O corredor estava barulhento com o som de armários se abrindo e estudantes trocando risadas antes da próxima aula. Luna caminhava rápido, os livros apertados contra o peito, tentando evitar olhares. Desde que as cartas foram enviadas, ela sentia como se andasse com um farol apontado para ela.
Então, ela o viu.
Peter encostado no armário, cercado por dois amigos, sorrindo daquele jeito despreocupado que ele sempre tinha. Mas quando os olhos dele encontraram os dela, o sorriso diminuiu. Ele murmurou algo para os amigos e se afastou em sua direção.
O coração de Luna acelerou. Ela pensou em correr, fingir que não viu, mas era tarde demais.
— Luna, posso falar com você um minuto? — disse Peter, parando na frente dela, a expressão curiosa, mas sem zombaria.
— Ah... claro — respondeu ela, tentando manter a voz firme.
Ele apontou com a cabeça para uma parte mais tranquila do corredor, perto da escada de emergência. Ela o seguiu, o silêncio entre os dois mais alto que todo o barulho ao redor.
Peter encostou-se à parede, cruzando os braços.
— Então... recebi sua carta. Aquela.
Luna engoliu seco. — Eu juro que não era pra ninguém receber. Foi um engano. Uma catástrofe, na verdade.
Peter sorriu de lado, como se achasse graça da escolha de palavras. — Não foi ruim, sabe? Quer dizer... foi surpreendente. Mas... interessante.
Ela não sabia o que responder. Queria que o chão a engolisse.
Ele inclinou um pouco a cabeça, analisando-a.
— Só que tem um problema. A Rebecca viu a carta também. E agora acha que eu estou te usando pra deixá-la com ciúmes. E você, pelo visto, está tentando escapar do... Josh?
Luna arregalou os olhos. — Como você...?
— Eu conectei os pontos. E tive uma ideia.
Ela franziu o cenho. — Que ideia?
Peter descruzou os braços e se aproximou um pouco.
— E se a gente fingisse? Um namoro de mentirinha. Você afasta o Josh, eu provo pra Rebecca que superei. Todo mundo sai ganhando.
Luna piscou, confusa. — Um namoro falso?
Peter sorriu. — Só até a poeira baixar. O que me diz?
Luna hesitou, olhando para ele como se tentasse decifrar se aquilo era mesmo real. Seu coração batia tão alto que parecia ecoar nos ouvidos.
— Isso... parece loucura — ela murmurou, abraçando os livros com mais força. — E se der errado?
Peter deu de ombros com aquele charme despreocupado que parecia natural nele.
— E se der certo?
Ela arqueou uma sobrancelha. — A gente ia ter que... agir como um casal?
— Exatamente. Mãos dadas nos corredores, talvez sentar juntos no refeitório, algumas fotos no Instagram... o básico.
Luna desviou o olhar, tentando processar. Ela não era o tipo de garota que entrava em joguinhos ou planos mirabolantes. Mas desde que aquelas cartas vazaram, tudo estava de cabeça para baixo. E a ideia de evitar Josh — que agora olhava para ela com uma mistura de confusão e expectativa — era tentadora. Talvez até necessária.
— E... quais seriam as regras? — ela perguntou, quase sem perceber que estava cedendo.
Peter sorriu como se soubesse que já tinha vencido.
— A primeira: sem se apaixonar, é claro.
Luna olhou para ele com uma expressão séria.
— Ótimo. Porque isso não vai acontecer.
Eles trocaram um olhar firme, quase desafiador, mas por um breve segundo, algo ali suavizou. Um reconhecimento silencioso de que, a partir daquele momento, tudo mudaria — mesmo que fosse apenas por "fingimento".
— Então... temos um acordo? — Peter estendeu a mão.
Luna olhou para a mão dele por um instante e depois apertou, com um leve suspiro.
— Temos.
No dia seguinte, Luna já se arrependia um pouco de ter dito sim. Ela entrou no colégio tentando parecer indiferente, mas seu estômago estava em guerra. Fingir um relacionamento com Peter não era exatamente uma tarefa simples. Ele era popular. Bonito. Confiante. Tudo o que ela não era — ou, pelo menos, achava que não era.
Quando ela dobrou o corredor principal, lá estava ele. Encostado na parede, olhando o celular com uma expressão tranquila demais para alguém prestes a iniciar uma encenação pública.
Peter levantou os olhos e sorriu.
— Pronta, namorada?
Ela corou. — Isso vai soar menos esquisito com o tempo, né?
— Com certeza. Ou a gente se acostuma, ou vira lenda no grupo do terceiro ano.
Antes que ela pudesse responder, ele entrelaçou os dedos nos dela. Simplesmente assim. Como se fosse o tipo de coisa que já fazia há meses.
— O que você tá fazendo? — ela sussurrou, surpresa.
— Regra número dois: casais de verdade andam de mãos dadas, lembra?
— Eu não lembro de ter concordado com uma segunda regra.
— Acabei de inventar — disse ele, piscando um olho.
E, então, eles seguiram juntos pelo corredor. As pessoas notaram. Era impossível não notar. Luna sentia os olhares queimando suas costas e ouviu cochichos se espalhando. Peter parecia imune a tudo isso. Ele sorria, conversava, agia como se aquilo fosse o mais normal do mundo.
Quando chegaram ao armário dela, ele se encostou ao lado.
— Então, a gente devia pensar em mais algumas regras. Pra manter tudo sob controle.
Luna o olhou com desconfiança. — Tipo quais?
— Nada de beijos fora de “cena”, encontros ensaiados nos intervalos, e talvez… uma história de como tudo começou.
— Uma história? Você quer mesmo criar uma narrativa?
— É um namoro de mentira, Luna. Quanto mais real parecer, melhor.
