(Capítulo 1)
O ar na Hawkins High School em 1984 cheirava a laquê, suor e a inevitável expectativa de um futuro incerto. Pelos corredores lotados, os armários batiam com o peso dos livros e dos segredos guardados ali dentro. A Hierarquia era visível como as jaquetas de time do colégio: populares, atletas, nerds, excluídos... cada um em seu quadrado (ou tentando desesperadamente sair dele).
No centro de um pequeno aglomerado perto dos bebedouros, estava Billy Hargrove. Lindo de um jeito perigoso, escorado nos armários com a confiança de quem sabia que todos os olhos estavam nele. O mullet loiro impecável, a jaqueta (jeans) surrada sobre uma camiseta de banda (provavelmente comprada para impressionar), os jeans justos. Ele ria alto de alguma piada de Tommy Hagan ou Carol Perkins, seus satélites menos brilhantes, que se penduravam em cada palavra dele como moscas no mel. Havia algo nele que atraía e intimidava em igual medida – uma energia bruta e imprevisível, como um motor de muscle car prestes a explodir.
Pelo corredor oposto, movendo-se com uma calma que destoava do caos ao redor, vinha Alex. Seu estilo era um sussurro mais sombrio em meio às cores berrantes dos anos 80. Calças jeans escuras e talvez um pouco rasgadas, uma camiseta de banda com uma estampa sutil, uma jaqueta de couro leve e desgastada. O cabelo era desalinhado de um jeito proposital, caindo um pouco sobre os olhos penetrantes. Ele não buscava atenção, mas sua presença era inegável. Ele era "na dele", observando o mundo com um leve ar de quem já tinha visto coisa demais para se surpreender facilmente.
Alex não estava prestando atenção especial ao grupo de Billy, apenas passando. Seus olhos varreram a multidão, registrando rostos, fofocas silenciosas, a microdinâmica social da escola. Foi então que ele ouviu. Alto o suficiente para que quem passasse por perto escutasse, Billy, rindo, soltou um comentário.
"Sério, olha só pra aquele cara ali...", Billy gesticulou displicentemente para um aluno que passava, talvez vestido de forma diferente ou simplesmente tímido. A risada dele e dos outros se espalhou. "...Parece que saiu direto do esgoto. Ou do clube de..." Billy fez uma pausa teatral, procurando a palavra mais ofensiva e debochada possível, e a cuspiu com desprezo: "...viadinhos."
Tommy e Carol riram ainda mais alto, reforçando a "piada". Era o tipo de comentário casual, cruel e nojento que Billy usava para afirmar sua heterossexualidade performática e sua posição no topo da cadeia alimentar social da escola.
Alex parou. Não de forma abrupta, mas como se a conversa ao redor tivesse ficado muda de repente. Seu olhar, antes apenas observador, focou no grupo de Billy. Não havia raiva flamejante em seus olhos, pelo menos não externa. Havia... decepção? Um cansaço profundo, talvez. E uma faísca de aço.
Ele não gritou, não fez um discurso. Apenas inclinou a cabeça ligeiramente, seu olhar encontrando o de Billy do outro lado do corredor. E com uma voz clara, calma, mas com uma lâmina afiada de sarcasmo por baixo, ele retrucou.
"Uau, Hargrove," Alex disse, sem aumentar o tom, mas alto o suficiente para que o riso de Billy diminuísse e alguns alunos próximos olhassem. "Seu vocabulário é tão avançado. Impressionante a originalidade."
O sorriso presunçoso no rosto de Billy congelou. Seus olhos azuis, que segundos antes brilhavam de escárnio, endureceram instantaneamente. A risada de Tommy e Carol morreu no ar. Ninguém falava com Billy Hargrove daquele jeito. Ninguém.
Alex não se moveu, apenas manteve o olhar fixo, uma sobrancelha levemente arqueada, como se estivesse esperando Billy dizer algo inteligente (e sabendo que ele não diria).
A surpresa inicial no rosto de Billy deu lugar a uma fúria súbita e intensa. Ele se desencostou dos armários como uma mola tensionada, sua postura ficando imediatamente mais agressiva. Ele deu um passo, depois outro, atravessando o corredor em direção a Alex. Tommy e Carol o seguiram a uma distância respeitosa, o choque ainda visível em seus rostos.
Billy parou a poucos centímetros de Alex, alto, ameaçador. Seu olhar era um estudo de raiva e... confusão? Ele não conseguia entender por que aquele cara, que ele mal conhecia, o desafiaria assim. E a forma calma e sarcástica com que Alex fez isso era irritante de um jeito que ele não conseguia nomear.
