Amor à Primeira Mordida
Desastre na cozinha e paixão secreta.
Farinha voava como neve em pleno verão, grudando nos cabelos já rebeldes de Beatriz. O aroma que deveria ser de baunilha e promessa de bolo fofinho, na verdade, lembrava mais a fumaça de um incêndio incipiente. A cozinha antes de um santuário de receitas da avó, agora se assemelhava a um campo de batalha onde a confeitaria havia declarado guerra e Beatriz, claramente, estava perdendo.
Beatriz
DROGA, DROGA, DROGA!
Ela murmurou tentando, em vão, descolar um pedaço de massa crua que teimosamente se agarrava ao seu dedo. Aquele bolo, que ela pretendia ser uma obra-prima, foi um desastre colossal. A cobertura, líquida e sem graça, escondida pelas laterais como lágrimas de frustração. O interior, bem, o interior era uma incógnita, mas Beatriz apostava que estaria cru quanto suas esperanças de impressionar certa pessoa.
Essa pessoa, claro, era Gabriel...o capitão do time de futebol da escola...com seus olhos cor do céu e um sorriso que derretia mais corações do que uma fornada de biscoitos no forno. Gabriel, o objetivo da paixão secreta e avassaladora de Beatriz, que fazia suspirar pelos cantos da escola e rabiscar seu nome em todos os cadernos.
O problema era que Gabriel parecia viver em um universo paralelo, um onde Beatriz não existia ou, na melhor das hipóteses, era apenas mais um membro independente da multidão. Ela precisava de um plano, algo grandioso, algo...doce.
Na sua mente, tudo parecia tão claro: Um bolo perfeito, uma demonstração de talento culinário que faria Gabriel perceber que ela era mais do que apenas uma garota desastrada. Ele veria seu talento, seu esforço, e, quem sabe, a paixão que ela escondia por ele. Mas a realidade era cruel e implacável. Aquele bolo, em vez de ser a chave para o coração de Gabriel, era mais um tijolo no muro da friend zone.
Respirando fundo, Beatriz tentou manter a calma. Ela precisava de uma perspectiva. Precisava da opinião de sua amiga Sofia. Depois que limpou a bagunça (ou pelo menos, tentou), Beatriz pegou o celular e discou o número da amiga. Sofia era âncora dela, a voz da razão em meio ao seu caos particular.
(Sofia atendeu a ligação de Beatriz)
Beatriz
Sofia, preciso de ajuda!
Aconteceu de novo!!
(Disse Beatriz, com a voz embargada)
Sofia
Deixe-me adivinhar: A cozinha sobreviveu?!
(Respondeu Sofia, com um tom divertido que aliviou um pouco a tensão de Beatriz)
Beatriz
Sobreviveu...mas o bolo...um caso perdido!
Sofia
Rexala, Bee, bolos vêm e vão. Mas me conta, tentando impressionar o Gabriel de novo?
Beatriz
Talvez...só talvez! Eu queria fazer algo especial, sabe? Mostrar que sou mais do que...
Sofia
Mais do que uma garota que tropeça nos próprios pés e derruba café em todo mundo? Bee, você é muito mais do que isso!! E Gabriel deveria enxergar isso sem precisar de um bolo.
Sofia
Ah, o Gabriel...deixe-me refrescar sua memória: Ele, quando tá com preguiça de arrumar o cabelo, usa gel em excesso, e, tem um vocabulário limitado a termos esportivos...
(Beatriz revirou os olhos)
Sofia sempre tinha uma lista interminável de defeitos (reais ou imaginários) de Gabriel, numa tentativa desesperada de conseguir fazê-la enxergar a realidade.
Beatriz
Sofia, você tá exagerando.
(Protestou Beatriz, mesmo sabendo que sua amiga tinha um ponto)
Sofia
Estou sendo realista! Você merece alguém que te valoriza pelo que você é, e não pelo bolo que você faz!! Aliás, você não acha que ele é um pouco...superficial?!
Beatriz
Ele é popular Sofia, é diferente!
(Beatriz protestando novamente)
Sofia
Sinceramente, ele parece mais preocupado com a própria imagem do que com qualquer outra coisa.
Beatriz sabia que Sofia estava certa, pelo menos em parte. Gabriel era bonito e popular, mas será que ele era realmente tudo aquilo que ela imaginava?! Será que ela estava apaixonada por ele, ou, pela ideia de quem ela pensava que ele era?!
Ignorando os avisos da amiga, Beatriz decidiu que precisava de um plano. Ela não poderia simplesmente desistir. Gabriel vê-la, notá-la. E um bolo, um bolo perfeito, ainda parecia ser a melhor maneira de conseguir isso.
Depois de se despedir de Sofia, Beatriz, caminhou até a estante da cozinha, onde encontrou o livro de receitas da avó. Era uma livro antigo, com páginas amareladas que contavam histórias de gerações de cozinheiros. Folheando as páginas, ela encontrou uma receita de bolo de chocolate que parecia promissora.
Era complexa, com ingredientes exóticos e técnicas elaboradas, mas Beatriz sentiu um lampejo de inspiração.
Por um momento ela se imaginou na sala de jantar, depois de ter preparado o bolo perfeito, com Gabriel observando com admiração. Ele provaria o bolo, se encantaria com o sabor e, finalmente, perceberia o quão especial ela era.
Mas a realidade logo a atingiu como um balde de água fria. Ela mal conseguiu fazer um bolo simples, quanto mais uma obra-prima da confeitaria. Ela precisa de alguém que entendesse de bolos, alguém que pudesse guiá-la em sua jornada culinária. Mas quem!?!