Ela suspirou. — Ok. Mas nada de surpresas. Se alguém perguntar, a gente vai dizer que tudo começou depois que você recebeu a carta.
Peter sorriu. — Essa parte, pelo menos, é verdade.
Ela sorriu de leve, sem perceber.
Pela primeira vez desde que as cartas foram enviadas, Luna sentiu que talvez pudesse ter um pouco de controle sobre o caos. Ou pelo menos fingir que tinha.
Perfeito! Aqui está a continuação da história, ainda do ponto de vista de Luna, mostrando o impacto do namoro fake na escola e o primeiro “encontro”. Depois disso, o próximo trecho será a perspectiva de Peter.
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O boato se espalhou antes do almoço.
Quando Luna entrou no refeitório com Peter, já sentia os olhos em cima deles como holofotes. Alguém da turma de teatro até soltou um “Quem diria, Luna!” — o que era especialmente estranho, considerando que eles nunca tinham nem conversado direito antes.
Peter, claro, agia como se fosse o rei daquele palco. Ele pegou duas bandejas, entregou uma a ela, e escolheu uma mesa bem no centro do refeitório.
— Aqui? — Luna sussurrou, desconfortável.
— Regra três: casais confiantes não se escondem — disse ele com um sorriso.
Ela sentou com cuidado, ainda se perguntando como aquilo tinha virado sua vida. A conversa ao redor era quase um fundo musical, cheio de sorrisos curiosos e perguntas não ditas.
— Então, quantas pessoas já te perguntaram se a gente é de verdade? — Peter perguntou, mordendo um pedaço de pizza.
— Três. E uma delas foi a bibliotecária.
Ele riu alto, e Luna não pôde deixar de sorrir também.
— Eu disse que ia funcionar. Ninguém vai mais te encher por causa do Josh. Aliás, ele me olhou estranho no corredor da ciência, talvez alguma coisa já tenha chegado no ouvido dele. Foi ótimo.
Ela o encarou. — Você está mesmo se divertindo com isso?
Peter deu de ombros. — Um pouco. Mas também estou ajudando você, lembra?
— Por enquanto. A qualquer momento, isso pode desandar.
Ele fez um gesto teatral. — Quando isso acontecer, a gente termina dramaticamente. Quem sabe até com uma lágrima.
Luna balançou a cabeça, mas estava rindo. Por mais absurdo que fosse, aquele acordo estava funcionando.
Ela só esperava que seu coração lembrasse que aquilo era só uma farsa.
Peter não achava que uma carta boba pudesse mudar alguma coisa — até aquela carta.
Ele não esperava gostar de ler aquilo. Mas gostou. A forma como Luna falava sobre ele era diferente. Não como se ele fosse só o cara popular ou o jogador do time. Ela reparava nas pequenas coisas. No jeito como ele penteava o cabelo quando estava nervoso. Em como ele ria meio abafado quando achava algo realmente engraçado.
Aquilo o fez olhar pra Luna com outros olhos.
Ela era diferente. Reservada, mas inteligente. Observadora. Meio estabanada às vezes, mas com uma presença calma. E agora, ela era sua "namorada" — mesmo que fosse só um acordo.
Peter não se importava com os cochichos. Ele gostava de causar burburinho. Mas com Luna, era diferente. Ele queria que ela se sentisse segura. Que a escola deixasse de ser um campo minado pra ela.
Naquele almoço, quando ela relaxou um pouco e sorriu de verdade, ele pensou algo que não ousou dizer em voz alta:
Talvez fingir não seja tão diferente de sentir.
Peter não era o tipo de cara que complicava as coisas. Ele jogava bem, tirava notas razoáveis, tinha amigos que o adoravam e uma ex-namorada que ainda rondava sua vida como se o mundo girasse ao redor dela.
Mas Luna... Luna era outra história.
Nos primeiros dias do namoro de mentira, ele achou que ia ser fácil. Um roteiro simples: segurar a mão dela nos corredores, sentar junto no refeitório, aparecer nas redes sociais com uma legenda fofa. Fácil. Controlado. Conveniente.
Mas aí começaram as pequenas coisas.
Como o jeito que ela mordia o canto da boca quando estava nervosa. Ou como sua risada escapava sem querer quando ele falava bobagem. Ou ainda, a forma como ela o olhava com um misto de desconfiança e curiosidade — como se tentasse decifrá-lo página por página.
Na sexta-feira, ele a encontrou sentada na biblioteca, lendo Orgulho e Preconceito, com os fones no ouvido e os cabelos meio presos com um lápis. Ele não disse nada de imediato. Ficou só observando por alguns segundos. Era estranho... mas também confortável.
Ela olhou para cima, surpresa com a presença dele.
— Você me seguiu? — perguntou, meio divertida, meio desconfiada.
— Eu juro que vim pegar um livro. — Ele mostrou um exemplar aleatório nas mãos. Era um guia de biologia marinha.
Luna arqueou a sobrancelha. — Você tem zero aulas de biologia.
— Talvez eu esteja me reinventando.
Ela sorriu, e foi aí que Peter sentiu o alerta mental: zona de risco.
Porque se apaixonar não fazia parte do acordo. E, mesmo assim, algo nele começava a se inclinar para isso. Uma parte dele gostava de ver aquele lado da Luna que quase ninguém conhecia. E mais do que isso: ele queria protegê-la da escola, do caos, do Josh — e até dele mesmo.
Fingir está começando a parecer real demais, pensou.
E quando ela estendeu a mão e disse: “Senta aqui um pouco”, ele não hesitou.
E não foi porque estavam atuando.
Foi porque, naquele momento, não fingir pareceu mais verdadeiro do que qualquer coisa que já tinha vivido.
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