"O que você disse?", Billy rosnou, a voz baixa e perigosa, o tipo que fazia as pessoas recuarem. "Repete."
Alex não recuou. Seu olhar se manteve firme, sem medo, mas também sem provocação desnecessária agora. Ele apenas observava a fúria nos olhos de Billy, talvez vendo algo familiar nela.
"Você ouviu, Hargrove", Alex respondeu, a voz ainda calma, mas com um tom final que não deixava espaço para dúvidas. "Não sou pago para repetir piadas sem graça."
A tensão no corredor era palpável. Os alunos próximos fingiam não olhar, mas estavam absorvendo cada segundo. Billy Hargrove estava cara a cara com alguém que não parecia nem um pouco intimidado por ele. E a raiva nos olhos de Billy escalava, procurando uma saída, buscando reafirmar seu domínio.
Ele ergueu a mão, não para bater ainda, mas para agarrar Alex pelo colarinho, para diminuir a distância, para forçar uma reação de medo.
[Continua no próximo capítulo...]
(Capítulo 2)
O corredor silenciou por um instante, a fúria contida de Billy Hargrove preenchendo o espaço. A mão dele, grande e forte, esticou-se para agarrar o colarinho de Alex, um movimento instintivo para dominar, para puxar para perto e intimidar.
Mas Alex não era um dos alvos fáceis de Billy.
Com um movimento rápido e fluido, Alex girou levemente o corpo para o lado, desviando do alcance da mão de Billy. Foi quase imperceptível, não uma fuga assustada, mas uma esquiva controlada, a de alguém que sabe como evitar ser pego. Ele manteve o contato visual, a expressão impassível, mas a faísca de aço em seus olhos ainda estava lá.
Billy cambaleou meio passo para o lado, pego de surpresa pela esquiva suave. Seus olhos se arregalaram por uma fração de segundo – ninguém desviava dele assim, não ali, não na frente de todos. A surpresa se transformou em uma raiva ainda mais ardente.
"Tá se achando espertinho, é?!", Billy rosnou, reajustando a postura, o corpo tenso, pronto para escalar a agressão. Ele avançou novamente, o punho fechando.
Alex não esperou o ataque direto. Quando Billy se moveu, Alex ergueu os braços num gesto rápido e defensivo, bloqueando o primeiro impulso de Billy. Não era uma briga de rua desajeitada; havia uma técnica ali, uma eficiência que Billy não esperava. Alex usou a força de Billy contra ele por um instante, desviando o golpe e usando o momento para criar um pequeno espaço entre eles.
"Acho que você não entendeu", Alex disse, a voz ainda surpreendentemente calma, mas com uma firmeza inabalável. Ele não estava sorrindo sarcasticamente agora. Estava sério, os olhos focados. "Eu disse, não vale a pena."
Essa demonstração de habilidade, de controle em meio à própria fúria, pareceu chocar Billy mais do que qualquer soco poderia. O punho de Billy parou no ar por um instante. Ele estava acostumado com medo ou com desafios diretos e desajeitados. Não com essa calma competência. Ele viu a falta de medo nos olhos de Alex, não a bravata vazia de alguém que está prestes a apanhar, mas a confiança de alguém que sabe que não vai.
Uma mistura de choque, humilhação (pois vários olhares curiosos estavam sobre eles) e uma raiva confusa passou pelo rosto de Billy. Quem era aquele cara? Por que ele não estava agindo como todos os outros? E por que... por que Alex o estava encarando daquele jeito, com aquela quietude que parecia ver através dele?
Antes que Billy pudesse decidir entre lançar um ataque total ou recuar, o sino da escola tocou. Alto, estridente, implacável. O som rompeu a tensão, sinalizando o fim do período e o início do próximo.
A multidão no corredor, que havia se congelado, começou a se mover novamente, hesitante no início, depois com mais pressa, querendo sair dali e se distanciar do foco de perigo.
Billy e Alex permaneceram parados por mais um segundo, encarando-se. A respiração de Billy estava um pouco ofegante pela raiva contida. A de Alex era regular. O momento parecia durar uma eternidade, o barulho dos armários batendo e das vozes distantes preenchendo o silêncio entre eles.
Os olhos de Billy percorreram o rosto de Alex – o olhar firme, a leve marca de cansaço sob os olhos, a linha da mandíbula definida. Havia algo ali que ele não conseguia decifrar, algo que o irritava profundamente e o intrigava ao mesmo tempo. Era mais do que apenas o desafio. Era a autonomia de Alex, a maneira como ele se mantinha firme em sua própria pele, sem pedir permissão ou desculpas.