Lucas: A salvação de beatriz
Beatriz ficou olhando para a página amarelada do livro, como se a resposta fosse saltar das entrelinhas da receita. Fechou os olhos por um momento, tentando pensar em alguém — qualquer um — que pudesse salvá-la do desastre açucarado que sua vida amorosa estava se tornando.
E então, como uma lembrança inconveniente que o coração finge esquecer, surgiu o nome: Lucas.
Lucas, seu ex-namorado. O garoto dos olhos tranquilos, das mãos firmes e da risada fácil. Ele era o tipo de pessoa que não precisava de popularidade para chamar atenção. Bastava vê-lo preparar algo na cozinha — cada movimento seguro, cada medida exata — e parecia que o mundo ao redor desacelerava só para assistir. Ele fazia mágica com farinha e manteiga, como se cada receita fosse um feitiço.
Eles tinham terminado há quase um ano.
Foi um término pacífico, sem brigas ou mágoas explícitas, mas cheio de palavras não ditas. Beatriz não sabia ao certo por que tinham se afastado. Talvez fosse o fato dela se sentir invisível demais ao lado dele — não por culpa dele, mas por uma insegurança que vinha de dentro.
Lucas sempre foi intenso, cuidadoso. Amoroso demais, talvez, para o momento em que ela ainda não sabia o que queria. E agora, ironicamente, ele era justamente o que ela precisava.
Engolindo o orgulho, pegou o celular e mandou uma mensagem:
Beatriz
Oi. Preciso de ajuda com um bolo. Urgente. Topa?
A resposta veio quase instantaneamente...
Lucas
Sempre. Me diz quando e onde.
Beatriz não respondeu de imediato...se arrumou e foi dar uma olhadinha no treino do time de futebol da escola...
Enquanto isso, em um canto ensolarado do campo, Gabriel ria alto cercado por seus colegas do time. O som da sua gargalhada era como um alarme que disparava o coração de Beatriz sempre que o ouvia.
Mas, ao observá-lo de longe, algo começou a mudar em sua percepção.
Sim, ele era bonito. Os cabelos cuidadosamente bagunçados, os olhos cor do céu que pareciam captar a luz como vidro, o sorriso de comercial de pasta de dente.
À medida que Beatriz o observava, começou a notar o que antes ignorava: as conversas sempre giravam em torno dele, as piadas que ele ria eram, quase sempre, às custas de alguém, e ele raramente olhava nos olhos das pessoas quando falava.
E pela primeira vez, ela se perguntou: Será que eu gosto dele...
Seu momento de lucidez durou pouco...
Beatriz, finalmente respondeu Lucas...
Beatriz
Sábado. Vou aí na sua casa...
Lucas
Perfeito. Combinado.
No sábado, Beatriz foi até a casa de Lucas. A cozinha era do mesmo jeito que ela lembrava — cheia de potes etiquetados, utensílios organizados com precisão cirúrgica e o cheiro constante de algo assando no forno.
Lucas a recebeu com um sorriso tímido, mas caloroso.
Lucas
Você veio armada de paciência ou de farinha?
Beatriz
Só com esperança... e um pouco de desespero.
(Ela respondeu rindo)
Enquanto começavam a preparar a massa, algo curioso aconteceu...
A tensão foi se desfazendo. O silêncio entre eles não era desconfortável, mas cheio de lembranças.
Lucas era paciente, didático e, a cada gesto, parecia tentar reconstruir uma ponte entre eles — uma colherada de cada vez.
Mas o universo, é claro, não deixaria as coisas simples.
A nova aluna
Na segunda-feira seguinte, uma nova aluna entrou na escola. Manuela. Linda, com um olhar afiado e um sorriso estrategicamente encantador.
Era a ex de Lucas — o tipo de ex que não sabia aceitar o fim.
Bastou ela avistar Beatriz no corredor, para que os olhos estreitassem como uma caçadora escolhendo a presa.
E Manuela era o tipo de garota que jogava para ganhar. Fazia silêncio virar atenção.
Quando entrou na sala de aula, foi como se todos os olhares gravitassem em sua direção, como se a própria luz do sol decidisse favorecê-la.
Beatriz não a reconheceu de imediato, mas Lucas, sim.
Lucas
Ela voltou...
(disse ele em voz baixa)
Beatriz
Ela quem?
(Beatriz perguntou, franzindo a testa)
Beatriz demorou dois segundos para fazer a conexão. Três para lembrar das poucas vezes que Lucas mencionara a ex. E quatro para perceber que Manuela estava parada alguns passos atrás deles, observando com um sorriso que não era exatamente amigável.
Disse Manuela, com a voz melódica de quem treina cada sílaba como se fosse parte de um encantamento...
Manuela
E… você deve ser Beatriz, certo? Já ouvi muito sobre você.
Beatriz
Posso dizer o mesmo. Ou quase nada, na verdade.
Beatriz respondeu, com um sorriso doce que escondia o amargor da intuição afiada.
Manuela
Espero que esteja cuidando bem dele.
Disse Manuela, sem perder a pose.
Manuela
Lucas é ótimo na cozinha… e em muitas outras coisas.
Lucas limpou a garganta, visivelmente desconfortável.
Lucas
Manuela, a gente já falou sobre limites...
Manuela
Falei só de bolo, relaxa!
(Ela piscou)
Mas Beatriz sabia: guerra declarada.
Nos dias que se seguiram, Beatriz se viu dividida entre três frentes:
• Evitar Manuela e seus comentários passivo-agressivos.
• Manter o foco no projeto do “Bolo Perfeito” com Lucas, que estava cada vez mais empenhado — e mais próximo.
• Lidar com o fato inusitado de que Gabriel estava finalmente começando a notá-la.
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