
— Eu... — Tento organizar meus pensamentos, lutando contra aquele efeito absurdo que ela tem sobre mim. — E... acredita que isso também se reflete na sua vida pessoal?
Por um instante, o silêncio pesa. Os olhos de Victoria ficam ainda mais intensos. Quase sombrios.
Ela sorri. Devagar.
— Mais do que você imagina. — Sua voz baixa faz meu corpo inteiro formigar. — Mas... — Ela faz uma pausa, como se me medisse. — Este não é exatamente o tipo de pergunta acadêmica, é?
Meu rosto queima na hora.
— E-eu... — tropeço nas palavras. — N-não foi... minha intenção...
Ela ri, baixa, rouca. É um som lindo, mas que me provoca arrepios e borboletas no estômago.
— Relaxe, Lia. — Sua voz suaviza, mas o olhar não perde aquele tom... predador. — Eu não mordo.
Mente. Eu vejo nos olhos dela. Ela mente. Ela definitivamente morde... E mais do que isso.
— Ainda. — Ela completa, e meu coração simplesmente para por dois segundos.
Sinto que o ar some dos meus pulmões. Desvio o olhar por um segundo, fingindo arrumar minhas anotações, apenas para não desmoronar na frente dela.
Respiro fundo. Tento não desabar. Tento não corar mais do que já estou. Tento, tento... mas falho miseravelmente.
— Certo... — minha voz sai falha. — Vamos prosseguir...
Victoria não diz nada. Apenas observa. Seu olhar segue cada movimento meu, como se estudasse minhas reações, meus limites, meus medos... minhas fraquezas.
— Quais foram os maiores desafios que enfrentou como mulher nesse mercado tão... competitivo? — Pergunto, tentando puxar a entrevista de volta para um lugar mais seguro.
Ela cruza os braços, recostando-se mais ainda, como se estivesse confortável no jogo que, claramente, controla desde o primeiro segundo.
— Desafio? — Ela repete, como se testasse a palavra. — O maior desafio, Lia, foi ensinar a todos os homens ao meu redor que eu não sou... domável.
Sinto um arrepio. Forte.
Ela sorri, levemente. Seus olhos percorrem meu rosto, deslizam até meu pescoço... e então descem, discretamente, para meu colo. Rápido o suficiente para parecer acidental. Lento o bastante para que eu perceba.
Engulo em seco. De novo.
— E, às vezes... — Ela desliza os dedos pelos lábios, pensativa. — A questão não é quem está disposto a se submeter... mas quem tem coragem de se entregar.
Meu corpo inteiro responde. Uma mistura de calor, confusão, fascínio e um tipo de medo que não me faz querer fugir... mas chegar mais perto.
— E você, Lia? — Ela pergunta de repente. — Você é do tipo que gosta de ter o controle? Ou de... entregá-lo?
Meu cérebro simplesmente trava.
O que...
Que tipo de pergunta é essa...?
Mas, no fundo... bem no fundo... talvez eu já saiba a resposta.
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