Alex não desviou o olhar. Ele viu a fúria nos olhos azuis de Billy, a performance agressiva, mas por um instante, ele pensou ter visto algo mais fugaz por baixo – uma faísca de surpresa, talvez até algo parecido com... reconhecimento? Ou era apenas a raiva?
Eventualmente, a necessidade de se mover, o fluxo de alunos aumentando ao redor deles, quebrou o impasse. Billy deu um passo para trás, seu maxilar travado. Alex fez o mesmo, virando-se calmamente.
Sem dizer mais uma palavra, Billy se virou abruptamente e abriu caminho pela multidão, Tommy e Carol apressando-se para segui-lo, lançando olhares de confusão e cautela para Alex.
Alex observou as costas de Billy se afastando, a pose ainda rígida, o cabelo loiro balançando levemente. Ele respirou fundo, a adrenalina diminuindo. Aquilo tinha sido... intenso. Diferente do que ele esperava. Billy Hargrove não era apenas um valentão barulhento; havia uma complexidade perturbadora por trás daquela raiva.
Ele ajustou a alça de sua mochila e continuou seu caminho pelo corredor, a cena ainda ecoando em sua mente. Ele sabia que aquele confronto não seria o fim. Era apenas o começo. E a raiva nos olhos de Billy, a forma como ele reagiu a ser desafiado por alguém como Alex... aquilo o deixou pensando.
E assim termina o segundo capítulo, com o confronto inicial e a primeira impressão forte mútua estabelecida. A semente foi plantada.
[ Continua no próximo capítulo.... ]
(Capítulo 3)
Os dias seguintes ao confronto no corredor foram carregados de uma eletricidade estranha para Billy Hargrove. A raiva inicial persistia, um caroço duro no estômago, mas algo mais estava misturado a ela: surpresa, uma pontada de humilhação e uma curiosidade irritante que ele não conseguia sacudir. Quem diabos aquele cara pensava que era? E por que diabos ele não teve medo?
Enquanto isso, Alex seguiu sua rotina, imperturbável por ter provado a fúria de Billy Hargrove. Ele não estava procurando por mais problemas, mas também não estava se escondendo. E ele fez a mudança no visual que vinha pensando em fazer.
Dois dias depois, no final da tarde, o sol de Hawkins começava a se pôr, pintando o céu de tons alaranjados e roxos. Billy estava fumando um cigarro perto da beira da quadra de basquete externa, observando o time treinar, a mente inquieta. Tommy e Carol estavam por perto, tagarelando sobre alguma fofoca irrelevante, mas Billy mal os ouvia.
Foi então que ele viu Alex.
Ele estava sentado sozinho nos degraus de concreto da arquibancada vazia, um pouco afastado, olhando para o nada enquanto ouvia algo em seus fones de ouvido. Mas o que realmente chamou a atenção de Billy foi a mudança.
O cabelo de Alex estava mais curto, cortado de forma a contrastar bruscamente com os traços angulares do seu rosto, realçando suas maçãs do rosto e o maxilar. Não era um corte tradicional "de garoto", mas algo com mais atitude, mais ousadia.
Ele usava um suéter preto de tecido fino que se ajustava perfeitamente ao seu tronco, delineando um físico atlético e bem cuidado sob a roupa – algo que Billy, que passava horas na academia, notou instantaneamente. O suéter estava enfiado dentro de uma calça jeans preta justa e rasgada em alguns pontos estratégicos, capturando perfeitamente o estilo despojado, mas intencional, dos anos 80 rebeldes.
Uma gargantilha preta apertada, lembrando uma coleira de cachorro, adornava seu pescoço. Piercings brilhavam na luz dourada do fim de tarde: uma argola sutil no lábio inferior, um pequeno no nariz e um na sobrancelha direita. Brincos adicionais pendiam de suas orelhas. Um colete curto cinza escuro, com alguns bottons de bandas de rock, completava a parte de cima, e nos pés, botas escuras de estilo gótico reforçavam a estética única. Um cinto preto com detalhes de rock prendia a calça.
Alex parecia saído de uma revista underground, um completo contraste com o visual mais tradicionalmente "cool" e esportivo que dominava a escola. Ele exalava uma autoconfiança silenciosa que era quase irritante.
Billy sentiu a familiar onda de irritação e desafio, mas dessa vez havia uma camada inegável de... fascínio? Curiosidade? Ele jogou o cigarro no chão e o apagou com a bota, ignorando o que Tommy estava dizendo.
"Relaxa, cara", disse Tommy, notando a mudança no humor de Billy. "Esquece aquele esquisito."
Mas Billy não conseguia esquecer. Ele precisava entender. Precisava de uma resposta. Ele se afastou de Tommy e Carol, que trocaram olhares confusos, e caminhou direto na direção de Alex.
Os passos de Billy ecoaram no concreto enquanto ele se aproximava. Alex pareceu não notar até que Billy estava a poucos metros de distância. Ele tirou os fones de ouvido, sem pressa, e virou a cabeça para encarar Billy, a expressão neutra.
"O que você quer, Hargrove?", Alex perguntou, a voz calma e direta, sem sarcasmo imediato, apenas um leve tom de cansaço. Ele não parecia surpreso em ver Billy.
Billy parou bem na frente dele, olhando para baixo. O novo visual de Alex era... impactante. Diferente. O cabelo curto realçava os olhos de Alex, e os piercings, a gargantilha... tudo nele gritava "não me importo com o que você pensa", e isso irritava Billy de um jeito que ele não entendia.
"Por que você fez aquilo?", Billy disparou, ignorando a pergunta de Alex. Não se referia apenas ao confronto, mas a tudo – a resposta, a falta de medo, a forma como Alex o olhou.
Alex inclinou a cabeça ligeiramente, a sobrancelha com o piercing arqueando. Ele pareceu considerar a pergunta por um momento.
"Fiz o quê?", Alex finalmente respondeu, um leve toque de sarcasmo retornando em sua voz. "Não ri da sua piada idiota? Ou não saí correndo quando você fez sua pose de macho alfa?"
A menção à "pose de macho alfa" atingiu Billy de uma forma estranha. Era exatamente o que ele estava fazendo, o que ele tinha que fazer. E Alex viu através disso. A raiva voltou, mas ainda misturada com aquela irritante curiosidade.
"Você acha que é esperto, não é?", Billy disse, a voz baixa e ameaçadora.
"Eu não acho", Alex retrucou calmamente. "Eu sou. E você, Hargrove? Além de ser barulhento, o que mais você é?"
A pergunta pairou no ar. Era uma pergunta que Billy nunca tinha parado para se fazer. Ele era o garoto popular, o atleta estrela, o rebelde. Mas além da fachada... o que mais? A raiva nos olhos de Billy vacilou por um instante, substituída por uma defensiva confusa.
"Não venha com essa de psicólogo de araque pro meu lado", Billy disse, tentando soar duro, mas a frase saiu com uma pontada de incerteza.
Alex não sorriu. Apenas manteve o olhar firme. "Não sou psicólogo. Só não suporto gente que se esconde atrás de barulho e preconceito. É patético."
"Patético?", Billy deu um passo à frente, a paciência esgotando, mas ainda contido por algo – talvez a calma inabalável de Alex, talvez a verdade incômoda nas palavras dele. "Você não sabe nada sobre mim!"
"Talvez não", Alex concedeu, para a surpresa de Billy. "Mas sei o suficiente para saber que quem precisa se provar o tempo todo gritando e pisando nos outros... geralmente está morrendo de medo de alguma coisa." Alex fez uma pausa, seu olhar mais suave por um instante, quase convidativo, antes de voltar a ser afiado. "Medo não serve para nada, Hargrove. Só atrapalha."
As palavras ecoaram para Billy. "Medo não serve para nada... só atrapalha." Isso ressoou de uma forma estranha, tocando em algo profundo e escondido. Ele pensou na sensação que teve no corredor, aquela hesitação que não deveria estar ali. Pensou... em Alex. A raiva em Billy começou a se misturar com uma inquietação genuína. Ele não conseguia rotular Alex. Não conseguia intimidá-lo. E Alex, de alguma forma, parecia ver algo dentro dele que Billy mantinha trancado a sete chaves.
Billy encarou Alex, seus punhos cerrados ao lado do corpo. A tensão não era mais apenas raiva; era algo mais complicado, confuso. Uma luta interna se refletia em seus olhos. Alex apenas o observava, esperando, sem pressionar, mas também sem desviar o olhar.
O sol continuava a descer, lançando longas sombras no chão da quadra. O ar esfriava. O confronto tinha terminado, mas a interação, a conexão estranha e indesejada, estava apenas começando.
[Continua no próximo capítulo...]
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